34-PALAVRAS MÁGICAS
No outono a noite caia mais cedo, eram 5 da tarde quando meu telefone tocou com uma mensagem do vampiro com as ordens do dia. Fiz o chek in do meu quarto, abasteci o carro, arrumei minhas coisas no porta malas e fiquei esperando por ele no saguão com aquela sensação estranha, quase dolorosa, na boca do estômago. Parecia um mau agouro.
Mas a ignorei por pensar que fosse um tipo de ressaca moral.
Pegamos a estrada por volta das 6 da noite, Eric guiava tão silencioso quanto eu estava, e eu mentalmente agradecia pelas duas coisas, até que comecei a achar o silêncio muito desconfortável e perguntei se poderia ligar o rádio.
Ele sintonizou numa rádio vampírica que só estava tocando baladas. De rabo de olho, percebi o vampiro tamborilar os dedos no volante com algumas canções e eu gargalhei ao vê-lo cantar total eclipse of the heart muita empolgado.
— Do que ri?
— Do seu gosto musical, só agora reparei que você ama uma balada romântica.
Ele balançou a cabeça, como se ponderasse, e sorrimos um para outro, esquecendo por alguns instantes do porquê estávamos naquele clima horroroso; ao perceber que me perdia naqueles olhos cintilantes, desviei a atenção para a estrada.
— E você não? — Dei de ombros. — Eu gosto de música e essa é tão vampírica!
— Sério?! Achei que era só mais uma música sobre um romance triste.
— Veja, nessa música, alguém está na sombra, vacilante e sofrendo; provavelmente, uma humana que está lutando contra o próprio sentimento, o sentimento que ela sente por alguém das sombras, um vampiro talvez; até que ela diz" volte com seus olhos brilhantes" e se entrega à escuridão por toda a eternidade, num eclipse total do coração.
Ao ouvi-lo cantarolar aquela parte, ri de novo, e ele também, até que entendi; depois, de cara fechada, apenas balancei a cabeça, como se concordasse só para não dar mais corda para ele. A interpretação que ele fez da música ao mesmo tempo parecia fazer sentido como era muito conveniente.
— Lara... — Olhei para ele. — não foi um indireta... a não ser que queira — virei meu rosto. — Lara... Lara!— Relutante, o encarei. — Foi só um beijo, não precisa ser algo... a não ser que queira.
— Dá pra mudar de assunto?
— Se você quiser...
— Meu Deus, Eric, tirou a noite pra me irritar ou quê? — ele riu, suspirei forte. — você fica nessa " o que você quiser" mas nunca me deu nada o que eu quis, e nem vem falar de ontem, ontem não conta.
— Você se arrepende? — disse após alguns instantes.
Não tinha me arrependido e mesmo que uma parte significativa tenha ficado bastante impressionada e disposta a ver até onde toda a fama de bom de cama dos vampiros era verdadeira, não faria de novo tão pouco.
— Não importa se me arrependo ou não, só queria que isso ficasse aqui e entre a gente.
Interpretei o silêncio como concordância e suspirei. Não tinha nem uma semana direito que eu e Taylor havíamos terminado. Como eu podia estar daquele jeito com outra pessoa e ainda mais com o Eric? Mas tinha sido bom, parecia certo de um jeito torto. Se quer pareceu algo novo. E foi a primeira vez, desde que eu descobri minha sensitividade que não precisei me concentrar em não ser invasiva e puder aproveitar meus próprios sentimentos.
Diferente de como era com Taylor. E compará-lo com Eric me pareceu tão errado, sujo, mesmo que ele tenha terminado comigo. Eu precisava de um tempo e ficar longe do Eric. Com ele perto, eu sempre ficava confusa.
Fizemos uma parada logo após passarmos pelo terceiro e último pedágio; e antes de ir ao banheiro, abri a boca para dizer que no final a caixa, que estava dentro da bolsa dele, era só uma caixa e deu tudo certo, mas preferi não contar vitória antes da hora e perguntei:
— Você vai levar a caixa ainda hoje para o Ludovic?
