⍟ twenty eight
Cinco dias se passaram desde o acontecimento mais inolvidável para Jimin.
Dizer que sentia-se bem e recuperado ainda era uma mentira, entretanto, não podia negar que, tanto seu corpo como sua mente, já encontravam-se acomodáveis. As noites, que antes eram sufocantes e atônitas, se tornaram aconchegantes e seu sono não demorava muito a chegar.
Às vezes, ele se pegava pensando em Hannah, na noite do incêndio. A sua imagem não o abandonava nem nos sonhos. A falta de respostas sobre sua amiga o fazia chorar em silêncio na penumbra da noite, arrancando seus soluços mais profundos e o deixando agarrado ao travesseiro como uma forma inconsciente de se sentir perto dela.
O detetive Jungkook não conseguiu que o caso ficasse em suas mãos, então a polícia local assumiu a área do incidente e investigou todo perímetro, se conseguisse alguma coisa suspeita associada ao caso do FBI, eles iriam comunicá-los. Mas até o momento não se havia nada, nem uma ligação.
Jimin raspou os dedos nos livros organizados na enorme prateleira. A princípio, havia ficado surpreso pelo tamanho daquele lugar, com estantes circulares em cada parede e uma escrivaninha antiga no canto, na retaguarda da vasta janela que dava para o oeste. As paredes eram talhadas na rocha e possuíam uma espessura antiga.
Ele começou um lento passeio, dessa vez vagando pela outra parte da biblioteca, correndo com seus olhos por cada capa em busca de um livro satisfatório. A maioria era sobre investigação, terrorismo, crime organizado, infiltração policial, a arte de investigar crimes e inúmeros outros dessa categoria. Não podia se surpreender com o padrão dos livros, visto que a biblioteca está situada dentro de um prédio que pertence a esse âmbito.
Escolheu um aleatório e folheou as páginas, lendo o título mentalmente.
Sistema de espionagem.
Uma estranha pontada picou seu peito com a sensação que aquela palavra lhe trazia. Espionagem o fazia pensar em uma única pessoa, cujo rosto ainda o assombrava nos corredores quando se esbarravam. Não tinha contado para o detetive Jungkook a causa de seu espanto no dia da entrevista, pelo mesmo motivo que evitou revelar o nome de Namjoon como o chefe da máfia: medo.
Contudo, os dias se passaram, ele foi tomando mais coragem e ganhando força para conversar mais com Jungkook. Ocasionalmente, eles se sentavam e Jimin contava-lhe do que se lembrava e da saudade repentina que sentia de Taehyung, mas nunca assumiu quem era a verdadeira Rose.
Ela passou a estar mais tempo grudada no pé do detetive, surgindo por vezes em uma dessas conversas que aconteciam em lugares aleatórios e interrompendo-os. Para Jimin, sua tentativa era proposital. Principalmente seu olhar insensível para o seu rosto quando Jungkook não estava por perto, isso o fazia deduzir que a ameaça não tinha que vir, necessariamente, através das palavras se ela podia transmiti-la através de um olhar.
Ele tomou uma respiração superficial e fechou o livro, colocando-o no mesmo lugar. Andou mais um pouco e acabou vendo um nome conhecido. Sherlock Holmes. Na infância, adorava ler as aventuras desse personagem, passava horas com a cara enterrada nas páginas e os olhinhos pregados em cada palavra.
Um sorriso contente se abriu em seu rosto e ele apanhou o livro, abraçando-o contra seu peito. Mesmo já tendo lido dezenas de vezes, pelo menos agora tinha algo que pudesse distraí-lo.
Seus olhos rolaram além da janela. Dava para ver o céu anuviado ficar cada vez mais cinzento e a beleza da cidade se esconder debaixo das nuvens. O tempo não estava frio como das outras vezes, mas ainda existiam poucas lufadas de ar que causavam calafrios quando tocadas na pele.
O ponteiro do relógio indicava que faltavam trinta minutos para as seis horas da noite. Jimin se apressou em sair da biblioteca e deixar tudo arrumadinho após escolher seu livro. Jungkook havia lhe dito que podia andar por qualquer lugar do prédio, exceto entrar nas portas com avisos e vagar pelo estacionamento para não correr risco de ser barrado por algum guarda. Geralmente, eles trocam os vigilantes de acordo com os turnos, e aqueles que nunca o viram antes poderiam, em alguma situação, detê-lo à força.
Olhou para os dois lados quando saiu pela porta, fechando-a silenciosamente. O assoalho do corredor da biblioteca era xadrez e seguia um percurso longo até uma área mais reservada. Ele, simplesmente, poderia ter voltado pelo elevador de onde viera, mas decidiu procurar uma escada de acesso ao andar de cima para não correr risco de trombar com um guarda de vigia.
