THEODOR - [TROCA]

{Capítulo III: Uma refeição com a realeza}

    Um verdadeiro incômodo.

    Olhei para a situação em que se encontrava o meu pé, oh, certo. Esse não era meu corpo, mas ainda assim era desagradável o fato de nenhum médico ter vindo checar o estado do príncipe que caíra em uma cratera, pelo visto não era bem-vindo nem mesmo no palácio.

    Me arrependo de ter dado atenção a este galo, se houvesse o ignorado até ter conseguido sair de lá, isso não haveria acontecido.

— Reclamar não irá me tirar dessa situação — suspirei deixando que esses olhos espalhafatosos se encontrassem com o espelho a minha frente, e estranhando a aparência que via, ergui uma mecha do cabelo ruivo para cima — Uma crina de um galo, não há dúvidas... Deveria ir ao templo demonstrar meu sincero perdão a deusa por usar seu nome de maneira inadequada?

    Fazia cerca de uma hora que havia despertado, e tudo o que fiz foi analisar a situação horrenda em que me encontro, e admirar o grande hematoma em meu pé, talvez não conseguisse levantar de forma devida. Como não possuía nem uma solução a primeira vista, decidi não me desesperar e ir seguindo o fluxo por ao menos uma semana para ver o que ocorre, minha família saberia lidar com uma nova personalidade por algum tempo, então não estava preocupado, mas se durante esse tempo nada ocorrer,

    Aí sim estarei livre para me desesperar.

    Cheguei a conclusão que estava nessa situação devido a ambos ter desejado a morte um do outro em nome de uma divindade, já que o clarão que preencheu aquela cratera não era normal, muito menos despertar em um corpo que não é o seu.

— Talvez me convertendo em sacerdote a deusa reconheça o meu arrependimento...

   Toc, toc.

— Pois não? — saí de meus desvaneios com o som. Será que ao final haviam enviado um médico? Era realmente um incômodo ficar manco.

— Sua majestade, a rainha, pediu para informar aos príncipes que hoje o jantar ocorrerá mais cedo devido a alguns compromissos com o rei, esteja no palácio principal dentro de trinta minutos, é melhor não inventar de fazer uma cena só por conta de sua quedinha, sei que fez isso só para se manter no quarto — uma voz feminina com um tom debochado e sem a mínima força de vontade de falar, ressoou atrás da porta. E sem me dar tempo de dizer qualquer coisa, pude ouvir os sons de salto se afastando.

    Uma quedinha?

    Olhei novamente para o hematoma roxo, para ter certeza que minha visão não estava me pregando peças, e de fato, não estava.

— Era uma servente...? Pelo seu tom não acho que irá vir mais ninguém aqui — com um suspiro desolado, apostei toda a minha resistência mental para conseguir me arrumar como uma pessoa descente. E manca.

    Olhei para aquele cabelo ondulado de galo que havia molhado no banho, e cheguei a conclusão que não sabia como lidar com ele, então apenas fiz como o meu tio Xavier e deixei que o tempo o moldasse.

    Estava acostumado a me arrumar de maneira rápida, então em menos de vinte minutos já estava nos corredores do palácio principal, que não era tão distante de onde estava localizado o do quarto príncipe.

— Com licença — chamei um servente, que passou por mim como se eu fizesse parte da decoração.

    Que tratamento agradável, não?

— Eu disse, com licença — me voltei para trás segurando com força o braço dele, talvez pela sua expressão tenha doído um pouco.

— Me solte! O que você quer!? — ele tentou se soltar do aperto, mas para a minha surpresa, o corpo do quarto príncipe também possuía uma força descente, talvez pelo uso de arco?

— A direção para o salão de jantar — ele pareceu duvidar um pouco sobre o que responder, não irei julga-lo dessa vez, deve causar estranheza alguém perguntar o local em que come todo dia. Mas por precaução coloquei um pouco mais de força no aperto.

— Está bem, está bem! Siga o corredor principal e entre no terceiro, o salão está na segunda porta — soltei o braço do rapaz, que murmurou algumas ofensas enquanto se afastava.

    As vezes a violência é a resposta, mas eu estava manco, e em um território desconhecido, então me abstive de socá-lo.

