06

Karina's pov:

Eu sinto alguma coisa me puxando para ela sempre que estamos juntas. Sinto uma atração ainda maior quando encaro aqueles olhos castanhos cheios de curiosidade. Porém, nada parece mais certo do que quando ela cai nas minhas provocações. O que eu sei que é errado. Tudo isso é errado.

Não há dúvida; eu não posso cometer o mesmo erro uma segunda vez. As consequências por trás disso são fortes, algo que eu já tive o prazer de testemunhar. Nunca na minha existência eu teria considerado fazer isso.

Pelo menos não antes de entrar na vida de Kim Minjeong.

Agora minha mente está considerando coisas loucas. Minjeong me faz pensar em desobedecer às regras, em encontrar brechas, em provocá-la até que ceda, e em seguir por um caminho completamente arriscado.

Passei mais de uma hora depois da aula analisando o motivo real de ter me aproximado dela, procurando todas as alternativas para a situação na qual estamos, lutando contra o desejo de colocar tudo a perder. Isso é loucura, né? Eu estou louca. Mas refleti sobre isso, e fiquei extremamente decepcionada comigo mesma depois que a hora passou.

Quando chego em casa, Giselle está sentada no sofá, conversando com alguém pelo celular. Aceno para ela enquanto vou até a cozinha. Pego uma garrafa de água na geladeira e me sento à mesa, olhando pela janela acima da bancada da pia. O céu está escurecendo com a aproximação das nuvens. O cheiro do ar anuncia que em breve virá uma tempestade.

Fico sentada ali por um bom tempo, o suficiente para me perder outra vez em questionamentos.

Preciso colocar um ponto final em tudo o mais breve possível. Embora não exista nenhuma parte de mim que deseja fazer isso.

— As coisas na faculdade devem ter sido péssimas pra você estar aí sozinha — brinca Giselle, caminhando até a geladeira para pegar uma bebida.

— Talvez você não esteja tão errada — murmuro, ainda olhando pela janela.

— Você precisa se divertir.

Olho para Aeri, arqueando uma sobrancelha.

— Estou bem.

— Não. — Ela balança a cabeça de um lado para o outro. Puxando uma cadeira, ela vira e se senta. — Você parece mais fechada do que o habitual. O que está acontecendo?

Dou de ombros.

— Nada com o que precise se preocupar.

— De verdade. Sua aura está muito estranha. — Ela insiste, cruzando os braços. — Chega a ser deprimente para alguém como você.

Tomo um gole da minha água e coloco-a de volta na mesa.

— Temos problemas maiores com os quais nos preocupar.

Respiro fundo e torno a olhar pela janela, observando o mundo lá fora, sua magnitude, mas também sua maldição.

Com a morte de Félix, recordei que, embora a extensão dos nossos poderes, há muito poucos dos meus em conflito contra uma inesgotável e autoregeneradora reserva de Sefarins.

A balança simplesmente não se inclina ao nosso favor. Não posso evitar o fato de que não vivemos eternamente, que podemos ser assassinados e que o equilíbrio pode quebrar-se em um instante a favor da Ordem Divina.

Desde que os céus enviaram os seus Arcanjos a terra há uma eternidade, o número de caídos tem diminuído de tal maneira que só restam uns quantos enclaves de população. Estamos a beira da extinção. Embora sejamos mortalmente bons no que fazemos.

Se eu fosse como os meus semelhantes, que desejam ser adorados e reverenciados por conta de seus poderes e influências, talvez o futuro tivesse sido mais prometedor. Mas eu não sou como os demais. Sou indiferente, não uma líder, me desenvolvo melhor cuidando dos meus ideias que influenciando, sendo causa da ruína desse mundo e daqueles que nele habitam.

Concentro-me de novo em Aeri. Quando seus olhos encontram os meus, percebo uma certa preocupação. E essa consideração sempre me deixa inquieta.

— Como foram as coisas na faculdade? — Pergunto, mudando de assunto. — Não tive tempo de te encontrar pelo campus.

