{Por favor, me perdoe}
{EXTRA I: Primeiro Dia em Morisete}
— E então? — perguntei por cima de seu ombro.
— Ficaremos no mesmo quarto? — ele afastou meu rosto, enquanto me encarava com as sobrancelhas erguidas.
— Não quer? É o único da casa que não invadem.
— Como não? Perdi a conta de quantas vezes despertei com seus primos reunidos aqui — seu rosto torceu em uma careta, cruzando os braços, o que me fez soltar um leve ar pelo nariz.
— Pediu alguma vez para que saíssem? — Zayn pareceu hesitar, mas pela forma que pressionou os lábios frustrado, já sabia que tinha chegado a uma conclusão — Não costumam vir até mim, pois não reajo as suas provocações, ao contrário de um certo alguém — dei de ombros, sentindo seu olhar hostil — Não me olhe dessa forma, não estou mentindo. Por que não toma um banho para descansar? Use uma de minhas roupas enquanto não providenciamos as suas, pedirei que façam algo para comer.
Seus ombros pareceram relaxar um pouco com a sugestão, me lançando um olhar de loslaio antes de suspirar, deixando sua irritação se esvair — Está bem, não irei recusar.
Assim que ouvi o alarde dos guardas no portão no meio da madrugada, de alguma forma, já sabia que algo tinha ocorrido com Zayn, e ver Dariel no meio do salão principal da nossa mansão, apenas contribuiu para aumentar esse desespero.
Aquela raposa astuta, poderia desaparecer.
O sentimento amargo que preencheu minha boca, não poderia ser acalmado nem com os medicamentos duvidosos de tia Ana, se não houvesse chegado a tempo naquele maldito julgamento, ia ter que ouvir os agradecimentos do império por ter lhe entregado um novo reino.
Nunca pensei que poderia sentir algo tão desagradável e angustiante, só de cogitar a possibilidade dele sumir.
— O que há com essa cara de enterro? Ninguém morreu — Ben se aproximou com uma careta no rosto, sentando-se no sofá oposto ao que estava na sala de descanso.
A mesa no centro estava preenchida com alguns alimentos que as serventes trouxeram, tortas, bolos, chás, não sabia qual tinha sido a última vez que Zayn comeu algo, dar algo forte poderia lhe causar dores no estômago.
— Esse é meu rosto habitual — suspirei. De uma forma infeliz, ninguém morreu, adoraria ter a cabeça daquele rei em uma bandeja.
— Hm? Por que estão aqui? Pensei que também tinham saído — Tony se esgueirou, vindo se sentar ao meu lado.
— Os outros saíram? — estranhei.
— Vovô voltou ao palácio com tio Willian, parece que terá que assinar uma ata para enviar ao império, seus pais estão na fronteira, meu pai teve que ficar no escritório e os outros foram conferir a fábrica — a cada pessoa que citava, contabilizava em seus dedos.
— Me surpreende ele ter conseguido arrastar meu pai para o palácio — Ben suspirou, ajeitando os óculos.
— É porque o vovô disse que se voltasse lá sozinho mataria o rei.
— Deveriam ter deixado — Tony soltou uma gargalhada pelo o que disse, mas Ben me encarou abismado.
— O que há com seu juízo esses dias??
— Uma raposa carregou — soltei um arzinho pelo nariz, o fazendo me olhar com uma careta ainda maior.
Virei a cabeça para trás ao ouvir o som do salto e quase não consegui desprender o olhar, Zayn não ficava muito bem em roupas escuras? Isso pareceu destacar ainda mais as cores chamativas de seu rosto, as ondas de seu cabelo estavam um pouco molhadas, ficando totalmente soltas.
Nunca pensei que o veria de bermuda e suspensórios, porém isso combinou de uma forma perfeita.
— Estão só vocês? — perguntou em um murmúrio, enquanto se sentava um pouco hesitante perto de Ben, graças ao abençoado que decidiu ocupar o lugar ao meu lado.
— Os outros saíram, e eu estou fugindo do trabalho — Tony se espreguiçou, tentando recostar em mim, porém me afastei mais para borda estragando seus planos.
