Capítulo 5 - parte 1 (não revisado)
Os treinos duraram mais uns poucos dias e Nobuntu provou que sabia comandar muito bem a sua tripulação. O filho dele era um líder nato, tal como o pai, e a artilharia da nave estava mais afinada que um piano pronto para a grande orquestra. Os cem Dragões Vermelhos e trezentos Azuis e Verdes sob seu comando estava muito bem preparados, da mesma forma que os artilheiros e marines. A nave foi abastecida com tudo, podendo passar mais de dez anos no espaço sem descer em planeta algum.
O sinal de alarme chegou sem pegar ninguém desprevenido, quando os sensores da frota de vigilância, a trezentos e dez anos-luz dali, registram um gigantesco abalo da estrutura do espaço-tempo. O líder não perdeu tempo e chamou a Terra.
– Atenção, Centro Espacial Selenita, aqui é o cruzador Marte em Terra-Nova, comandante Ibsen. Respondam com máxima urgência.
Na lua, onde ficava o centro de controle principal do sistema solar, a resposta foi imediata porque todos os chamados de Terra-Nova eram de grau prioritário. A ligação foi estabelecida e o operador selenita observou o rosto do interlocutor, sério e preocupado.
– Aqui é a Lua, Centro Espacial da Frota. Pode falar, comandante, Ibsen.
– Uma frota desconhecida acabou de aparecer a dois dias luz. São dezenas de milhares de abalos da estrutura do espaço-tempo. Estamos enviando uma nave auxiliar camuflada para fazer o reconhecimento. Avisem o Imperador e o Almirante Daniel o quanto antes.
– Confirmado. Boa sorte, amigos, e fiquem no aguardo. Lua desliga. – O operador não perdeu tempo em chamar a Terra, pois possuía um canal privado com o palácio e outro com o quartel.
― ☼ ―
Na Terra, o Daniel e a esposa passeavam de mãos dadas pelos parques da Cybercomp após apreciarem um almoço bem agradável. Era a hora em que ambos dedicavam a si mesmos porque tinham sempre muito pouco tempo por causa dos preparativos. Em frente ao hospital, uma praça chamou a atenção da garota.
– "Este lugar é muito agradável, Dan, e sinto algo diferente, aqui" – disse ela.
– "Esta é a praça Chang, meu amor. Eu sempre gostava de vir aqui desde criança, mas só há pouco tempo soube o porquê disso quando restauraram a minha memória a teu respeito."
– "Quer dizer que eu sou famosa?" – perguntou ela, com um sorriso no rosto. – "Conta isso para mim!"
– "Em 2095, esta cidade era bem diferente, superpopulosa, com mais de seis milhões de habitantes. Havia muita miséria e o povo mais pobre sofria bastante. O meu eu anterior" – ele sorriu para ela –, "o meu bisavô, construiu a Cybercomp com o objetivo de criar, inicialmente, próteses biônicas para pessoas que tivessem mutilações. Naquela época, ainda não sabiam clonar partes do corpo. Na verdade, foi o meu trisavô que criou a tecnologia que foi terminada pelo pai da Jéssica Silverstone, o doutor Isaac Silverstone. A Daniela Chang, namorada do meu bisavô, pouco antes do noivado, conheceu o local e tinha uma grande afeição por esses pobres seres. Passou a trazê-los aqui todas as tardes, depois da escola, lendo para eles, em especial os cegos. O amor que tinham por ela era tão grande, que este lugar passou a ser chamado assim. Quando morreu no acidente aéreo, um dos cegos que foi escultor, após ter implantados os olhos biônicos, fez uma estátua dela que foi colocada aqui e isto estava sempre cheio de flores aos seus pés. A estátua foi levada para o túmulo dela..."
– Almirante Daniel Moreira, reporte-se à presidência com urgência extrema – disse o comunicador, interrompendo a conversa mental de ambos.
– "O que poderá ser, amor?" – perguntou a esposa. – "Coisa boa não deve ser, pois o teu pai nunca te chamou desse jeito, muito menos pelo teu título."
– Mensagem recebida, estamos a caminho. – "Com certeza. O Imperador deve estar lá. Vamos saltar."
Ambos desaparecem do seu tranquilo passeio para surgirem na sala da presidência, assustando os presentes. Como Daniel previra, o Imperador estava lá, da mesma forma que Nobuntu e o João, todos com o olhar bem sério.
– "Xi, amor, deu encrenca da grossa. Acho que a invasão começou" – pensou Daniel.
– Olá, gente, Alteza – cumprimentou. – Suponho que a invasão começou.
