30-SOU BOM PARA VOCÊ?
Não consegui parar de pensar no porquê eu tinha beijado Eric. Até sonhei com a Acácia e o namorado, que nunca lembrava o rosto, misturando o que aconteceu comigo e com o Eric no sonho. E por mais que eu quisesse acreditar que o que me motivara tenha sido o nosso laço de sangue, eu sabia, em meus ossos, que tinha sido uma vontade genuína.
Tomei café da manhã do hotel, muito mais farto e diverso que minhas tigelas de sucrilhos, e fui até a recepção sondar se Eric deixou alguma orientação para mim. A recepcionista do dia, muito mais simpática que a loira da noite, entregou as chaves do carro do vampiro e um envelope. Dentro havia o cartão de crédito e um bilhete:
"Deixei meu blazer na lavanderia do hotel, pegue-o. Lave e reabasteça o carro. Não deu tempo de entregar o cartão ontem.
E."
Eric poderia ter me mandado uma mensagem com todas essas ordens, mas eu não iria julgar sua escolha por preferir o papel. A tecnologia também não era o meu forte e de todo modo teria que me entregar o cartão. No final, foi melhor assim. Avisei a recepcionista para deixar as roupas do quarto dele no meu e segui para o meu destino.
A agência diurna dos correios ficava a 4 minutos de distância, de carro, na Av Harvey Norte bem em frente ao Museu e Memorial Nacional de Oklahoma. O atendimento foi bem rápido, talvez por ser sábado, e com a procuração de Lorenza em mãos, consegui a caixa que era um pouco maior que um porta cds e consideravelmente leve. Mesmo sem nenhuma sinalização de conteúdo frágil a carreguei com o máximo cuidado até o carro. Depois de deixar o corvette brilhando e abastecido, voltei para o hotel. Ao todo, eu gastei apenas uma hora e meia da minha manhã.
Sentada na cama, analisei a caixa por todos os ângulos possíveis. O que será que tinha ali dentro de tão importante? Curiosa, a segurei tentando captar algum fragmento de energia humana que possa ter ficado. Com muito esforço consegui pegar uma fagulha e forcei sobre ela toda a minha habilidade. No final, tudo o que consegui foram sensações vagas, cansaço, irritação, tédio, talvez de todos os trabalhadores que tocaram nela, e uma pequena dor de cabeça.
Depois de tomar um analgésico acabei dormindo a tarde toda.
Acordei um pouco antes do anoitecer, peguei o celular procurando por mensagens de Taylor, esquecendo por um momento que tínhamos terminado. Chorei um pouco, o que era mil vezes melhor do que aquele bolo na garganta, e deixei a tristeza sair de mim em forma de canto até me aliviar, e fui tomar banho e desembaraçar os cabelos.
A vida não iria esperar eu melhorar para continuar.
Passava das 8h da noite quando decidi subir, com o blazer e a caixa, para o quarto de Eric, já que ele não aparecia. Bati na porta e após uns instantes ela se abriu, saindo de lá uma mulher de pernas longas, seios fartos, branca e loira. Ao passar por mim, com seu vestido super colado de lantejoula pretas, manga longa e costas nuas, notei duas marcas de mordidas recentes no pescoço. Nos comprimentamos com a cabeça e eu entrei. Dentro do cômodo, Eric estava só de jeans escuro e super corado.
— Oi! — disse disfarçando o riso de nervoso. Aquele vampiro era realmente um enorme pedaço de mau caminho. — Desculpa se atrapalhei algo... é que vc... é que eu ... não sabia... Aqui, a caixa e o blazer! O cartão também...
Ele colocou a camiseta preta enquanto caminhava na minha direção para pegar os objetos. Era o fim de uma excelente vista e a volta da minha capacidade de formular uma frase.
— Você ainda não está pronta?
Olhei para minha roupa, igual a que ele usava, sem entender.
— Pronta pra quê?
— Para sairmos.
— Você não disse nada.
— Eu avisei que poderíamos sair.
— Sim, de forma vaga. Se você tivesse deixado na mensagem, por exemplo, eu saberia. — Ele deu de ombro e colocou a caixa dentro do cofre. — Achei que com a caixa em mãos voltaríamos para Shreveport hoje.
— Nunca disse isso.