    Segui a direção informada e para minha humilde surpresa cheguei ao lugar que esperava, porém antes de abrir a porta uma memória desagradável preencheu minha mente.

    Teria que me curvar.

    Não pude evitar minha expressão de desgosto, era um costume intrínseco em minha família que não deveríamos abaixar a cabeça à ninguém da realeza, entretanto estava no corpo de um príncipe sem nenhuma competência e desprezado, isso não seria ignorado. 

    Respirei fundo, deixando meu orgulho de lado para entrar no salão, e o ambiente era de fato... algo.

— Presto meus respeitos às vossas majestades, luzes do reino, que a glória esteja convosco — deixei que meu corpo se curvasse de maneira perfeita, e mesmo sem ver o que estava em minha frente, podia sentir inúmeros olhares hostis cravados em mim.

— Basta, apenas se sente — recebendo a estranha aprovação, me guiei ao único assento vazio.

     A ânsia invadiu meu estômago, não havia nenhum motivo visível para ficar daquela forma, porém para um bom entendedor, meia palavra basta.

    Repulsivo.

    A presença do quarto príncipe não era de fato requerida, nem mesmo entre a família. Isso era curioso.

    Não posso crer que por um momento fiquei interessado sobre a família real, que desserviço.

    O rei começou a comer, permitindo que os outros que estavam na mesa fizessem o mesmo, e havia alguns rostos familiares sentados comigo.

— Soube que caiu em uma cratera junto com o jovem marquês de Morisete — a rainha comentou, sem sequer tirar os olhos de seu prato. Como não era uma pergunta, não havia o que responder, então apenas continuei a cortar meu bife — Receio que seus modos tenham sido afetado por aquele jovem — sua voz não parecia nada contente.

— Peço que ignore a grosseria de meu irmão, vossa majestade. A senhora o conhece — a princesa ao meu lado tomou partido, por conta disso pude reconhecer a voz que havia me chamado mais cedo, a garota possuía o mesmo cabelo cor-de-galo.

    Não tinha estômago para aturar troca de ofensas durante a refeição.

— Peço perdão, a dor não está me permitindo pensar como deveria — mentira, porém se quisesse saber sobre algo que me mandasse um médico em primeiro lugar.

— Oh, céus! O príncipe se machucou? Que pena — a primeira concubina colocou as duas mãos na boca, deixando que uma expressão surpresa e deprimida a tomasse.

— Se queixando de algo assim, poderia lhe confundir com uma princesa, Zayn — agora foi a vez do príncipe herdeiro.

    Ainda estava na metade do prato, seria um desperdício me retirar antes da sobremesa, então apenas me concentrei em minha comida. De qualquer forma, essas ofensas não eram dirigidas a mim.

— Soube que o número de refugiados aumentou, o reino de Andi já está sendo invadido, deveríamos tomar medidas antes que toda a nossa fronteira do leste esteja comprometida — o rei soltou de forma casual a bomba durante o jantar — o que estão fazendo a respeito?

— Estou intermediando contato com o império de Valley, eles devem nos enviar ajuda em breve. Iselin não irá atacar de forma tão descuidada nosso reino se o império estiver abertamente ao nosso lado — O príncipe herdeiro deixou que a confiança saísse em sua voz.

— Enquanto não recebemos resposta do império, mobilizei algumas tropas privadas para fazer a segurança da fronteira de Sivan. Tentei contato com o Marquês de Morisete, mas não acho que irão se manifestar... — a voz do terceiro príncipe era um pouco incerta, e deixou que vacila-se ainda mais no final.

— Contanto que façam seu trabalho na fronteira de seu território, e não deem brecha para que Iselin avance, não precisam se incomodar com aqueles selvagens — o rei suspirou.

    Queria que tivesse essa confiança em nos chamar de selvagem diretamente.

— Estou cuidando dos refugiados — o primeiro príncipe respondeu, ainda de boca cheia. De canto de olho pude ver a expressão de decepção da rainha.

— Não se foque tanto nisso, ou os nobres poderão vir encher nossos ouvidos. Tente barrar mais suas entradas e cuide das doenças de inverno que eles podem trazer — o rei pressionou as sobrancelhas deixando a sua insatisfação a mostra.

