⍟ twenty
Jimin abriu os olhos com dificuldade, sentiu os músculos de seus braços e pernas tremendo de exaustão. A textura sólida e fria do chão fez com que seus ossos gritassem por socorro. Em seu pequeno corpo bradava a insaciável dor que o circundava por consequência do maciço.
Sua visão perdeu o foco e os joelhos bambearam para o chão quando finalmente tentou se levantar. Uma dor insuportável atravessou sua cabeça e, mesmo estando sacudindo de frio, o suor escorria por sua testa até a curvatura do pescoço, sendo possível vê-lo gotejando de seu lábio superior.
Ele colocou ambas as mãos na cabeça, tentando, de uma forma inútil, dissipar a dor que parecia surgir como um som agudo rugindo contra seus ouvidos. Seus joelhos se ergueram do chão e então ele os abraçou com necessidade, procurando conter a agonia furtiva que caminhava por seu corpo.
As mangas longas do casaco que Eric tinha lhe dado estavam úmidas de seu suor. Ele as encarou com espanto, depois se abraçou para controlar o tremor da febre.
A lembrança do que havia acontecido o invadiu de repente e, ao descer suas vistas, ele enxergou o vestido e as meias curtas. A fumaça fugia de seus lábios à medida que os suspiros escapavam de seus pulmões.
Tentou dominar a palpitação acelerada de seu coração, que parecia esmagar seu peito, e se cobriu ainda mais com o casaco, mas a temperatura estava tão baixa que aquele tecido se tornava insuficiente perto da vibração constante de seu corpo.
Uma sensação impulsiva cresceu dentro de si e sua própria mão foi levada para os olhos na tentativa de abafá-los da claridade assim que a porta metálica rangeu em denúncia de alguém.
Jimin levantou a cabeça apenas o bastante para ver, na penumbra, uma silhueta alta e musculosa cruzando a porta precisamente. Eric entrou em passos acelerados, fincando as solas dos sapatos no chão com certa urgência.
Agachou-se perto do menino, formando uma sombra sobre o rosto dele, e ficou em silêncio por infindáveis segundos até que finalmente juntou as palavras para dizer:
— Derek está vindo. — sua fala ecoou baixa, como se aquele assunto fosse um segredo. — Preciso que me dê o casaco de volta antes que ele o veja.
O menino não se moveu, seus lábios tremiam continuamente e a cor de seu rosto havia desaparecido com a energia de seu corpo. Os traços delicados ganharam a lividez do frio, como se tivesse acabado de dormir sobre o gelo.
Quando Eric não o viu se bulir, ele direcionou suas mãos até o casaco, livrando-o daquele pequeno corpo que estremeceu ainda mais com a ausência do tecido. Os olhos selvagens que antes avistara, estavam, naquele instante, acusando uma crescente preocupação. Jimin o olhou lentamente, estudando o rosto dele antes de pronunciar qualquer coisa.
— Por que não me ajudou quando eu te pedi? — o lembrou, seu tom era baixo, quase como um cochicho, e percebeu a surpresa do homem ao ouvir sua pergunta.
— Aquilo fazia parte do meu trabalho. Eu ganho para isso. — mesmo relutando para respondê-lo, Eric deixou uma segurança absurda escorrer de suas palavras.
Jimin sentiu o frio congelar suas roupas quando o calor do outro corpo se distanciou do seu. O homem repousou o casaco sobre o antebraço e se afastou para um canto mais escuro, longe do fulgor de luz que atravessava a entrada da porta.
E como se uma grande energia arrefecida tivesse soprado sua pele, o menino orientou sua concentração até a porta, assustado, e saltou quando um rosto familiar apareceu na cela.
Lá estava Derek com seu típico ar superior, usando as botas requintadas e o sobretudo brilhante da noite passada, exalando poder através de seus passos finos e bem elaborados.
Aturdido, Jimin deixou seus olhos caírem na arma que ele sempre carregava na cintura. E, naquele momento, finalmente desejou roubá-la para usá-la em si e acabar de vez com todo sofrimento.
Derek se agachou, deixando seus braços frouxamente apoiados nas coxas. Havia um brilho duro e implacável em seus olhos, o que fez o garoto estremecer.