De fato, ele tinha dado uma outra estimativa da duração da viagem; o retorno para casa naquela noite concluí por minha conta. Eric colocou a usual jaqueta de couro e a bota, ainda não entendia porque minha roupa não era boa, mas saímos juntos em direção ao meu quarto.
No elevador, notei que o sol que eu havia desenhado na mão dele tinha sumido. E ele fazer tão pouco caso me deixou um pouquinho chateada, principalmente, por ter passado metade da noite anterior remoendo aquela cena. Talvez eu estivesse levando muito a sério um ato tão inocente quanto aquele beijo, mas por ser tão inocente e cheio de doçura que me assustava. Esses eram sentimentos não sadios de ser ter por alguém como Eric.
— Está tudo bem? — ele perguntou um pouco antes da porta abrir.
— Sim.
— Lara?!
— Eu to bem... Só queria que você tivesse me avisado direito sobre hoje! — Não era mentira, aquilo também me irritou. — Não gosto dessa sensação de ter tomado uma bronca sua. Por culpa sua. — Ele meneou a cabeça em afirmação. Entrei no quarto, e ele ficou na soleira. — Não vai querer entrar?
— Posso?
— Sim! Vampiros também precisam de convites para entrar em quartos de hotéis?
— Não. — Ele deu alguns passos dentro, olhando para o quarto. — É parecido com o meu, só menor. É confortável? — Assenti. — Na próxima, eu vou dar mais detalhes.
Sorri desarmada, ao menos ele reconheceu o erro. E para evitar mais estresse, abrir o cabideiro:
— Não faço a mínima de onde a gente vai. — Apontei para os vestidos pendurados. — Escolhe!
— Esses são os únicos vestidos que você tem? — Ele olhou, e pareceu bem crítico. Assenti e perguntei o porquê da dúvida; após um tempo ele pegou o vermelho. — São todos tão sóbrios. Mas eu gosto desse.
— Claro que gosta.
Peguei o vestido da sua mão, me troquei no banheiro e prendi os cabelos, tal como eu sabia que ele gostava. Não quis pensar muito sobre o porquê de querer agradá-lo, apenas aceitei que fazia por ser parte do trabalho de "assistente" dele na viagem.
— O que fez essa tarde? — ele me perguntou já no carro.
— Andei por aí gastando todo seu dinheiro. —Menti e ele me deu um olhar bastante incrédulo. — Não se preocupe, seu cartão tá seguro, não usei para nada além do que pediu.
— Poderia ter usado. Não acho que você seja capaz de me levar à falência e nem seria louca de tentar.
Eu tentei muito controlar, mas sorri muito feliz.
— Não quer saber como foi nos correios?
— Não. Se você está aqui é porque deu tudo certo. — Ele me olhou bem sério. — Eu sei que você é capaz de se virar sozinha muito bem.
— Você confia em mim?!
— Só quando posso.
E mais uma faceta do vampiro se revelava, me deixando surpresa. Ele olhou para mim, e por alguns instantes eu fiquei presa naquele olhar. Abalada, desviei o rosto e prestei atenção às fachadas das lojas.
— Quem era aquela moça? — Cansei de fingir para mim mesma que não estava interessada em saber.
— Ciúmes? — Eu ri, balançando a cabeça em negação. — Uma doadora cadastrada de sangue. — Era a forma legal de chamar as prostitutas especializadas em vampiros. — O hotel disponibiliza os serviços.
— Humm, bonita ela. E como é isso? Tem algum catálogo, você diz a preferência...
— Algo do tipo.
— Então, seu tipo é mesmo louras altas peitudas, hum?
— Não diria que é um tipo, pois não é uma exigência. Só acontece. — Dessa vez o olhar incrédulo era o meu. — Também gosto de peitudas baixinhas morenas .
— É caro? — Voltei para o assunto.
— A doadora de hoje me custou mil dólares... e o sangue delae nem era tão especial assim como me fizeram acreditar.
— Mil dólares?! — Nossa, eu definitivamente estava no emprego errado. — É sério? Onde me cadastro pra isso? — Eric me olhou com a sobrancelha erguida — Eu to brincando! — Na verdade, estava mesmo cogitando a possibilidade. — Mas vamos concordar, mil dólares por uma mordidinha não é tão ruim assim, é? A vampira na tv disse que a mordia dos vampiros não doem. Apesar que deve ser uma balela das grande.
