Capítulo 3 - parte 5 (não revisado)
Daniel foi para o hospital da nave ver a esposa. Como a ordem era para não mergulhar, a nave auxiliar da Jessy ia demorar pelo menos uma hora a aparecer.
– "Amor, estás ocupada ou podemos jantar juntos?" – perguntou, após beijá-la. – "Estou morto de fome."
– "Que bom, também estou. Vamos?"
De mãos dadas, ambos foram para a cantina mais próxima que era junto ao convés recreativo, um nível abaixo deles. Conversavam sem parar, mas não saía uma única palavra das suas bocas. Na cantina, encontraram Bia com os dois ubruranos, também jantando, e resolveram juntar-se a eles.
– É um mistério e tanto o que temos pela frente, Alteza – comentou Bia. – Vai ser difícil de desvendar.
– Bia, minha querida – afirmou, gentil. – Quando não estamos de serviço, podes continuar a me chamar de Daniel. Bem sabes que eu não combino com esse título.
– Claro, Dan, desculpa.
– Não precisas de te desculpar – respondeu. – Mas acho que tens razão e vai ser bem difícil de desvendar a menos que encontremos os centurianos, que não se manifestam. Em breve, partiremos para o décimo planeta e talvez tenhamos sorte. Mas eu acho que estou na pista certa.
– Não consigo imaginar como! – Exclamou ela, muito espantada.
– Bem, prefiro guardar algumas observações para mim até ter a certeza delas, mas acredito que o sol deste sistema esteve instável por algum tempo e a sua radiação provocou a catástrofe. Deve ter sido há cerca de quatrocentos mil anos, talvez menos, e deve ter perdurado por muito tempo. Tanto que os habitantes desse mundo emigraram com tranquilidade.
– Isso é o mais lógico a se imaginar – disse a Daniela. – Mas vejo que escondes até de mim a outra suposição, amor.
Ela recebeu em troca um sorriso matreiro e juvenil. Nesse momento Zulu apareceu para jantar. Encontrou a namorada e beijou-a. Daniel notou os olhos de ambos e sorriu de novo porque via muito bem a paixão que sentiam. Sentia que, em breve, muitas coisas iam mudar no Império e seria para melhor.
– Então, Zulu, cansado de inatividade?
– Sabe, Almirante – disse o gigante, com um sorriso franco e um brilho ousado nos olhos. – Eu prefiro ficar inativo. Isso é sinal de que não precisamos de provocar qualquer destruição.
– Tens toda a razão, meu amigo, mas não desgrudem daquelas telas. Vocês viram os buracos feitos nos cilindros dos lagartos. Conforme a quantidade de canhões que essa gente disponha, as coisas podem ficar perigosas para nós.
– Fique tranquilo. Disponho dos melhores artilheiros do Império.
– Eu sei. Por isso não me preocupo.
Depois, a conversa foi para o trivial. Enquanto comiam, Davri fazia para a namorada um pequeno relato de como era o seu mundo e a sua cidade natal, que todos ouviram com atenção e prazer porque o rapaz tinha um grande orgulho de falar sobre o seu mundo e ter uma plateia interessada.
– Vou adorar conhecer Ubrur – disse a Daniela. – Pelo jeito que falas, deve ser bem parecido com a Terra.
– As nossas cidades são pequenas e com muitos jardins e parques porque nós gostamos de ter uma grande proximidade com a natureza – continuava Davri. – Os prédios não são altos e todas as ruas são cercadas de árvores. É muito parecido com a vossa cidade, mas não tão belo. Eu jamais vi uma cidade mais bela que a vossa...
Daniel ia falar alguma coisa quando recebeu um chamado. Pediu desculpas e retirou-se para falar em particular. Quando voltou, eles já estavam tratando de outro assunto, ainda relativo ao planeta Ubrur.
– A astronomia acredita nas minhas suposições – disse o Daniel, sorrindo. – Pelo jeito, pode mesmo ter sido uma mudança no sol. Apuraram uma probabilidade de setenta por cento, mas não há como saber mais detalhes sem explorar outros mundos, especialmente os internos.
– Então será que os encontraremos alguma vez? – perguntou o Zulu, curioso. – Será que não foram destruídos pela catástrofe e agora existe apenas um mundo morto?
– Acho que não. Deveremos encontrá-los – respondeu Daniel, compenetrado. Levantou-se e continuou. – Gente, foi um prazer estar com vocês, mas devo retornar para a ponte. O João deve chegar em breve.
Despediu-se dos amigos e deu um abraço na esposa, que o seguiu com os olhos muito brilhantes.