Quando sua mão se esticou para tocar o rosto do menino, ele recuou para fora de seu alcance. O movimento de sua palma parou no momento que ele o viu inclinar a cabeça. E então, um guincho de dentes cruel endureceu a expressão de Derek, na qual orientou sua mão mais uma vez, tocando o pescoço dele delicadamente.
— Está com muita febre. — ele disse, parecendo paciente em suas palavras, enquanto mudava a localização de sua mão a cada instante. — Eric, leve ele para o quarto e dê roupas quentes. Depois me acompanhe até a reunião. Vou precisar de você comigo.
Após dizer aquilo, ele se levantou do chão e deu espaço para que Eric o segurasse nos braços, o carregando no colo.
Com as pálpebras quase que fechadas, Jimin sentiu a claridade dos refletores atingindo seu rosto quando Eric o conduziu para fora da cela. Não enxergava nada além das paredes cobertas por tijolos antigos e os archotes pendurados sobre elas, formando uma trilha até a saída.
Parecia que tinha acabado de sair de uma masmorra, um lugar com ausência de luz e tremendamente sombrio. Nunca tinha visto essa parte da boate, mas acreditava que era porque nunca havia sido punido severamente ao ponto de ser levado até lá.
Cansado, ele deixou sua cabeça tombar no ombro de Eric para descansar os olhos, sentindo seu corpo balançar de acordo às pegadas dele. Sentia-se fraco e, naquela altura do campeonato, não se importaria em quem estivesse se apoiando.
Alguns passos a mais e Jimin já podia vislumbrar as luzes fortes de um outro corredor quando abriu os olhos novamente, o qual suspeitou ser o caminho para o quarto de Derek. Havia dois homens na frente da porta servindo de segurança.
Um rangido de pegadas às suas costas o fez olhar na mesma direção e automaticamente seus olhos encontraram os de Derek, sombrios. A mandíbula dele estava levemente travada e, ao esbarrar nos olhos do menino, ela se desfez de repente.
Eric gesticulou a cabeça para um dos seguranças, que girou a maçaneta e se afastou da porta. O homem entrou no cômodo morosamente, carregando o corpo do menino na direção da cama.
Com seus olhos indiscretos, Jimin alcançou a imagem de Hannah no canto esquerdo do quarto. As emoções que surgiram quando ele se deparou com a menina não foram boas. Aquele lugar lhe dava calafrios na espinha.
Seu corpo foi colocado acima do colchão e, como se uma linha invisível o arrastasse inconscientemente, seu olhar afluiu na direção dela, que estava com uma linha fina em volta dos lábios.
A figura de sua amiga foi cortada ao meio quando Derek bloqueou sua visão, sentando-se ao seu lado.
— A Hannah vai cuidar de você enquanto eu estiver em reunião. — Jimin engoliu a saliva quando sentiu a ânsia se manifestar. Como ele podia ser tão fingido? Parecia ter esquecido o acontecimento da noite anterior. — Há dois seguranças na porta, assim que ela terminar, eles vão levá-la. — ele subiu uma mão até o rosto do menino e acariciou a sua bochecha com o polegar. — Não fiz a ligação e pretendo não fazer se você se comportar bem da próxima vez.
Não houve resposta por parte do garoto e o homem nem esperou por uma, apenas selou os lábios dele e se afastou. Levantou-se da cama e virou-se de frente para a garota isolada no canto. Quando ela enxergou a escuridão nos olhos dele direcionadas à si, sua postura mudou abruptamente e, então, ela endureceu a coluna contra a parede.
— Acho bom você cuidar bem dele, não quero ter de o ver com febre quando voltar. — a ameaça deslizou rudemente por suas palavras.
Ela assentiu duas vezes, sem encará-lo. E então, as pisadas duras no chão a fizeram perceber o caminho dele para fora do quarto. Esperou que a porta fosse fechada para correr, desesperada, na direção do amigo. Seus braços o envolveram com devoção, sentindo-se retribuída quando Jimin a abraçou de volta.
— O que esse desgraçado fez com você, meu anjo? — ela questionou, inclinando seus olhos para baixo para avaliar a roupa que ele vestia.