– Sim – disse João – eles estão a dois dias-luz de Terra-Nova. Pela contagem, há nada menos do que trezentas mil unidades inimigas. Acho que o Titio Imperador Jacaré quer mesmo dar um jeito em nós. A minha nave já está pronta.
– Como está a sua frota, Alteza? – perguntou Daniel, sentando-se com a esposa e mantendo uma calma tão grande que desnorteou uns e tranquilizou outros.
– Temos mil aparelhos prontos e mais mil para daqui a uma semana. Os três mil restantes ainda demorarão mais um mês. Mas só temos tripulantes para oitocentas naves. Será que isso chega? Eu temo que não...
– As suas naves não vão combater, Alteza, mandarei distribuir todas as unidades possíveis em volta de cada planeta do Império, exceto Terra-Nova. A frota do meu avô e as minhas unidades são mais do que o suficiente. Não precisamos de nos preocupar muito porque eles não passam de ponto cinco c. João.
– Fala, tchê – respondeu ele, informal –, devo ir já?
– Exato, a Jessy vai para lá e alerta a frota de Vega. Tu assumes o comando até chegarmos. Diz-lhes que fiquem invisíveis e deixa apenas a Jessy e as suas naves auxiliares em órbita. Dispõe o resto das unidades num arco grande acima do planeta, viradas para a frota invasora. Quando eles atacarem a Jessy será o nosso sinal para a ação. Usem todas as naves auxiliares. Isso deverá fazer um estrago enorme neles. Assim que a coisa esquentar um pouco, vamos mostrar-lhes a Dani. Se tiverem juízo, coisa que não me parece que tenham, desistirão. Do contrário, tanto pior. Afinal, tudo tem os seus limites. Vocês não têm ideia do quanto isto me desgosta. Bem, não te afobes, porque temos cerca de quatro dias.
– E se eles derem um salto dentro do sistema, bebê?
– Não darão, irmãozinho, porque não têm neutralizadores de inércia. Precisam desse tempo para reduzir a velocidade das naves.
– Ok, bebê. Não esquenta que vamos dar um jeito neles – disse o primo, saindo. – Até mais, gente. Alteza...
– Bebê? – O Imperador olhou para o Daniel, estupefacto.
– É uma forma carinhosa de me chamar, Majestade. Quando eu era bebê, estava sempre brincando com ele que é bem mais velho.
– Entendo. Daniel, tem a certeza de que as suas naves são suficientes?
– Absoluta. Não podemos é arriscar os outros planetas do IS São cinquenta e duas unidades mais doze vezes isso em naves auxiliares. E as naves de combate da Dani, são muito mais potentes que as naves auxiliares. São veículos de cem metros totalmente automatizados controlados por apenas dez homens: um piloto, um engenheiro e oito artilheiros. Noventa por cento do espaço delas são reatores e canhões de grosso calibre. Os raios de cada canhão têm cinco metros de diâmetro. Os canhões impulsores, quatro ao todo em cada nave, arremessam bombas de vinte gigatons. O poder de fogo um deles pode abalar até a nave-mãe, praticamente equivalendo-se a ela. Com a Dani, podemos volatizar um planeta, que Deus me livre. Chamei essas pequenas naves de destroyers, inspirado em um filme antigo. Nobuntu, prepare a Dani para subir. Quando estiver pronto, entre em órbita que eu e a Daniela saltaremos direto para a nave. Só fique a menos de dois milhões de quilômetros sem os campos de supercarga.
– Tu não estás a pensar em levá-la para uma guerra, não é meu filho? – perguntou o pai, preocupado.
– Pai, nós juramos dividir tudo nas nossas vidas. E ela é médica da nave. Inscreveu-se na frota como oficial médica. Apresento-te a tenente Daniela Chang, médica-chefe da Dani. O doutor Chang está na Jessy.
– Tomem cuidado os dois – afirmou o pai. – Não gostaria de perder nenhum de vocês.
– Fique tranquilo, pai. Vamos, anjo, quero pegar umas coisas em casa. Não se preocupe, Alteza, que a vitória é certa, mas triste. Até mais ver. – O casal saltou para a residência.
Na presidência, o Imperador olhou para o vazio que se formou com a saída deles.
– Santo Deus. Quem fala com ele não acredita na sua idade. Não creio que haja outro rapaz com tamanha força, maturidade e determinação.
– Ele foi educado assim, Alteza, para ser um líder. E o grau cem, torna-o inigualável.