– Ele é especial, Daniela – disse Bia, sorridente. – Nunca o vi tão feliz exceto quando conheceu a Jéssica. Aquilo foi algo muito trágico para ele. Só se recuperou depois que voltou de Terra-Nova. Ainda bem que ele te encontrou porque não imaginas o quanto procurou. Chegou a namorar uma moça porque tinha o teu nome.
– Eu sei, Bia. Ambos conhecemos o nosso passado muito bem. Não precisas de te sentir constrangida perto de mim. Eu jamais tive ciúmes do que aconteceu antes.
– Obrigada, Daniela.
Quando terminaram de jantar, os dois casais recolheram-se para as cabines. Daniela voltou para o hospital, mas permaneceu apenas estudando um pouco sobre uma nova técnica cirúrgica que um médico criara. Ficou tão absorvida que nem notou o tempo passar. Enquanto estudava, meditava se ela não poderia ser melhorada e começou a imaginar uma forma de a aprimorar. Decidiu que, quando retornassem para a Terra, ia procurar esse cirurgião fenomenal.
― ☼ ―
A pequena esfera de cinquenta metros pousou no hangar para os visitantes e João desceu da nave muito curioso para saber o que o primo desejava. Para sua sorte já jantou, porque o Daniel levou-o direto para a sala de reuniões.
– O que houve, bebê. Eu já estudei todo o material que enviaste. Acredito que uma catástrofe ocorreu aqui há milhares de anos, provavelmente o sol a tenha provocado. A ausência de uma lua pode ter contribuído para a desestabilização do clima.
– É nisso que baseio a minha teoria e só não tinha pensada em uma lua, irmãozinho, mas tenho a certeza de que os centurianos não se afundaram nela. Amanhã, vamos fazer uma visita ao cemitério de naves, já que agora é noite e fica mais confortável trabalhar de dia. A esta hora há furacões homéricos passeando por ali.
– Começo a entender. Queres fuçar em alguns computadores, eu presumo.
– És mesmo um menino esperto. Para isso preciso de um perito em computadores e tu já os conheces muito bem.
– Ora, Dan, podias ter-me mandado vir amanhã. Vais me obrigar a passar a noite longe da minha Daniela?
O primo deu um sorriso.
– Desculpa, João, só me atinei para os horários locais quando te mandei chamar. Mas podes voltar para a Jessy e retornar amanhã, daqui a nove horas.
– Acho que vou fazer isso, Dan. – João levantou-se – até amanhã. A propósito, por que não nos deixas mergulhar.
– Porque estou certo de que somos observados e não quero que conheçam toda a nossa tecnologia de uma vez só.
– Ok, maninho, até amanhã.
O primo retirou-se e Daniel também deu-se conta que não tinha uns momentos a sós com a esposa há muito tempo.
– "Dani, estás ocupada?" – perguntou, enquanto transportava-se para a sua cabine.
– "Estava estudando, por quê?"
– "Porque teremos nove horas de pausa e..."
– "Aqui estou, amor" – disse a garota, surgindo do nada e atirando-se ao pescoço dele. – Também estou com vontade de ficar a sós contigo.
― ☼ ―
A alguns milhares de quilômetros da espaçonave do Império, o gigantesco computador "pensava" nos estranhos em órbita. Por que seria que eles ainda permaneciam ali? O que seria aquela esfera que veio e retornou em direção ao sol tão rápida? A primeira conclusão lógica era que havia outra nave dos estranhos fora do alcance dos sensores, talvez perto do sol ou em órbita do décimo planeta que está do outro lado do sol, em oposição a si. A segunda conclusão, era que a nave trouxe alguém ou alguma coisa, retornando para a outra nave. Isso era inquietante e ele sabia que não tinha poder de fogo para enfrentar aquele gigante do espaço. Precisava de alarmar a central para uma eventual descoberta. O que será que os desconhecidos, que mostraram uma atividade tão intensa, faziam agora parados sobre o jazigo das naves do inimigo há já quatro horas? Com uma resposta que quase chegou a ser dolorosa, o setor de lógica respondeu que os seres eram semelhantes aos construtores e, por isso, orgânicos. Deviam estar no seu período de descanso.
Com isso, tomou uma decisão que se poderia revelar perigosa para ele. Moveu uma pequena antena direcional e mandou o seu relatório usando um sinal fortemente condensado e dirigido a uma antena retransmissora que ficava em um mundo formando um ângulo de sessenta por cento com a nave. A probabilidade de não ser detectado era de mais de noventa e nove vírgula nove com dez casas decimais.