— Não me pergunte isso, por favor, eu não quero ter que lembrar. — respondeu com dificuldade, e sem perceber, seu inferior tremeu em denúncia da febre.
— Vou pegar uma roupa mais aquecida para você. — ela o isolou por curtos segundos enquanto agarrava a muda de roupa que trouxera. — Acho que isso serve.
Ela retornou com uma blusa de manga comprida e uma calça moletom que parecia suficientemente grande comparada ao corpo de Jimin.
— Obrigado. — sussurrou, soltando as palavras com impasse, em seguida se ajeitou para fora da cama, sentando-se com as pernas para fora do colchão.
— Consegue se vestir sozinho enquanto eu molho o pano? — a cabeça dele balançou em uma confirmação silenciosa.
À vista disso, ela abandonou as roupas sobre a cama, ao lado do corpo dele, e caminhou até o banheiro.
Mesmo com os músculos do corpo sensíveis, Jimin conseguiu se mexer aos poucos para tirar o vestido e depois as meias. Seu corpo estava tão quente que ele chegou a suspeitar que uma fornalha se acendeu dentro dele. Vestiu primeiro a calça e em seguida se abrigou sob a blusa quente. No mesmo impulso em que se enroupou, ele caiu de cabeça no travesseiro. A sensação era de que mil botas de aço estavam caminhando por suas costelas e costas.
Hannah retornou com um pano úmido entre as palmas, ela acabou sentando ao lado dele, onde deslizou as costas da mão pela sua testa, sentindo a temperatura aquecendo sua pele. Seus dedos sutis separaram alguns fios da testa dele, colocando-os para trás, e sem demora localizou o tecido molhado em cima.
— Por que o Derek quis que ficasse comigo? — ele perguntou baixo, com os pequenos olhos se fechando e abrindo lentamente por causa do cafuné que ela começou a fazer em seu couro cabeludo.
— Ele acha que sou a melhor pessoa para cuidar de você nesse momento. — ela pegou um par de meias que estava ao lado do traje e andou até os pés da cama, cobrindo os pés gelados do garoto. — Isso vai ajudar a diminuir a febre.
— Hannah... — sua voz eclodiu contra a audição dela, que depositou sua concentração nele.
Sua boca abriu para continuar, mas as palavras morreram no caminho, e ele a fechou. Quando ela percebeu a sua falta de coragem se manifestando como uma premonição ambígua no rosto alheio, seus pés marcharam na direção dele.
— Pode dizer, meu anjo. — sua mão se apertou contra a dele em modo de encorajamento.
Jimin olhou em volta, explorando o quarto à procura de alguma coisa que nem ele mesmo sabia decifrar qual era, depois seus olhos mergulharam nos dela.
— Se eu tirasse minha vida, você me perdoaria? — a pergunta foi como um choque para Hannah, que não evitou demonstrar o espanto em cada traço de sua feição.
— Está pensando em fazer isso? — sua cabeça pendeu um pouco para o lado e a menina entendeu o movimento como um sim. O suspiro que ela deixou partir de seus lábios em seguida foi frustrante. — Entendo que esteja pensando em fazer isso, meu anjo, eu mesma já pensei inúmeras vezes, mas tirar sua vida não vai livrá-los do que eles merecem.
— Vai livrar meu sofrimento. — ele concluiu com notas frias.
Hannah acariciou a palma dele com o polegar e seus olhos verdes o fitaram com mais atenção.
— Talvez sim, mas essa não é a melhor opção. — Jimin sentiu uma pontada de egoísmo asfixiá-lo, sua fisionomia foi tomada por uma expressão de puro desânimo. Hannah apertou a mão dele como forma de fazê-lo olhar em seus olhos. — Ontem você estava tão feliz com a ideia do policial e de repente passou a ter esse tipo de pensamento.
— É porque você não sabe o que me aconteceu ontem. — ele apertou as têmporas, tentando se livrar da preocupação que ecoava como uma dor incômoda.
Hannah espremeu os olhos como se acusasse sua incerteza e depois acariciou os cabelos macios de seu amigo, enquanto sua outra mão massageava a dele com afeição.
Ela podia sentir o suor dele escorregando pela lateral do rosto e se habitando no travesseiro. Os pequenos olhos haviam perdido a cor por conta da temperatura, então ela virou o pano para o lado contrário, buscando a parte fria.