Ao caminhar mais um pouco e virar a direita, Jimin entrou em um tipo de saguão com diversas portas e todas elas fechadas. Sua boca se repartiu em surpresa e seus olhinhos de gato estudaram o local. Na parede ao lado da entrada por onde passou havia uma placa de vidro escrito "Treinamentos de prática".
Ele pensou em voltar quando um pensamento estranho invadiu sua mente e o alertou de possíveis câmeras espalhadas naquele espaço, entretanto, um barulho diferente cortou aquele silêncio e o fez ficar paralisado no mesmo lugar.
O som veio de novo, dessa vez mais forte, e se repetiu uma sequência de vezes. Jimin estreitou os olhos e olhou em volta. A batida surgiu mais uma vez. Alguém estava dando socos em alguma coisa e parecia violento em seus movimentos.
Então ele manobrou seu corpo na direção do estrondo, sentindo que estava cada vez mais perto de encontrá-lo. Nem todas as portas estavam fechadas, uma delas achava-se entreaberta e, conforme se aproximava, Jimin teve a certeza que o barulho vinha de dentro daquela sala.
Tomado pela curiosidade e ignorando todos os alertas de seu sexto sentido, o menino se aproximou em passos lentos, evitando manifestar qualquer ruído que entregasse sua presença. Ele encaixou sua cabeça na pequena abertura e acabou sufocando um grito de surpresa com o que seus olhos encontraram.
O detetive Jungkook estava lutando boxe com um saco de pancada. Seus dedos estavam enfaixados e posicionados em combate. Ele mantinha os pés separados e alinhados aos ombros, suas mãos movendo-se levemente antes de fazer o saco balançar novamente com mais um soco.
Seus cabelos escuros grudavam na testa e seus olhos pretos se concentravam no alvo. A pele nua de seu abdômen brilhava com o suor escorrendo pelas linhas de seus músculos, deslizando até a entrada de seu quadril e perfurando o cós do shorts.
Jimin nunca o tinha visto daquele jeito, tão absorto nos próprios movimentos e vê-lo tão fora do habitual, deixando de lado a gravata e o terno caro, se tornou uma surpresa para o menino, uma surpresa interessante.
Jungkook realizava socos e alguns chutes uma vez ou outra. Jimin reparou em como seus músculos posteriores se contraíam a cada golpe e sua respiração ricocheteou com essa visão. Talvez fosse errado espioná-lo em um momento como aquele, sendo totalmente desrespeitoso em invadir seu espaço privado, contudo, mesmo sabendo que era um erro, ele quis continuar assistindo-o.
Não sabia deduzir quantos minutos se passaram enquanto ficou parado com a cabeça quase enfiada na fresta da porta, testemunhando aquele momento como se nunca mais pudesse vê-lo de novo. Ele só queria se manter quieto como uma mosca sem fazer qualquer zunido, umedecendo por vezes os lábios ressecados. E ele sabia que o ressecamento se dava ao fato de estar com eles abertos, admirados.
Jimin abraçou o livro com mais força contra seu corpo e piscou pela primeira vez durante todo tempo que esteve observando-o. A respiração raspou para fora de seu peito enquanto contemplava suas manobras pouco ensaiadas, mas bem executadas.
E como se uma força do além estivesse calculando o momento exato para fazê-lo passar o maior vexame, Jimin se desequilibrou quando a porta deslizou para trás com seu peso.
O livro se estatelou no chão e ele deu um salto espantado com as duas mãozinhas cobrindo a boca. Jungkook parou seus movimentos subitamente e olhou em sua direção, os olhos escuros alarmados enquanto cortava entre o livro no chão e a imagem do menino perplexo na entrada da porta.
Jimin tentou engolir a saliva, sentindo-a descer rasgando sua garganta como se fosse facas afiadas. Ele afastou as pequenas mãos do rosto, agora, retorcido em desespero. O detetive continuava o encarando em silêncio, os lábios, vagamente, entreabertos ao mesmo tempo em que respirava forte, seu peito desnudo subindo e descendo com o resultado da potência de seus golpes realizados instantes atrás.
Sua boca se moveu, relutante, em um pedido de desculpas, mas não houve som em suas palavras. A tensão já começava a se tornar desagradável, então Jimin deslocou seus olhos pelas paredes da sala enquanto o detetive não desviou os seus em momento nenhum.
Jimin deixou seus ombros encolhidos e a cabeça abaixada, demonstrando que estava envergonhado.
– Me-e d-desculpe, senhor. – ele balbuciou em meio as palavras, sentindo suas bochechas esquentarem de repente.
