Capítulo 3 - parte 1 (não revisado)
Sozinho na sua cabine, o jovem imperador virava-se de um lado para o outro na sua cama sem conseguir pregar o olho. Quanto mais perto do prazo final ficava maior era o martírio por que passava, mesmo sabendo que estava coberto de razão.
Num impulso súbito, ergueu-se e sentou-se na cama, apoiando os cotovelos nos joelhos e esfregando o rosto com ambas as mãos. Após alguns segundos ergueu-se de vez e foi para o sanitário, entrando debaixo do chuveiro.
Pouco tempo depois, materializou-se na sala de comando e chamou o comandante:
– Nobuntu, mande preparar uma naveta e avise os nossos companheiros que não atirem em mim. Pretendo ir ao planeta e falar com o imperador para ver se ele cria um pouco de juízo.
– Com todo o respeito, Almirante, isso é insano – disse o coronel com uma franqueza que agradava o superior. – Bem sei que a tarefa que nos aguarda é horrível, mas é um mal necessário. Ir lá é uma loucura rematada...
– É sim – concordou Daniel, interrompendo. – Mas uma naveta pequena e invisível, apenas comigo pilotando não envolve riscos de maior monta. Com os meus dons, infiltro-me dentro daquele mundo sem dificuldades.
– O senhor é que sabe, Almirante – disse o comandante, que já o conhecia tão bem que sabia ser impossível tentar demovê-lo. – A Dani P I já está pronta.
– Tão rápido? – perguntou ele, espantado.
– Seu avô me disse que o pai dele seria um sujeito doido o bastante para tentar uma maluquice dessas e que talvez fosse melhor deixar tudo pronto antes que enlouquecesse de martírio, senhor.
– Não há dúvida que ele me conhece melhor que ninguém. – O almirante deu um sorriso. – E mesmo assim o senhor tentou me demover?
– Eu não seria um bom comandante e muito menos seu amigo se não fizesse isso, Almirante – disse o gigante com um sorriso.
– Obrigado, Nobuntu. – Daniel colocou a mão no ombro do seu interlocutor. – Tenho muita honra em ter um amigo como o senhor.
– A honra é recíproca, Almirante, então tente voltar inteiro. Vou colocar a nave em alerta vermelho assim que sair e a Vega já está. Basta um pedido de socorro e estaremos lá em vinte segundos.
– Obrigado, Nobuntu. – Daniel sorriu e desapareceu no ar para ressurgir à frente da naveta. Na entrada, um piloto aguardava por ele.
– Bom dia, senhor – disse ele. – Estou aqui para acompanhar o senhor. Realço desde já que me voluntariei e...
– Deixe de tolices, tenente – cortou Daniel, interrompendo enquanto abria um armário e pegava uma mochila energética, vestindo-a. – Não quero que o senhor se arrisque desnecessariamente.
– Senhor – imsistiu o piloto, inflexível. – É necessário cuidar do planador enquanto o senhor estará lá em baixo. Com a nave invisível não vejo motivo para riscos, mas ela parada em órbita sem ninguém e com meio milhão de naves inimigas subindo e descendo toda a hora, o risco de colisão é grande e o senhor ficaria impossibilitado de retornar. Eu assumo os riscos, mas não permitirei que o homem mais importante do império se arrisque sozinho.
Enquanto falava, ia entrando na nave e sentou-se no console do piloto, ligando a nave que emitiu um zumbido quase imperceptível.
– Pronto, Almirante? – perguntou, gentil.
Daniel encolheu os ombros e sacudiu a cabeça, sorrindo. Sentou-se na segunda poltrona de pilotagem e disse:
– Vocês decidiram armar um complô contra mim. Eu não sou o homem mais importante do império.
– Pode até não ser, senhor, mas há bilhões de pessoas lá fora, inclusive eu, que pensam o contrário. Sem o senhor, já seríamos escravos desses demônios.
– Não subestime a versatilidade do ser humano. Vamos lá que tenho pressa.
– O senhor tem ideia de onde quer descer? – perguntou enquanto a navezinha se erguia no ar e avançava devagar para a comporta que se abria. – Este planeta é maior que a Terra, um bom bocado maior.
– Vamos atravessar o bloqueio deles e procuraremos o local onde fica o espaçoporto. Não deve ser difícil, com este tráfego todo. Acho que o palácio imperial deve ser por perto.
A naveta rompeu os campos de contenção de ar e saiu do hangar, cuja porta voltou a se fechar. Com uma curva suave, ela passou por baixo da nave-mãe e avançou alguns metros até que apenas se tornou visível para os equipamentos especiais de vigilância.
As duas frotas estavam apenas cinco minutos-luz distantes uma da outra e o piloto só teve alguma dificuldade quando chegaram perto do enxame de naves inimigas.
– Suba acima da elíptica, tenente – pediu Daniel. – Na região dos polos há menos naves para atravessarmos. Não se esqueça que os propulsores podem ser detetados pelo calor.
