Capítulo 4 - parte 2 (não revisado)

A caminho da sua casa, Daniel estava satisfeito. Ele gostava demais da vida que levava no momento, com uma garota maravilhosa que amava muito e sendo bem correspondido. Na estrada vazia, acelerou o veículo a mais de trezentos e cinquenta.

– Dan, diminua isso, pelo amor de Deus. Você vai nos matar.

– Não te preocupes, minha linda, que eu posso prever o perigo antes dele ocorrer. Céus, como eu amo este carro – acelerou ao máximo e a pobre moça, que já se sentia esborrachada na próxima curva, deu um pequeno grito. Ao fim de um tempo, reduziu a velocidade porque estava próximo aos limites da cidade, apesar da maioria das pessoas usar planadores e não carros.

– A que velocidade fomos, amor?

– Trezentos e noventa e cinco por hora.

– Meu Deus, é mesmo o meu super-Dan. – Ela virou-se para o lado e beijou-o no rosto, muito contente.

– Quem disse isso, lindinha?

– A sua mãe disse, quando você enfrentou todos os Brancos. O seu primo tinha razão lá na sua casa, ao dizer que nenhum homem no mundo pode derrotar você.

– Só podia ser ela. – Ele deu uma gargalhada. – Sim, tinha, mas odeio chamar a atenção. João sabe disso e gosta de me provocar. Vamos jantar fora?

– Onde?

– Ora, escolhe o que quiseres.

– Um bom bacalhau. Lá no Rio comia bacalhau com frequência e tenho saudades.

– Claro, princesinha. Aqui perto há um restaurante português muito bom.

Comeram o bacalhau com um vinho de uma ótima safra e terminam a noite na casa dele. De madrugada, a garota acordou e não o viu na cama. Levantou-se e desceu as escadas, encontrando-o num quarto em que nunca entrara. Sentado no chão de futons, Daniel meditava de olhos fechados. Ela olhou a sala e viu várias fotografias, observando que eram quase todos parentes. Finalmente, viu a Jéssica e, impressionada demais, aproximou-se para olhar a imagem mais de perto.

– Essa era a Jéssica, meu amor – disse o Daniel. A garota virou-se, muito assustada.

– Você me assustou. Então esta é a minha rival?

– Como podes concorrer contra ti mesma?

– Você acha que eu sou a reencarnação dela!? Como pode pensar assim?

– Simples, eu sempre soube como te agradar, tudo o que tu gostas, até como fazer amor do jeito que tu gostas e nunca tinha ido para a cama com alguém nesta vida. Como eu poderia saber tanta coisa? – Arrematou com um sorriso doce e apontou para a foto do bisavô. – Além do mais, sei que era ele.

– Quem são os outros?

– Aquele – apontou uma foto – é o meu pentavô, que construiu esta casa e a fortuna da família que permitiu ao meu bisavô criar a Cybercomp. Ali, meus tetravós e aqueles são meus trisavós, que foram brutalmente assassinados pelos asseclas da Megadrug. Aqui, como tu já viste, somos nós – ele sorriu e beijou-a – ou os meus bisavós, se preferes assim. Os que estão à direita eram amigos que eles amavam muito: o mestre Lee, a Suzana e o João, a Bianca e o Manoel Fonseca e estes dois eram os amigos mais chegados, o Paulo e a Cláudia. A filha deles é a minha avó Daniela. Aqueles, do lado esquerdo, são o professor André Focault e a doutora Janine, esposa dele. O filho deles é avô do João. Por último, temos os pais da Jéssica, Natália e Isaac.

– Não há mais ninguém?

– Não morreu mais ninguém desde então. Mas algo me diz que faltam imagens aí. De três pessoas.

– Você sabe se mais algum deles reencarnou, como costuma dizer, Dan?

– Sim, o mestre Lee é o mestre Lee de hoje, que te apresentei no hospital. O Paulo e a Cláudia, são os meus pais. Os outros, não sei.

Ela aproximou-se dele com um sorriso maroto e beijou-o no pescoço junto da orelha, sussurrando:

– Vamos subir, vamos? – pediu, cheia de desejo. – Sabe, amor, sinceramente essa história de reencarnação não é para mim.