– Há quanto está aí? – perguntou ele, mas sua fala estava longe de ser uma acusação.
Jimin sacudiu a cabeça desajeitadamente. Nem ele sabia há quanto tempo esteve observando-o; mas, para a sua surpresa, esse desconhecimento era, igualmente, fascinante. Havia algo perturbador em estar fitando aquele par de olhos, irresistivelmente, pretos e ele não soube dizer o que foi.
– Sherlock? – perguntou Jungkook, encarando a capa do livro no chão.
O menino pigarreou antes de correr ao livro e agarrá-lo contra seus braços.
– Eu lia quando era mais novo. – Um sorriso torto se desenhou nos lábios de Jungkook e ele, depois de muito tempo, se moveu na direção de sua blusa jogada no chão.
– Então você é amante das aventuras de Sherlock? – indagou ainda de costas.
Jimin meio que se perdeu na resposta quando examinou seus movimentos conduzirem a camisa branca sobre a cabeça e deslizá-la por seu dorso suado, deixando-a que se agarrasse nos músculos rígidos de suas costas.
O detetive virou de frente e o menino percebeu seu devaneio quando a sobrancelha dele subiu discretamente. Jimin limpou a garganta e focou em seu rosto, controlando os olhos para que não se atrevessem a escorregar por cada centímetro daquele tronco.
– Sim, e-eu sou m-muito fã d-dele. – Jimin pensou ter visto um sorriso secreto de aprovação, mas nos últimos minutos estava delirando com bastante coisa, por isso decidiu não considerar essa percepção.
– Entre, Jimin. O espaço é enorme.
Recuando, o detetive deu uma rápida olhada minuciosa em sua direção, escrutinando seu rosto antes de agarrar duas garrafas de água em uma das bolsas no chão. Enquanto isso, Jimin avançou algumas pegadas hesitantes para dentro da sala, os pequenos olhos analisando o espaço colossal com poucos sacos de pancada pendurados.
– Aqui é enorme. – o menino falou, impressionado.
– Cada sala é específica para um tipo de treinamento. Do outro lado fica o tiro ao alvo. – explicou Jungkook, voltando com os dois frascos em mãos. – Precisamos sempre estar treinando nossas habilidades, mesmo que já tenhamos passado por isso antes. Aceita uma?
O menino mirou na garrafa esticada em sua direção. – Obrigado.
Ele negou suavemente, se prendendo mais ao livro. Mas diferente de sua resposta, Jungkook jogou a garrafa oferecida sobre a bolsa e abriu a sua, colocando a boca no gargalo e engolindo grandes porções de água.
Foi aí que Jimin sentiu esse momento dançando nas beiradas de sua mente; reproduzindo, lentamente, a forma como sua garganta se mexia quando o líquido atravessava-a. Era errado permanecer tantos segundos explorando do suor abaixo de seu queixo, mas era tentador demais para controlar o desespero de seus olhos.
De repente ele inalou duas respirações agudas, desviando seus olhos para o piso e mexendo a pontinha do tênis por cima do assoalho, um rubor feroz subindo por suas bochechas.
– Eu acho que já vou. – disse, ainda de cabeça baixa. Jungkook parou de beber sua água e se concentrou nele, passando a parte de trás da mão por cima da testa para varrer o suor. – Não devia ter atrapalhado o senhor. Me desculpe.
– Não precisa me chamar de senhor, Jimin. Sem meu distintivo eu sou só Jungkook.
– Não sei se consigo... – assumiu, levantando seus olhos de encontro aos dele.
E ele tinha razão. Não conseguia enxergá-lo diferente, mesmo sem o terno fino e a expressão meticulosa que sempre costumava ver nos corredores e nos diálogos que tiveram, ele continuava sendo um homem eminente que exalava poder.
Jungkook soltou um suspiro risível e jogou a garrafa ao lado da outra. – Tudo bem, me chame como achar melhor então.
Jimin não queria sucumbir diante daqueles olhos polidos, mas uma estranha sensação se repetiu em seu peito e o fez continuar com os pés enfiados no chão, completamente incapaz de se mover. Ele tinha escondido de Jungkook sobre a mulher disfarçada, e um nó em sua garganta elucidava o que sua mente já sabia.
– Como está se saindo esses dias? – perguntou o detetive, suas mãos fortes trabalhando em desenrolar a faixa nos dedos.
– Me sentindo melhor, mas não totalmente. – assumiu. – Estou lendo como o senhor sugeriu. Isso tá me ajudando a não ter pesadelos.
– Muito bom. Fugir um pouco da realidade pode ser um bom remédio. – disse ele, dobrando as tiras na mão. – Isso que eu faço é um bom remédio para o estresse. Eu soco alguns sacos quando me sinto esgotado.
