Capítulo 1 - parte 1 (não revisado)
Lee ia a caminho do palácio do imperador para dar apoio ao Daniel, a pedido do pai, e apressou-se bastante. Não lhe agradou a história do soberano ter prendido o seu pupilo mais querido e estava disposto a cometer atos muito perigosos. Já se encontrava na periferia do palácio cujo terreno tinha mais de duzentos metros de lado, quando, ainda distante, avistou Daniel e a noiva saindo tranquilos. Mal andaram cinquenta metros, um grupo de guardas barrou a saída do par e o chinês teve vontade de rir.
– "Esses idiotas nem têm ideia do que lhes espera se insistirem nisso" – pensava, divertido. – "Daniel vai-lhes dar uma sova de respeito."
Enquanto aproximava-se, notou que o jovem caminhava sem sequer tomar ciência dos guardas. Logo depois ouviu dois estampidos agudos saírem de um dos agentes, enquanto a Jéssica atirava-se à frente do noivo e, com um grito intenso, caiu no chão acompanhada pelo Daniel. Logo a seguir, mostrando muita dificuldade, Lee viu o jovem ficar de joelhos e falar com a noiva, enquanto mantinha o rosto crispado de dor e aparentava dificuldade em respirar. Sem reação, o monge parou o veículo e ficou olhando e tentando compreender, enquanto o imperador aproximou-se e ajoelhou-se, chorando. A garota dissera algo para Daniel e depois para o tio. Nesse momento, como se saísse de um pequeno transe, Lee saltou do carrou e começou a correr para o casal, passando pelos guardas e ignorando-os porque eles também estavam em choque, paralisados. Foi nesse momento que ouviu um novo tiro.
Estacou os seus passos e virou-se para trás, pronto para tudo, mas o que viu foi o agente que atirara na garota, suicidar-se. Voltou a correr os cem metros que faltavam, tentando alcançar o par para ver se os podia ajudar. Novamente algo inusitado aconteceu e, abobado, presenciou a garota começar a brilhar forte em uma luz branca tão intensa que ofuscava os olhos. Quando a luminosidade reduziu, o corpo da Jéssica não estava mais ali. Sobraram apenas as suas roupas.
Cheio de lágrimas, Daniel juntou as suas vestes e tentou levantar-se, cambaleando um pouco. O mestre alcançou-o e apoiou o rapaz, levando-o calmamente para o carro após ver que não estava ferido, apenas em choque completo, o que era de se esperar.
Cheio de dor no coração, o chinês pôs o rapaz no veículo e levou-o para casa, quase que o carregando. Foi um golpe muito cruel que o destino lhe pregou, a morte prematura da sua Jéssica. Ajudou Daniel a sair do carro e entrar na sua residência.
– Atenção, Lee! – disse o computador – as últimas ordens determinam que ninguém entre aqui.
– Computador: situação modificada. Daniel está comigo e a sua mulher foi assassinada. Ele está em choque e precisa de cuidados. Cancela as ordens.
– Ordens canceladas. – Disse a máquina, ao constatar os fatos apresentados. – Devo chamar socorro?
– Comunique o pai dele na Cybercomp e peça-lhe para vir aqui e trazer uma dúzia de Vermelhos. Se o imperador quer guerra, guerra terá. Ele devia ter lido Sun Tzu.
– Confirmado. Estão a caminho. – Comunicou a máquina.
– Obrigado. Vamos, filho, reaja. – Disse para o jovem.
Apesar das tentativas, Daniel não reagia. Ainda estava em choque e não havia nada que o confortasse.
― ☼ ―
Um planador com doze Dragões Vermelhos, saiu do edifício da administração e pousou no hospital. A mãe do Daniel entrou, preocupada.
– O que houve amor, por que esta correria toda?
– Aconteceu qualquer coisa muito grave com Daniel, Alexa.
Empalidecendo entrou de vez no aparelho e o marido pilotou para a casa do filho. Enquanto isso, explicava:
– Dan estava falando comigo quando a comunicação mental foi bruscamente interrompida. Pouco depois, Lee pediu por intermédio do computador que fôssemos para a casa dele levando doze Vermelhos e com urgência.
– Interrompida? – questionou, muito aflita. – Será que lhe aconteceu alguma coisa?
– Não sei. Acho que ele está vivo, mas, se o Lee pediu uma dúzia de Vermelhos, algo de muito grave ocorreu. Sem falar que o Daniel estava dizendo que o Saturnino o tinha preso a ele e à Jéssica e que estavam saindo do palácio contra a sua vontade.
– Oh, meu Deus. – Comentou a mãe, estarrecida. – Só falta ter acontecido algo com a garota. Eles deviam ter ido para Vega XII como o teu pai sugeriu.
– Acredito que tu tenhas razão, amor. Logo saberemos – disse o marido, pousando no pátio.
― ☼ ―
Com cuidado, o seu mestre levou-o para a cama e deitou-o, permanecendo por perto. Ao fim de dez minutos, uma pequena naveta planetária pousou no pátio.
