⍟ thirty two

Jungkook dormiu por 6 horas, ele sentia partes do seu corpo protestarem com leves dores nas costas e um peso nas pálpebras. Ele estava cheirando ao perfume do travesseiro, quando saiu da cama, pestanejando e gemendo, desejando apenas enfiar o rosto entre as cobertas e dormir por mais tempo. Entretanto, o dever o esperava.

Com isso em mente, ele trocou as roupas casuais por um terno medular e uma calça social bem adequada às suas pernas, espalhou sua essência amadeirada e arrumou os fios emaranhados. A bandeja com os petiscos que Jimin levou estava com os pratos vazios em cima da escrivaninha. Ele a deixou sobre a pia quando se retirou do quarto e sondou os cantos do apartamento; provavelmente, Jimin estaria em seu quarto lendo algum livro ou dormindo. Infelizmente, isso era tudo que o lugar poderia oferecer de distração para ele, por mais que Jungkook quisesse proporcioná-lo com algo melhor.

Então ele acabou seguindo pelo corredor, direcionando-se à sala onde eles estavam reunidos horas antes. Logo que abriu a porta, Jungkook olhou à distância e enxergou Seokjin ao lado de Yoongi; havia um mapa da cidade estendido num painel de vidro e ambos o analisavam. Quando ouviram o som da porta chiar, os dois pares de olhos caíram sobre ele com cuidado, porém espantosos.

Um sorriso rompeu as feições de Yoongi e ele avançou até Jungkook, o qual já tinha fechado a porta e dado alguns passos para perto. Ele se moveu facilmente; Yoongi podia sentir uma composta preocupação firmemente controlada em seu rosto.

– O que estão fazendo? – perguntou enquanto examinava o esboço com dezenas de linhas e nomes.

– Olha só para ele, a aparência parece melhor, não acha, Seokjin? – brincou, tocando seu rosto à medida que recebia empurrões na mão para que se afastasse. – Estávamos esperando por você, donzela.

– Colocamos esse mapa aqui para estudar o local exato que eles vão nos oferecer para a troca – explicou Seokjin, confiscando algumas pastas sobre a mesa.

– Então já devem ter decidido que eu vou? – Jungkook quis saber, percebendo a troca de olhares entre eles.

– Nós decidimos aceitar a sua escolha, contanto que haja um plano perfeito para eles não te pegarem – esclareceu Yoongi, com um olhar tomado por segurança. – Conversamos com a equipe de estratégia, eles já estão elaborando táticas entre os possíveis locais. Geralmente, costumam fazer em ambientes isolados e de difícil acesso às pessoas.

– Eles vão querer verificações de que estou sozinho.

– Não se preocupe, faremos eles pensarem que está sozinho, mas o nosso pessoal vai estar espalhados como pessoas normais, porém armados. – Seokjin garantiu, fazendo Jungkook exalar fundo. – A não ser que tenha desistido de ir no lugar do menino.

– Não. Eu vou no lugar dele. – Seu tom herdou uma nota mais carregada, profundamente grave. – A questão é que eu não sei se vou voltar.

– Olha aqui, você nem ouse tentar começar. – falou Yoongi, buscando parecer bravo, mas demonstrando sua urgente aflição.

– Estamos trabalhando nisso justamente para que volte. – Seu chefe assegurou, o olhar penetrante como se amarrasse as dúvidas de Jungkook e arremessasse-as para longe. – Vamos entrar na estratégia deles e deixar que pensem que estão na frente, quando você der o sinal que combinaremos, então, nosso exército ataca.

– Você vai estar com um colete – completou Yoongi, ganhando o meticuloso olhar de Jungkook.

– Eles vão me revistar antes. Saberão que estou com colete e, assim, vão chegar à conclusão de que tem uma tropa nas minhas costas – acrescentou, apostando todas as prováveis chances de dar errado. – Tenho que estar desarmado, sem colete e sem escuta.

– Se eles souberem que está despido de proteção, a primeira coisa que farão será acertar um tiro na sua testa. É isso que quer? – questionou Seokjin, fazendo a resposta dele se dissolver num silêncio. – É por isso que estamos tendo esta reunião. Devemos seguir a ordem deles, mas em segurança. Você deve mostrar que está desprovido de armas, mas sem deixá-los que te revistem.

– Concordo com o Seokjin. – Foi a vez de Yoongi protestar a favor. – Eles provavelmente te querem morto, se você for com ou sem arma, eles vão te matar de todo jeito. A única certeza que temos que ter é se chegaremos a tempo de te acudir sem que se machuque.

– Estamos tirando conclusões precipitadas – assumiu Jungkook, enfatizando seu mais infalível tom magistral. – O certo é aguardar a ligação deles e depois decidir o que fazer.

– Tudo bem, eu vou levar essas pastas para o armazém. Não me demoro. – Seokjin falou, unindo os documentos em uma pilha organizada e os colocando no braço. – Se receberem a ligação, gravem a conversa. E, Yoongi, não se esqueça de rastrear de onde vem.

Ele deu um aceno suave, enquanto Jungkook ergueu as sobrancelhas questionando.

– Você não vai voltar agora? – indagou, parecendo curioso.

– Vou arrumá-los na ordem em suas respectivas caixas. Talvez isso me atrase – explicou, ignorando o insulto disfarçado nas palavras de Jungkook.

Então ele saiu da sala. Jungkook acabou torcendo o nariz de escárnio, um traço fino se contraindo em sua boca. Yoongi o observou em silêncio, uma de suas sobrancelhas vagamente suspensa em indizível inquérito.

– Controle seu deboche, bebê. – Se expressou, arrancando uma curta risada de Jungkook.

– Ele não colabora comigo.

Yoongi olhou para ele com incredulidade, por mais que discordasse dele, um sorriso divertido puxava sua boca. Ele viu Jungkook caminhar até uma cafeteira e despejar um tanto de café em sua xícara.

– Já que estamos sozinhos – ele começou, recebendo o olhar de Jungkook por cima da borda da xícara. –, você conversou com o Jimin?

Seus olhos disseram que sim.

– E o que ele escolheu? – Yoongi continuou com o questionamento.

– Não escolheu nada.

– Nada?

– Ele está pensando a respeito. Não o julgue se sua decisão for ficar aqui. – Yoongi sinalizou a mão em um gesto dramático de "Quem sou eu para fazer algo?"

Ele engoliu alguns comentários a respeito e tentou novamente, de um jeito mais profundo.

– Diante do que você conversou com ele, acha que ele tem interesse em ir? – Yoongi o observou e seu rosto tinha virado uma máscara.

– Talvez – ele tossiu.