— Bem tranquilas. — Ela diz isso com tanta naturalidade que tenho que rir. — Sério Karina. Por que não me disse que ela tinha uma amiga tão gata? Nem tenho certeza se você ainda tem visão. Estou dizendo, tem alguma coisa acontecendo.

— Minhas prioridades são diferentes, Giselle — retruco. — Você sabe porque pedi para que entrasse na Yonsei, então não comece.

Ela bate palmas uma vez e se endireita na cadeira.

— Eu não esqueci do meu objetivo, mas isso não me impede de aproveitar a estadia no mundo universitário. E você deveria fazer o mesmo.

— Não — recuso.

— E se formos a uma festa! Não fazemos isso há anos!

— Podemos ir para o Moonlight Seul. Você se diverte enquanto eu trabalho.

Ela ri.

— Tá bom, eu já entendi. Bem, quanto ao meu serviço... — Sua expressão assume um tom mais sério. — Como você sabe não é a primeira vez que frequento uma universidade, então vai ser fácil me misturar com os demais.

Assinto com a cabeça antes de me levantar.

— Aonde você vai, Karina? — Pergunta Giselle suavemente.

— Estou indo dar uma corrida.

— Está caindo o maior temporal lá fora — ela argumenta.

— As melhores corridas são na chuva — comento enquanto caminho para meu quarto para pegar minhas roupas e meus tênis de corrida.

— Ah, tá. Claro. Bem, se acontecer qualquer coisa você sabe como me encontrar!

\[...]

Uma hora depois, sento-me a uma mesa em uma das melhores áreas do Moonlight Seul. Um número razoável de pessoas circula pelo lugar. O ruído das conversas, misturado com a batida da música eletrônica comandada pelo DJ. Me recosto no sofá enquanto observo o ambiente.

Fico tão imersa nisso que só noto a presença de Woojin quando este desmorona no assento à minha frente. O garçom o segue.

— O melhor Whisky da casa com gelo — diz com um ar presunçoso.

— Deseja alguma coisa? — O garçom me pergunta.

— Não, estou bem — respondo.

Quando ele parte, eu digo:

— Faz um bom tempo que não te vejo. Estou louca para saber qual é a grande razão da sua presença.

— Nem começa. Estou precisando aliviar o estresse. Não bebi nada descente desde que cheguei a Seul. — E completa após uma pausa: — Isso sem contar os drinks em uma reunião de trabalho, e eu não conto.

Kim Woojin é alto, poderoso, mais forte que muitos que já conheci. Também é uma lenda sexual no nosso mundo, bonito como um idol e com um ar misterioso. Os humanos, tanto homens como mulheres, não resistem em cair nos seus encantos. Pelo menos até que vislumbrem seu lado sombrio. Perto de Woojin, a única característica que temos em comum é a nossa origem. E talvez o efeito sobre os humanos. Mas definitivamente os ideais nem se comparam.

— É melhor que ele traga minha bebida logo — diz Woojin. — Vou começar a reclamar se não consumir alguma coisa decente nos próximos 45 segundos. E você sabe muito bem que eu só preciso relaxar depois de um dia estressante convivendo com a humanidade.

— Tem o seu Whisky preferido no catálogo de bebidas — comento, indiferente. — Os garçons já sabem o que te servir quando vem aqui.

O rosto dele se ilumina.

— É por isso que você tem todo o meu respeito Karina.

Suspiro enquanto passo a mãos nos cabelos.

— Você sabe que isso não funciona comigo.

Ele sorri.

— Já volto — diz se levantando. — Vou cumprimentar alguns conhecidos. Depois te atualizo sobre o que me trouxe a Seul.

Enquanto o espero, começo a prestar atenção ao fluxo crescente de pessoas no ambiente. Então um rosto familiar chama minha atenção. Não, dois rostos familiares.

Ning Yzhuo e Kim Minjeong.

Não posso acreditar. Tenho vontade de dar uma risada diante de um fato tão inusitado como esse.