— Não doi quando a gente não quer que doa. E posso te garantir, que é um inferno quando a gente quer. E nem sempre o serviço é só uma "mordidinha". Você deveria conversar com aquela sua amiga, ela era uma doadora de sangue antes de Devon tomá-la para si.
— Ela me contou. — Do jeito dela, mas contou. — Devon é bom para ela? Você sabe me dizer.
— Defina bom, Lara.
— Não a machuca, não deixa ela triste... não sei...
— Esses são os critérios para bom? — Balancei a cabeça para os lados, como se dissesse mais ou menos. — Você me acha bom para você?
— Mas não tô falando de você... não sei, Eric! Você é um mistério pra mim. Às vezes te acho um crápula, e é quase sempre, mas às vezes, bem raramente, você é ok. Mas me responde, ele é bom para ela?
— Ah, sim. Ele é bom para ela. Acho que gosta genuinamente da sua amiga. Devon é um vampiro peculiar. — Ele me olhou, com aquele brilho de quem tem uma fofoca e está louco pra soltar. — Ele nunca se mostrou muito interessado em humanos como outros vampiros, e assim como eu, ele não costuma compartilhar do próprio sangue. Na verdade, ele encara isso tudo como uma maldição. A religião dele diz que ele não tem alma. A porra de Louis. — Eric revirou os olhos ao compará-lo com um dos personagens da Anne Rice. — O que é frustrante para sua amiga. Ela quer ser uma de nós, sabia? — Não sabia. — Mas Devon nunca irá transformá-la. O que é uma pena, ela daria uma vampira formidável.
— Você já usou o serviço dela? — a pergunta surgiu de um ponto enciumado, só não sabia se era dela, dele ou de ambos.
— Está com ciúmes! — Neguei, ele riu — Não. E não é porque acho que ela daria uma ótima vampira que eu gostaria de ser seu criador. Já tenho crianças o suficiente, e Pam me dá muito orgulho.
— E dizem que os pais não têm filhos preferidos! — Digeri todas aquelas informações, passado um momento: — Quando me mordeu, doeu? — Aquilo tava martelando na minha mente. — Quer dizer, você quis que doesse?
— Eu estava preso, ferido, fraco. Você chegou no celeiro, me olhando, e do nada me soltou. A sede e raiva parecia uma coisa só.
— Você realmente não me forçou a te soltar?
— Eu tentei, mas não funcionou. Naquela época já não funcionava, a verdade é que só consegui apagar sua memória porque você estava muito fraca. E nem isso fiz direito... Alguns raros humanos são completamente imunes a nossa influência, mas eles não sabem, nem sentem. Mas você sim, não é? — assenti. — Não estou pedindo desculpas, pois fiz o que precisava para me proteger. Não me arrependo, e não fingirei o contrário só pra te agradar. Espero que entenda.
— Eu entendo.
Eu realmente entendia, só não gostava. Alguns minutos mais tarde, Eric estacionou em frente a uma loja de fachada simples. Ao entrarmos ele disse:
— Provavelmente amanhã sairemos de novo. Esteja pronta ao anoitecer.
Eric cumprimentou a dona da loja, uma vampira; sua atendente, uma humana, me guiou até o cabideiro cheio de vestidos. Após me perguntar sobre minhas medidas, que graça a Nancy, eu sabia exatamente, me mostrou a arara com modelos que cabiam em mim. Um vestido meio bege meio dourado que parecia uma camisola me chamou atenção. Além de ser muito decotado, tanto na frente quanto nas costas, e com uma fenda que começava na virilha, o preço era exorbitante. Larguei a peça como se minha mão pegasse fogo. Eric se aproximou nesse meio tempo e ficou observando. Mostrei a ele um vestido parecido com o que eu usava e ele torceu o nariz.
— Eu realmente não sei escolher, meus gostos são sóbrio demais para o seu.
— Só seja rápida.
A aposta mais rápida, e segura, era o vermelho que estava ali perto. O preço parecia aceitável e ele era até bonito no corpo. Como ele supostamente seria muito curto, numa pessoa de estatura mais privilegiada que a minha, ele ficou numa altura boa, um pouco acima do joelho e o decote da frente, apesar de bastante generoso, era confortável, A estrutura dele mais rígida parecia que não deixaria nada escapar. Eric pagou o vestido e os complementos e pediu para que eu continuasse o usando.