– Eu estive pensando, e seria melhor ele não andar pelos corredores enquanto tratamos do caso. – Jungkook colocou a xícara ainda com café sobre a mesa, ouvindo-o em silêncio. – Ele terá todo conforto na casa do Seokjin e não dormirá sozinho.

Um som cortou o ar. Yoongi esbugalhou os olhos quando viu a xícara espalhar estilhaços por todo canto da sala e o café espargir pelo chão. Jungkook soltou um palavrão baixinho e se agachou para limpar a sujeira.

– Está tudo bem?

– Sim – Jungkook respondeu, recolhendo as lascas da xícara.

– Deixe isso aí, vou pedir para que limpe. Saia do chão, você precisa de uma luva para que não se corte – ele falou ao mesmo tempo em que o apanhou pelo braço para se erguer. – O que houve?

Agora, Yoongi o segurava pelos ombros e o afrontava com um olhar de puro questionamento. Ele pareceu brevemente atordoado, seus olhos encaravam o rosto dele, sem piscar, não indicando nada de seus pensamentos.

– Estou bem – disse de repente, um lampejo de consciência clareando seus olhos pretos. – Você disse que ele não dormirá sozinho? Como assim?

Yoongi lutou contra a urgência de rolar seus olhos e apenas suspirou.

– Seokjin dorme lá, se esqueceu? – O lembrou, arrastando-se até a cadeira da ponta da mesa. – Apesar de passar o dia fora, ele dorme lá.

– Está decidido, Jimin não vai.

Yoongi cruzou as pernas por cima da mesa e fabricou uma expressão cínica.

– Está dizendo que quem decide por ele é você? – Ele pulou sobre a informação e atacou, quase sério.

– Quer jogar as cartas na mesa? Vamos fazer isto – declarou o detetive, as palavras mais preocupantes. – Eu não confio no Seokjin e você sabe bem disso, mas ainda assim você insiste em discordar de mim para apoiá-lo. Sabe que a ideia dele é maluca e apesar disso continua o defendendo.

– Tem coisas que precisamos fazer sem deixar as emoções afetarem – ele revelou, parecendo querer atingir um ponto exato na consciência do detetive, o qual levantou discretamente suas sobrancelhas.

– Diga-me o que tem para dizer.

Uma respiração pesada escapou dos lábios de Yoongi e ele controlou suas palavras que mal se formaram na cabeça.

– Esqueça isso, Jungkook. Vamos voltar ao trabalho.

– Está com medo de que eu me ofenda? – indagou.

– Não.

– Então diga.

Yoongi acabou fazendo uma pausa e mordeu o lábio à medida que fitava o rosto analítico de Jungkook.

– Você deixa as emoções falarem mais alto quando se trata do Jimin – argumentou, olhando muito além dos olhos dele. – Ele é seu ponto cego, Jungkook. Quando o assunto é ele, você faz as coisas pela emoção e não pela razão. No fundo, você sabe que deixá-lo preso nesse prédio, sem nada para se distrair e exposto a se esbarrar com outros policiais, pode ser danoso para ele, mas está contra isso justamente porque suas emoções gritam em seu ouvido. Seu instinto protetor.

– Isso não é verdade.

– Nem você acredita nisso – rebateu, levantando-se da cadeira e ficando em pé na frente dele. – Você não pode vigiá-lo o tempo todo, então ele precisa estar em um lugar que se sinta bem em todos os lados.

Jungkook tinha sentido uma vibração fria se desprendendo por seu corpo ao ouvir essa última parte. Talvez uma porção de egocentrismo o controlasse naquele momento, mas ele não conseguia imaginar o garoto protegido em sua ausência.

– Vou chamar alguém para limpar esse chão – disse o detetive, dirigindo o assunto da conversa para outro conteúdo.

– Está fugindo do assunto.

– Estou evitando discutir com você, Yoongi – corrigiu, indicando a porta com o queixo. – Se me permite, tenho algo para fazer.

Yoongi segurou seu braço quando ele deu o primeiro passo. – Será que pode me ouvir pela primeira vez?

Jungkook o analisou por um longo momento, depois puxou seu braço devagar da mão dele e deslizou até a porta, deixando para trás um rosto retorcido pela confusão, e abriu-a para dar partida. Um toque contínuo e vibrante ressoou no silêncio, o fazendo paralisar entre a metade da porta. Era o telefone.

Olhares cúmplices foram trocados à medida que o aparelho pulsava. Jungkook fechou a porta e fez um gesto com a mão para Yoongi se agilizar. Este se acomodou defronte ao notebook e posicionou os fones maiores no ouvido, regulando de maneira sofisticada o microfone.

– Hackeie a localização, tente invadir a câmera do celular e transmita a conversa para a equipe de perícia em audiovisual. – Jungkook deixou a ordem, recebendo uma aprovação antes de atender o telefone. – Alô?

Como dormiu, detetive? – Foi sua primeira pergunta, e soava, igualmente, depravada.

– Melhor do que esperava. E você?

Ele queria entrar na brincadeira, então arriscaria seu jogo.

De um jeito relaxado. – A voz robótica disse, banhada de ameaça. – Embora os gritos horripilantes da menina estivessem aos pés dos meus ouvidos o tempo todo. Mas nada que uma música lenta e um vinho branco não resolvesse.

Gosta de vinho branco? – O detetive perguntou.

– Tenho gostos peculiares – rebateu, tranquilamente. Seu tom parecia derramar calmaria. – E isso inclui o corpo nu do Jimin.

As palavras seguintes se engasgaram na garganta de Jungkook, ele se concentrou no desafio dele e baniu a aversão que protestou em seu estômago.

– Está tão calado, detetive. Não gostou dessa última parte? – A voz metálica caçoou, depois uma risada incrédula rugiu no ouvido de Jungkook. – Se você soubesse como essa última parte é a minha favorita, principalmente as pernas dele.

– As instruções! – o detetive exigiu.

Oh, calma, eu ainda vou chegar lá. – Jungkook quase revirou os olhos quando a seguinte frase foi dita. – Primeiro eu quero brincar. Não gosta de diversão, detetive?

– Prefiro um jogo cara a cara.

O que me diz de adivinhações? – perguntou-o, não parecendo ter pressa alguma.

– E o que você me diz de me encarar nos olhos ao invés de se esconder atrás de uma voz metálica?

Houve um momento de silêncio até a ligação ricochetear com a risada áspera dele.

Você tem a língua afiada, policial – ele falou, rindo; depois as palavras ficaram duras como pedra. – Há um prédio abandonado em Yaletown, número 120. Quero que leve o garoto até lá no fim da noite. Ele tem que estar sozinho e sem agasalhos.