Observo brevemente Minjeong que nem nota minha presença. Não a vejo desde a aula na faculdade, quando me dei conta de que ela realmente está focada em me afastar. Como se sentisse que a estou observando, seus olhos castanhos percorrem o bar lotado até me encontrar.

Uma garota comum se surpreenderia e arregalaria os olhos, talvez desse um sorrisinho de reconhecimento, mas não Minjeong. Ela diz alguma coisa por cima do ombro para a amiga e depois simplesmente volta a focar na conversa.

Bom, pelo menos uma coisa eu sei: Kim Minjeong não sabe do sou capaz, porque não estou nem perto de deixar uma oportunidade como essa passar.

Permaneço no meu lugar até Yzhuo se levantar e seguir até o bar. Então me aproximo, adorando seu constrangimento enquanto ela olha para todos os lados, à procura de um jeito de escapar, e descobre que não há saída além de se abaixar ali na mesa.

— Muito bem — digo, sorrindo. — Você não se contenta em ficar comigo cinco dias por semana? Também precisa me ver à noite?

— Peço desculpas pela infeliz coincidência, mas Ningning e alguns amigos não paravam de falar nesse lugar.

Me acomodo no assento de Yzhuo. Quando descanso os braços, noto que Minjeong parece perdida em pensamentos. Pego seu copo e fico girando-o nas mãos.

— Todos os assentos estão ocupados — ela diz. Como não respondo, ela pega o copo de volta e dá um gole. — Você não deveria estar trabalhando em vez de confraternizar com os clientes?

Sorrio. Meio que não consigo acreditar que estou dizendo isso, mas ver Minjeong assim toda irritadinha — de verdade — é surpreendentemente interessante. Ela não faz ideia do quanto facilita para que eu continue com as provocações.

— O que você vai fazer no próximo fim de semana? — Pergunto.

Minjeong fica em silêncio, encarando-me com um misto de confusão e incredulidade.

— Está me convidando para sair?

— Você está ficando atrevida. Gosto disso, Anjo.

— Não ligo para o que você gosta. Não vou sair com você. Não para ter um encontro. Sozinha. — Ela cora e desvia o olhar. Não preciso ler sua mente para saber que está imaginando como pode ser uma noite sozinha comigo. — Calma aí. Você acabou de me chamar de Anjo? — pergunta.

— E se chamei? — Provoco.

— Não gosto.

Sorrio.

— Continua sendo Anjo.

Curvo-me sobre a mesa, levanto a mão até seu rosto e passo o polegar no canto da sua boca. Ela afasta-se tarde demais.

— Você ficaria melhor sem isso. — Digo, esfregando o gloss entre o polegar e o indicador.

Minjeong me fuzila com o olhar.

— Com esses olhos castanhos e atitude atrevida, aposto que basta uma piscadela para que as garotas caiam na sua cama — ela murmura. E embora a música esteja alta, eu consigo escutar perfeitamente.

Meu sorriso se alarga.

— Quer descobrir?

Por um segundo, vejo confusão em seu olhar.

— Descobrir o quê? — Ela pergunta.

— Se uma piscadela minha faz com que garotas caiam na minha cama.

Ela me encara com um olhar impassível, tentando parecer inabalável diante do meu comentário. Joga o cabelo para trás do ombro e retoma a conversa anterior.

— De qualquer maneira, não posso sair na véspera de dias de aula.

— Que pena. Tem uma festival acontecendo no Rio Han. Achei que poderíamos ir. — Digo, sendo sincera.

Minjeong torna a ficar em silêncio e bebe outro gole da sua bebida. Então morde o lábio inferior por meio segundo e, cara, isso é bem atraente.

Se você gosta desse tipo de coisa, é claro.

Ficar sozinha com Minjeong seria fascinante e perigoso. Não sei exatamente por quê, mas estou certa da minha intuição. Sim, é uma loucura eu estar pensando assim. Mas agora que minha mente está considerando coisas loucas, talvez eu me permita desobedecer um poucos as regras.