As memórias daquele lugar eram de sangue, terror e dor. Hannah podia imaginar o que Jimin passou nas mãos de Derek, por isso revelou um sorriso confortável, acolhedor e saturado de entendimento.
— Posso imaginar o que esse desgraçado te obrigou a fazer, meu anjo, só que eu nunca vou aceitar que você tire sua vida por causa disso. — o rosto dele estava relaxado, embora uma fisgada de vulnerabilidade ainda refletisse em seus olhos. — Eu te perdoaria se fizesse, mas sinto que minha obrigação é te mostrar um pouco de esperança.
— Você mesma disse que não devemos ter esperança vivendo num lugar como esse. — seus cílios estavam levemente fechados por causa da claridade do quarto.
— Tem razão. — disse ela, apertando a palma dele, agora, com suas duas mãos. — Mas nós ainda podemos sair daqui.
Os traços dele foram preenchidos pela confusão e suas sobrancelhas subiram instantaneamente.
— O que você quer dizer? — ele lançou um olhar emaranhado na direção dela.
Hannah se retificou, olhando pelos cantos à procura de algum corpo além do deles. Bisbilhotou a porta e, mesmo sabendo que haviam dois seguranças do lado de fora, sua intuição a alertou que tudo estava limpo.
Seus olhos correram de encontro aos dele e Jimin captou o seu semblante cintilando.
— Ontem, quando eu e as meninas fomos trabalhar, o Yixing nos deu alguns convites para que distribuíssem aos clientes. Eu não pude ler tudo o que estava escrito, mas me parece que vai haver um leilão. — naquele preciso momento, Jimin se levantou tão abruptamente que o pano em sua testa desabou em seu colo.
Os olhos dele se arregalaram e, por um momento, sua expressão ficou assustadoramente pasma.
— Isso quer dizer que...
— Eles estão fazendo um leilão para arrecadar mais dinheiro, como no desfile. A única diferença é que não seremos vendidas, apenas compradas por uma noite. — ela explicou com seu tom baixo, evitando deixar a informação solta pelo ar para não entrar em ouvidos errados.
— Você vai? — seus olhos amoleceram e a tristeza denunciou seu medo.
— Acho que todas as meninas vão dessa vez, meu anjo. — a mão dele se afrouxou contra a dela e, muito de repente, Hannah percebeu que ele estava nervoso.
Ele soltou um suspiro pesado, tão pesado que era capaz de fazer seu peito apertar rigorosamente, então puxou seus joelhos para cima enquanto abraçava-os.
— Não fique assim, Jimin. Talvez o policial esteja lá. — o garoto sobressaltou ao ouvir aquela palavra.
Policial. Uma palavra tão simples, mas que existia um significado forte por trás dela. Ele procurou o ar até que criasse fôlego para perguntar:
— Você acredita em mim?
A sua amiga o segurou pela mão mais uma vez, lhe passando uma confiança que talvez já tivesse sido dissolvida dele a muito tempo.
— Eu tenho que começar a acreditar em alguma coisa, não é? — um sorriso furtivo surgiu nos lábios dela, mesmo que não houvesse humor em sua reação. — Ter esperança de algo é o que pode nos motivar a fugir daqui. E também ele já invadiu o desfile, se descobrir sobre o leilão, talvez a gente tenha sorte.
— Hannah — ele a segurou com suas duas mãos, colocando a outra sobre a dela. — Se você o encontrar, tente dizer onde estamos.
— Eu já tentei fugir várias vezes, vi coisas que podem nos ajudar a sair daqui. Se ele vier atrás de mim, eu vou contar o que vi. — o rosto de Jimin se iluminou, e apesar do suor repentino em sua testa, aquele brilho evidenciava outra coisa. — Eu só preciso que você me ajude com alguma característica dele para que eu possa reconhecer.
— Eu... Eu não o vi, estava tão escuro na hora. — ele abaixou a cabeça, mexendo os olhos pelo ar enquanto fuçava suas memórias. Forçou até que uma vívida imagem flutuou no fundo. — Ele parecia um pouco maior do que eu pela sombra, não um pouco, talvez da mesma altura que Taehyung. A voz era baixa e ele parecia não ser muito velho.