– Minha equipe pensou a respeito da proposta, e decidimos que eu irei no lugar do Jimin. – Jungkook falou num tom calmo e medido.

A pessoa do outro lado da linha estava em silêncio, e quando falou, havia irritação em suas palavras.

Queremos o garoto de volta, a decisão foi clara! – ele repreendeu com a voz quente. Jungkook olhou para o relógio no pulso, cinco minutos tinham se passado. Seu olhar encontrou o de Yoongi, e o gesto que ele fez indicava para que continuasse a conversa. – Está tentando ganhar tempo agora, detetive? A garota morre se o Jimin não estiver nas minhas mãos até amanhã!

– Por que vocês o querem tanto? – De repente, Jungkook perguntou, a pergunta parecia mais direcionada a seus próprios pensamentos. – Se fossem por medo de que ele nos contasse sobre o esconderijo de vocês, tenho certeza que já teriam se preocupado em vir o quanto antes atrás dele. Mas vocês o deixaram escapar de propósito, porque no fundo há outro objetivo.

Você é o analista aqui, descubra você. – Foi o que ele refutou, mas a vibração em sua voz indicava que ele não estava tão ciente do pensamento de Jungkook.

Seu olhar correu à Yoongi e uma conclusão imediata gritou em sua cabeça. "É o Derek ", foi o que seus lábios disseram.

A proposta foi ordenada. Traga o Jimin e a amiguinha inútil dele, vive.

– Você não vai matá-la. – Assegurou-se, a tensão em seus ombros indo embora logo que percebeu que esta frase o atingiu. – Não fará isso porque a garota é a chave para conseguir o Jimin. Ela é a única pessoa que pode fazê-lo desistir de tudo e se entregar. Mas sabe qual é a melhor parte? Eu não vou deixar. Então você pode ameaçá-la de morte, só que se fizer isso, você vai perder. Ninguém além da Hannah pode o afetar tanto, emocionalmente. Foi por isso que você a usou como isca e continuará usando até conseguir o que quer. Mas entenda uma coisa, Derek , eu vou te encontrar antes que toque um dedo nela. Quando eu fizer isso, vai desejar nunca ter encostado sua mão podre no Jimin; eu vou desfigurar a sua cara inteira e nem o diabo vai te reconhecer.

Controlar seu temperamento estava, oficialmente, longe de questão. Yoongi o analisou, pasmado e engoliu a saliva com dificuldade, voltando ao seu estado normal quando a voz robótica chicoteou seus fones.

Ora, ora, ora, você parece mais aguçado, policial. Está tão confiante assim? – Sua voz era uma tempestade grotesca de deboche, mas no fundo havia notas vacilantes e Jungkook conseguiu capturá-las. – Vou repetir novamente: traga-me o Jimin ou a garota morre. – ele fez um barulho estranho com a boca, parcialmente, como um riso depravado. – Talvez você esteja certo, eu não vou matá-la. Mas o lugar onde ela está vai contribuir para uma morte lenta e dolorosamente satisfatória. Você me deu uma ótima ideia, detetive, a morte demorada é muito melhor do que um rápido disparo de bala. Eu gosto de ver a dor, então vai ser divertido vê-la agonizar no chão enquanto treme de frio e implora por ajuda.

Jungkook manteve o olhar fixo no telefone, sem emitir qualquer palavra. Agora era ele quem tinha perdido a noção de raciocinar e deixado evaporar todas as opções guardadas em sua mente.

Yoongi acenou em sua direção, cortando seu momento de transe. Seus movimentos diziam que havia conseguido alguma coisa, então ele exilou a confusão momentânea e pensou com mais cuidado.

– Se não me quer no lugar do Jimin, então tente novamente. Eu vou encontrar a Hannah e, se quer um conselho, deseje não estar por perto quando esse dia chegar – garantiu, cuspindo uma ameaça forte e incontrolável. – Talvez a amante do seu chefe me conte algumas coisas. Lembra dela, Derek ? A infiltrada? Ela está muito bem com as algemas nos pulsos. Não se esqueça de dizer ao seu chefe que a vadia dele não pode mais conseguir as informações. Vocês vão precisar trabalhar melhor de agora em diante, eu vou estar atrás de você quanto menos esperar.

Seu tom nivelado disparou o aviso agressivo, tão agressivo que deixou a pessoa do outro lado em completa mudez; possivelmente, em choque. De repente, o toque finalizador da chamada tiniu continuamente, indicando que a ligação foi encerrada.

– Caramba, você calou a boca dele, literalmente. – Yoongi falou com ênfase, retirando os fones.

– Me mostre o que descobriu – falou sem rodeio, caminhando de encontro ao outro. Seu rosto estava cheio de preocupação.

– Essa ligação foi de um celular, diferente da primeira que recebemos, por isso foi mais fácil identificar a localização. Só que as câmeras do celular estavam cobertas, por essa questão não consegui ver o rosto do sujeito – explicou Yoongi, apontando para o local onde pulsava um círculo vermelho em volta. – Foi daqui que veio a ligação.

– O que tem no perímetro de um raio?

– Casas, comércios, parques, mas nada de boates. – respondeu, consultando o rosto rígido de Jungkook. – O que acha disso?

Um suspiro aborrecido escapou da boca de Jungkook, ele deu uma longa e considerável olhada para a tela do notebook, no instante seguinte andou de um lado a outro com os dedos presos na nuca, pensativo.

– Eles queriam que fizéssemos o rastreamento. – afirmou o detetive, esfregando o interior dos olhos. – É por isso que cobriram a câmera, sabiam que estaríamos preparados para localizá-los.

– Então não vamos até lá? Nem, sequer, mandar duas viaturas para fazer uma sondagem? – Seus olhos encontraram os de Jungkook. – Se eles queriam que nós os achássemos, então fizeram direito.

– Mas não vamos dar isso a eles. Amanhã cedo colocaremos policiais disfarçados de pedestres para investigar aquela zona. Por algum motivo eles queriam que soubéssemos. E isso me faz pensar que pode haver alguma pista lá.

– Talvez câmeras de segurança? – supôs Yoongi.

– Eles não ficariam expostos às câmeras, mas aos moradores eu não tenho tanta certeza. – Um fino sorriso riscou seus lábios e Yoongi sorriu ao mesmo tempo.

– Está dizendo que alguém que estava lá pode ter visto eles? – O detetive acenou com convicção. – Eu não tinha parado para pensar nisso.

– Andrew e outro policial vão verificar amanhã. Nós os desestabilizamos, pelo jeito, não sabiam que a Rose foi presa. Temos uma vantagem.

