01
Coréia do Sul, Seul — Dias atuais
Winter's pov:
O professor começa a fazer a chamada. Respondo a Ningning rapidamente, “Te encontro na próxima aula”, e guardo o celular na mochila.
— Kim Minjeong? — Diz o professor. Levanto a mão. Ele olha para mim, assente com a cabeça e marca no papel. Dou uma olhada ao redor para ver se reconheço alguém. Na minha optativa do semestre passado havia umas duas pessoas do meu curso, mas não costumo ver muitos rostos familiares.
Percebo que um garoto moreno na primeira fileira virou-se completamente. Quando meu olhar encontra o dele, sinto um aperto no coração. Ele sorri e acena ao ver que o reconheci. Então pega suas coisas, se levanta e sobe a escada.
Não. Ele está vindo em minha direção. E prestes a se sentar ao meu lado.
— Minjeong! Caramba, que coincidência! Quanto tempo — ele diz.
Eu me esforço ao máximo para sorrir, tentando descobrir se o que estou sentindo é raiva ou tédio.
— Oi, Jong Seong. — Tento passar a impressão de que estou contente em vê-lo. Ele senta ao meu lado, se inclina e me abraça.
— Como você está? — ele sussurra. — Como está Ningning?
— Ela está bem — respondo. — Devo me encontrar com ela na próxima aula.
— Sério? Então ela também resolveu cursar jornalismo — ele diz, balançando a cabeça, sem acreditar.
Park Jong Seong e eu nos conhecemos desde a adolescência. Estudamos juntos no ensino médio, mas não nos vemos há quase dois anos. Cortamos laços de maneira não muito amigável, para dizer o mínimo, mas ele parece genuinamente animado por ter me encontrado. Pena que não posso dizer o mesmo.
— Como estão seus pais? — Pergunto. Nós éramos bem próximos na época em que eu era amiga de Jong Seong, mas não nos falamos desde que ele começou a insistir na ideia de que devíamos namorar.
Isso não vai acontecer.
— Eles estão bem. Muito bem. O escritório de advocacia da família finalmente está se expandindo e ganhando reconhecimento.
— Fico feliz por eles.
— Park Jong Seong? — Chama o professor.
Ele ergue a mão.
— Aqui em cima. — Então volta a atenção para mim. — E você? Namorando?
Balanço a cabeça.
— Eu também não. — Ele sorri.
Reviro os olhos mentalmente. Fomos amigos durante um bom tempo, então eu o conheço muito bem. Estou vendo que suas intenções não são boas.
— Não estou namorando, mas estou conhecendo alguém — minto. Noto uma mudança sutil na expressão em seu rosto, mas ele tenta disfarçar com um sorriso.
— Que bom — ele diz. — Tem alguma chance de virar algo sério? — Ele está querendo investigar meu namoro falso, então corto o assunto logo de uma vez.
— Todas.
Quando o professor começa a explicar o trabalho de finalização de semestre e o programa de estudos para o próximo ano, nós dois viramos para a frente e não dizemos muita coisa mais, fora um ou outro comentário dele sobre a matéria. Quando o professor nos dispensa, eu me levanto rapidamente.
— Que ótimo vê-la, Minjeong — ele diz. — Agora estou mais animado com essa matéria. Temos muitas novidades para colocar em dia.
Sorrio para ele, sem concordar. Pego minhas coisas e vou para o local da segunda aula enquanto penso num jeito de contar essa novidade para Ningning.
[…]
— É por essas e outras que eu fico feliz em não encontrar ninguém da minha época do colégio na faculdade — diz Ningning ao meu lado na nossa sala. — Bastariam alguns dias de convívio para minha vida acadêmica perder a graça.
— Como assim, Ningning? — falo contendo um sorriso — Podia jurar que você tinha passado o semestre inteiro doida para encontrar uma certa pessoa pelo campus.
Ela passa as mãos nos cabelos loiros e abre um sorriso travesso.
— Eu não sou Museu para ficar revivendo o passado.
— Eu nem te reconheço mais, Ning Yizhuo.
— Só estou dizendo. Ultimamente ando bem mais interessada em pegar umas aulas extras com as garotas do último ano.
Ela dá uma piscadela bem na hora em que o professor entra, obrigando-nos a ir para nossos lugares, que ficam lado a lado.
O professor Park é um jornalista conceituado, ensinar gêneros jornalísticos e técnicas de entrevista às turmas da Yonsei University é mais um comprometimento pessoal do que uma forma de ganhar uma renda extra. Todo mundo sabe disso.
— Talvez não tenha passado pela cabeça de vocês que ser jornalista é mais que apenas jogar redigir uma matéria. Mesmo o trabalho mais simples necessita de uma certa ciência. E o que é ciência?