As navetas eram bem diferentes das naves interestelares. Pequenas, possuíam apenas quinze metros e formato aerodinâmico, como os primeiros ônibus espaciais do século XX, mas com as asas retráteis para o voo atmosférico. Como as naves espaciais, possuíam campos repulsores, neutralizadores de inércia e de massa, além de geradores antigravitacionais. No espaço, para se locomoverem usavam jatopropulsores de partículas e eram capazes de atingir a velocidade da luz em pouco mais de cinco minutos, mas não estavam aptas a ultrapassá-la. Já para voo atmosférico, tinham propulsores de ar comprimido e superaquecido, graças ao potente reator nuclear. As navetas, com capacidade para quinze pessoas, também eram chamadas de planadores, embora estes últimos fossem exclusivamente para voo atmosférico, menores e, também, com menos capacidade de carga, como carros voadores.
Os pais e uma dúzia de Dragões Vermelhos desceram da naveta que ficou pousada no estacionamento de visitantes, dentro do terreno da residência do Daniel.
Os Vermelhos formaram um cerco em volta da casa, de guarda e prontos para tudo. Seria necessário um exército enorme para derrotar aquela dúzia de homens sérios e determinados a qualquer coisa pelos seus líderes.
O imperador, com a sua leviandade, nem fazia a menor ideia do ninho de marimbondos em que meteu as mãos, embora viesse a descobrir muito em breve.
Assim que viu a nave pousando, Lee desceu as escadas e dirigiu-se para a varanda, encontrando os pais do Daniel no caminho. O pai notou logo o pior, pois a interrupção repentina da comunicação telepática com o filho foi o prenúncio de problemas da pior qualidade e a cara do oriental dizia tudo, tanto que a esposa, assustada, agarrou com força o seu braço. Lee fez uma rápida mesura, correspondida por ambos, e iniciou o seu relato, falando de forma objetiva:
– Quando se retiravam do palácio, um dos agentes do portão ergueu a arma e atirou nele. – Informou com a voz bastante abalada, angustiando ainda mais a mãe. – A moça atirou-se à frente do Daniel e levou dois tiros fatais no coração. O seu filho sentiu toda a dor dela e ficou incapacitado para a salvar. Não cheguei a tempo e ela morreu. Sinto muito.
– Onde está o corpo dela, Lee? – perguntou o pai com a voz tremendo, cheio de fúria. – Quero o corpo dela agora. Ninguém, absolutamente ninguém, vai tocar nele.
– O senhor não vai encontrar corpo algum. Eu mesmo vi e ainda não acredito direito no que aconteceu, porque ela se transformou em energia. Começou a brilhar tão forte que meus olhos doeram e desapareceu. Tudo o que sobrou foram as suas roupas. Se não fosse isso, tê-la-ia trazido junto, mesmo contra a vontade do tio, se fosse o caso.
– Muito bem, Lee. Vou deixar um Vermelho aqui e os demais vão comigo invadir o palácio. Aquele infeliz vai ter de me explicar tudo muito direitinho ou mato-o com as minhas próprias mãos. Será deposto ainda hoje. – A ira do pai era enorme e jamais alguém o vira transtornado desse jeito, porque ele era naturalmente pacífico e muito calmo, quase tanto quanto o filho. Os poucos meses em que Daniel começou a namorar com a Jéssica e, depois, a viver com ela, foram o suficiente para aquela família se apegar à moça, muito carismática e simpática. Além disso, eles tentaram matar o seu filho, o que tornava a sua ira ainda maior.
– Não, pai, não vá que ele já sofre demais. – Daniel estava no patamar, com uma cara transtornada. – Ele irá a si, acredite em mim.
– Meu filho – disse a mãe, subindo escadas acima aos tropeções. – Meu filho.
Ela abraçou-o, chorando por ele.
– Mataram-na, mãe, mataram-na a sangue frio. – A sua era embargada e não passava de um sussurro agudo. – Ela não sabia que eu poderia sobreviver ao tiro e meteu-se na frente. Não tive tempo porque a sua dor veio para mim com tanta intensidade que perdi a força até para bloquear a minha mente. A culpa foi minha, mãe, se não tivesse ensinado a telepatia seletiva, ela não seria capaz de transmitir o que sentiu e tê-la-ia salvo. – Pelo seu rosto, grossas lágrimas caiam dos olhos.
– É claro que a culpa não foi tua, filho – disse a mãe, já controlada e apertando-o com os braços. – Saturnino jamais poderia ter feito o que fez. Ele sim, é o verdadeiro culpado.
– Senhor e senhora – afirmou Lee – acho que vocês deveriam resolver alguns detalhes disto antes que o crime seja acobertado. Eu ficarei de vigília até que se recupere.
– Obrigado, Lee, cuide dele – pediu o pai. – Enquanto isso, vou chamar a família. A propósito, o que aconteceu com o homem que atirou neles?
– Matou-se, senhor, não aguentou a consequência das suas ações.