– Eu não contaria vitória antes. Eles parecem saber exatamente onde estão pisando. – Yoongi deslizou até a cafeteira e colocou café em duas xícaras, entregando a segunda para Jungkook. – Como você mesmo disse, jogar o garoto aqui dentro soa como parte do plano deles.

– Deles não. Do chefe – Jungkook o corrigiu, tomando um gole de seu café. – Não viu como ele ficou perdido quando citei uma hipótese? Jimin está aqui dentro porque faz parte do plano do chefe dele e não dele. É por essa questão que nem ele mesmo soube me responder.

– De qualquer forma, há um cérebro extremamente inteligente calculando tudo. – Jungkook fez um pequeno gesto e balançou sua cabeça para cima e para baixo. Então, Yoongi estreitou os olhos e se inclinou para perto dele, falando em um tom confidencial. – Aliás, como você sabe que era o Derek no telefone?

Jungkook estava quase sorrindo porque ele sabia, pontualmente, o que havia retido da ligação sem ao menos escutá-la de novo, mas ele apenas deu de ombros e colocou uma pitada de açúcar no café.

– A voz da pessoa de hoje estava diferente da voz de ontem. Ele parecia mais desesperado, não controlava a ansiedade quando falava do Jimin, muito menos escondia a possessão por ele. – Jungkook se relembrou do seu tom e lamentou-se. – Como também não escondeu a repulsa assim que citou a Hannah. Ele tem raiva dela por algum motivo que direciona ao Jimin. – Seus olhos encontraram os de Yoongi no meio da sala. – Se dependesse dele, ela já estaria morta.

– Esse cara é maluco. Ele devia ir para um manicômio ao invés da prisão – disse em uma voz condescendente, parcialmente afetado pelas palavras de Jungkook.

– Bom, você pode cuidar desse maluco, eu vou resolver outra coisa – disse o detetive e, por um rápido instante, o estupor vidrado nos olhos de Yoongi desapareceu.

– Espera aí, onde você vai? Eu achei que fôssemos no prédio abandonado.

– Que horas decidimos isso?

– Eu estou decidindo agora – falou com o peito estufado. Jungkook acabou bufando.

– Chame o Seokjin, tenho algo para fazer.

Jungkook atravessou por ele e percorreu até a porta. Yoongi abriu a boca e a fechou sem saber o que dizer. No final, ele apenas expirou forte e sentou-se na cadeira quando a porta se fechou num estalo. Estava decidido a encontrar pistas sobre o local da ligação e o prédio indicado para a troca. Quer dizer, a antiga troca, dado que Jungkook arremessou um conjunto de insultos ao malfeitor, o fazendo ficar sem palavras e sem ação.

Além disso, havia um fiapo de curiosidade coçando a mente de Yoongi para saber o que Jungkook estava prestes a fazer. Ele não sabia explicar, mas um pensamento sinistro agitou sua cabeça, dizendo que tinha relação com Jimin.

Entretanto, ele apenas ignorou essa observação e rolou os olhos novamente para a tela do notebook.

✮✮✮

Jimin passou a mão na calça pela terceira vez. Estava tão notório o seu nervoso, que ele não conseguia controlar a necessidade de limpar suas palmas toda vez que as sentia escorregadia. De todas as coisas que podia pensar, quaisquer delas estavam, incontrolavelmente, norteadas naquela manhã.

Sua memória voltava para o momento em que Jungkook o convidou para acompanhá-lo até a biblioteca. Ele se lembrava do estreito sorriso enfeitando a boca dele, da forma suave de formular as palavras e no seu tom brando dizendo-lhe que o ensinaria a lutar.

Lutar? Por Deus, Jimin não conseguia se imaginar lutando. Não sabia nem, sequer, deixar os punhos alinhados e tesos. Tinha dificuldade para realizar um simples chute na bunda do Taehyung quando este o perturbava para acordar, quem dirá aprender golpes especializados. Jungkook teria um problemão para instruí-lo, e ele teria o rosto vermelho ao passar por este vexame.

Quase derrubou um telefone vermelho pendurado na parede no momento em que dobrou o corredor da biblioteca. Ele acabou gemendo e passando a mão por cima do ombro. Seu olhar hesitou no fim do corredor e seus passos foram interrompidos abruptamente, deixando seus pensamentos se tornarem um conjunto de complexidade deturpada quando sua audição captou o som de algumas vozes masculinas se aproximando.

Um mau presságio se espantou dentro dele. Jungkook havia dito que no início da noite os guardas faziam patrulha pelo prédio e que era arriscado ele sair nesse horário. Um tremor involuntário despertou seus sentidos e ele correu para dentro da primeira porta que enxergou ao lado.

Escondido atrás da porta, Jimin avistou, pela fresta, uma dupla fardada caminhar na direção que ele viera. Um frio congelante roçou sua espinha quando um porte musculoso passou em sua frente, uma espingarda amparada nas mãos enquanto duas pistolas eram mantidas no coldre da sua perna.

Ele colocou a mão contra a boca para conter sua respiração e deixou a sala assim que os guardas contornaram a escada, seguindo para a direção acima. Por um momento, ele continuou olhando as botas de couro esmagando os degraus acima de sua cabeça, depois se atentou em alcançar a sala da biblioteca.

Mais adiante, uma faixa de luz bruxuleante atravessava por baixo de uma porta, como sombras oscilantes, então Jimin se moveu a caminho dela. Ele segurou a maçaneta e olhou para os dois lados antes de empurrá-la com cuidado. Antes que a abrisse por completo, uma silhueta familiar acomodada na poltrona da escrivaninha prendeu seus olhos.

Jungkook estava sob a fraca luz do castiçal, com metade do rosto iluminado pelas flamas. Os cantos da biblioteca estavam escuros, exceto pelo dossel luminoso que as velas formavam em torno da escrivaninha. Havia um notebook em sua frente e, às suas costas, a noite se derramava em contínuas e barulhentas gotas de chuva contra a enorme janela de vidro.

Ele parecia tão concentrado, que não se deu conta da presença do menino. Seus amendoados se semicerravam diante de alguma informação que lia e sua língua fazia uma rápida aparição sempre que ele umedecia os lábios, atento.

Jimin deu um suspiro silencioso e seu corpo estremeceu quando recebeu o olhar dele por cima da tela. Pequenas rugas se desenharam no canto de seus olhos quando ele sorriu, e o menino só agradeceu por estar na parte escura da sala e Jungkook não poder enxergar como suas bochechas esquentaram de repente.

– Entre – pediu. Sua voz soou tão suave que podia ter sido um sussurro.