— É o conhecimento adquirido pela experimentação e observação! — Exclama um garoto no fundo da sala.
— Muito bom — diz o professor, esfregando as mãos. — É necessária muita prática para se realizar um bom trabalho como jornalista. — Ele volta-se para mim. — Minjeong, você se senta ao lado de Yizhuo desde o início do ano.
Assinto com a cabeça, mas tenho um pressentimento ruim sobre o rumo que o assunto vai tomar.
— Imagino que vocês duas se conhecem há bem mais tempo que isso. — De novo assinto com a cabeça. — Aposto que sabem muito uma sobre a outra.
Ningning chuta-me embaixo da mesa. Sei o que ela está pensando: que ele não faz ideia de quanto nos conhecemos. E não estou falando apenas de segredos que compartilhamos. Ningning é minha gêmea ao avesso.
O professor contempla a turma.
— Na verdade, aposto que cada um de vocês conhece bem demais a pessoa sentada ao lado. Vocês escolheram esses lugares por alguma razão, certo? Foi pela familiaridade. Que pena, pois os melhores jornalistas evitam a familiaridade. Eles estão constantemente se desafiando e se reinventando dentro das técnicas que dominam. E é por esse motivo que hoje vamos reorganizar seus lugares.
Abro a boca para protestar, mas Ningning é mais rápida.
— Como assim? Já estamos quase no fim do semestre. Não vejo necessidade para esse tipo de mudança agora.
O professor esboça um sorriso.
— Mas é exatamente esse o motivo da mudança. O projeto de conclusão de semestre de vocês vai consistir em trabalhar com um parceiro completamente novo. E, se você for reprovada na matéria, vai voltar para esse mesmo lugar e aguentar todas as minhas mudanças mais uma vez.
Ningning cruza os braços na frente do corpo olha feio para ele. Sem parecer se importar com sua reação, o professor Park vira de costas — e nós entendemos a mensagem.
— O nome de vocês foi selecionado por base de sorteio, então não poderia ser mais aleatório — ele diz, pegando uma caderneta da mochila. — Ning Yzhuo e Kim Chaewon. Jeong Yoonoh e Lee…
A lista continua. Ningning olha para mim e dá um suspiro pesaroso. Então pega sua mochila e levanta. Mordo o lábio inferior e dou um tchauzinho. Viro-me discretamente, olhando para o professor.
— Kim Minjeong… e Yoo Jimin.
Fecho os olhos. Isso não pode estar acontecendo.
Sei a quem ele se refere apenas por conta da chamada, porque nunca vi essa garota conversando com ninguém da turma. Ela está sentada no fundo da sala, os olhos castanhos e frios fixados em mim. Deve ter entendido a situação também, porque se levanta e desliza para a antiga cadeira de Ningning.
Sorrio.
— Oi.
Seus olhos castanhos me atravessam e ela abre um sorrisinho. Meu coração para por um segundo e, nessa pausa, um sentimento sinistro e desesperador parece me envolver como uma sombra. Passa depois de um segundo, mas eu continuo a encará-la. O sorriso dela não é amistoso. É um sorriso que quer dizer confusão.
Volto minha atenção para a frente da sala, onde o professor Park finaliza sua lista.
— Certo turma. — Ele diz. — Usem o resto da aula para aplicar as técnicas de entrevista e conseguir o maior número de informações sobre o seu novo parceiro. Amanhã, tragam um artigo sobre o tema e podem acreditar: vou checar a autenticidade das informações. Quero ver interação e trabalho de equipe de verdade.
Fico sentada, completamente imóvel. O passo seguinte deveria ser da minha parceira de trabalho — eu já sorri e de nada adiantou. Assim próximas consigo sentir o cheiro dela. Não é nada forte ou intenso. É algo mais suave e agradável, como uma floresta.
Meus olhos estão fixos à frente, mas escuto o suave deslizar da caneta dela. Ela está escrevendo, e eu me pego bem interessada em saber o quê. Nós deveríamos estar usando esse tempo para se conhecer, mas ela parece bem indiferente quanto a isso. Dou uma olhada à esquerda e vejo que o texto já contem diversas linhas, e continua a crescer.
— O que está escrevendo? — Pergunto.
— E ela fala — ela diz enquanto continua a escrever, em um movimento suave e descuidado.
Curvo-me, aproximando-me dela o máximo que minha ousadia permite, tentando ler o que mais escreveu, mas ela fecha o caderno e esconde o conteúdo.
Levanto o olhar a tempo de ver outro sorriso travesso. Este parece me desafiar a conseguir qualquer informação sobre ela.
