Capítulo 3 - parte 3 (não revisado)
– Computador: abrir a casa e fazer café da manhã para três.
Sem aviso ou resposta, as portas e janelas da casa abriram-se, dando a ideia de que a sala se misturava ao jardim. Um dos robôs começou a preparar a refeição enquanto outro punha a mesa. A bela alienígena caminhou para fora olhando a piscina e o jardim, maravilhada com a beleza daquele planeta. Observava, no final do terreno, o rio Guaíba. Os cães, sentados ali perto, aproximaram-se dela, que não demonstrou o menor medo. Sem que Daniel falasse para os animais e impressionando-o muito, eles começaram a lambê-la nas mãos. Ela sorriu, apaixonada pelos bichos, agachando-se e fazendo carinho em ambos. Eles tinham animais de estimação em Ubrur, mas nunca viu exemplares tão esplêndidos como estes lindos quadrúpedes que encontrou pela primeira vez.
– Como se chama este tipo de animal?
– São cães, considerados os melhores amigos do Homem. Existem de várias raças e tamanhos.
– O vosso mundo é incrivelmente belo – a sua voz exprimia uma admiração profunda. – Tão belo ou mais que o nosso. Quando estava na vossa nave, pensava que o planeta para onde me levariam seria poluído e fedorento. Sempre achei que a tecnologia traria a destruição do ecossistema, mas vejo que o meu povo estava errado, pelo menos em parte.
– Explica isso, Srina – pediu Daniel, impressionado com o que ela disse. – Por que o teu povo está errado?
– Bem, qualquer criança sabe a nossa história – disse, olhando para eles. Depois, sorriu. – Desculpem, esqueci que vocês não são do nosso mundo. Bem, há uns dez mil anos, por aí, o nosso povo tinha uma tecnologia muito grande. Tanta, que já tínhamos ido à lua e ao planeta vizinho. – Daniel arregalou os olhos e olhou para a esposa, espantado. – Infelizmente, éramos divididos e estávamos prestes a entrar em uma guerra apocalíptica, um verdadeiro genocídio. Tínhamos armas tão poderosas que, se as usássemos, morreríamos todos, mas ninguém se importava com isso. Na competição entre os dois continentes, construíamos cada vez mais coisas, procurávamos cada vez mais tecnologia, destruindo os recursos naturais do nosso mundo.
– O nosso povo teve uma história muito parecida, Srina. Que incrível essa semelhança conosco. Continua que estamos muito interessados.
– Nessa época – informou a moça. – Surgiu um homem. Ninguém sabia de onde ele veio ou quem era. Simplesmente era conhecido como "O Iluminado". Falava ao mundo sobre os perigos da destruição dos nossos recursos naturais, assim como tínhamos de acabar com a desconfiança entre os dois continentes. Tanto falou, que algumas poucas pessoas passaram a acreditar nele, seguindo-o quase que religiosamente. Aos poucos, começou a surgir um movimento forte de conscientização, isso nos dois continentes. Começaram a aparecer acordos de redução de armas. Durante cem anos o nosso mundo foi se transformando, no início muito devagar por causa da desconfiança reinante, mas depois foi com uma velocidade muito grande. Aos poucos, a desconfiança entre os dois continentes desapareceu por completo e as armas de destruição em massa foram abolidas de vez. Nessa época de grande paz, o nosso povo começou a se preocupar cada vez mais com os recursos naturais. As pesquisas de navegação espacial foram abandonadas. Depois, a energia atômica foi abolida, assim como muitas indústrias começaram a parar, já que cada vez mais nos envolvíamos com a natureza. Esse processo durou cerca de mil anos. Temos tecnologia até hoje, mas só o básico, eletricidade, luz artificial, refrigeração, medicina, enfim, coisas para nos dar suporte e qualidade de vida. Cinco mil anos depois, descobrimos o nosso grande erro: os tantorianos chegaram. De início, recebemo-los de braços abertos, mas eles eram opressores, cruéis e nós nem sabíamos mais como construir uma arma. Fomos escravizados. Agora, eles exploram os nossos recursos naturais e precisamos de nos submeter, mas jamais esquecemos do nosso passado grandioso.
Daniel e a esposa entreolharam-se, abismados.
– Há cerca de mil anos – continuou Srina. – Uma profecia surgiu no nosso povo. Foi repentina e ninguém sabe quem a disse pela primeira vez, mas ela conta que um povo igual a nós, só que com poderes especiais virá nos libertar da escravidão e expulsará os tantorianos do nosso mundo. Será que são vocês?