— Tem algo mais que eu deva saber? — a menina quis saber.
— Quando o Eric fingiu me ajudar no início, ele foi educado e insistente, mas quando ele falou comigo, eu percebi o jeito que ele tentava me compreender. — Jimin deixou seus olhos caírem em um ponto fixo, como se estivesse hipnotizado. — Ele estava tentando se colocar no meu lugar.
— Então talvez ele seja um detetive, meu anjo. — Jimin desfocou daquele ponto e focou sua visão nela. — Análises comportamentais. É o que eles fazem. Já assisti muitos filmes, e acredite, dá até medo ver a forma que eles te olham, parece que estão querendo invadir sua alma.
— É, ele me perguntou se podia se aproximar quando me viu com medo. Eu disse que não e ele continuou parado.
— Ele vai nos achar de novo. — ela disse por fim, virando-se apenas quando a porta rangeu à denúncia de alguém.
O segurança estava com metade do corpo para dentro e a outra metade para fora. Seu semblante era de poucos amigos e aquilo assustou a garota brevemente. A voz rouca e sufocada rugiu em seus tímpanos.
— Está na hora, mocinha. Já acabou? — a sua fala desdenhosa a fez acenar levemente em resposta, então ele fez um gesto com a cabeça, chamando-a até a porta.
Antes de se levantar, ela sussurrou:
— Continue fingindo que está doente, Derek não vai te tocar se souber que está debilitado. Mesmo que a febre passe, finja uma dor no corpo ou um desmaio. — ela sorriu para ele e, finalmente, Jimin sentiu um lado do colchão nivelar com a ausência do peso do corpo dela.
Antes de sair, ela lhe deu um sorriso promissor, sendo puxada pelo braço para fora do quarto instantes depois. Jimin expulsou o ar pela boca e se afundou na cama, deslizando o cobertor sobre seu corpo para controlar o frio daquele inverno.
✮✮✮
Com os olhos pregados na estrada, Jungkook apertou a mão contra o volante e virou à esquerda. Yoongi orientou os olhos a ele, vendo sua mandíbula rígida e o braço escorado na janela do carro, enquanto o indicador massageava o próprio lábio superior, pensativo.
Apesar da velocidade do carro, sua atenção não fugiu da estrada adiante nem por um segundo. A neblina do lado de fora estava abafando um pouco sua visão, mas aquilo não era suficiente para fazê-lo diminuir a velocidade. Apesar dos ruídos de tráfego, Yoongi podia ouvir o súbito arfar de Jungkook.
— Acha que ele vai estar em casa? — Yoongi cortou aquele silêncio que começava a ficar assustadoramente irritante.
— São cinco horas da manhã. — respondeu de forma óbvia. — Ou ele está em casa, ou passou a noite fora.
— Prefiro acreditar na primeira opção. Quero colocar o desgraçado de joelhos no chão para o interrogar. — ele fez o mesmo movimento que Jungkook e apoiou seu braço na superfície do vidro, inclinando a cabeça um pouco para o lado até que estivesse recostada.
As suas pálpebras se fecharam devagar, quase cedendo ao sono que o puxava com impulso e, de repente, seus olhos se abriram quando o carro parou subitamente. Seu corpo chacoalhou para frente e sua atenção correu para a neblina lá fora, notando o sinal vermelho pulsando entre a fumaça de nuvens.
— Olha, eu não dormi por sua causa, então espero ter algum resultado nessa busca. — a voz de Yoongi soou mais lenta do que ele gostaria. Estava realmente com muito sono.
— Pensei que ser um detetive não tivesse horas exatas para analisar casos, fazer buscas e estudar locais de crimes. — Jungkook falou, o canto de sua boca estava caviloso.
Ao ser afrontado, Yoongi o encarou com os olhos semicerrados, mesmo não sendo correspondido por aquele que estava no volante. O sinal abriu e então Jungkook fez o motor roncar quando afundou o pé no acelerador.
— Você tem razão, mas não quando se passa cinco anos analisando os mesmos relatórios. Sério, aquelas palavras estão até agora flutuando na minha cabeça. — Jungkook finalmente o olhou, exibindo uma expressão sagaz e docemente deliberada.