Jimin quase riu da forma que ele falou, se não fosse por um motivo tão deprimente.
– O senhor parecia com muita raiva.
– Algumas coisas me estressam nesse trabalho, mas como um profissional, eu devo manter a postura e controlar isso. – Jimin se surpreendeu por ouvi-lo dizer aquilo diretamente à alguém vítima de um de seus casos, no entanto, isso não parecia ser um problema para Jungkook. – Minha preparação é só uma parte disso, você enjoaria se soubesse de toda burocracia que existe para me comportar em devidas situações.
Definitivamente, não estava falando com o detetive Jungkook. Estava falando com Jungkook.
Logo que ele se virou para arrumar as coisas dentro da bolsa, a espinha de Jimin formigou ameaçadoramente, e ele acabou desviando seus olhos para a porta escancarada. Aquela sensação de arrependimento voltou com mais impulso e seus dedos acabaram espremendo a capa do livro para contê-la.
Ele voltou-se a Jungkook de novo, vendo-o agachado fechando o zíper da mochila após colocar suas coisas dentro.
– Você já está indo para cima, não é? – perguntou, ainda inclinado de costas, depois ele se levantou e pousou a alça da mochila em um ombro. – Preciso de um banho, então acho que vou acompanhá-lo.
– Senhor, espera.
Jimin quase implorou, ao mesmo tempo em que notou o corpo dele totalmente virado de frente. As linhas na testa de Jungkook enrugaram, parcialmente desentendido de seu pedido.
– Podemos conversar?
A resposta veio num duradouro silêncio, até a cabeça de Jungkook se agitar uma única vez, afirmando.
Sua imaginação tinha conjurado um par de olhos duros e melancólicos por baixo daqueles cílios postiços, e agora ele tinha certeza que devia contar ao detetive sobre quem ela era e o que fazia. Todas as noites, reviva o momento da entrevista, a chance que teve de expor aquela farsa, porém havia algo que o prejudicava toda vez que tentava ter essa conversa com Jungkook. O momento certo.
– Jimin? – Ele escutou a voz do detetive de repente e um choque de consciência o fez saltar para fora de sua imaginação. – Tem alguma coisa que queira me contar?
Ele mastigou a pontinha do lábio e acenou devagar, os olhinhos conectados nos dele, no instante seguinte Jungkook aguardou sua manifestação, mas ele parecia não saber por onde começar.
Subitamente, Jungkook deu um passo à frente e caminhou até a porta, fechando-a com um estalo. O toque de conforto e segurança acariciou a pele de Jimin e ele sorriu, mentalmente, com aquela atitude. Jungkook sempre buscou formas de mostrá-lo que ele estava protegido desde que pisou naquele prédio e não podia negar que era inédito ver alguém oferecer de tudo para vê-lo seguro.
Mesmo sendo o seu trabalho, aquilo soava, igualmente, generoso.
– Assim está melhor? – perguntou Jungkook, voltando-se a ele depois de aferrolhar a porta. O menino balançou a cabeça e olhou para ele. – Estou ouvindo.
Jimin tomou um grande fôlego e organizou as palavras seguintes em sua mente, antes de articulá-las como devia.
– É sobre aquela detetive. A Rose. – Jungkook estreitou, vagamente, os olhos, relativamente desconfiado sobre o assunto da conversa.
– Ela te disse algo?
– Não, é só que.. – ele pausou, limpando a garganta outra vez. –, eu não sei como te dizer isto da melhor forma sem parecer chocante.
– Pode tentar do seu jeito. – falou, varrendo qualquer resquício de precipitação no peito dele para longe.
Nessa hora, o menino apenas passou a mão pela nuca, nervoso, depois olhou para ele sob os cílios.
– Ela trabalha para eles.
Inicialmente, Jimin achou que o detetive não o tinha escutado direito, já que ele não externou qualquer reação imediata, entretanto havia um ressentimento sombrio se fechando em seus olhos e uma rudeza aguda se acentuando nas linhas de sua mandíbula.
– Ela está infiltrada aqui pra conseguir informações. – continuou Jimin, após ouvir o silêncio como resposta. – Eu devia ter te contado antes, mas tive medo do que ela podia fazer. Toda vez que a gente estava perto um do outro, ela aparecia de surpresa e ficava me encarando como se quisesse me ameaçar.
– Tem certeza disso, Jimin? – Sua voz era, meramente, baixa.
– Sim, detetive, eu tenho. No dia, eu tentei ligar para a polícia através de um telefone que tem na sala do Namjoon, mas o aparelho pedia senha e eu não sabia. Então me escondi no armário quando ouvi a voz dele. – Um vinco se desenhou em sua testa enquanto se lembrava dos detalhes. – Ele entrou e ela veio depois. Usava um vestido e o cabelo estava solto. Até a voz dela eu não me esqueço.