    Não costumava dar atenção a assuntos políticos, até porque isso era da área de meu tio Willian e das gêmeas, porém era interessante ter uma posição privilegiada de ouvir as decisões insensíveis da realeza.

    Entretanto, no momento estava mais interessado no pudim que foi posto em minha frente.

Você deveria parar com seus maus hábitos que aprendeu com sua mãe e começar a ser mais útil, todos os seus irmãos estão fazendo algo abertamente, quanto tempo mais planeja envergonhar o nosso nome? — o rei bateu um dos talheres que estava segurando, estremecendo toda a mesa.

    Ergui o olhar devagar para observar com quem falava com tanto desagrado, porém ainda me mantive comendo a sobremesa, muito pequena por sinal.

    Todos estavam me encarando.

    Ah... é com o quarto príncipe.

Perdão, quais hábitos? — pelo histórico que meu tio Willian falava, havia alguns que poderia considerar: isolamento, desinteresse na política, alcoolismo, baixa cognição... bem, era só um estorvo. E se lhe comparava com sua mãe, a segunda concubina, seria a demência que teria adquirido? Não creio que possa aprender a ser uma pessoa doente.

    Mas sinto que de alguma forma, fui interpretado de maneira errônea, já que o rei se levantou em um estrondo com o rosto vermelho de irá.

— Seu incompetente, acha mesmo que eu caio no jogo de vocês!? SUMA, suma da minha frente antes que faça uma besteira! Esse jantar está encerrado — ele bateu sua mão com força na mesa, antes de virar as costas e sair.

    O que há com esse surto de donzela? Não estou interado de seus assuntos familiares, não irei entender se não disser de forma clara.

   A rainha se levantou o seguindo, e após isso um à um foi se retirando da mesa, esperei terminar minha sobremesa antes de fazer o mesmo.

— Você e a mamãe me envergonha, lixo — a princesa cuspiu em minha bota e saiu.

    ...

    Eram essas as pessoas que estavam cobrando modos? O que nos céus o quarto príncipe estava fazendo de tão grave para receber tando ódio? É óbvio que não precisa de um motivo muito grande para não gostar da família real, porém creio que ser um vagabundo irresponsável não deveria causar tanta hesteria entre outros irresponsáveis.

    Me levantei da cadeira e saí do salão, deveria aproveitar de sua fama para me manter no quarto até completar o prazo em que posso me desesperar. Céus, mal fazia um dia, entretanto já sentia uma falta absurda de minha família.

— Você enlouqueceu!? — meu braço foi puxado de maneira abrupta enquanto andava nos corredores, em direção à um espaço que não parecia ter ninguém. Por uns segundos senti que fosse me encontrar com o chão, já que meu tempo de reação e equilíbrio estavam comprometidos devido este corpo, porém fui apoiado — Minha nossa, você tá machucado mesmo.

— Receio que não era necessário me puxar dessa maneira — voltei a ficar de pé para olhar quem havia me abordado... O primeiro príncipe?

— Por que está falando todo certinho? Credo, me dá arrepios — o primeiro príncipe abraçou o próprio corpo, fingindo sentir arrepios — Mas sério, o que há com você? Bateu sua cabeça no acidente? Deveria ter me chamado para que levasse um médico até você se era nesse nível.

    Era estranho receber um trato normal neste corpo após tudo o que ocorreu no dia.

— Por que diz isso? — inclinei a cabeça curioso.

— Como assim "por que"? Você nunca respondeu aqueles dois dessa forma, sempre abaixou a cabeça, decidiu mudar de abordagem do nada? Pelo menos me avise antes para que não me sinta tão estranho — um suspiro frustrado saiu de seus lábios — Enfim, mandarei um médico lhe ver pela manhã, não me deixe fora de seus assuntos.

    Recebi um peteleco.

    O primeiro príncipe virou as costas e se foi, depois de me dar um peteleco.

    Por que um peteleco???

    Respirei fundo, ao menos tinha conseguido um médico. Tudo o que iria fazer agora era deixar este corpo cair em sua cama, e rezar para que quando acorde tudo esteja na normalidade.

*Calendário Ominiano: [27/06]

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