— Não seja tão exagerado. — Yoongi abriu a boca para protestar, mas se interrompeu no meio do caminho. Jungkook estava olhando direto para ele, o canto de sua estreita boca curvado em diversão. Então, ele voltou a estudar as sinuosidades da estrada, segurando, desta vez, o volante com suas duas mãos. — Posso perguntar uma coisa?
— Acabou de fazer isso. — respondeu, mudando a direção de seus olhos para a estrada também. — Mas vou deixar que faça outra.
Jungkook sorriu um pouquinho e então disse:
— Quanto tempo a Rose treinou antes de ser chamada para o Departamento?
Houve um silêncio inopinado após aquela pergunta, até que de repente a voz de Yoongi foi ouvida.
— Não sei dizer, o Seokjin é o único responsável por essa informação.
— Eles já tiveram um caso, não tiveram? — a dúvida escorreu duvidosamente por suas palavras, deixando Yoongi com os fios em pé, desconfiado.
— Por que quer saber disso? — ele o olhou e Jungkook lhe devolveu o olhar rapidamente, sua expressão parcialmente relaxada. — Não me diga que você não deu uma chance a Rose porque ela já teve um caso com o nosso diretor.
Jungkook curvou as sobrancelhas, incrédulo, depois expirou meio impaciente, meio cético, voltando a se concentrar na estrada à sua frente. Um arfar inesperado entregou seu aborrecimento por aquela dúvida imoderada.
— Ela não faz o meu tipo. A questão aqui é outra.
— Eu estava só me divertindo com sua cara. Mas não, não foi bem um caso, eles quase chegaram a ter um relacionamento sério. — Yoongi respondeu.
— Isso já tem cinco anos?
— Ou mais que isso. — ele viu o queixo de Jungkook se movendo lentamente, como se um sorriso clandestino surgisse de repente. — Mas o que isso tem a ver? Eu estou sentindo que você quer chegar a algum lugar.
— Apenas acho estranho não haver registro dos treinamentos dela e, ainda assim, ser a escolhida para trabalhar em um caso tão polêmico como esse. — suas mãos voaram pelo ar, dando ênfase em sua meia indignação. — Sabe, ela é nossa parceira, devíamos saber mais sobre ela.
— A Rose deve ter mostrado as estratégias dela para o Seokjin, por isso ele a contratou. Ela sempre foi uma mulher inteligente, não me surpreendo de ter sido escolhida.
— Você a defende tanto, detetive. — suas notas sarcásticas saltaram para fora de sua garganta como facas afiadas.
— Não fique com ciúme, ela me impressionou assim como você fez no primeiro dia.
— Estamos em uma competição?
— Você continua sendo meu favorito. Isso te acalma? — um meio sorriso pitoresco aguçou o canto da boca de Jungkook.
Um brilho se evidenciou na tela do celular de Yoongi, indicando uma mensagem. Ele ergueu o aparelho de frente aos olhos e leu o recado mentalmente. Jungkook o espiou pelo canto do olho, o vendo guardar o celular no bolso do terno. Os traços de seu rosto se robusteciam de repente e um suspiro volúvel escapou de seus lábios.
— Taehyung?— Jungkook supôs, o olhar fincado inexoravelmente no trajeto.
Yoongi o encarou, os olhos arregalados pela pergunta.
— Por Deus, eu não falo com ele há dias.
— Mas bem que gostaria, não é? — um sorriso sacana explodiu em seu rosto, então Yoongi bufou em seu banco.
— Não curto garotos de dezoito anos.
— Dezenove.
— O quê? — perguntou, surpreso, e no momento seguinte, sentiu seu corpo se inclinar para o lado quando Jungkook girou o carro, entrando em uma esquina de casas aglomeradas.
— Ele completou 19 anos semana passada. Caso queira dar uma conferida... — ele fez um leve gesto na direção do notebook alojado no banco de passageiro.
— Você bisbilhotou a vida do garoto? — Jungkook não evitou colocar a língua na parte interna da bochecha enquanto um sorriso sacana se despertava em seu rosto. Aquilo significava um sim.
— Eu dei uma conferida para você. Fica me devendo essa.