Lutando para segurar o nervosismo, o menino fechou a porta e tropeçou à frente, quase que esbarrando nas estantes com livros.

– Está sem energia? – O sorriso do detetive aumentou.

– Na verdade não vamos ficar aqui por muito tempo e eu, também, não quero chamar atenção – respondeu, o vendo se aproximar da mesa com uma expressão parcialmente confusa. – Mas se quiser eu posso acender as luzes.

– Não, está tudo bem assim. – Ele encaixou as mãozinhas acima da mesa e encarou o notebook. – O que o senhor está fazendo?

– Bloqueando a câmera da sala de treinamento. Não quero que eles te vejam entrando comigo em uma área apenas para policiais.

– Pensei que o senhor fosse me ensinar aqui – ele disse com uma cara divertida. Jungkook correu o olhar para ele e riu.

– Acho que aqui não tem espaço suficiente para o que vamos fazer – argumentou, olhando em volta com seu jeito teatral.

– Então me pediu para vir para cá porque não queria que eles soubessem que eu fui para a sala de treinamento? – Jungkook confirmou com um leve aceno. – Parece um pouco arriscado.

O detetive verificou uma mensagem positiva brilhar na tela e sorriu. – Não mais.

Após conseguir romper uma das câmeras de acesso a sala de exercício, Jungkook fechou o notebook e deixou a poltrona. Uma sensação estranhamente reconfortada viajou pelo corpo de Jimin, e ele não se mexeu nem quando sentiu-o dar a volta pela mesa.

Atento, os olhos do garoto dançaram, curiosamente, na forma zelosa que o detetive fechava uma bolsa preta no chão e a erguia por cima do ombro. Ele quase desviou o olhar quando, lentamente, o rosto de Jungkook se virou ao seu. Recusando-se a ceder a vergonha, Jimin sustentou o olhar e um estranho silêncio se instalou na biblioteca.

– Podemos ir? – O detetive perguntou, mas não houve resposta além de um suave aceno.

De frente as costas de Jungkook, Jimin analisou sua jaqueta acompanhar o movimento de seus ombros enquanto o acompanhava até a saída. Logo após puxar a maçaneta da porta, um barulho de pegadas rigorosas cortou o silêncio do corredor.

Instintivamente, o braço de Jungkook se esticou contra Jimin, um gesto intuitivo e que o fez interromper os passos na metade do caminho. O mesmo braço deslizou-o, cuidadosamente, de encontro a parede que dividia o corredor da biblioteca, deixando-o escondido.

Uma sombra apareceu na parede do corredor, aproximando-se. Um medo sobrenatural se agitou dentro de Jimin e seu coração disparou.

– Senhor, ouviu algum barulho? – Uma voz diferente dirigiu a pergunta a Jungkook.

Ele estava na entrada da porta, relativamente encostado no batente da porta para mascarar a presença de Jimin.

– Que barulho? Não ouvi nada. – O menino levantou os castanhos amedrontados ao detetive e se afundou ainda mais no escuro.

– O telefone estava desajustado e a porta da sala com aviso está aberta. – Jimin conteve um soluço na garganta ao se recordar que havia esquecido de fechar a porta.

– Talvez algum policial tenha a esquecido aberta. E sobre o telefone, qualquer um pode se esbarrar nele – Jungkook refutou, com seu tom inexorável, impondo, fortemente, sua autoridade. – Cuide de coisas mais importantes do que um simples telefone.

– Sim, senhor.

O guarda se distanciou em pegadas longas e apressadas. Um suspiro de alívio fugiu dos lábios de Jungkook e sua visão disparou à Jimin, retraído na parede.

– D-Desculpa – ele sussurrou, tremendo.

– Eles observam tudo nesse lugar. Acho que devemos nos apressar agora, não acha?

Jimin agitou a cabeça depressa e rastejou os pés para fora da biblioteca depois do detetive pedi-lo para seguir à frente, diretamente para o setor de preparação. Era inusitado pensar que, minutos antes, ele estava nervoso por conta de aprender a lutar e que, em seguida, sentiu-se, satisfatoriamente, reconfortado ao ver Jungkook na biblioteca, mas que, ao se deparar com o guarda novamente, acabou provocando uma queda absurda em sua coragem.

Honestamente, não havia planejado se preparar para isso, nem sequer sabia como dar um tapa na cara de alguém. No entanto, tinha interesse em desenvolver suas habilidades na luta, pelo menos para se defender um dia. E Jungkook parecia disposto a ajudá-lo nisso, ele só devia agradecê-lo ao invés de se sentir tão deprimido.

No fundo, ele não entendia onde se despertou essa sensação de rebaixamento.

Jungkook entrou na mesma sala que Jimin o viu treinando boxe da última vez, e o menino acabou reparando que, desta vez, os sacos grandes não estavam pendurados, mas havia equipamentos diferentes no canto da sala.

– Prefere luvas ou faixas? – Jungkook perguntou do outro lado, pousando a bolsa no chão.

– Tem alguma diferença?

– Luvas são mais resistentes, não machucam seus dedos. Faixas apenas evitam cortes e ferimentos profundos. – Jimin arregalou os olhos e um sorriso divertido despertou na boca do outro. – Não se assuste, não vamos usar nada que te machuque.

– Então eu prefiro as faixas.

Com um aceno entendedor, Jungkook voltou-se para os instrumentos dentro da bolsa, caçando as faixas para as mãos. Jimin estava inquieto, ele não conseguia deixar a perna parada. Nervosismo? Medo? Incômodo? Ele não sabia dizer, mas estava sentindo um conjunto misto de efeitos estranhos.

– Está nervoso, Jimin? – De repente ele ouviu a pergunta, vendo as costas de Jungkook viradas a si, ainda vasculhando a bolsa.

A garganta do menino se fechou, dificultando colocar as palavras para fora. Sem querer, ele lançou os olhos aos próprios pés, sem nem mesmo compreender o que se passava em sua mente.

Com as tiras brancas nas mãos, Jungkook carregou-as até o garoto e as entregou para ele. Jimin segurou sem ao menos encará-lo nos olhos. No entanto, quando as puxou, elas não vieram com suas palmas. Jungkook havia prendido.

– Vou entender se não quiser tentar – falou, finalmente, recebendo os olhos dele.

– Eu quero. – Sua afirmação não o convenceu. – Mas... – Ele desceu a cabeça, controlando suas emoções. –, eu devia ter tomado mais cuidado quando me escondi daqueles guardas. Se não fosse o senhor, eles podiam desconfiar que fui eu que entrei lá dentro. Me desculpe.