Ele assentiu e completou:
— Vou direto ao cassino, na volta te deixo em casa.
— Mas eu não fui banida?
— Detalhes. — Piscou. — Só não recomendo ir lá sem mim; caso for, será um detalhe que não vai passar despercebido.
Ao entrar na loja de conveniência para pegar a chave do banheiro, vi colado atrás do balconista um pôster da sociedade do sol escrito em letras garrafais: " O Sol é a cura do mundo" . Às vezes, até me esquecida de como os religiosos ficavam cada vez mais proeminentes e seus discursos anti vampiros mais violentos, principalmente após a morte suspeita do Reverendo Newlins, o pai do Steven Newlins, há algumas semanas.
Fui direto ao banheiro agradecendo por Eric sempre ficar no carro, a presença dele não passaria batido e se houvesse uma briga eu não teria como defender o humano, e, talvez, nem quisesse.
Acabava de lavar a mão quando aquela parte estranha do meu cérebro se encheu de ódio e desespero. Meu corpo se enrijeceu e sai correndo para o pátio em direção a fonte daquelas sensações.
A primeira coisa que vi foi o porta malas aberto, minha mochila e a mala do Eric estavam reviradas, algumas roupas, inclusive meus dois vestidos novos, jogados pelos chão. Foi triste vê-los caídos numa poça de óleo.
Na lateral do carro, Eric estava sendo arrastado pelo asfalto, o rosto estava coberto por uma malha de metal e as mãos e os braços presos por correntinhas, tudo de prata pelo chiar e cheiro de queimado. Foi rápido, e a imagem dele cruzou com lembrança do homen do meu sonho sendo espancado.
Meu coração apertou numa angústia maior que imaginei sentir, e nem tive tempo de assimilar o que aquilo significava; numa coragem insana, me joguei sobre a senhora por volta de 50 anos, com a camiseta branca e os cabelos loiros curtos sujos de sangue, olhos brancos opacos. Com uma força sobre-humana, fui jogada longe, caindo como uma fruta podre no chão.
A dor que percorreu meu corpo, após a queda, foi paralisante e aquele apito agudo em meus ouvidos fazia minha cabeça doer; com a visão turva, observei Eric ser levado para longe de mim em um furgão. Talvez fosse porque caí na beira da estrada quase na vala em meio ao mato que ladeava a rodovia, talvez porque fosse noite ou porque ninguém tenha visto toda aquela briga barulhenta ou pior, não se importava, mas não teve uma alma para me ajudar. Não sei quanto tempo levou, talvez segundos ou minutos, talvez mais, porém consegui entrar no carro.
Eu sabia que Eric estava vivo, ou ainda existindo, mas podia senti-lo enfraquecer, dirigi a toda pela rodovia sem um rastro sequer do furgão. Quando parei num cruzamento, tudo o que tinha era a vaga presença dele ressoando na minha mente e urgência de encontrá-lo. Seguindo minha intuição, virei a esquerda e torci para estar certa.
Alguns quilômetros à frente, em uma região mais rural e escura, visualizei em meio ao milharal um pontinho de luz. Me aproximei e vi uma cabana e o furgão aberto, estacionando de qualquer jeito.
Deixei o carro na esquina e corri, sob a lua cheia num céu limpo, por uma trilha recém aberta na plantação abandonada. No meio do caminho, parei para respirar e controlar a sensitividade; por fim, desisti e a usei para verificar quantas cabeças eu deveria evitar.
Fui me aproximando de pé em pé até conseguir captar uma faísca de vida, mas ela não reverberava como energia humana. Forcei ao máximo, até ficar tonta, e consegui reconhecer aquela presença: Um Kappa!
— Merda— murmurei—, a gente tá ferrado, Eric.
Ao chegar perto da cabana, a mesma lua que me ajudou, agora atrapalhava me deixando muito exposta. Me agachei, mesmo sendo pequena, e passei pela porta da frente interditada com tábuas presas à parede. Duas das três janelas estavam fechadas igual a porta, somente a última tinha um fresta por onde a luz escapava e foi por ela que verifiquei o interior.