Ele sorriu sem se incomodar com o comentário, pegou na garota ao colo e subiram para o quarto. Maliciosa, olhou para ele cheia de sensualidade e acariciou-lhe a nuca, que já descobrira ser um ponto que lhe dava muito prazer e o deixava bem arrepiado...

― ☼ ―

O imperador estava meio chateado com a sobrinha porque não recebia notícias com a regularidade combinada. Sabia, porém, que a moça precisava de agir com cautela para granjear a confiança do rapaz. Acessou os seus e-mails particulares e nada de informações da Helena.

Escreveu uma nota para ela e enviou. Decidiu que ia esperar mais um pouco antes de a chamar, pois temia trair o segredo da agente.

― ☼ ―

Depois que começaram a namorar, Daniel e Jéssica estavam sempre juntos. Iam para a escola, embora esta estivesse no fim do período e, depois, ela acompanhava-o à Cybercomp para este trabalhar na construção da nave. A garota não entendia nada do que ele fazia, mas o simples fato de estar perto do seu Daniel dava-lhe um profundo prazer e satisfação. Notou que ele tinha uma dedicação enorme pelo seu projeto, e já havia descoberto que ele era muito bondoso e jamais pensara em tirar vantagem de seja quem fosse, sendo a construção da nave totalmente custeada pelo seu próprio patrimônio pessoal que era o maior do império, como ela veio a saber. Às vezes, tinha coisas para fazer e não o acompanhava, sentindo-se muito triste com a sua ausência. Às vezes encontrava-se com o imperador, mas omitia grande parte das informações.

Em geral, costumavam dormir na casa dele por metade da semana, de quinta a domingo. Aos fins de semana a turma toda reunia-se para jogar polo e o tradicional churrasco. Daniel jamais imaginou que fosse possível ter tamanha felicidade e a construção da sua espaçonave crescia a olhos vistos, como se a Jéssica fosse um pilar que o motivasse.

– Dan – perguntou a namorada, um dia na empresa quando terminavam o almoço. – Afinal o que tem de tão especial na tua nave, tirando o tamanho colossal. Não é possível que haja tanta inovação assim!

– Mas há, amor. Para começar, a capacidade energética dela é absurda, o que lhe confere uma tremenda autonomia. Já voaste pelo espaço? – Ele sorriu. – Nesta vida, claro.

– Não, por quê? Antes voei? – Ela não engolia muito essa coisa de reencarnação, mas pequenos atos dele deixam-na na dúvida, confusa. Daniel não a forçava a aceitar a sua crença e, eventualmente, conversavam sobre isso.

– Passamos mais de duzentos anos no espaço, meu amor, e lembro-me de muitas coisas. Vem, vamos dar um passeio na nave experimental.

– O que tem essa nave de especial?

– Testo os meus inventos nela, Jessy, mas os hiper-propulsores ainda são originais e isso vai-te ajudar a entender uma das maiores invenções da atualidade, modéstia à parte.

Levou-a para o espaçoporto. Ao lado da gigantesca nave, parada a quinze metros do chão e apoiada por quatro colunas telescópicas, ela viu uma pequena esfera de trinta metros, que passava desapercebida, tamanha era a diferença entre ambas. Entraram na navezinha e Daniel perguntou-lhe, sorrindo.

– Tens dois ou três dias só para nós?

– A mim, meu amor, parece que essa é a melhor parte. – Ela sorriu de volta. – Já estou adorando este passeio mas não tenho roupas para trocar.

– Bem, em Vega XII compramos alguma coisa; mas, na nave, não precisamos de preocupações desse tipo – disse, malicioso.

– Estou cada vez gostando mais, amor. – Ela sorriu outra vez e beijou-o.

– Então, vamos partir. – Ajudou-a a sentar-se na poltrona de navegação e sentou-se na cadeira de comando. Após certificar-se que não havia mais ninguém na nave, fechou as escotilhas. – Computador, assumo o controle individual. Colocar sistemas no automático, fazer checklist eletrônico.