— Bem, como disse, no dia seguinte tem aula. — Ela diz, trazendo-me de volta a realidade. Então acrescenta: — Se você se interessa pelo tal festival, tenho quase certeza de que eu não me interessaria.

Me recosto no assento e quando penso que Minjeong não vai dizer mais nada, ela pergunta:

— Por que está me convidando?

Até então, venho dizendo a mim mesma que não me importo com o que Minjeong pensa sobre mim. Mas, nesse momento, eu sei que isso é uma mentira. Embora provavelmente vá me arrepender depois, estou tão curiosa a respeito dessa garota que vou com ela a praticamente qualquer lugar.

— Quero ficar sozinha com você — respondo.

No mesmo momento, vejo suas defesas se reconstituírem.

— Olhe só, Jimin, não quero ser grosseira, mas...

— É claro que você quer ser.

— Bem, você começou! — Ela respira fundo e passa a mão nos cabelos. — Não posso ir ao tal festival. Final da história.

— Porque você não pode sair na véspera de um dia de aula ou porque tem medo de ficar sozinha comigo?

— Pelas duas razões. — A confissão parece escapar da sua boca.

— Você tem medo de todas as garotas... ou só de mim?

Ela revira os olhos como se quisesse dizer que não vai responder uma pergunta idiota.

— Você não fica à vontade comigo? — Pergunto com firmeza, ainda que um sorriso curioso brinque em meus lábios.

Minjeong não me responde de imediato, acho que tentando decidir se é sincera ou não. Ou quão sincera é capaz de ser.

— Sinto muito — ela diz por fim — Do que estávamos falando?

— De você.

— De mim?

— Da sua vida pessoal.

Ela ri, insegura do que deve responder.

— Se você vai falar de mim... Dos meus relacionamentos... Descanse, porque a Ningning já me fez esse discurso. Não preciso ouvi-lo duas vezes.

— E o que a sábia Ningning disse?

Percebo que suas mãos estão agitadas e ela as tira de vista.

— Não consigo entender por que está tão interessada.

Balanço a cabeça suavemente.

— Interessada? Estamos falando sobre você. Estou fascinada.

Um sorriso involuntário surge em seus lábios, e é um sorriso fantástico. Quando percebe o que está fazendo, sua expressão torna-se séria.

— Acho que você deveria voltar ao trabalho — ela diz, soando indiferente.

— Se quer minha opinião, gosto da ideia de que não haja na faculdade uma garota que atenda suas expectativas.

— Esqueci que você é uma autoridade sobre as minhas pretensas expectativas — ela desdenha.

Encaro-a fixamente, absorvendo cada detalhe do seu rosto impecável. Sua pele lisa, os olhos castanhos levemente escuros, a boca perfeita na qual tenho me pegado pensando mais do que deveria. Ela é tão linda, e por um minuto eu me sinto privilegiada por poder observar isso.

— Você não é tão fechada, Minjeong. Nem tímida. Só precisa de uma boa razão para se dar o trabalho de conhecer alguém.

— Não quero mais falar sobre mim.

— Você acha que sabe tudo sobre todo mundo.

— Não é verdade — ela diz. — Por exemplo, bem, não sei muito sobre... você.

— Não está pronta para saber. — Não demonstro nenhuma expressão quando digo isso.

— Bom, de uma coisa eu sei... Tem algo de errado com você. Você não enganou todo mundo. Vou descobrir o que quer. Vou fazer você mostrar tudo.

— Estou ansiosa por isso.

Ela cora, percebendo tarde demais o duplo sentido. Por cima da sua cabeça posso ver Yzhuo abrindo caminho entre as mesas.

— Sua amiga está chegando — digo, me levantando. — Acho que essa é minha hora de sair.

Minjeong fica em silêncio, olhando para mim com atenção, pensativa.

— Por que você está me olhando desse jeito? — Provoco-a.

Ela respira fundo, cruzando os braços.

— Porque você é cem por cento diferente do que eu esperava.

— Você também — retruco. — É muito melhor.

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