Um homem branco, por volta dos 50 anos, usando camiseta e bermuda, devorava ferozmente que sobrou de um animal morto no chão. Seus olhos também eram opacos, me ajeitei um pouco e consegui ver um par de pernas andando de uma lado para outro. O dono das pernas conversava com alguém mas não consegui entender uma palavra que fosse e nem ver, ou sentir, a outra pessoa. E nem sombra do vampiro.
Segui em direção aos fundos. E nada tinha me preparado para o que vi ao virar a lateral da cabana. Eric totalmente indefeso com um dos braços erguido preso a uma viga da cabana por uma corrente de prata; o outro, mantido no chão pela corrente jogada em cima do pulso. Haviam o drenado e deixaram no braço dele o garrote e o escalpe.
Mas a coisa mais aterrorizante foi perceber que ele estava sendo devorado. A senhorinha que ataquei mais cedo estava mastigando ruidosamente um grande pedaço da lateral da barriga do Eric.
Eu e o vampiro nos entreolhamos em reconhecimento, tentei tirar a mulher de cima dele e ela grunhiu, sem parar com o que fazia, me empurrando. Cambaleei e tentei mais uma vez; dessa, eu consegui afastá-la um pouco, e seus olhos mortos caíram em mim.
Com a minha habilidade descontrolada, visualizei seus últimos momentos de vida humana, ela e outro senhor estavam na estrada, felizes, quando o pneu estourou, ao saírem do carro para verificar foram atacados pelo kappa e transformados em carniçais. A camiseta que ela o marido usava tinha uma foto deles e dizia " melhores avós do mundo". Meu coração pesou. E o pouco que restou da humanidade dela gritava em desespero, ela só queria descansar. Vi no chão um pedaço de vergalhão próximo a algumas ferramentas, e tremendo muito o segurei.
O que não me faltava era motivo para ter raiva, então canalizei tudo até ver o mundo vermelho e enfiei o ferro direto na cabeça dela. Ela tombou sobre o Eric e a empurrei para o lado.
— Me desculpa — murmurava mesmo sabendo que já não havia nada além de carcaça. — Me desculpa, senhora.
Enquanto tirava as correntes, vi que o estrago feito por ela era bem maior. A mordida na cintura foi tão funda, e larga, que eu consegui ver a pontinha de duas costelas e parte das vísceras dele. O ombro e a coxa também foram mordidos com a mesma ferocidade. Mais pálido e gelado como nunca tinha visto até então, nenhuma das feridas cicatrizavam com a rapidez que supostamente acontecia com as feridas dos vampiros. Eu precisaria de muitas imagens bonitas e fofas para esquecer o que vi naquela noite.
— Consegue andar? — perguntei sem som e ele assentiu, mas levantou com muito esforço.
De pé, ele sinalizou para irmos para o fundo da casa. Agachados, andávamos devagar até a porta arrombada. Quando Eric se vangloriava por ser um vampiro excelente, ele não estava falando da boca para fora. Mesmo ferido e drenado, ele ainda teve forças para invadir a casa e empurrar o Ghoul, que o atacou, contra os chifres da cabeça do veado presa na parede. E Eric foi certeiro ao jogá-lo, os chifres atravessaram os ombros, pescoço e cabeça.
A visão do corpo suspenso me deixou atordoada, e nem vi como começou a briga entre Eric e o Kappa, só que o vampiro estava levando a pior. Acuado na parede, ele evitava os ataques feitos pelo kappa, que eu só via as costas, e estava com um cassetete retrátil, provavelmente, de prata. O vampiro caiu no chão quando o kappa o acertou bem no quadril. Pelo barulho, quebrou alguns ossos.
O kappa mirou o bastão em direção ao coração do meu chefe e pulei nas costas dele, minha sorte era que o kappa não era muito mais alto que eu, tinha 1,60 no máximo. E me agarrei nele, uma mão puxava os cabelos e outra batia e arranhava. Muito mais forte que eu, quando ele acertava as cotoveladas era realmente doloroso, mas resistia até que caímos no chão, e nos embalamos na porrada. Ele tentava me morder e com os pés o empurrava. Em um chute aceitei o rosto com tudo.