– Talvez, Srina. Tudo vai depender da sequência de acontecimentos, mas vamos ajudar vocês sim. Jamais deixaríamos abandonada uma raça irmã.
– Obrigada. – Ela atirou-se ao pescoço do Daniel e beijou-o, mas ele afastou-a gentil.
– Srina, não deves fazer isso de novo.
– Mas por quê? – perguntou ela. – Foi tão bom, ontem. Pensei que íamos ficar juntos, os três, formar um grupo.
– Srina – disse a Daniela. – Eu e o Daniel temos um amor muito profundo um pelo outro. O que aconteceu esta noite foi muito gostoso, mas era uma brincadeira, uma fantasia. No nosso mundo não fazemos casamentos em grupo. E tu, além disso, não aguentarias o Daniel.
– Na verdade, ele dá conta de uma dúzia de nós. Meu Deus, que energia. Como tu aguentas sozinha?
– Somos iguais, Srina, temos a mesma energia. Ninguém mais aguentaria.
– Quer dizer que matarias de cansaço um homem do nosso mundo?
Daniel sorriu, divertido.
– Srina, é normal casamentos em grupo no teu mundo?
– Bem. Há pessoas que não gostam, mas, em geral, os homens assim são malvistos.
– Por quê?
– Porque a nossa população tem dez vezes mais mulheres que homens. Por isso, é comum ver de mulheres compartilhando o mesmo marido. A quantidade, depende da resistência física dele e da sinergia do grupo. Há algumas mulheres que não conseguem maridos e juntam-se em grupos femininos. Nós respeitamos os desejos de qualquer um.
– Tenho alguns amigos que iam achar o teu mundo um verdadeiro paraíso – afirmou Daniel, com uma risada franca.
– Nós temos a mente muito aberta quanto ao sexo. É saudável e faz parte da nossa vida. Quem não tem uma vida sexual sadia, adoece ou vive muio mal-humorado.
– Quantos anos tens Srina? – perguntou Daniel, rindo.
– Eu tenho dezoito.
– Vocês têm notado alguma mudança na vossa espécie? Pessoas diferentes, mais inteligentes, mais fortes?
– Não, mas temos tido problemas com mortalidade infantil. Há crianças que estão morrendo antes do primeiro ano de vida por causa de uma doença desconhecida e não encontramos qualquer explicação para isso.
– Começou agora.
– O que começou agora?
– O teu povo está passando por uma mudança, tal como nós. Se tu tivesses filhos com certos tipos de pessoas, eles morreriam antes de um ano. Sabes o que é um gene?
– Claro que sei. Não te esqueças que não somos primitivos como os tantorianos pensam.
– Pois bem, há um gene que está ligado a uma evolução da nossa espécie. Ele pode estar ativo, recessivo ou não existir.
– Quando está ativo, tem determinado um grau de intensidade. Abaixo de vinte, a pessoa é normal, porém tem uma inteligência muito mais apurada. Mas, acima de vinte, ele é letal na primeira geração. O meu trisavô descobriu o gene e a cura. O filho dele, foi o primeiro homem do nosso mundo a sobreviver. Podemos ajudar o vosso povo. Eu tenho o gene e estou na quarta geração.
– Queres dizer que eu tenho o gene ativo!?
– Sim, em grau dezenove. Estás perigosamente perto do limite. E o teu irmão também.
– E o teu grau, qual é?
– Eu e a Daniela, somos os únicos seres vivos que têm cem, o máximo.
– O que acontece com as pessoas que têm o gene?
– A partir de vinte, aproximadamente, desenvolvem a telepatia. Isso não é regra fixa. Quanto maior o grau, maior a inteligência e a memória. A partir de quarenta, a pessoa tem uma força física muito grande e resistência também. Passa a viver muito mais, cerca de trezentos e cinquenta anos. Acima de noventa, vivem mais de mil anos.
– E os cem?
– Não sabemos, somos os primeiros. A grande diferença é que somos teleportadores, telecinetas e podemos fornecer energia para uma pessoa, curando-a. Os portadores acima de vinte nunca adoecem. Novamente, isso é uma aproximação, porque a ativação vai de quinze a vinte.
– Quantos anos vocês têm?
– Dezesseis.
– Mas parecem mais velhos. Parecem ter uns vinte.
– Amadurecemos mais rápido que os não portadores, como chamamos os que não têm o gene. Nós, aos treze anos, somos maduros física, sexual e intelectualmente. Depois, acontece o contrário. A partir de uma certa idade, paramos de aparentá-la. O meu pai, tem trezentos anos e o meu avô tem mais de setecentos anos. Parecem ter trinta anos. Vamos comer? – sorriu para elas. – O café está pronto.