– Tem razão senhor – disse o jovem dando uma guinada repentina para desviar de um dos cilindros.
Pouco tempo depois, flutuavam com toda a calma na estratosfera do planeta Tantor. Na segunda revolução, Daniel mostrou um ponto na tela dos sensores.
– Ali deve ser os espaçoporto – afirmou, convicto. – Afaste-se cem quilômetros para o norte, que há menos chances de esbarrarmos em algo.
O piloto obedeceu e Daniel continuou:
– Tenente, eu vou saltar para a superfície e você aguarda por aqui. Mantenha os campos de força ativados mas nada de ativar o campo de supercarga exceto em uma emergência. Procure ficar dentro do limite dos dois milhões de quilômetros da superfície que é o máximo que consigo saltar. A minha mochila é do novo modelo, que pode ficar invisível e tem comunicador de superonda, então use-o, se for necessário.
– Sim, senhor – disse o piloto olhando para o superior. – Boa sorte.
– Obrigado. – A imagem do almirante desapareceu do assento como se nunca tivesse estado na naveta e o tenente viu-se sozinho.
― ☼ ―
Daniel já teve azar de cara. Materializou-se em uma rua cheia de gente e, com a diferença de gravidade, perdeu o equilíbrio por alguns instantes. Deu um pequeno salto para o lado de forma a não colidir com um dos verdes e esbarrou em uma fêmea que vinha por trás. Como era de se esperar a "mulher" reagiu da pior forma que lhe poderia ocorrer: começou a gritar assustada erguendo os braços para todos os lados e chamando a atenção de muitos lagartos que fizeram um círculo fechado em volta dela.
Apressado, o almirante concentrou-se em um lugar mais adiante, vazio de tantorianos, e saltou. Aliviado, encostou-se a um muro e suspirou fundo. O planeta era desconfortável, com uma gravidade duas vezes e meia a da Terra e uma atmosfera demasiado poluída, cujo ar era difícil de respirar e muito insalubre para um ser humano. Mesmo sendo um portador de alto grau, ele concluiu que era melhor não ficar muito tempo exposto àquele ar porque acabaria por sentir os efeitos negativos da pouca oxigenação.
Felizmente, o seu preparo físico era mais do que suficiente para suportar aquela gravidade toda, especialmente porque ele não desejava usar nada além do campo de invisibilidade para reduzir a emanação de campos magnéticos e energéticos. Como o seu avô já tinha dito, o mundo que ele observava estava condenando à morte há muito tempo. A poluição era tanta que a cem metros de distância o horizonte tornava-se uma mancha castanha e não se via os prédios com definição precisa.
Procurou, em vão, orientar-se ali, mas concluiu que precisaria de obter informações com alguém e optou pelo método mais simples. Pôs-se a andar ao acaso até encontrar uma rua perpendicular com menos movimento. Viu um prédio com a porta aberta e entrou, vendo um saguão igual a qualquer outro da Terra no século XX. Não demorou muito e apareceu um verde isolado, dirigindo-se para a saída. Arriscando tudo, Daniel chamou:
– Ei, cidadão.
O tantoriano espantou-se ao ouvir um chamado do nada e virou-se para todos os lados. Quando ia voltar a sair, o ar à sua frente começou a tremeluzir e Daniel surgiu do nada. O jovem não esperava uma reação tão rápida, quando o verde o agarrou pelo pescoço e atacou. Ao ser ameaçado, agiu por instinto e desferiu um golpe no peito do sujeito, que morreu no ato.
– "Droga" – pensou ele –, "usei força demais."
Irritado saiu logo dali antes que fosse dado o alarme quando alguém passasse e seguiu adiante pela rua. Aquela região devia ser residencial porque quanto mais penetrava para o interior da rua, menos gente havia, o que lhe vinha a calhar. Encontrou em beco vazio e já ia passando reto por ele quando notou um verde saindo de uma porta.
Apressou o passo na direção dele e não cometeu o mesmo erro de antes. Com toda a calma, paralisou o tantoriano com telecinésia enquanto ele chiava e ficava roxo. A seguir, tratou de desligar o campo de refração, tornando-se visível para o inimigo.
– Onde fica o palácio do imperador, tantoriano?
– Como chegou aqui, humano – perguntou ele, autoritário, mas muito assustado –, e como consegue fazer isso?
– O senhor não ouviu o ultimato que nós demos? – perguntou Daniel, debochado. – Nós somos o povo mais poderoso do Universo, tantoriano, nós somos solarianos e nem mesmo os centurianos podem conosco. Agora responda a pergunta: onde fica o palácio?
– Se eu respondesse isso, seria morto por traição, humano, e não acredito que seja assim tão poderoso.
– Você acabou de responder, seu tolo – disse Daniel rindo. – Eu sou telepata. Obrigado, mas já sei onde é.
― ☼ ―
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