Seguimos para onde quer que ele estivesse me levando. Chegamos numa área mais rural, e paramos de frente a uma mansão de três andares, estilo Vitoriano. Do lado de fora, uma varanda com balanço de namoro. Era uma residência que nos seus dias de glória deveria ser incrível, mas parecia um pouco judiada pelo tempo. Eric bateu na porta e aguardamos sermos atendidos. Não demorou e uma vampira de pele marrom escura, bem mais escura que a minha, atendeu.
— Avise seu mestre que Leif Viklund, de Houston, veio vê-lo!
A jovem olhou para nós dois, depois mirou em algum ponto no horizonte e nos deu passagem. Alta, apesar de magra, curvilínea; a vampira caminhou na nossa frente com um vestido preto brilhoso tão fino, que eu consegui ver seus pêlos pubianos, e seus cabelos crespo em black power. Reparei que dentro a mansão estava em melhor aspecto que a fachada. O piso de madeira parecia encerrado recentemente, havia vasos de plantas espalhados pelo corredor e as paredes foram pintadas em tons terrosos fortes. Chegamos na sala, e a vampira se sentou no meio de duas mulheres humanas. Uma delas, a branca de cabelos escuros, aparentava um pouco mais de quarenta anos, cabelos presos em coque elaborado, usando calças social e apenas de bustiê preto, ofereceu o punho à vampira. Ao vê-la cravar os dentes, virei o rosto.
— Leifi Viklund! A que devo a honra da visita?
Um vampiro de altura mediana, sorriso largo, muito convidativo usando terno e gravata borboleta saiu por entres véus coloridos na parede.
— Suraj Pandit! Seria muito descortês de minha parte se não me apresentasse.
Ele nos apontou o sofá vazio, de frente ao que a vampira estava, e se sentou na poltrona do meio. Eu e Eric sentamos em seguida.
— Claro. E sua presença na cidade é...
— Apenas de passagem. Minhas felicitações ao noivado.
— Creio que também sejam palavras de sua rainha, digo, rei.
Eric apenas meneou a cabeça confirmando. Desde que entrei eu mal respirava por medo de ser desmascarada, mas aquele pedacinho do meu cérebro zunia em expectativa, quase feliz. Ainda assim, não deixei passar batido a fala daquele vampiro indiano. Não foi um erro, foi proposital. A vampira que se esbaldava entre os seios da humana, parou o que estava fazendo e nos encarou.
— Claro, mestre! — ela disse com uma voz grave olhando para Suraj e voltou os olhos para Eric. — Posso servi-lo, Leif? Prefere sangue fresco — Olhou para a humana que há pouco tinha mordido. — Ou ...
— Uma garrafa de True Blood O- , se tiver, será perfeito.
A outra humana, que até aquele momento estava como eu, silenciosa, se levantou. Um pouco mais alta, ela também era negra, mas sua pele tinha o mesmo tom que a minha. Reparei que a textura dos nossos cabelos também eram iguais. O rosto era mais quadrado e a testa um pouco maior. Os olhos eram cor de mel, bem mais claro que os meus. Mas no geral, nós duas passaríamos tranquilamente por irmãs.
— E você? — a humana perguntou para mim. — Aceita alguma coisa?
— Água, obrigada!
E ela partiu, passando pelos mesmos tecidos que Suraj Pandit entrou.
— Por que beber esse lixo quando você trouxe ela? — A vampira deixou claro que eu não passava de um lanche aos seus olhos, e logo olhou para Suraj voltando o olhar para Eric. — Desculpa! Não é educado falar assim da alimentação e companhia dos outros.
— Farah é minha criança mais nova, e grande parte da sua existência foi em ninho — Suraj falou. — Ela ainda não se acostumou com todas as normas após a grande revelação, não é, querida? E às vezes pode ser um pouco rude. Peço que releve.
Os dois se olharam de novo e ela meneou a cabeça. Podia ser coisa minha, mas aqueles dois estavam conversando pela mente. Seria isso possível? Eu e Sookie conversamos, mas éramos humanas especiais para não dizer estranhas. Mas vampiros poderiam fazer isso? Eu nunca tinha visto Eric e Pam conversando desse jeito.