Ele jogou algumas reclamações por ter feito isso, mas ignorei cruzando as pernas e recostando no sofá, vendo como logo em seguida, meus primos focavam toda sua atenção em Zayn, Ben conversando de uma forma tranquila, o incentivando a comer mais pelo estresse que passou, e pela risada de Tony ele deveria está contando alguma de suas piadas, não estava prestando atenção de fato.
Só me dei o trabalho de ouvir, quando notei que os três me encaravam de repente, parecendo esperar alguma resposta — O que há?
— Eu disse que ele não tava nem escutando! — Tony riu, fazendo Zayn deixar de beber seu chá para cobrir o próprio rosto, enquanto negava com a cabeça repetidas vezes.
Inclinei a cabeça, estranhando as reações. Estavam falando de algo importante assim? Não parecia, já que Zayn sequer havia mexido muito os lábios.
— Irá criar um buraco no garoto, se abrir mais um pouco a boca deixará a babá escorrer, Tsk, tsk — Ben balançou a cabeça com desgosto.
— Deixe-o, Ben~ não vê que ele está abalado por conta de Zayn? — isso era de fato, verdade, porém saindo da boca do Anthony até uma pedra se tornava motivo de provocação. O olhar de Zayn pareceu brilhar de curiosidade, comendo sem dizer uma palavra, mas sua expressão sempre o entregava.
Senti o canto de meus lábios se erguer de forma leve e inconsciente.
— Algo memorável, foi a vez em que mais vi expressões no rosto do Theo, ultrapassou seu limite de três por dia — Ben acenou com a cabeça confiante, e Tony o acompanhou concordando.
— Não estão exagerando? — questionei pensando de forma séria no que falavam, a única coisa que tinha feito foi pegar o espadão de meu pai, mas em seguida o soltei no chão por me lembrar das provas.
De fato, não é algo do meu feitio.
— Você age como não se importasse com ele, chato — Tony me deu a língua. — Está preocupado por seu rosto de porta se expressar? — Ben falou no exato mesmo tempo.
— Não é como se fosse me importar com algo como isso, quão repudioso eu seria?
.
.
.
Há momentos em que você consegue pressentir uma tempestade se formando em um copo d'água, e esse foi um deles.
— Espere, isso soou um pouco... — me apressei em dizer, mas fui interrompido.
— Céus, você não tem coração? — Ben me olhou espantado, porém eu só conseguia focar na cabeça baixa de Zayn, não conseguia ver seu rosto, ele não iria mal interpretar algo como isso, certo?
— Minha nossa, dizer essas palavras logo após tudo o que ocorreu... você o trouxe aqui para isso? — Anthony encarava com repúdio.
Irei cometer um crime.
— Parem de criar problemas, eu estava me referindo a fala do Benjamin — me expliquei, por fim. Porém uma estranha sensação começou a percorrer o meu corpo quando vi que ele não se moveu.
Eu tinha percebido isso há algum tempo, Zayn não costuma falar muito, mas sempre parece estar meio aéreo, como se estivesse perdido em seus próprios pensamentos e então de repente, sua expressão muda de forma drástica.
Como agora.
— Estou sendo um incômodo? — senti meu sangue gelar com sua fala.
— Não, de forma alguma. Por que eu manteria algo incômodo por perto? — os dois energumenos que proveram esse mal entendido se entreolharam notando o que haviam feito, e então de forma lenta começaram a sair, como se aquilo fosse lhes safar das consequências mais tarde.
— Então por que age como se eu fosse um capricho? — sua voz estava rígida de uma maneira anormal.
— Quando... fiz isso? — senti meus olhos arregalarem.
Zayn pensava que eu o via apenas como uma distração? Algo descartável? Em que momento lhe dei a entender algo tão desagradável e absurdo? Algo entalou em minha garganta com esse pensamento, estava disposto a abdicar de meu título sem hesitação caso meu avô não o aceitasse em nossa casa e ainda assim lhe causei incerteza?
— Você não sabe ler o ambiente? Posso ser desavergonhado, mas isso não impede seus comentários de me machucar, não é difícil se por no lugar de outra pessoa mesmo racionalizando, argh — soltou o ar frustrado, sua mão estralando o próprio pescoço como se o impedisse de ter uma síncope.
