Acorde, mas não se mexa finja que está dormindo...

Com Shura soprando essas palavras pra mim eu recobrei a consciência mas me mantive imóvel, senti algum movimento na cama o que indicava que Guren estava acordado.

-Mahiru-sama, seu pai vai ficar com raiva se você se aproximar de alguém como eu – Guren disse e eu tive que fazer uma imensa força de vontade pra não me levantar, então ela estava ali. Então no final ela ainda finge que se importa com o Guren.

-Eu também sou diferente do que era antes. Eu posso tomar minhas próprias decisões. É o trabalho da líder da casa, meu trabalho como uma Hiragi também é se preocupar com as pessoas das casas subordinadas – só o timbre da voz dela me irritava, a casa Ichinose não era mais subordinada da casa Hiragi a muito tempo e ela sabia bem disso. Mas mesmo assim ela ousou usar tais palavras.

Os dois ficaram em silêncio por longos minutos.

-...passou bastante tempo, mas ainda não me diz nada?

-É que eu não tenho nada pra dizer.

Novamente um silêncio constrangedor se instalou, apenas nossas respirações eram ouvidas eu suspirei propositalmente dando indícios que eu podia acordar mas apenas me ajeitei e continuei fingindo que dormia.

-Como está a ferida?

-Não tem problema – Guren respondeu.

-Ouvi dizer que a sua avaliação... Foi lamentavelmente baixa, é verdade? – ela perguntou.

-Se é o que dizem suponho que seja verdade – Guren respondeu.

Novamente um longo silêncio se estendeu, eu esperei por barulhos de passos indicando que ela fosse embora mas eles não vieram, Guren dessa vez quebrou o silêncio.

-Mahiru-sama, se ficou forte e bonita nesses dez anos...

-E alguém como você aprendeu a agradar as pessoas? – a voz dela demonstrava surpresa e parecia mais animada.

-Não é um elogio – Guren rebateu com a voz sem emoção.

-Mas me deixa feliz ouvir você dizer que estou bonita, eu acho...

Guren se mexeu na cama desconfortável – Precisa de alguma coisa de mim?

Nesse momento a atmosfera do quarto mudou a pressão aumentou então poucas palavras foram trocadas antes de Guren a parabenizar pelo compromisso, ela fez uma pausa antes de responder com um "obrigada" sem emoção.

Seus passos deixaram a enfermaria, pude ouvir Guren suspirando, se eu acordasse agora estaria muito na cara que eu estava ouvindo tudo, me contive e fiquei para por mais um tempo foi quando senti a cama mexendo de novo e logo senti os dedos do rapaz percorrerem pelos meus fios de cabelo.

A última vez que ele tinha encostado na minha cabeça tinha sido na minha partida anos atrás, então a sensação foi incrivelmente nostálgica.

Mas o que realmente me despertou foi o fato de estender a caricia pra minha bochecha exposta, me mexi devagar e abri um olho – O que você está fazendo? Devia estar descansando...

Levantei minha cabeça e cocei meu outro olho, precisava convencer ele que eu realmente estava dormindo não escutando a conversa dele escondida, de novo...

Mas aparentemente ele resolveu me ignorar e manteve a mão no meu rosto, ele parecia tentar descobrir alguma coisa – Guren? – eu chamei e num instante já tinha voltado a posição original dele com os braços cruzados.

-Por que ficou aqui? Cadê a enfermeira? – ele perguntou olhando em volta.

-Eu matei ela e escondi dentro do armário, estava esperando você acordar pra me ajudar a desfazer do corpo – respondi no tom mais sério que eu consegui.

Ele arqueou uma sobrancelha pra mim e eu não pude deixar de rir – Ela estava aqui quando eu acabei cochilando não sei exatamente quando ela saiu, e quanto eu estar aqui eu a ajudei a te mumificar então em sinal de gratidão ela deixou que eu ficasse.

Ele pareceu mais tranqüilo, mas logo vi que ele fechou a mão em punho e a apertou até que os nós dos dedos ficassem brancos, ele tinha o olhar baixo. Coloquei a minha mão sobre o punho dele.

-Você não é fraco Guren – falei tentando soar reconfortante. A mão dele relaxou embaixo da minha mas permaneceu fechada. – Eu falei que te conhecia e também não é difícil saber o que você está pensando. E independente do que você diga, eu sempre vou te dar cobertura e proteger as suas costas.

-É pra isso que serve a família – eu ri enquanto ele fazia uma careta – Já que você já está recuperado e o sinal bateu eu vou embora. Não me espere na saída, tenho algumas coisas pra resolver.

-Com o que? – ele perguntou.

-Guren, uma garota também tem seus segredos – respondi, com um aceno me levantei e sai da enfermaria, não era mentira eu realmente tinha um compromisso, teria ido direto pra sala que um braço não tivesse impedido a minha passagem.

-Com licença...? – eu falei.

Ergui meus olhos pra encontrar o dono daquela mão, me deparei com olhos escuros e sérios.

-Cabelos negros e olhos dourados como o mais puro ouro derretido, você se encaixa na descrição. [Nome] Hirai não é? – aos poucos o garoto abaixou o braço enquanto eu continuei o olhando.

-Depende, quem é você?

-Kureto Higari – ele respondeu.

**Extra POV - Guren **

Meu coração batia num ritmo mais acelerado do que estava acostumado, mas eu não sabia se o motivo era pelo fato de Mahiru ter vindo me ver ou pelo pequeno momento que tinha compartilhado com [Nome] alguns minutos atrás.

Quando eu acordei a primeira coisa que reparei foi que ela estava com a cabeça apoiada na cama do meu lado, não importa quantas vezes eu diga pra ela que consigo me cuidar sozinho [Nome] sempre vem ao meu resgate, mesmo que contra a minha vontade. Tem sido assim desde de crianças, o rosto dela parecia tranquilo e diferente... [Nome] não era mais aquela garota frágil ela era forte e determinada e tinha desenvolvido uma língua bastante afiada. Com certeza eu tinha uma afeição por ela que era diferente...

Mas então tem Mahiru, eu tinha enterrado bem no fundo aqueles sentimentos que nasceram quando ainda éramos crianças, mas ver ela tão perto me fazia duvidar da minha própria capacidade de manter eles longe... Grunhi e joguei a minha cabeça pra trás encarando o teto branco.

-...Droga. Eu sou tão idiota.