– É por isso que está tão calado? – Um suave meneio de cabeça sancionou sua pergunta. – Veja bem, se não tivesse se escondido, provavelmente eles iriam te ver. Se isso acontecesse, então não teríamos a chance de estar aqui agora. Está dentro dessa sala porque foi esperto o bastante para se esconder deles.

– O senhor acredita mesmo nisso? Eu tenho medo de andar na frente deles, como vou aprender a lutar desse jeito?

– Aprender a lutar depende da sua agilidade e resistência, não da sua coragem. – O menino considerou, por um momento, a sua explicação, refletindo a respeito. – É a mesma coisa quando entramos no colégio, não sabemos nada até que nos ensine. Quando você entrou na escola de dança, sabia dançar?

Aquela referência o pegou de surpresa, mas ele não se ofendeu pela rápida avaliação.

– Não.

Ao invés de responder, Jungkook apenas reagiu afrouxando as mãos e deixando que as faixas deslizassem, prontamente, às mãos dele. Jimin sentiu a batida de seu coração se atrapalhar no instante em que ele deu um passo à frente, colocando uma fita sobre a sua cabeça para prender os fios soltos e evitar que o atrapalhasse.

– Então aprenda a lutar comigo.

Uma linha de admiração sobressaltou nos olhos de Jimin e uma corda invisível amarrou sua atenção a ele de um jeito irrefreável, quase que em transe.

Jungkook era a unificação do risco e a certeza, enquanto Jimin se atava ao medo e a dúvida. Eram diferenças espantosas, mas que, por trás, guardavam uma conjunção de reforço e prestação, uma dessemelhança, tentadoramente, perigosa.

De repente, o menino começou a enrolar as faixas pelos dedos. Jungkook sorriu e se afastou, arrancando a jaqueta das costas e ficando apenas com a blusa branca por baixo. Ele suspendeu as mangas longas na altura dos cotovelos e apanhou um par de luvas almofadadas da bolsa, posicionando-as nas mãos.

– Vamos começar testando seus socos – comunicou Jungkook, situando as almofadas de frente ao tronco.

Jimin olhou para elas sem saber o que fazer exatamente, entretanto, com um leve movimento dos olhos escuros a sua frente, ele entendeu que devia acertar as almofadas. Então ele o fez, atingindo o macio das luvas, mas seu golpe não saiu tão bem como ele esperava.

– Deixe os cotovelos abaixados, endureça os punhos quando for golpear e não se esqueça de sempre manter suas mãos protegendo o rosto – instruiu Jungkook, preparando as almofadas outra vez.

– Como aprendeu a lutar?

– Em Virgínia, quando fui selecionado à academia de treinamento do FBI. – Jimin se mostrou, brevemente, surpreso.

– Então o senhor entrou como eu?

– Todos começam errando na primeira vez. A melhor parte é quando se domina. – Seu esclarecimento serviu para o garoto agir com mais uma batida em luta com as almofadas.

Eles trabalharam uma sequência de vezes na forma correta de equilibrar os punhos antes de lançar os socos de forma direta. O choque brusco das mãos dele impactando-se com as luvas acolchoadas formava um eco contínuo na enorme sala.

– Isso parece mais apropriado para um ringue – Jimin assumiu, arrancando uma risada gostosa do outro.

– Bom, sim. Mas como irá se defender sem saber como agredir os pontos sensíveis?

– Pontos sensíveis?

– Sim, tem partes no nosso corpo que são sensíveis a qualquer pancada, se você souber onde ficam, então só precisa saber atingi-las. – Sua explicação foi imparcial e objetiva; o menino acabou entreabrindo a boca e deixando um som arrastado sair, parcialmente surpreso, parcialmente entendedor. – É por isso que precisamos treinar suas habilidades com as mãos. Quer tentar mais uma vez?

Jimin aceitou, caminhando alguns passos para trás e se preparando para seu novo soco. Ele se amaldiçoava por ficar tão aflito diante de uma simples atividade. Eram apenas golpes com as mãos, certo? Ele não precisava se preocupar tanto se iria efetuá-los corretamente.

Jungkook estendeu as mãos em frente ao corpo e esperou que elas fossem atingidas pelos murros, que acabaram sendo executados de um jeito falho.

– Bata com mais força – pediu Jungkook, alinhando os pés aos ombros numa posição que não o surpreendesse para trás quando fosse atingido. Jimin bateu, relativamente, mais compacto. – Outra vez – induziu o detetive, recebendo outro golpe. – Outra vez, Jimin – ele pediu novamente e uma sequência de pancadas foi desferida contra sua mão enluvada.

Na última delas, o braço de Jungkook recebeu o impacto para trás, declarando que o soco havia sido mais forte do que até o próprio Jimin esperava.

– Me desculpe, eu te machuquei?

– Não, está tudo bem. Eu quero que seja assim, se agarre a essa resistência e direcione toda força para os seus punhos.

– Falando assim parece tão fácil – ele se queixou, deslizando as costas da mão pela testa. – Mas eu quero acertar sua mão de novo.

Aquilo pareceu um desafio. Jungkook deixou uma sobrancelha subir, furtivamente, e espremeu os cantos da boca, totalmente injetado pelo comportamento desafiante do outro.

– Ora, gostei de ver. – O menino quase sorriu. – Eu sou um tanto apegado a desafios.

– Talvez isso estimule um pouco a minha vontade de socar alguém. Então, eu preciso me testar.

Algo diferente se agitou nos olhos de Jungkook, ele apenas parou para pensar, embora sua decisão já estivesse tomada.

– Tente me acertar.

Esta foi sua deixa, clara e concreta. Ele sacolejou as luvas e se preparou em posição de defesa. O menino enrijeceu os punhos e olhou diretamente para o alvo. Logo que moveu a mão para frente, Jungkook afastou as suas para os lados e o seu movimento acabou morrendo abruptamente, interrompendo-se a poucos centímetros do peito alheio.

Ele engoliu seu fôlego com dificuldade, quase apavorado, e o encarou, praticamente, em pânico.

– Eu quase acertei o senhor – ele repetiu, recolhendo a mão que havia movimentado.

Sua mente estava paralisada para pensar com clareza.

– Devia ter atingido. Mas você pensou rápido e parou quando percebeu que não estava prestes a acertar as almofadas – argumentou, removendo as luvas dos dedos e atirando-as para o outro lado. – Isso é um bom sinal, você agiu com a cabeça também, não apenas por impulso.

– E o que foi isso?

– Seu autocontrole. – Os braços de Jimin afrouxaram, ligeiramente, diante da surpresa da resposta. – Mas agora precisamos treinar sua defesa. A técnica nos socos você pode aprender com o tempo, mas a técnica da defesa é mais precisa.