O excelente autocontrole de Zayn impedia que Theodor visse nesse momento, a quantidade de pólvora que estava prestes a explodir na mente do ruivo, ele estava há um dia sem se alimentar, saindo de uma situação de quase morte, vendo sua mãe dando preferência a Zaydete após tudo isso, e apesar do breve alívio que sentiu ao estar em Morisete, não demorou para que sua insegurança ressurgisse em forma de pensamentos não requisitados.
"E se Theodor se cansar de mim?"
Zayn já havia sido atingido pelas atitudes estranhas, mas calorosas dos Morisete, algo que ele só havia recebido poucas vezes na vida apenas por sua mãe, ele realmente deveria aceitar isso tão facilmente? O que faria se após se tranquilizar, tudo isso fosse de novo tirado dele?
O sentimento amargo foi apenas se instaurando cada vez mais em sua mente, se sentindo deslocado, um parasita, uma erva-daninha em meio a um invernadeiro de cristal. Sequer poderia ir para Hamilton, pois não se sentia próximo de seu avô ao ponto de pedir um favor tão grande como esse, afinal, a prioridade de Ed sempre tinha sido sua mãe, não ele.
De repente Zayn havia pisado em um abismo que estava evitando todo esse tempo.
SOLIDÃO
Ele nunca teve a oportunidade de criar laços com alguém e a primeira vez que conseguiu fazer isso, se sentia insuportavelmente incômodo, o mais obscuro de sua mente lhe deteriorando por pensar que não merecia aquilo, não depois de tudo o que havia feito, e se Theodor reconsiderasse tudo isso? E se ele criasse repúdio sobre si?
Era doloroso, confiar em alguém cegamente era mais doloroso do que conseguia se lembrar e isso de alguma forma o irritava, porque do fundo do seu coração, Zayn queria que aquilo durasse, ele queria que pelo menos dessa vez conseguisse aproveitar uma vida consideravelmente normal em meio a pessoas que o quisessem por perto e não o repudiasse.
E essa irritação por algum motivo, o consumiu ainda mais ao ouvir a brincadeira de Anthony. Se Theodor nunca tivesse de fato, se importado com ele, e apenas agido por capricho, isso não seria ainda mais constrangedor e agonizante?
— Alguma vez... você foi sincero com o que sente?
— O que...? — fiquei atônito com o que tinha ouvido, porém isso não durou muito, logo que senti o olhar de fúria cair sobre mim e ele se levantar de supetão.
Zayn está bravo.
É a primeira vez desde que o conheci que eu vejo de fato, o Zayn bravo.
Agora de pé ele me olhava com uma pressão assustadora que eu desconhecia, me deixando incapaz de se levantar do sofá, meus primos estavam de longe escondidos atrás da parede da sala apenas espiando, com receio de se aproximarem.
— Isso...
— Cala a sua boca.
Abaixei a cabeça de imediato.
Talvez eu tenho cometido um erro... Não, eu cometi um péssimo erro, a última coisa que ele queria nesse momento era que eu hesitasse ao responder, o que poderia fazer para resolver essa situação?
— Zayn...! — não tive tempo para isso, no momento seguinte ele começou a andar para fora da sala, pela segunda vez nessa semana um turbilhão de sensações preencheu o meu peito, e nenhuma delas eram positivas.
Fui testemunha do quão longe pode ir a persistência de Zayn caso decida algo, se ele atravessasse o portão e fosse para Hamilton...
Mas tudo o que fez foi passar como um furacão de volta às escadas. Não sei em qual momento prendi minha respiração, mas pude senti-la retornar aos meus pulmões assim que não o vi passando pela porta.
Um silêncio tortuoso preencheu a sala, e antes que desse por mim, notei que pela primeira vez, minhas luvas estavam molhadas pelo suor.
— Satisfeitos?
Pude ver tanto Antony quanto Benjamin se encolherem, passei a mão pelos meus cabelos tentando conter a sensação de sufocamento que parecia dilacerar meu peito.
━┅┅┄┄⟞•| ⊱✥✦✥⊰ |•⟝┄┄┉┉━
Bati duas vezes na porta, obtendo claro, nenhuma resposta, com hesitação a abri ao notar que estava destrancada, entrando com passos lentos e receosos no meu próprio quarto, observando aquele grande montin de lençóis envoltos na cama.
Deixei que minhas costas deslizassem pela cabeceira da cama, me sentando no chão em completo silêncio.
O que Zayn estava sentindo? Por que ele se irritou mesmo sabendo do mal entendido entre as palavras?