— Humana maldita! — Ele cuspiu sangue e alguns dentes. — Eu devia ter te destroçado quando tive a oportunidade!
E só naquele momento o reconheci, ele era o kappa que torturou Taylor. E ao lembrar daquele dia, o ódio tomou conta de mim e fui pra cima dele com tanta selvageria que ele ficou com medo e tentou fugir. Agarrei as pernas fazendo cair de novo, e soquei repetidamente sua cabeça contra o chão. Só parei ao ouvir a voz rouca do vampiro:
—Me traz ele! — Arrastei o kappa até o Eric, no chão, encostando na parede. — Quanto tempo, Blanc.
— Vai a merda, vampiro! — ele cuspiu no chão.
Eu o segurava pelo pescoço fazendo ele ficar de joelhos. Eric ameaçou um riso, mas o que saiu foi um som estranho.
— Eu avisei que um dia você se arrependeria pelo o que disse — o vampiro continuou —, também avisei que estaria lá para vê a dor em seu rosto, só não imaginei que seria tão rápido.
E com o sinal do vampiro, eu torci o pescoço do Kappa. Ele tombou para frente e fui até o vampiro sem um pingo de remorso.
— Você tá um caco, Eric...talvez precise de ajuda médica.
— Adoraria ouvir suas piadas, mas não temos tempo mesmo. Lewis está voltando.
Fiz uma careta, aquele inferno não teria fim não?
— Você dá conta?
— Não desse jeito, precisamos fugir.
— Não. — Arregacei a manga da minha blusa. — Vamos terminar isso agora; se morrer, morreu; se viver, viveu. Beba.— Ofereci meu braço.
— Esse é o espírito; mas tem certeza?
—Tá vendo outro humano aqui ou um engradado de True blood?
Ele me puxou pelo punho e cravou os dentes no antebraço. Não teve nem sombra do charme e erotismo da noite anterior, mas, pelo menos, não doeu. Enquanto ele bebia, suas feridas superficiais sumiam e eu ficava mais fraca.
— Eric! — Tentei puxar o braço e ele agarrou com mais força. — Eric, me solta!
Agarrei seus cabelos com força, mas ele parecia em frenesi e os ruídos que soltava avisaram que ele não pararia até se saciar. Bati e tentei empurrar, mas ele ficou mais voraz. Cada vez mais fraca, fechei os olhos, minha cabeça tombou para trás e por um milésimo de segundo o mundo girou mais devagar, ouvi a pulsação dos corações humanos que passavam a quilômetros de distância na estrada, o bater das asas de uma mariposa, senti o cheiro da tempestade se formando bem distante, da vegetação que nos cercava e todas as vidas que nela se escondia. Meu próprio coração parecia soar tão alto e estranho a mim, como um tambor descompassado. O céu noturno era tão claro como o próprio dia com a via láctea brilhando. Endireitei a cabeça, abri os olhos, e me vi pelos olhos dos vampiros. E depois, perdi a consciência.
Quando despertei, minha cabeça estava apoiada na coxa sadia de Eric enquanto sua mão fresca acarinhava meu rosto e cabelos, estava com sede e frio, por alguns segundos imaginei que tivesse me transformado, mas meu coração batendo, mesmo que fraco, dissipou a possibilidade de ser uma vampira.
— Quanto tempo?
— Nem 5 minutos. — Fiz menção de me colocar de pé, mas ele me segurou. — Você está bem?
— Tô viva — Tudo o que tinha acontecido há poucos era tão confuso. Eu estive dentro, e não absorvendo as emoções dele? — Eu tô viva, né?
— É o que tudo indica.
— Eric! — Tentei me levantar de novo. — O outro cara vai vir, a gente...
— Eu já dei conta dele. — Ele apontou outro corpo estirado no chão a poucos metros de distância. — Assim que você tirou a sonequinha, ouvi o barulho do carro e antes que ele se desse conta, enfie aquela foice nele.
— E porque a gente ainda tá aqui?
— Temos que apagar nossos rastros.
— Temos?! Eu não faço mais nada hoje.