A humana que parecia comigo voltou trazendo uma garrafa de sangue sintético e uma jarra de água. Satisfeito, Eric deu os dois gole costumeiro. Começava acreditar que nem ele gostava muito daquilo. E os dois vampiros passaram a conversar sobre coisas que eu não entendia, por mais que me esforçasse. Com a boca seca, bebi meu segundo copo quando aquela coisa no pescoço me avisou que mais um vampiro entrou no lugar. Ele saiu das sombras e meu coração disparou. Pele branca pálida, cabelos cacheados ruivos e aqueles malditos olhos escuros cheios de maldade.
— Venha, querido, venha conhecer nossos visitantes — Suraj disse sorrindo para o vampiro mal saído da adolescência — Leifi Viklund, esse é meu primeiro tenente: Frederick.
Engasguei com água, Eric me deu um breve olhar atravessado.
— É um prazer conhecê-lo, Leif. Espero que esteja gostando da visita. Diga-nos se tiver algo em que possamos ajudar. — George que na verdade era Frederick disse. Ele olhou para mim, e um arrepio me atravessou. — Está tudo bem?
Meneei a cabeça confirmando.
— O prazer é todo meu! — Eric disse. E nenhum dos dois estenderam as mãos.
— E como se chama, humana?
Pensei que Eric iria falar por mim, até preferia já que ainda estava tossindo, mas todos da sala ficaram me encarando. Aliás, era a primeira vez que Suraj olhava para mim. Reuni forças e soltei:
— Nara!
Eric me olhou torto de novo; mas cara, ninguém tinha me preparado para aquilo, fiz o meu melhor. Sem tirar os olhos de mim, Frederick sentou-se no mesmo sofá que Farah, ao lado da humana que parecia comigo. Com um sorriso imenso ela ofereceu o pescoço para ele.
— Amanhã, teremos uma apresentação extraordinária no Fosso. A melhor dos últimos tempos. Caso ainda esteja na cidade, espero sua presença, Leif de Houston.
Ouvi Suraj falar com Eric, mas não prestei atenção na resposta já que o recém chegado não parava de me encarar.
— Ela tem um belo nome, não acha, Claire? Rima com Lara...— Frederick falou, tirando a boca suja de sangue do pescoço da humana.
— Sim, Mestre!
—Vocês são parecidas... será que são parentes? — E ele continuou com aquele olhar perverso em mim — Será que não são irmãs, Nara?
— Sou filha única — disse.
Eu não tinha muito certeza disso, mas esperava que sim. Encontrar uma irmã perdida nessa situação e com tão péssima companhia seria muito desagradavel.
— Primas, talvez? — Claire perguntou e ela parecia tão curiosa como eu. — Minha família é daqui de Oklahoma. E a sua?
— Ah... eles não são daqui.
— Seria interessante, não seria, se você quisesse se juntar a nós?
— Não! — respondi de imediato, ele sorriu. — Muito obrigada!
— Claro, isso foi rude da minha parte — ele disse olhando para Suraj e depois para o Eric— Acredito que ela ainda te pertença, Leif.
Eric apenas balançou a cabeça e voltou atenção para o norte daquele lugar.
— Muito obrigado, pela recepção. Direi a Sua majestade o quão receptivo Oklahoma tem mostrado. Até amanhã.
Assim que ele se levantou, imitei seu gesto e o segui até a porta. Não ficamos mais que 30 minutos naquele lugar e já tinha o escolhido como um dos piores do mundo, só perdendo para o cativeiro que estive com Taylor e o beco que apanhei dos gêmeos. Do banco do carona, já um pouco longe da propriedade falei:
— Por que me trouxe? Não acho que precisava estar aqui.
— Mostrar que você está sob a minha proteção direta a Suraj fazendo ele manter aquela serpentizinha sob controle, de quebra exibi você para Frederick. Três coelhos, numa abocanhada só.
Soltei um risinho abafado. A roupa começou a fazer sentido, eu não era nada mais que um brinquedo que dois garotos mimados disputavam. Não iria nem comentar sobre o quão errada essa visão sobre mim era. Era uma luta perdida.
— Você sabia que George não era o nome dele? — ele assentiu — Desde quando?
— Sempre soube. Se ele queria se apresentar a mim por George ou qualquer que fosse o nome não seria eu quem impediria. Se ele fazia isso, é porque tinha um motivo.