Jungkook percorreu os dedos pela boca, estupefato, uma escura sombra vendando seu olhar. Seus pés deslizaram pela sala e Jimin teve a certeza de que ele estava imerso em seus pensamentos.
Sempre teve razão. Sua perspectiva, desde o início, estava certa e, de fato, havia alguém disfarçado de policial para conseguir informações para a máfia, o que não esperava é que essa pessoa fosse a queridinha do chefe: a Rose. A princípio, chamariam sua acusação de ambição pela ex do diretor, entretanto, nesse momento, ele tinha seu nome nas mãos e abusaria de suas habilidades para pegá-la de surpresa.
– Você se lembra do que ela disse? – perguntou. Seu tom, levemente, pacato.
– Conversaram bastante. Mas me lembro de ela mostrar sua foto a ele e dizer que você acreditava que ela queria dormir com o senhor.
As bochechas do menino ficaram vermelhas após sua confissão em voz alta. Jungkook parou, os olhos virando-se à ele abruptamente. Ele não parecia surpreso, no entanto havia uma curiosa faísca vagando por seu rosto que o deixou impressionado.
– Dormir?
– Ela usou outra palavra, mas... o senhor me entendeu. – tentou consertar, mas o rubor em suas maçãs indicavam que o resultado fora pior do que esperava.
– O que mais ela falou? – perguntou precipitadamente. Uma fagulha furiosa fazendo seu maxilar se apertar.
– Disse que vocês achavam que estavam perto de encontrar eles. – A expressão de Jungkook se fechou completamente. – Ela deu todas as informações pra ele, mas eu não as ouvi porque os dois saíram juntos pra outro lugar e eu fiquei no armário. – ele exalou, quase num som de alívio. – Me desculpe, senhor, eu devia ter te contado quando tive a chance. Me desculpe por esconder isto e deixar que ela soubesse do que planejavam. Eu deixei o medo falar mais alto do que a razão, então não fique bravo comigo, por favor.
– Jimin – O detetive se aproximou e o garoto olhou fixamente para a sua face. –, você estava com medo no momento e continuou com ele todos esses dias. Mas você se abriu comigo quando considerou ser o momento certo e me contou tudo. Fez a sua parte, agora devo fazer a minha.
– O que o senhor pretende fazer? – Sua voz era calma, mas seu olhar estava apavorado.
Jungkook parou por um momento, sua mente calculando uns pontos dispersos e juntando-os numa única lógica.
– Preciso de você. – disse o detetive, a voz calma e confiante, fazendo uma sensação golpeante girar em torno do estômago do menino. – Vamos pegá-la, mas você tem que fazer exatamente o que eu disser. Acha que consegue?
O menino mordiscou a pontinha do inferior e acenou a cabeça, seu rosto estava coberto por um espesso entusiasmo e um brilho curioso nadava em seus olhos. – Posso tentar, senhor.
✮✮✮
Namjoon atirou as pernas acima da mesa e se esticou na poltrona, o rosto voltado para cima. Despejou mais porção de vinho branco na sua taça e saboreou, o gosto leve do álcool roçando sua garganta. Os primeiros botões de sua camisa estavam, meramente, abertos e sua audição se deleitava de uma música baixa tocando no fundo.
Um eco de vozes vindo através da porta se misturou com as notas lentas da canção e o fez se desconcentrar da melodia para focar na porta, inexorável. A taça foi levada aos lábios novamente e seus dedos sutis limparam as gotas de vinho que se perderam no canto de sua boca.
Houve um som duro de passos se aproximando até que a porta se escancarou de repente, e o rosto enfurecido de Derek se revelou. Namjoon o encarou, ele tinha uma mão na taça e a outra sobre o colo, o líquido tremulando suavemente à medida que oscilava seus dedos.
Derek estava lá, a poucos centímetros de distância de seu aliado, o rosto imóvel e esvaziado para uma exposta hostilidade.
– Temos que conversar. – disse, seu tom inflexível se destacou e ele acabou deixando os olhos numa linha estreita após vê-lo bebericar o vinho.
– Continue.
Derek rangeu os dentes e apertou os lábios quando o avaliou, tranquilamente, sobre aquela poltrona. Ele andou a frente, sua expressão sustentando um intrigante traçado escuro de puro ódio.
– O que pretende fazer com toda essa situação? Não sei se você se lembra, mas seu plano de merda deu errado. – O homem deixou escapar uma risada fugaz antes de olhar para a taça que tinha em mãos.
– Está tão preocupado com meu plano... – falou, sem afrontá-lo.