– E como eu me defendo?

Jungkook olhou atentamente para ele e pensou. Havia muitas maneiras de ensinar Jimin a se proteger, porém não sabia distinguir qual delas era a mais eficiente e menos assustadora para ele.

– Eu posso te explicar como funciona e dizer onde ficam os pontos sensíveis – ele pausou, tomando cuidado com as palavras –, ou então te mostrar na prática.

Percebendo sua sensível relutância em dizer a última parte, Jimin acabou se interessando por ela.

– Pode me ensinar dos dois jeitos.

O detetive deu uma segunda olhada para ele e pigarrou quando notou a sua ausência de resposta.

– Tem certeza?

– Eu só preciso saber me defender. Não vou estar com o senhor para sempre, então tenho que começar a me cuidar sozinho. – Jungkook balançou a cabeça, brandamente, e preparou as palavras posteriores.

– Precisa saber que existem três lugares fatais para se ganhar tempo de fugir – começou a falar, observando os castanhos a sua frente brilharem com um certo interesse. – O nariz, o estômago e por fim a virilha. Quando alguém te prende por trás, você tem todas essas alternativas. Basta pensar rápido e agir na hora correta.

– E como eu consigo fazer isso? – Sua voz tinha mudado, notas de curiosidades vagavam entre as palavras.

– Precisa segurar o braço que está em volta do seu pescoço e firmar sua cabeça. Quando você sentir que está pronto, ataque com o cotovelo contra o estômago dele. Quatro pancadas vão ser suficientes para que o sujeito se curve, então você tem duas opções: acertar o nariz dele quando se livrar do braço que te prendia ou chutar os testículos dele. Mas também existe uma terceira opção, onde você pode chutar o lugar que foi atingido antes, no caso o estômago dele.

– Então se eu for preso por trás, devo usar o cotovelo?

– Exatamente.

– O senhor pode me mostrar como é? – A urgência em seu tom tremeu, ele piscou os olhos uma sequência de vezes.

Houve um suspiro suave, em seguida um sorriso franco se expôs em seu rosto, cedendo ao seu pedido.

– Tudo bem, eu irei te dizer algumas coisas e você tenta reproduzir o que eu disser, certo? – O menino chacoalhou a cabeça num breve sim.

Jungkook deu a volta por ele e se agitou às suas costas, ficando bem próximo de seu corpo, porém numa distância considerável.

– Eu vou simular alguém que quer te prender por trás. Se, em algum momento, você se sentir desconfortável, me diga. – Jimin curvou o rosto para o lado, deixando metade do seu rosto acessível aos olhos do detetive.

– Sim, senhor.

Limpando a garganta, Jungkook andou alguns passos e se inclinou para frente, colocando lentamente o braço em volta do pescoço dele, sem tocá-lo em qualquer parte. Ele viu as costas do menino darem um leve solavanco, certamente, surpreso pela proximidade tão desconhecida.

– Segure meu braço com as duas mãos, como se tentasse se soltar ou afrouxar o aperto. – Embora estivesse com o braço longe de tocá-lo, ele queria trazê-lo para dentro de sua momentânea simulação.

Jimin falhou quando tentou engolir a saliva diante do vento quente soprando sua nuca. Ele o sentia tão perto, mas seu corpo estava tão longe do que ele presumia que estava. Toda sua força e calor se dissolveu e ele, finalmente, acabou segurando o antebraço do outro com as duas palmas.

– E-Eu acho que não tem problema o senhor me tocar. – ele falou, envergonhado, se referindo a distância respeitável do braço de Jungkook do seu pescoço.

– Não quero que se assuste.

– O senhor não me assusta – ele disse, sua voz murmurando no intermédio daquele vasto espaço.

Após sua permissão, Jungkook enganchou seu cotovelo no pescoço dele gentilmente, parecendo tomar cuidado para não o assustar. Mesmo que não fosse uma ameaça, qualquer toque falho podia ser crucial para que ele tivesse uma má lembrança do que passou.

O coração acelerado do menino diminuiu.

– Vai usar o cotovelo para atingir meu estômago, continue acertando até que eu me curve. No momento eu sou seu inimigo. – Sua voz quente, real e de aceitação, escorria como mel aos ouvidos dele.

Jimin entendia que aquilo era só um teste, mas ele estava, relativamente, com medo de perder o controle quando o acertasse e acabasse o machucando de verdade.

Com um gosto amargo subindo por sua garganta, ele soltou sua mão do braço de Jungkook e empurrou o cotovelo para trás, não com muita força. Um murmurinho às suas costas o pediu para repetir o movimento mais três vezes. Ele o fez, só que sem atingi-lo.

– Muito bem, Jimin – ele elogiou, vendo a surpresa estampada nas feições do garoto ser ligeiramente seguida de satisfação. – Você tem que acertá-lo até que ele se curve, certo? Depois disso, você vai se livrar do meu braço. Estou te prendendo com o direito, você vai virar para o lado contrário assim que sentir o aperto se afrouxar.

– E como sabe que o braço dele pode folgar?

– Porque ele vai se arquear para diminuir a pressão dos seus golpes. Por isso não terá resistência no braço quando o fizer, e é nesse momento que você precisa se livrar dele.

Jimin deu a ele um aceno de apreciação. Tudo ficaria memorizado em sua mente, só precisaria treinar mais vezes para pegar as habilidades certas.

De repente, ele se endureceu, espremendo o braço de Jungkook quando o agarrou com suas mãos, o driblando por cima da cabeça e usando seu peso para rolar seu corpo para o lado esquerdo. O detetive foi pego de surpresa, ele não havia dado a voz de autorização. Entretanto, sua agilidade o agradou.

Apesar do acontecimento súbito, Jungkook sorriu e sua expressão se tornou mais focada e metódica de um jeito suave. Seu braço estava esticado entre as pequenas palmas do menino.

– Acerte meu estômago com um chute e corra. Ou então agrida meu nariz para que me deixe ainda mais vulnerável. – ele determinou num tom delicado.

– Está falando sério?

– Na simulação.

Jimin suspirou aliviado; no instante seguinte, escorregou seu pé para frente e fingiu um chute na região torácica dele. Para sua surpresa, Jungkook segurou seu calcanhar.

– Não pode dar tempo para ele pensar, Jimin. Muito menos que se recupere.

– E-Eu achei que isso fosse uma simulação.

– É sim, mas precisa entrar dentro dela e achar que está enfrentando um inimigo, não eu. – Ele deixou seu pé com cuidado e voltou à posição anterior.