– Sistemas no automático. Reatores um e dois em ordem, sistemas de navegação em ordem, propulsores em ordem, campos de força em ordem... – O computador passou o checklist com aquela voz impessoal, mecânica e de tom metálico. Na cadeira do comandante surgiu uma bandeja móvel em cada braço que possuía uns poucos comandos. Jéssica observou que eles se iluminavam, mostrando uma quantidade respeitável de controles, todos virtuais, projetados em hologramas tridimensionais que reagiam aos movimentos das mãos. Após refletir, afirmou:

– Sabe, amor, você poderia dar um tom mais humano para a máquina. Afinal, com toda essa tecnologia isso deve ser relativamente fácil.

– É verdade, minha linda! – Daniel deu uma risada e acionou o rádio. – Espaçoporto Salgado Filho, aqui fala a nave experimental CCB001, preparando-se para decolar do espaçoporto da Cybercomp. Apenas dois tripulantes: comandante Daniel Moreira e Jéssica Helena Almeida, com destino a Vega XII. Solicitamos permissão de decolagem e vetor direcional.

– CCB001, como pode voar com apenas dois tripulantes!?

– Trata-se de uma nave experimental que permite esta manobridade, amigo, verifique os registros e verá que tenho autorização.

– Confirmado, comandante. Tripulação e destino registrados. Pode decolar; o espaço está livre. Siga em phi zero até cem mil metros de altura, depois mude para phi oitenta, e teta cento e vinte, por vinte milhões de quilômetros. Boa viagem, CCB001.

– Obrigado, Salgado Filho, CCB001 subindo em trinta segundos, paz e desligo. – Daniel acionou os campos de antigravidade. Para a Jéssica entender, ia falando o que fazia.

– Acionar g zero, aos trinta segundos, aceleração de menos cinco décimos de g – afirmou enquanto mexia no console. Ela observava-o com os olhos extasiados, notando a segurança e tranquilidade com que manipulava a astronave. – Ligar telas e fechar as clarabóias.

Chapas de aço especial desceram, lacrando todas as janelas que existiam na nave, surgindo, logo a seguir, uma série de telas holográficas em volta de toda a ponte o que oferecia uma visão completa do espaço externo.

– Por que você fez isso, amor?

– Esta nave incorpora tudo o que eu criei para o meu projeto, que é testado aqui. Embora aquela nave tenha sido desenhada para ser uma unidade de pesquisas, também possui recursos para poder enfrentar um ataque desconhecido e, apesar da extrema resistência destes vidros, morreríamos se eles quebrassem. Bem – ele sorriu malicioso – agora, estamos isolados, com privacidade total.

– Não provoque... – Ela beijou-o, feliz, e olhou em volta.

A sensação era que a ponte era toda de vidro. À frente da poltrona do comandante surgiu uma imagem semitransparente, assim como na cadeira do navegador, onde a Jéssica acompanhava tudo, ora olhando para a tela ora para o seu Daniel.

– Acionando gravidade artificial, ativando neutralizadores de inércia.

A nave começou a mover-se, mas ela só notou porque a imagem nas telas mudava constantemente, mostrando a subida. Dentro, ainda parecia que estavam parados. Observava a Cybercomp tornar-se cada vez menor e via os enormes parques da cidade, tudo reduzindo aos poucos.

– Cem quilômetros de altura, mudando rumo e acelerando a menos cem g. – Dentro da nave nada se notava, mas esta disparou alucinada pela estratosfera. – Computador, calcular rumo para Vega XII. Quero o trajeto em cinco saltos. Apresente os cálculos graficamente na tela do navegador e do comandante.

– Centro de navegação automática para o comandante: apesar da posição não ser favorável, o trajeto pode ser feito em dois saltos.

– Negativo, computador. O objetivo desta viagem é didático, mas fá-lo em três saltos.

– Caramba, Dan, todas as nossas naves são assim?

– Claro que não, minha linda, o sistema de navegação desta nave é um aperfeiçoamento meu, mas ainda não estou muito satisfeito com os resultados. – Ela olhou a sua tela modificar-se, aparecendo a imagem da Galáxia que se ampliava até mostrar a Terra. Depois, uma linha vermelha apresentava a trajetória que a nave ia fazer e os saltos que seriam dados eram marcados com pequenos círculos brancos.