– É claro que estou! Ou você esqueceu que ele pode denunciar todo mundo aqui!?
Para a sua minúscula surpresa, Namjoon não se alterou, muito menos levantou o olhar à ele. Encontrava-se na mesma posição, imperturbável e, completamente, quieto. Sabia que um par de olhos furiosos estavam descansados sobre si, esperando por uma resposta urgente.
Entretanto, tudo o que fez foi engolir seu vinho e colocar a taça por cima da mesa, voltando-se a ficar inclinado sobre o assento com o cotovelo equilibrado no apoio de braço, seu olhar brandido sobre o dele.
– Você nos colocou em risco. – continuou Derek depois de ganhar a atenção dele. – Criou todo plano para pegar aquele policial de merda e veja só agora, ele está com o meu garoto!
– Ah, então toda essa revolta é porque ele está com o seu brinquedo? – provocou, vendo-o ficar com o rosto esbraseado de fúria e os punhos cerrados. – Não se preocupe, Derek, vou trazer sua boneca inflável de volta e poderá colocar seu pau para trabalhar de novo, já que sua mão não está dando conta.
– Quase uma semana! – esganiçou-se, ignorando toda aquela provocação. – Já se passou quase uma semana desde a fuga dele. Seu plano foi à merda, aquele babaca do policial descobriu a escuta que você usou nele e agora estamos correndo risco de sermos caçados. Jimin vai dar os nomes a ele e, tanto eu quanto você, vamos nos foder nessa droga toda.
– Acredita mesmo nisto? – ele perguntou com um pesado sotaque. A expressão de Derek era um misto de fúria e descrença. – Você acha mesmo que eu deixaria ele fugir sem ter um plano B? Ai, Derek, você precisa colocar seus neurônios para funcionar, sabia? Eu sempre penso no próximo passo, como um jogo de tabuleiro.
– Mas aqui não é um jogo! – Ele aumentou sua voz. – Sabe o que eles podem estar fazendo agora? Preparando uma armadilha pra pegar a gente enquanto você ri da situação. Se aquele panaca fardado conseguiu ver a nossa escuta, planificar uma emboscada é moleza para ele.
Namjoon deixou a cadeira e arrastou-a para trás com o seu peso. Ele fechou os botões abertos e deslizou até o outro, deixando toda tensão perdurar no ar.
– Quando eu digo que tenho um plano B, é porque há um plano B.
– Então por que você não o colocou em prática ainda? – desafiou-o, verificando pela primeira vez ele puxar o ar pelo nariz, depois um sorriso como uma faca desembainhada cortou seus lábios.
– Uma pessoa nossa está com eles. – Derek se mostrou, brevemente, surpreso, mas não desfez sua expressão inflexível. – Ela está com os olhos grudados no menino, não tem como ele fugir. Estou entrando em contato com ela através de um celular pré-pago e, até o momento, ela me garantiu que o garoto não disse uma palavra para eles. Aparentemente assustado.
– Como pode ter tanta certeza?
Namjoon mostrou a ele um sorriso sombrio.
– Eu a treinei bem para isto.
– Não a conheço, então não confio. – falou, duro e simplista.
– Você não tem que confiar nos meus escolhidos, Derek. Eu sou o líder aqui, e a pessoa que eu definir será responsável pela tarefa que lhe ordenar.
O silêncio, ligeiramente, se sobrepôs sobre sua voz; uma agitada tensão banhando toda sala. Derek apertou o canto dos olhos com os dedos cobertos por anéis e exibiu um sorriso incrédulo e, parcialmente, grosseiro.
– Prefere confiar em uma mulher aficionada, do que no seu próprio parceiro que te ajudou em cada processo disso aqui. – O rosto de Derek estava rígido e sua voz veio em um grasnar.
– Não seja tão melancólico. Precisamos dela com a gente. – articulou Namjoon, sentando-se na pontinha da mesa e cruzando os braços. – Estamos procurando o melhor dia para tirar o garoto do prédio sem que ninguém veja. Ela vai provocar um apagão no dia em que os dois detetives estiverem fora do trabalho, e então vai levá-lo a uma mata para devolvê-lo a nós.
– Como garante que vai dar certo?
– Não garanto, é só uma das hipóteses. Estou vendo como posso chamar a atenção deles para fazer com que saiam do prédio e levem reforço, mas para isso vou precisar de você também.
– É uma chance arriscada. – assumiu, enxergando um divertimento flutuar pelo semblante amorenado de Namjoon.
Este sugou uma quantidade densa de ar e se aproximou dele, deixando o hálito provocar ondas oscilantes contra sua orelha enquanto uma palma acariciava o tecido grosso de seu casaco por cima do ombro.