– Não admira que a Helena se tenha apaixonado tão profundamente por ele. – A voz do Imperador ficou triste ao se lembrar da sobrinha.
– Alteza, esse é um assunto com que nem penso em conversar. Já lhe disse mais de uma vez que o senhor teve muita sorte quando o Daniel apareceu aqui naquele dia. O meu pai estava fora de controle e a sua vida nunca correu tanto perigo. Ele amava essa garota como uma filha, mais ainda, como a mãe dele porque reconhecia na Jéssica Helena, a mãe renascida e o amor que tem pelo meu filho, fez com que ele ficasse transtornado ao extremo. O senhor escapou de um golpe de Estado e de uma sentença de morte por causa do Daniel, que tem uma bondade inigualável e uma influência poderosa sobre o avô, que também o reconhece como o pai renascido. Então, acho melhor esquecermos isso de uma vez por todas.
– O senhor, Daniel, acredita nisso, renascimento?
– Nós somos budistas, imperador, mas, neste caso, há provas documentadas. Lembra-se como a sua sobrinha morreu? Ela transformou-se em luz. No templo shaolin há um santuário onde estão os corpos do meu avô e avó. Eles morreram há mais de cento e cinquenta anos, mas o corpo deles jamais se decompôs. Estão em uma redoma de vidro e muitos monges vão ali rezar por eles. Na mesma hora em que ela se transformou em luz, o corpo da minha avó desapareceu, também transformado em luz. Lá havia um monge rezando, mas também há câmeras de vigilância que filmaram tudo, inclusive a hora exata.
– Não sabia disso!
– Somente a minha família e os monges shaolin sabem disso. Quando o Dan tinha dois anos, foi mandado para o templo de modo a receber parte da sua educação. Um dia, disse-me que era a mesma pessoa que estava na redoma sem saber que se tratava do bisavô. E nasceu com lembranças de várias línguas, falando-as com fluência, assustando até o seu mestre que ele também reconhece como a reencarnação do seu antigo mestre da vida anterior.
– Estou impressionado. Tenho de rever os meus conceitos.
– Tem sim, Alteza, mas para isso, precisa de se virar para o seu interior. De todos nós, só o Daniel consegue ir tão profundamente dentro da mente. Esta moça é a reencarnação da noiva do meu avô, morta no acidente aéreo de 2095, o último da história da aviação. Foi só por isso que ele se recuperou pois, antes disso, vivia numa tristeza infinita. Desde a morte da Jéssica até encontrar esta moça, mais de um ano, ele nunca mais riu. Dava apenas alguns sorrisos corteses. A dor que sentia devia ser devastadora e ele guardou-a só para si, para não atingir mais ninguém com o seu sofrimento. Chegou a tentar um relacionamento com outra moça, mas não deu certo. A única pessoa com quem ele se abre para esse assunto é o avô, por terem uma grande afinidade.
– Sabe, quando isto terminar, estou pensando em abdicar a favor dele. A Helena ia ser a minha sucessora, mas... – Ele deixou de terminar a frase.
– Nem pense nisso, Alteza. Ele não quer nem nunca quis o poder. Já o tem de sobra. Ofereci-lhe a presidência da empresa e nem sequer quis tocar no assunto embora esta seja dele por direito de testamento. Quer explorar o Universo e essa é a sua paixão. Está disposto a feri-lo ainda mais?
– Eu estou cansado do trono. Trezentos anos lá é muito tempo. Desejo arranjar um sucessor, mas não quero trazer mais dor para esse rapaz tão fenomenal. Há uns meses eu refiz o meu testamento, apontando-o como meu sucessor. Farei a mudança, mas sinto que ele seria um imperador maravilhoso, senhor Moreira. O seu filho sacudiu o Império nos alicerces; trouxe mais novidades e projetos de melhorias e expansões que os últimos duzentos anos juntos. Tudo o que eu fiz neste último ano proveio da cabeça dele.
– Então, aguarde um pouco, Alteza, mas fale com ele. As coisas arranjar-se-ão, verá. E, como Almirante, o meu filho é muito mais útil porque ele e o seu mestre, o senhor Lee, são quem mais entende sobre táticas e combates. Sem eles, a vitória seria muito duvidosa.
– Obrigado pelo conselho, senhor Moreira. Foi preciso uma tragédia para eu ver como estava fora dos trilhos. Agora entendo porque o seu pai se tornou o meu opositor. Não o posso culpar, mas gostaria que pudéssemos encerrar este capítulo.
– Ele vai acabar se acalmando, Alteza. Dê-lhe tempo.
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