― ☼ ―
– Comandante chamando Almirante.
– Não podia demorar muito – disse Daniel contrariado, erguendo-se da cama –, que já me chamam.
– É a tua função, meu amorzinho – daniela acordou e ergueu o rosto, mandando um beijo. – Dirigir e orientar a frota.
Daniel pôs um quimono limpo e enxugou o rosto, colocando-se à frente da câmera.
– Aqui Daniel, o que ouve?
– Almirante, desculpe incomodá-lo, mas as comunicações detectaram um sinal fortemente condensado e impossível de decodificar.
– Qual a origem e o destino?
– Veio da superfície e segue para um dos planetas interiores. Devido ao ângulo que forma com a nave, deve ser o número quatro. Há mais um detalhe, foi em super-onda.
Daniel avaliou as informações obtidas e concluiu que as mesmas eram de importância crucial, motivo pelo qual decidiu que deveria ele mesmo verificar isso.
– Estou indo para aí – foi a resposta lacônica.
– Ouviste, Dani? – perguntou para a médica, enquanto vestia-se às pressas. – Eu tinha a certeza de que éramos vigiados. Ainda por cima em super-onda, logo é de uma raça com, no mínimo, a nossa tecnologia. Cada vez estou mais certo que os centurianos não desapareceram. Apenas escondem-se e não se pretendem tornar conhecidos para qualquer um. Vamos ter que provar que merecemos isso.
– O que vais fazer?
– Vou visitar o quarto planeta.
– Por que não mandas a Jessy? – perguntou-lhe. – Está tão próxima dele!
– Tens razão, farei isso. Beijo. – Ele pensou na ponte e desapareceu do seu quarto para aparecer no local desejado, enquanto a Daniela levantou-se, tomou um banho rápido e vestiu-se com calma. Depois, materializou-se na ponte onde viu o marido, o comandante e quatro operadores de rádio debruçados sobre uma projeção em cima da mesa. Aproximou-se e viu que se tratava da representação gráfica do sinal recebido.
– É impossível decodificar sem uma chave e o grau de condensação – disse um dos operadores.
– Concordo – respondeu outro colega – mas tenho quase total certeza de que os sinais são feitos por computador.
– Pode provar isso, Lopes? – questionou Daniel – como pode ter tanta certeza?
– Não posso provar, senhor, mas baseio-me na experiência que tenho em comunicações espaciais. Estes gráficos refletem, para mim, o sinal de um computador, principalmente o protocolo incial do link de comunicação assíncrono.
Daniel, muito compenetrado, observou os sinais gráficos durante bem dois minutos. Todos aguardavam em silêncio.
– É possível que o senhor tenha toda a razão – disse ele, mas não muito convencido. – Eu não tenho conhecimentos suficientes para distinguir um sinal digital de computador de um de voz!
– Senhor – disse novamente o oficial de comunicações. – Pode acreditar no que digo. A super-onda é difícil de manter estabilizada e possui pequenas variações de intensidade. Esta aqui é demasiado linear. As variações não passam de ponto zero zero um percentual.
– Nisso o senhor tem toda a razão – afirmou Nobuntu. – Mas precisamos de nos lembrar que lidamos com um povo desconhecido e, em teoria, muito mais avançado do que nós.
– Isto deve ser uma transmissão de texto e imagem, provavelmente a nosso respeito – conjecturou Daniel. – Este setor da Galáxia "apenas" parece abandonado. Nobuntu, chame o coronel João, desejo falar com ele agora mesmo. É urgente.
Assim que a ligação foi feita, Daniel olhou para o primo, que não parecia nada satisfeito. Reprimiu uma tremenda vontade de rir, da mesma forma que os demais.
– Oi, maninho, desculpa a interrupção, mas preciso que saias em uma missão.
– O que houve?
Daniel contou-lhe tudo e este foi mudando de fisionomia, passando para o espantado.
– Qual é a missão.
– Vais ao quarto planeta de sistema e quero que faças sair todas as naves auxiliares. Mapeiem-no e fotografem toda a superfície. Usem rastreadores energéticos para determinar se há alguma forma de energia na superfície ou debaixo dela. Quando terminarem, a Jessy volta para a posição de espera e tu vens direto para cá, de modo a continuarmos a tarefa original.
– Confirmado. Sairemos em quinze minutos.
– Obrigado, João – sorrindo, acrescentou. – Vê se passas uma água no rosto. Estás cheio de marcas de batom.
Os presentes irromperam numa gargalhada enquanto ouviam João praguejar muito alto. Daniel desligou e ainda ria quando sentou na sua poltrona.
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