– Tenho uma estratégia muito melhor que essa. – disse, curvando seu rosto para o lado e escorrendo o olhar pela linha do queixo dele. – Venha comigo.
Um cintilar de hesitação se manifestou na mente de Derek enquanto o via abrir a porta e acenar com a cabeça para o lado de fora. Ele não disse nada, sua boca apenas se contorceu e seus pés se arrastaram para longe dele, além da sala.
Namjoon andou a frente, recebendo alguns olhares desconfiados de Derek. Suas mãos se dobraram para trás do corpo e uma expressão, lentamente, áspera emoldurou seu rosto. Detestava surpresas, sejam elas boas ou ruins. O gosto do imprevisto era terrivelmente pútrido.
Eles caminharam por alguns corredores e desceram escadas abaixo, após se agitarem para cima de mais degraus e cruzarem uma passagem por dentro de uma sala, que até o momento Derek não tinha noção que existia ali dentro, eles acabaram estacando diante de um elevador de carga.
Derek olhou ao redor, seus pensamentos correndo tão espessos como sangue por cada centímetro daquele espaço. Não o identificou, justamente, por nunca ter descoberto aquele lugar. E pela modéstia recatada de Namjoon, ele tinha certeza que ali se guardava uma mina de ouro.
O ambiente possuía um eco remoto de pessoas esmagando o teto acima de suas cabeças. Derek curvou o pescoço e olhou para a cobertura na escuridão, vendo alguns feixes de luz pendurados no teto.
– Onde estamos? – perguntou, seus olhos estudando meticulosamente o ambiente.
– Embaixo da boate.
Namjoon puxou uma trava amarela embutida na parede lascada por rochas e a grade com formatos de losango chiou quando deslizou para o lado. Ele entrou primeiro, mas Derek permaneceu parado no mesmo lugar; o rosto retorcido numa leve suspeita.
– O que garante que não vai me matar? – indagou.
Namjoon suspirou e levantou fracamente o canto da boca para um único lado.
– Eu não sujaria as minhas mãos.
Ele não era fã de surpresas fortuitas, mas decidiu entrar no ascensor sem refutar. As engrenagens guincharam no momento que começaram a se mover para baixo. A parte clara com os pequenos faróis de luz foi sumindo à medida que o solo subterrâneo começou a engolir o elevador.
Paredes gretadas era tudo o que eles enxergavam. Apesar de haver uma lâmpada dentro do ascensor, conforme desciam, o pequeno espaço parecia escurecer ainda mais. Derek focou em Namjoon de esguelha e um toque intercalar se agitava no rosto dele.
O motor estacionou e um ronco tiniu num último balanço. As grades se arrastaram para o lado assim que Namjoon moveu a tranca para baixo. Eles deixaram o elevador e a única coisa que avistaram foi uma escuridão profunda, exceto pelo fraco luzeiro dentro do elevador que clareava bem pouco toda imensidão fosca.
– É por aqui. – falou Namjoon, já experiente sobre o lugar.
Derek não podia ver a forma de sua mão em frente a seus olhos, nem o chão da superfície onde estava, logo que marcharam numa direção completamente desconhecida para ele.
Apesar de cismado, deixou-se ser guiado por uma passagem estreita talhada nas rochas com dois pilares sustentando uma tocha em cada lado. As suas chamas provocavam sombras nas paredes e fazia o par de correntes anexadas nas pedras brilharem à luz do archote.
O vulto deles bruxuleou perante as flamas e Derek acabou olhando mais uma vez em volta. Estava há vários níveis abaixo do chão, o teto possuía uma estrutura rochosa e os outros três corredores eram engolidos pela escuridão, exceto um.
Eles seguiram pelo acesso iluminado por tochas e entraram dentro de um espaço esférico com várias celas em volta. Havia dois homens estáticos ao lado de uma com barras de metal estreitamente espaçadas, no canto deles, dois bancos pequenos descansavam. Ali, Derek entendeu que estava dentro de uma masmorra.
Duas tochas encontravam-se enfiadas nas paredes ao lado do calabouço, as chamas bruxuleantes arremessando desenhos estranhos à cobertura de pedra. Ele viu Namjoon andar mais a frente e parar com os braços atrás das costas diante dos capangas. Não precisava estar olhando para o seu rosto para saber que uma de suas sobrancelhas estava, misteriosamente, curvada para cima.
Um dos marmanjos se mexeu na direção da cela, cutucando seu bolso à procura da chave. Quando a achou, inseriu-a dentro do pesado cadeado, estalando quando o destravou. Um som de metal antigo retiniu contra o silêncio assim que a grade da cela rangeu, se abrindo.