Jungkook passou o carro por baixo de um arco de árvores que coroavam a estrada e virou à direita, para dentro de uma vaga espaçosa.
— Isso está muito errado. — ele balançou a cabeça em negação, mas não havia aborrecimento em seu gesto.
— Você curte garotos, aproveite a chance. — Yoongi entreabriu a boca, confuso, e depois riu.
— E você, o que curte? — Jungkook desejou engolir em seco, mas quando seu inconsciente o alertou de fazer, sua parte instintiva foi mais ágil, então ele projetou o melhor sorriso.
— Aquela é a casa? — mudou de assunto subitamente, olhando com mais atenção para além do para-brisa.
— Vou fingir que você não está evitando falar que adora chupar um pau e vou responder a sua pergunta: sim. — Jungkook gargalhou, mas por dentro um gelo arrepiou sua pele.
Ele estacionou o carro em uma rua curvilínea e cheia de árvores na calçada. Estava vazio, exceto por alguns gatos perambulando em volta de uma lixeira na entrada de um beco.
Jungkook abandonou o carro, olhando em volta para sondar o terreno. Lá fora, o ar escuro da manhã tinha o intenso sabor do inverno, por isso ele friccionou suas mãos com força para esquentá-las. A lua ainda estava no céu manchado pelo cinza. Ao longe, uma coruja piava lastimosamente.
Seu rosto recebeu o impulso do vento e uma massa de ar esfriou suas narinas. Ele passou as mãos cobertas por luvas por cima do cachecol e o jogou levemente contra o local, buscando aquecê-lo. Yoongi surgiu logo atrás, arfando sons baixos sob a vibração do queixo.
Ele beirou o corpo de Jungkook e esperou que ele andasse a caminho da casa indicada, porém o seu parceiro se obteve parado, estudando-a com seus olhos intensamente negros, distraindo-se apenas quando uma lata de lixo desabou no chão. Os gatos subiram em cima e começaram a cavar em busca de comida.
— Não estou afim de congelar nesse frio. — Yoongi sussurrou sob sua respiração.
— Vamos entrar.
Jungkook e Yoongi conduziram os pés por cima da neve acumulada sobre a pista. O cabelo de Jungkook bagunçou levemente por conta do vento e seus lábios ficaram estupendamente vermelhos. O sobretudo escuro que usava estava com os botões fechados e com a faixa amarrada em torno da cintura.
O topo das árvores estava coberto pela neve, mas a manhã não estava nevando. Apenas uma ventania rodeava cada perímetro da cidade, o suficiente para fazer muitos tremerem o queixo de frio.
Jungkook subiu na calçada, afundando seus pés na grama, agora branca, e passou por uma curta trilha de pedra que levava à varanda. Ele subiu o primeiro dos três degraus lentamente enquanto retirava a arma do coldre em sua perna e uma lanterna do bolso externo do casaco.
Ele a esticou na direção da porta da frente e virou a cabeça para Yoongi, que se posicionou do outro lado da porta. Eles lançaram um olhar cúmplice e então Yoongi também sacou a arma. Jungkook se aproximou mais um pouco, buscando algum ruído no interior da casa, mas estava absolutamente quieto.
Ele olhou através do vidro da janela, no entanto a escuridão sombria era tudo o que cingia o interior da casa.
— Elliot Campbell, aqui é o FBI! Abra a porta! — Jungkook exclamou, só que não houve retorno. Apenas o silêncio.
Yoongi se mexeu devagar, removendo os olhos da porta para averiguar o âmbito. Quando se concentrou em Jungkook novamente, seus olhos pescaram o movimento repentino de seu dedo para que ele desse a volta pela casa.
— Se não abrir a porta agora, nós vamos arrombar! — sua voz se agravou e, novamente, não aconteceu nada.
Por isso, Jungkook gesticulou para que Yoongi cercasse os fundos da residência enquanto ele ia pela dianteira. Com isso, Yoongi movimentou os pés passo a passo para não deixar evidente a sua presença. Jungkook, por outro lado, segurou a maçaneta da porta e então a chutou com força, fazendo a madeira rachar no meio.