Tirei as luvas que agora pareciam tão incômodas, deixando-me focar apenas no som abafado de sua respiração irregular.
— Eu quero entender como se sente... mas preciso que me diga — minha voz saiu em um murmúrio, um estranho receio que nunca havia sentido de que minhas palavras, poderiam causar algo.
Sua respiração pareceu aos poucos voltar ao normal em meio aquele silêncio.
— Responda a pergunta que fiz — a voz abafada e quase inaudível ressoou, fazendo toda minha pele formigar.
— Não há sequer uma única vez, que eu não tenha sido honesto sobre o que sinto ao seu respeito.
O ouvi se remexer na cama e olhei em sua direção, sendo encarado por aqueles olhos reluzentes que não decidiram qual cor teriam, não tinha ideia de qual expressão estava fazendo naquele momento, mas com certeza não era a minha habitual. Senti meu peito vacilar assim que soltou um longo suspiro, para logo em seguida erguer um pouco seu braço coberto pelo lençol, indicando para eu me mover, e sem hesitação retirei meus sapatos com os próprios pés, e fui até ele, me juntando naquele emaranhado de lençóis, enquanto o contornava em um abraço.
Sua cabeça foi apoiada em meu peito, e eu tinha certeza que estava ouvindo meu coração descompassado, coloquei minha cabeça entre seus cabelos, fechando os meus olhos tentando diminuir essa sensação angustiante, enquanto deixava sair em inúmeros sussurros, pedidos de desculpas.
— Nunca mais faça isso... — murmurou e eu assenti no mesmo instante.
— Não irei, pode me enterrar caso hesite de novo — o ouvi soltar um arzinho pelo nariz, trazendo um pouco de tranquilidade para mim.
Comecei a afagar suas costas em gestos circulares, acarariciando seu cabelo pela nuca, controlando esse sentimento amargo do dia anterior, de que Zayn poderia apenas ter desaparecido.
— Não quer que eu vá embora?
— É um pedido egoísta...
— Egoísmo é o menor dos seus defeitos, apenas responda.
Soltei um arzinho, incapaz de retrucá-lo — Sim, não quero que vá embora, por favor, fique apenas comigo de agora em diante — ele ergueu o olhar para me ver e aproveitei para descer a mão de seus cabelos até sua bochecha, acariciando cada detalhe de seu rosto — Não gosto de ver os outros lhe provocando, gostaria de poder monopolizar as expressões adoráveis que faz.
Seus olhos se fecharam, deixando o peso de sua cabeça recair em minha mão e pude sentir seu rosto aquecendo.
— Sinceramente, você é terrível.
Me aliviei ao ouvir seu tom de voz habitual retornar, e então depositei um beijo em sua testa, e outro, e outro, e outro, até fazê-lo dar uma pequena risada e beliscar as minhas costas.
— Não vai se desculpar pelas ofensas que me fez?
— Sabe que a maioria são insinceras... apenas para lhe irritar.
— Não falo dessas, me chamou de verme quando nos conhecemos.
— Hm? — tentei me lembrar de alguma situação em que utilizei essas palavras — Fala sobre o platelminto? — afirmou — Bem, você me chamou de demônio em seguida — não tinha para onde desviar o rosto do olhar ameaçador que me lançou — Me perdoe, eu estava errado.
Se divertindo com minha situação lamentável, Zayn riu antes de dar um pequeno selinho em meus lábios, se afastando para me olhar, e então ergueu a mão para ficar tentando bagunçar meus cabelos.
— Escute.
— Hm.
— Converse comigo — Zayn me olhou como se houvesse dito a coisa mais estúpida já vista — Sobre você, converse comigo sobre tudo o que pensa quando fica em silêncio — deslizei minha mão pelo seu pescoço, trazendo para o seu campo de visão a pequena insígnia de mariposa vermelha que o havia entregado, e pude ver seus lábios tremerem ao assimilar o gesto.
Minha vida estava em suas mãos, e eu o havia entregado de bom grado pois sabia que nunca me arrependeria dessa decisão, mesmo que ele escolhesse a minha própria morte, um Morisete nunca voltaria atrás com seus sentimentos.
— Se essa bagunça que temos é o que chamam de amor, então talvez eu não precise mais procurar seu significado em livros.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top