– Eu não sou forte o suficiente – reclamou, quase desapontado.

– Crie sua própria estratégia e surpreenda seu adversário. Isso depende da sua agilidade como também da força.

Jungkook sugeriu, arrancando um pensamento vagaroso do menino. Ele podia ter sucesso, só precisava pensar em como se defender de um inimigo.

Então uma lembrança ácida mergulhou em sua cabeça e ele se lembrou de Derek . Lembrou-se das chicotadas em suas costas e das mesmas marcas que viu hoje de manhã no espelho que, por sinal, o fizeram derramar lágrimas por todo rosto.

Enfiando as unhas contra a pele da mão, desta vez ele refez o movimento anterior em Jungkook, forçando-o a perder o equilíbrio com um golpe em seu joelho, seguida por uma rápida sucessão de ataques e socos. Ele se defendeu de todas as investidas, mas no final permitiu que o último golpe encontrasse seu peito, o fazendo cambalear para trás.

– Muito bom – ele disse, os cantos de sua boca subindo.

– Eu fiz isso mesmo?

– Usou muito bem seu controle e velocidade, continuou atacando mesmo depois de eu ter perdido o equilíbrio. Esse é o ponto chave. – Tranquilidade suavizou os olhos de Jimin e ele acabou sorrindo com triunfo pela primeira conquista. – Nos próximos treinos, eu quero te preparar para se esquivar de ataques e a usar seu corpo para derrubar o sujeito. Já fez chave de braço alguma vez?

Jimin teve uma lenta surpresa, na qual ele se envolveu com fascínio.

– Chave de braço? – Seu sorriso ficou maior. – Meu Deus, não! M-Mas eu quero aprender.

Jungkook riu e desceu as mangas da blusa, marchando até sua jaqueta sobre a mala.

– Vou te ensinar passo a passo, hoje foi só um aquecimento. Podemos voltar no final de semana, pode ser? – perguntou, recebendo um aceno frenético em resposta.

Os olhos do garoto escanearam o, meticuloso, sorriso que ainda desenhava o seu rosto quando o mesmo se virou de frente a ele. E então ele deslizou as faixas dos dedos e a tira da cabeça e os devolveu ao detetive.

– Posso te perguntar uma coisa? – Jungkook se ofereceu, meio relutante, ouvindo um murmurinho em autorização. – Você pensou sobre nossa conversa de hoje cedo?

O coração do garoto afundou. Ele não tinha pensado a respeito de ficar ou partir para a casa de Seokjin. Talvez, se aprendesse a lutar e soubesse as habilidades certas de como se defender, isso o fizesse ir. Mas no fundo ele não sabia se somente isso bastava.

– O que o senhor prefere? – refutou com uma pergunta. Jungkook o estudou com um olhar contemplativo, perspicaz, porém moderadamente indizível.

– Não cabe a mim responder isso por você, Jimin.

– Por favor.

O detetive continuou o encarando nos olhos, e, em silêncio, um aceno murcho agitou sua cabeça.

– Eu gostaria que não fosse. – ele falou em voz baixa. – Mas se aqui não te faz bem, então prefiro que vá.

Lançando um olhar comovente a Jungkook, o menino fitou seu rosto e engoliu com dificuldade a saliva.

– Eu não acho que lá seja melhor do que aqui – sussurrou, uma emoção abrupta pegando sua voz.

Aquela parecia uma decisão pronta, embora Jungkook não alcançasse a definição dela. Por um momento, o silêncio dominou os cantos daquele vasto espaço, deixando que as gotas furiosas da chuva fizessem contato com a grama do lado de fora e fosse o único som soprando em seus ouvidos.

– Eu vou para o quarto – ele comunicou, com um nó na garganta por vê-lo tão distraído. – Espero não encontrar aqueles guardas no corredor de novo.

Ele riu, mas não havia emoção em seu ato. Enquanto Jungkook tinha sido coberto por uma preocupação contida.

– Posso te levar até lá. – Jimin sacudiu a cabeça para os lados.

– É melhor não. Não é bom que nos vejam sozinhos... a essa hora.

– Olha, Jimin, eu não quero que vá para a casa dele. Você me perguntou isso e estou te respondendo com sinceridade – assumiu de supetão, como se as palavras estivessem engasgadas há muito tempo. – Eu estive trabalhando dia e noite para te encontrar. A partir do momento que eu consegui isso, automaticamente, você passa a ser responsabilidade minha. Eu não me perdoaria se te levassem de volta, por isso não quero que aceite o convite de alguém que desconfio, cegamente, aqui dentro. – Jimin se agarrou aos olhos dele, tentando expulsar o frio que bateu em seus ossos após suas palavras. – Mas, por outro lado, o que me importa é, além da sua segurança, a sua saúde. Se não se sente confortável na presença desses guardas e prefere ir, eu apenas deixarei que faça.

Jimin estava, vagamente, abalado pela resposta que tanto esperava ouvir. Jungkook se importava com ele, tanto que foi capaz de declarar sua desconfiança afiada do próprio chefe. Ele estava movido a uma profundidade de receio gritante, porque, no fundo, não se sentia merecedor de toda essa proteção.

Havia desconfiado de Jungkook inicialmente, porventura de todos os testes cruéis que Derek o fez passar para provar sua lealdade, para que, no final, pudesse usá-lo como um saco de lixo. Ele tinha apodrecido sua mente de tanto afirmar para si mesmo que Jungkook não passava de mais um fantoche que Derek dava a ordem e ele cumpria.

E mesmo depois de desconfiar, de pensar coisas horrendas a respeito do detetive, ele enxergava o lado humano de Jungkook, o lado que guardava sua dedicação e sinceridade. Ele dificilmente desistia, enquanto Jimin se rendia no primeiro segundo.

– Eu não quero ir, nem nunca cogitei ir – falou ele, controlando a instabilidade em sua voz. – Eu gostei de lutar com o senhor.

Com um pequeno sorriso no rosto, o detetive respondeu:

– Se saiu muito bem para uma primeira vez.

– Eu tenho um bom professor. – Eles riram juntos, suavizando o clima que, até pouco tempo, parecia maculado pela tensão. – Se não se importa, pode me acompanhar até o quarto? Eu, realmente, não estou afim de encontrar seus colegas de trabalho.

A garganta de Jungkook chiou com uma leve risada e seu queixo se agitou na direção da bolsa preta no chão, onde situava um punhado de equipamentos para treino dos mais variados tipos. Jimin sacudiu sua visão ao local indicado e encontrou todos eles espalhados no chão e acima da bolsa.

– Vou precisar de uma mãozinha antes.

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