— Então… Jimin, né? — Digo, torcendo para que a vacilação em minha voz não passe de fruto da minha imaginação. — O que faz em seu tempo livre?
Jimin recosta-se na cadeira, cruzando os braços na frente do corpo.
— Tempo livre… — ela repete, pensativa. — Tiro fotos. Tenho uma bela coleção de uma garota que estuda jornalismo, que escreve poesia nas horas vagas e que esta indecisa sobre em qual área atuar quando se formar daqui a dois anos.
Encaro-a por um momento, surpresa — ela acertou todas as informações. Isso não parece ter sido um chute. Ela sabe. E eu quero saber como isso é possível se nunca tínhamos trocado uma palavra sequer até hoje.
— Mas, no fim das contas, você só vai conseguir se decidir no último minuto.
— Como é? — Assim que as palavras saem da minha boca, eu me arrependo.
Jimin posiciona o cotovelo na mesa e apoia o rosto no punho, olhando para mim. Sem saber bem se devo me afastar e demonstrar medo ou não reagir e fingir tédio, prefiro a segunda opção.
— Apesar de ser qualificada para atuar em qualquer área que escolher quando se formar, você vai demorar até se identificar com uma em específico — ela diz. — Indecisão é uma das suas fraquezas.
— Do que é que você está falando? — Digo, contendo a raiva.
Quem é essa garota? Que tipo de piada sem graça ela pensa que está fazendo?
— Que você tem medo daquilo que não consegue prever ou controlar. — Ela responde ainda olhando para mim com esses intensos olhos castanhos.
Sinto um arrepio na nuca e a temperatura da sala parece cair. Em uma situação comum, eu teria ido direto à mesa do professor e pedido para mudar de lugar. Mas me recuso a deixar que Jimin pense que pode me intimidar ou me assustar.
— Já fez alguma coisa ilegal? — Ela pergunta, me pegando de surpresa.
— Não. — Respondo passando as mãos nos cabelos. — Por que você não me faz uma pergunta normal? Por exemplo… De que tipo de música eu gosto?
— Não vou fazer uma pergunta para a qual eu já sei a reposta.
— E por acaso você sabe o tipo de música que eu escuto?
— Clássica. Com você, tudo tem a ver com ordem, controle. — Ela fala como se tivesse discutindo o clima.
— Errado. — Outra mentira, mas essa faz com que um calafrio percorra toda a minha pele. Quem essa garota é de verdade? Se sabe que todas essas informações, o que mais pode saber?
— Pais casados ou divorciados? — Jimin continua.
— Moro com minha tia.
— Onde estão seus pais?
Eu me encolho.
— Eles morreram há alguns anos. É um assunto particular, por favor.
Jimin parece notar minha emoção e seu olhar se tornar mais brando.
— Deve ter sido difícil — ela diz, parecendo sincera. O professor Park encerra a aula, e Jimin levanta-se e caminha até a porta.
— Espere — chamo. Ela não se vira. — Jimin! Ainda temos que discutir sobre o nosso trabalho.
Ela dá meia-volta e anda na minha direção. Pega minha mão e escreve nela alguma coisa antes que eu sequer pense em puxá-la.
Olho para os números escritos em tinta azul na palma da minha mão. Fecho o punho. Quero lhe dizer que não há a menor chance de o celular dela tocar hoje a noite, mas apenas fico ali sem fazer nada, como se tivesse me esquecido de como abrir a boca.
— Vou estar ocupada hoje à noite — digo por fim.
— Eu também — ela responde, sorrindo, antes de partir.
Fico imóvel, tentando assimilar o que acabou de acontecer. Será que ela acha que um sorriso sedutor é o suficiente para redimi-la? Não. Ela tem certeza que é.
— O que você acha de eu também começar a escrever no meu tempo livre? — Diz Ningning se aproximando.— Estou pensando em escrever sobre a injustiça da mudança de lugares. Até que fiquei com uma garota legal, mas óbvio que preferia fazer o trabalho com minha melhor amiga.
— Minha nova parceira — digo, apontando Jimin no corredor.
Ela tem um jeito de andar irritantemente confiante, do tipo que combina com camisetas velhas e jeans rasgados. Jimin não usa nenhum dos dois. É uma garota do tipo jeans escuro, camisa lisa e jaqueta militar.
— A novata do início do ano? Acho que ela deve ter aprontado muita coisa na antiga faculdade. — Ela me lança um olhar de quem já entendeu tudo. — Será que ela vai causar confusão por aqui também?
— Ela me dá calafrios. Sabia várias coisas sobre mim.
— Como o quê, por exemplo?
Suspiro. Jimin sabe mais do que eu sou capaz de encarar com
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