Namjoon olhou para o seu parceiro uma única vez, um sorriso ladino beirando o canto de sua boca, depois pisou fundo para dentro do espaço escuro. Derek o seguiu em passos deliberados e vincos acabaram se formando em sua testa quando ele a franziu.
Derek viu os contornos escuros de uma silhueta de joelhos no chão, sentada nos calcanhares. Uma manta clara cobria seu corpo como se fosse um vestido feito à mão. Era uma menina. Não dava para identificar seu rosto, visto que sua cabeça estava abaixada e os cabelos caindo para frente, entretanto, bastava apenas observar seus movimentos oscilantes para saber que ela estava sob o efeito de alguma coisa.
Uma luz resplandeceu acima. Era uma lâmpada velha e suspensa, que balançava de um lado a outro no alto de suas cabeças.
– Hannah, acorde! – Namjoon quase bradou, o tom rigoroso, mas ela não se moveu.
Derek olhou para baixo, vendo a forma que ela se desequilibrava por vezes para o lado, como se estivesse embriagada. Ele raciocinou e sua única reflexão era que a menina estava aprisionada naquela masmorra desde o incidente no leilão. Talvez como punição, pensou Derek.
– Acorde sua vadia! – berrou Namjoon, mais forte, acertando um chute no tórax dela.
Seus olhos se esbugalharam, assustados e seu cabelo, molhado pelo suor, foi arremessado para trás. Ela tentou se erguer do chão, mas seus pés descalços escorregaram e ela acabou patinando para trás, suas costas acertaram a parede dura e um gemido grotesco fugiu de sua garganta.
Meio retorcida, Hannah ficou com apenas um ombro amparado na parede enquanto seu peito subia e descia rapidamente. Ela olhou na direção de Namjoon, friamente, e friccionou o canto da boca, mostrando toda sua raiva com o sorriso fino que se rastejou pela boca dele.
Movida pela ira, Hannah se atirou na direção de Namjoon, mas as correntes em seus pulsos chacoalharam como um coro de sinos ao vento e limitou sua distância dele. Ela foi puxada para trás depois de tentar se lançar contra ele de novo.
– Acho bom não tentar isso, mocinha. – alertou o líder, alargando mais o sorriso com a falha dela. – Você precisa mesmo é ficar drogada pra parar de ser tão rebelde.
– Me solta daqui! – ela ordenou em um grito.
Namjoon estalou a língua no céu da boca, negando; no instante seguinte, chamou um dos capangas com um gesto. No momento que o grandalhão se aproximou, ele esticou a palma e uma seringa foi colocada na sua mão.
– Se tentar me atacar de novo, vou aplicar isso em você e vai passar o dia alucinando. – Ele sacudiu a injeção com um líquido amarelo enquanto recebia o olhar assombrado da menina. – Entendeu?
Ela olhou para a expressão insensível de Derek, escondida sob as sombras, e voltou-se para o homem em sua frente, acenando a cabeça fracamente.
– Eu não ouvi.
– Sim, senhor.
– Boa menina. – Ele sorriu, depois olhou para o capanga ao lado. – Coloque a cadeira.
O grandalhão arrancou uma cadeira velha no canto mais afastado da cela e colocou-a atrás dela. Alguma coisa chamuscou em sua garganta e ela acabou engolindo com dificuldade quando reparou naquele par de olhos frios se aproximando.
Derek podia ver uma contusão em seu rosto, sua face estava muito branca e havia cortes pequenos em sua testa e bochecha. Seus olhos fixaram-se nela com um olhar de ofuscada confusão, mas sem um pingo de piedade.
Hannah sentou-se na cadeira após um gesto duro feito por Namjoon. Ela colocou as mãos sujas e acorrentadas sobre seu colo e abaixou a cabeça; sentia-se tonta e com os pensamentos bagunçados. Sabia que Namjoon estava drogando-a, mas não fazia ideia do motivo.
Ele agachou, colocando seus frios olhos castanhos no nível dos de Hannah, então, a olhou por baixo.
– Você vai fazer o que eu mandar, fui claro? Vai usar as palavras que eu permitir que use e se comportar direitinho, se quiser ficar livre da injeção por alguns dias. – explicou ele, seu tom baixo, mas carregado de severidade. – Me dê a câmera.
O marmanjo trouxe um tripé com uma câmera simples apoiada em cima, já ligada, e a posicionou de frente para a menina. Namjoon já havia se levantado e agora estava com as mãos enfiadas nos bolsos, sorrindo baixinho com o pânico estampado no rosto dela.
– O que vai fazer? – Derek perguntou, beirando o corpo dele.
Então o homem o encarou, um risco maligno brincando em seus lábios.
– Dar um pequeno susto nos meus oponentes fardados.
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