A garota apreciou muito a comida da Terra, em especial o café. Enquanto comiam e conversam, Daniel faz uma pergunta:
– Srina, ontem disseste que esse perfume é teu, mas tem o mesmo cheiro do que eu dei para a Daniela, onde o arrumaste?
– É fabricado no meu mundo, Daniel. Modéstia à parte, somos excelentes nessa arte, tanto que os tantorianos nos obrigam a produzir toneladas de perfumes.
O casal olhou um para o outro, descobrindo finalmente o local onde se fabricava aquele perfume transcendental que tanto agradou aos dois.
Após o café, Daniel pediu para a Cybercomp mandar um planador robotizado à sua casa. O aparelho desceu com suavidade e pousou ao lado da garagem.
– Daniel, vejo que as vossas naves não precisam de foguetes para subir e, também, são muito silenciosas.
– Todos os nossos aparelhos voadores são providos de campos antigravitacionais, Srina. Para o voo atmosférico, os reatores nucleares alimentam turbinas de ar superaquecido. Assim, não há poluição. No espaço, usamos jatopropulsores de partículas direcionais, proibidos no âmbito planetário por serem poluentes, exceto, é claro, em casos de emergência.
– Mas os vossos reatores atômicos não são poluentes?
– Não. A fusão a frio é segura e temos elementos químicos que revestem a estrutura do chassis. Em caso de acidente, a radiação é neutralizada de imediato, sem fugas. Já temos esta tecnologia há oitocentos anos, antes mesmo de alcançarmos as estrelas.
– Vocês tem uma tecnologia muito grande, comparada aos tantorianos. Entretanto, praticam a navegação estelar há muito pouco tempo!
– Por causa do gene, Srina – respondeu Daniela. – Em breve, o teu mundo dará um grande salto, verás.
Os três subiram e Srina não parava de perguntar sobre tudo, olhando maravilhada para a capital do império, abaixo dela.
– Que cidade linda, que planeta lindo! Nem o meu mundo é tão belo. Vocês têm muita sorte.
– Srina. Quero que tu conheças umas pessoas e contes a história do teu mundo para elas. Isso tem o objetivo de vos ajudar.
– Claro. Que prédio é esse ai? – perguntou, apontando para um edifício enorme e belo, de cerca de dez andares, com as paredes todas revestidas em um tipo de mármore azul.
– O palácio do Imperador.
– Vocês devem ser muito importantes para serem recebidos pelo Imperador assim na maior.
Daniel apenas sorriu.
– "Dani, leva-a para os nossos aposentos desta casa. Aguarda o meu chamado e salta direto para a sala onde eu estiver. Não lhe contes quem somos."
– "Claro, amor. Fica tranquilo. Eu vi na mente do mordomo os aposentos."
– Vocês estão-se comunicando, não é? Eu sinto.
– Sentes?
– Sim, não consigo entender a comunicação, mas sinto-a com muita intensidade, como um murmúrio. Quando estávamos os três juntos, eu sentia o que vocês sentiam. Por isso fui abaixo tão rápido, pois nunca na minha vida tinha feito isso tantas vezes. Foi bom demais e eu quase sentia o vosso pensamento. Devíamos fazer do novo, só para ver isso. Afinal, se fizemos uma vez, não há nada de mal em repetir, já que foi tão bom.
– Talvez, Srina. Vale a pena ver isso – disse a Daniela, com um sorriso maroto. – Mas agora, o foco é outro.
– "Dani, saltem para lá, vou pousar sozinho."
O planador pousou no terraço do palácio. Os guardas correram a ver quem era. Ao avistarem o imperador, ajoelharam-se.
– Alteza – disseram em uníssono. – Bom dia.
– Bom dia. São dez e quarenta e cinco. Solicitei uma reunião convosco para as onze. Estão prontos?
– Sim, senhor. Somente a guarda mínima não irá.
– Errado, quero todos, o palácio está seguro. Chamem toda a guarda.
Cento e noventa homens aguardavam pelo imperador na sala do trono. Ele sentou-se e olhou para eles, que ficaram desconfortáveis e sem jeito. Por mais que pensassem que era um garoto, dois fatores tiravam-nos do sério: primeiro, era o Imperador; segundo, não agia como um adolescente.
– Senhores – principiou ele. Quantos de vocês estavam presentes no dia em que a minha primeira mulher morreu?
Uma onda de desconforto passou por eles e ninguém se manifestou.
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