— Vou ter que frustrar seus planos, mas preciso da sua ajuda. Ainda estou fraco.
— Você tá fraco; e eu? Você quase me matou
— Lara, não é como se você tivesse muito sangue também com esse tamanho, do jeito que estava precisava de duas você para me saciar e curar.
Tirei a mão dele do meu rosto e levantei a cabeça do seu colo. Fiquei tonta, obviamente, pela rapidez e pela perda de sangue, e o encarei muito consternada.
— Isso que é cuspir no prato que comeu, nem sei porque me choco ainda. — Encostei a cabeça na parede. — depois de tudo, você não disse as palavras mágicas...
— Que palavras?
— As que dizemos quando alguém salva sua bunda branca e morta de virar poeira.
— Obrigado!?
— E...
— E o quê?
— Você quase me matou..
Ele devolveu um olhar contrariado e disse por fim:
— Desculpa, minha doce e saborosa Lara.
— Sem deboche...
— Não é deboche, você é doce e saborosa. E eu sinto muito por ter perdido o controle, garanto que dá próxima não vou perder e será muito mais prazeroso.
— Não vai ter próxima. — Aquela erguida de sobrancelha dele me irritou — É sério! Não vai ter próxima.
Ele me auxiliou a levantar e explicou como ajudá-lo a ocultar os corpos. Eric despregou parte do piso de madeira e cavou, com as mãos, um buraco onde os dois Kappas seriam enterrados. A minha parte, e a mais nojenta, era pegar as roupas dos caniçais e atear fogo.
Diferente dos Kappas, que levavam anos para entrar em decomposição e o sangue era translúcido, as crias deles, os ghouls, se decompunham com muita rapidez e o sangue era escuro e fétido. Conforme orientação dele, tirei um pouco de gasolina do tanque do furgão e cavei um buraco, usando a pá, numa parte sem vegetação e fofa atrás da cabana. Tudo feito no meu tempo e em silêncio, mas quando mexi nos corpos em estado de putrefação avançado, comecei a reclamar.
— Eu só não queria dormir com um vampiro e nem ajudar a desovar um corpo... só isso; olha para mim agora?! — Cheirei meu braço sujo com o que respingou quando puxei da meleca que a mulher tinha virado a blusa e a bermuda. — Esse cheiro nunca vai sair de mim...Uma vida tranquila, era tudo o que queria, mas tô aqui me traumatizando mais. Por que não posso ter um conto de fadas Disney ao invés dos contos de fadas originais? Por que não tem um príncipe encantado vindo no seu cavalo branco me salvar e acabar com essa merda de vida? Por quê? Por quê? Eu quero ser uma princesa intocada, num castelo, protegida! — Joguei com raiva as roupas no buraco.
— Nem você acredita nisso. — Eric me assustou ao parar do meu lado segurando sua bolsa de viagem. E sorriu daquele jeito dele, como se estivesse realmente se divertindo. — Isso estava no bolso do Lewis — Era um isqueiro. — Vou me livrar dos carros. Mantenha o fogo baixo para não chamar atenção.
— Vai chover logo.
— É uma coisa boa. O vento vai levar culpa pelo teto da cabana quebrado e a água vai apagar nossos rastros e os fluidos corporais que sobraram dos carniçais, mas vai dá tempo.
— Qual é dessa bolsa?
— Você não quer saber.
— Vai demorar?
— Já está com saudade? — Mostrei a língua para ele — Um pouco. Tome cuidado!
Não foi um processo rápido, se livrar dos dois automóveis; onde quer ele tenha ido, foi dirigindo e voltou a pé e sem a bolsa.
Quando, enfim, veio me buscar, eu já tinha transformado tudo em cinzas e enterrado, estava muito cansada; não; eu estava destruída: corpo todo doía pela queda e pela surra tomada, certeza que tinha vários roxos e arranhões, estava tremendo de fome e frio, encostada na roda do corvette sem força nenhuma para entrar e me proteger da chuva que começava a pegar corpo. Tinha gastado o último pingo de energia ao correr para fechar a capota do carro.
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