– Estamos no espaço. Ativando neutralizadores de massa e acionando jatopropulsores com empuxo máximo. – Uma vibração leve fez-se sentir e o espaço começou a mudar um pouco. Ao fim de três minutos, estavam perto de c.

– Cinco horas e quarenta minutos para o salto – anunciou a máquina.

– Desligar jato-propulsores, prosseguir em queda livre.

– Por que motivo tanto tempo?

– Temos de nos afastar do sistema solar. O supersalto produz ondas de choque. Vamos ficar assim por cerca de seis bilhões de quilômetros, mais ou menos cinco horas e meia luz.

Ela levantou-se da cadeira e abraçou-o, começando a beijá-lo. Por cinco horas e meia, a nave seguiu pelo espaço a noventa e nove por cento da velocidade da luz, aguardando o ponto do salto. Quando chegaram perto do momento, veio a mensagem do computador:

– Ponto de salto em trinta segundos. Rota correta.

– Ligar jato-propulsores. – Daniel executou a própria ordem.

– Salto em cinco segundos, quatro, três – Daniel liberou o dispositivo de salto – dois, um, salto.

Jéssica estava curiosa para saber como era fazer um hipersalto, pois imaginava que fosse algo como um estouro cheio de efeitos luminosos, mas tudo o que aconteceu foi uma pequena vibração mais forte. Depois, a tela piscou por um segundo e a garota notou que a imagem da Galáxia mudou.

– Salto efetuado, calculando margem de erro e posição para o novo salto. Tempo estimado: duas horas.

– Certo, colocar no piloto automático. Avisar o comandante quando faltarem cinco minutos.

– Confirmado.

– Obrigado – respondeu. – Jessy, vamos comer alguma coisa?

– Que tal você, amor?

Ele deu uma risada alegre.

– Vem, temos duas horas. Quero ver se te lembras como é sem gravidade...

Felizes da vida, retornaram duas horas depois. Ela não sentou na cadeira do navegador, pois preferia ficar ao lado dele.

– Computador, informe.

– Erro de voo de zero vírgula oito milhões de quilômetros. Rota corrigida e recálculo do salto efetuado. Cinco minutos para o tempo zero.

– É incrível, amor.

– Não viste nada, princesa, na volta verás o mesmo voo em um simulador da minha nave.

– Dan, você avançou até pouco depois da órbita de Plutão, mas sei que há mais planetas após isso. Não deveria ter-se afastado mais?

– Há milhares de objetos após a órbita de Plutão, amor, mas são apenas planetoides ou asteroides. Muitos deles estão muito afastados e acabarão por se tornar cometas de órbitas instáveis. Entretanto, o local onde saltamos estava vazio de corpos celestes em uma distância segura porque Plutão está o periélio.

– Como você pode saber tanta coisa, amor?

– Eu gosto muito de física, Jessy, e tenho memória eidética, lembra? – Sorrindo, acrescentou. – Sem falar das minhas lembranças anteriores...

Ao fim de três saltos e muito carinho no meio deles, estavam orbitando Vega XII. Daniel tentou contatar o avô diretamente e conseguiu.

– Oi, vô. – A tela mostrou a imagem do avô, tão perfeita que parecia estar presente. Ele, ao vê-los, deu um sorriso cheio de alegria. – Estamos em órbita de Vega XII. Tem um quarto sobrando para nós? Viemos dar um passeio.

Com uma gargalhada estrondosa, ele respondeu:

– Mas claro, meus amores, para vocês sempre haverá espaço na minha casa. Pena que a tua avó foi visitar o irmão em Mitris. Pousem no espaçoporto da cidade que mandarei um planador. O nosso porto está lotado. Temos dez cargueiros parados lá.

– Ok, vô, vou contatar o espaçoporto. A propósito, o senhor deve-me um conjunto de alto-falantes que estes pifaram com a sua gargalhada.

Daniel não devia ter dito isso, pois a segunda foi ainda pior. Sorrindo, contatou o espaçoporto da capital.

― ☼ ―

Sigla matemática para a velocidade da luz.

Periélio é o ponto mais próximo do sol, o oposto de afélio.

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