— Assim como você está fazendo? Por que, você sabe, eles sabem que você não é Leif coisa nenhuma...
Ele deu de ombros.
— Vampiros espionam uns aos outros o tempo todo.
Não iria fazer disso uma questão de todo modo. Se eu vivesse tanto quanto os vampiros também ficaria entendia para fazer esses tipos de joguinhos estúpidos.
— Nara?! Nara?! — ele riu — Olha, você nem se esforçou para pensar em um nome. Karen era muito melhor, tinha personalidade, história... não pode mais reclamar..
— Que bom que foi engraçado pra você! — devolvi ríspida. —Suraj é um sherife igual a você?
— Sim. E toda parte Leste e parte da central, onde estamos hospedados, faz parte do seu território. E provavelmente será rei caso todas as negociações com Oklahoma sejam resolvidas.
— Teria sido legal se você tivesse me contado tudo isso antes...
— Teria? — Parecia uma pergunta genuína.
— Sim, Eric! Se você me leva para lugares com pessoas, seres tão poderosos e está esperando de mim algo, eu saber o que tá acontecendo é de muita ajuda. Coisas como "Nara" não aconteceriam...
Ele olhou para mim, como se ponderasse. E depois de alguns instantes meu deu o primeiro curso de imersão aos costumes Vampíricos. E eu tive que pedir para ele parar algumas vezes só pra eu ter certeza que não tinha perdido nada. Porque os vampiros eram muito confusos.
— Então, Suraj e Oklahoma estão há 4 anos discutindo um possível acordo de casamento?! — Eric não chamava nem a própria rainha pelo nome, sempre pela cidade que governava. — E Louisiana, sua rainha, agora é a favor dessa união pois beneficiária ela no próprio contrato de casamento com Arkansas. Mas você não disse que Arkansas era um inimigo não declarado da sua rainha? Por que ela vai casar com ele?
— Poder! Louisiana, o estado, é fraco economicamente em comparação a Arkansas. Porém temos muita relevância cultural e social tanto com humanos quanto com outros seres sobrenaturais. É uma união bastante vantajosa para ambos os lados.
— Mas eles se odeiam...
— Por isso os contratos de casamento demoram tanto para serem assinados. Há sempre uma parte tentando passar a perna na outra..
Miguel estava certo quando disse que os vampiros não se davam bem nem com eles mesmo.
Por muito tempo, Eric me explicou, que eles viveram em ninho, uma forma de comunidade de três ou mais vampiros que vivem anos, décadas, juntos, criando uma noção de cumplicidade e pertencimento mais fortes que os vampiros solitários poderiam chegar a sentir, e um olhar para os humanos bastante violento, depravado e sem nenhum pingo de respeito por outras vidas que não a dos vampiros.
Aconteceu que no momento da grande revelação, Suraj optou por se inserir na sociedade humana e muitos dos seus companheiros o deixaram por achar ultrajante respeitar os humanos. Farrah e Frederick só ficaram porque ele exerceu seu poder de criador sobre os dois. Eric me explicou também que o poder do criador era impossível de resistir, aliás nem havia resistência, os vampiros simplesmente faziam. Mas nenhum dos dois gostavam daquela filosofia de vida, ou de morte, gostavam da liberdade cruel que experimentaram nos anos de ninho.
E como se isso já não fosse ruim, Suraj era um vampiro muito ciumento e possessivo, não aceitando não ser a única obsessão de Fredrick; e Fredrick, por sua vez, era um vampiro com uma natureza obsessiva e implacável quanto a saciar seus desejos. Logo nos primeiros anos de transformação dele, Suraj matou uma jovem por quem o seu adorado havia se afeiçoando, Frederick com raiva matou a vila inteira, obrigando-os a se mudar às pressas por chamarem atenção. Farrah foi alvo de uma dessas obsessões do vampiro ruivo e o desejo dele era transformá-la em sua criança, mas Suraj não permitiu, como nunca permitiria, e para puni-lo ele mesmo a transformou.
E agora, pelo visto, Fredrik encontrou uma nova obsessão. E eu estava preocupada se eu era o objeto principal da obsessão dele ou se era Claire. E estava envergonhada de comentar sobre isso e Eric, com aquele jeitinho dele, dizer para baixar a bola.
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