Quando o presidente da Cybercomp referia-se à família, tratava-se, entre outros, dos nove Dragões Brancos restantes. Na mente do monge, isso ia acabar mal, diria até catastrófico. Em especial quando o avô Daniel soubesse porque amava a moça desde o primeiro dia em que a viu. Ele estava certo, e com toda a razão, de que ela era a sua mãe renascida e dedicava-lhe um amor todo especial. Quando recebesse a notícia, a coisa ia ficar preta para o lado do imperador. O mínimo que ele previa era um golpe de Estado porque ninguém tinha um poder tão grande quanto aquela família que governava nada menos do que oito dos mais ricos e prósperos mundos do Império. Na opinião do Lee, isso até que seria bom porque esse imperador era incapaz.
– Senhor, chame a família e todos os Dragões, mas espere o rapaz voltar a si, ou cometerá um grave erro. Acho que seu filho tem razão em um ponto. Deixe o imperador tomar a iniciativa. Ele está muito encrencado e sabe que precisa de falar com vocês. Assim que aparecer, o próximo lance será o vosso, sem falar que é fraco e totalmente incapaz de enfrentar seja o que for. Ele está acabado e só um milagre o poderá salvar.
– Farei isso, Lee, obrigado pelo conselho. Já mandei o nosso departamento de tecnologia interceptar as câmeras de segurança do palácio. Aquele tolo do Saturnino nem imagina o que nós podemos fazer. Deve ter-se esquecido que somos os detentores da tecnologia mais avançada do Império.
Dizendo isto, o casal retornou para a naveta seguido pelos fieis Dragões. Lee observou por alguns minutos a nave subir e afastar-se no horizonte.
Enquanto retornava para o quarto do Daniel, pensava preocupado no que ia acontecer. Depois de uma coisa destas era certo que algo teria de mudar e muito. De vigília ao rapaz, pensava nos meses em que ele viveu com a linda ruiva. A felicidade e alegria que o seu aprendiz irradiava eram a prova cabal que ela só lhe fazia bem. O imperador não poderia sair impune de uma ação destas, que começou com uma prisão ilegal e terminou com um assassinato a sangue frio, sem sequer um aviso. Com certeza que isso precisava de ser castigado, não importando, em absoluto, o fato da moça ter sido a sua sobrinha.
Após chorar por uma hora, Daniel acabou adormecendo. Lee desceu à sala dos ancestrais para meditar, quando algo estranho aconteceu: ficou com a cabeça muito pesada e adormeceu, como se o tivessem nocauteado.
Nesse preciso momento, o Daniel acordou sendo beijado nos lábios. Abriu os olhos e não acreditou no que viu, pois a sua querida Jéssica estava deitada ao seu lado, beijando-o e acariciando-lhe os cabelos com um sorriso terno nos lábios.
– C... como? – perguntou sem entender. – Estarei tendo alucinações?
– Só temos algumas horas, meu amor. Quando ascendemos, podemos fazer certas coisas. Podes tocar em mim que o meu corpo é real. – Ele olhou para ela e o seu corpo de uma beleza estonteante. Tremendo, abraçou-a, cheio de carinho e saudades. Jéssica correspondeu e ambos ficam juntinhos em silêncio. Mais tarde, Helena olhou para ele e disse:
– Amor, tenho apenas até ao amanhecer. Ouve bem, que é demasiado importante: a invasão vai mesmo acontecer e precisas de proteger a humanidade. Somente tu poderás evitar a catástrofe, porque o meu tio é demasiado fraco. Estás no caminho certo, mas também deves procurar o teu destino e é imperativo que termines a tua espaçonave, uma das chaves para salvares o Império. Não te podes atirar aqui em desgosto, esquecendo do resto. Para minha infelicidade, nós não estávamos destinados a ficarmos juntos, mas o tempo que tive ao teu lado foi a coisa mais especial que eu vivi nesta vida e sei que tu sabes disso.
– Mas nunca mais te ver, meu amor, é demasiado doloroso.
– Se cumprires o teu destino, também ascenderás e não renascerás mais aqui. Tu tens de encontrar a Daniela, que é a chave desta tua vida, o teu caminho.
Ela beijou-o com muito amor, recomeçando a acariciá-lo. Passaram a noite toda assim e Daniel esqueceu por algumas horas que perdera a esposa, ficando mais calmo e aliviado. A terapia da Jéssica fez-lhe bem e, pouco antes do amanhecer, ela despediu-se com um beijo, desaparecendo novamente em um facho intenso de luz branca.
– Adeus, meu amor – disse para o vazio que se formou – pelo menos consegui ver-te mais uma vez, mas vai ser um fardo muito pesado sem ti. Muito mesmo.
Levantou-se, ainda muito abatido, e foi para a cozinha. Por cada cômodo que passava, sentia a sua presença, o seu cheiro, como se ela fosse despontar ali a qualquer momento para tomar o café da manhã consigo.
― ☼ ―
Sun Tzu – autor do famoso livro "A Arte da Guerra"
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