Ele direcionou a arma na direção que a luz da lanterna estava iluminando. Seus pés sacudiram pela sala, passando por um tapete peludo que descansava ali. Uma televisão e um sofá moderno estavam instalados no meio do cômodo. Havia uma garrafa de cerveja e um maço de cigarro acima de uma mesa de centro.
Com passos moderados e cuidadosos, Jungkook se inclinou para baixo e viu a garrafa recém-aberta. Ele estudou em volta, lançando a luz da lanterna em várias partes da casa até que focou em um corredor que levava à cozinha. A sala de estar ficava à sua esquerda, mas não havia nada lá dentro.
O homem parecia ter fugido com pressa, deixando tudo para trás, inclusive um cigarro recém aceso. Jungkook presumiu que uma ligação ou uma mensagem imediata o fez romper sua noite, o que, possivelmente, causou sua fuga inusitada. Ele já suspeitava de quem poderia ter sido a informação, mas deixaria que as provas dessa concepção brotassem espontaneamente.
O barulho de uma madeira rangendo na cozinha ecoou contra seus ouvidos, então ele segurou a arma com mais força e se dirigiu pausadamente na direção do ruído. Desligou a lanterna para não deixar evidente a sua presença no local, e continuou beirando a parede para evitar mostrar sua sombra.
Quando seu corpo penetrou a cozinha, a arma foi apontada intuitivamente para o canto. Yoongi ergueu as mãos na altura do queixo, deixando escapar um suspiro de alívio quando se deu conta de quem era. Jungkook relaxou os ombros e abaixou o revólver.
— Podia ter avisado que já tinha entrado. — o detetive Jeon sussurrou na escuridão.
Pelo alvor da meia lua que ainda pairava no céu escuro da madrugada, era possível ver a expressão de Yoongi entre as luzes apagadas.
— Pensei que tivesse alguém aqui. — Yoongi retrucou, esboçando uma expressão de pânico.
— Ainda falta olhar no andar de cima. Veja se acha alguma coisa que pode incriminá-lo. — sugeriu Jungkook.
Antes que Yoongi dissesse algo, ele abandonou a cozinha e atravessou o corredor até que estivesse subindo a escada.
Atencioso, Jungkook rolou os pés pelos degraus e, quando chegou no último, ele diminuiu a velocidade das pegadas. Em uma mão ele ergueu a arma, a outra ele apoiou embaixo com a lanterna. Seu pulso estava sustentando o outro levemente, enquanto seu olhar compenetrado vagava por cada raio.
Havia duas portas naquele corredor, e ele suspeitou que uma delas fosse o quarto de Elliot. Plantou os sinais de seus sapatos em frente à primeira porta e então, devagar, a abriu. Ele canalizou o brilho da lanterna ao redor de todo cômodo antes de entrar totalmente.
A cama estava devidamente arrumada, como se Elliot não tivesse dormido em casa. Alguma coisa parecia soar suspeito. Até o momento, aquilo ainda não havia sido decifrado por Jungkook, que endureceu a expressão subitamente.
Ele conduziu os pés até o armário, esperando encontrar muitas roupas e acessórios, uma vez que, ao julgar pela mobília pomposa, com certeza a sua conta bancária estava recheada. Mas, ao invés disso, o detetive só encontrou um armário vazio, sem qualquer item deixado para trás.
Seu pensamento correu rapidamente para Nolan e um sentimento de raiva repentina rasgou cada fibra de seu corpo, o fazendo endurecer a mandíbula. Uma fornalha violenta ameaçou explodir em sua cabeça quando a certeza invadiu sua mente.
Jungkook sabia que Nolan contaria sobre a polícia, mas preferiu estar enganado quanto a isso. Ele fechou a porta do armário com força, fazendo-a rugir com o impulso, oscilando para os lados.
Sua mente foi tomada por um silêncio espesso. Ele colocou a arma de volta no coldre e procurou o interruptor, quando finalmente o achou, acendeu a luz do cômodo enquanto pesquisava ao redor.
Yoongi surgiu na porta, sua fisionomia expectante se reduziu quando ele se esbarrou no quieto olhar de seu parceiro.
— Achou alguma coisa? — perguntou Jungkook, recebendo um balançar a cabeça para os lados.
— Olhei cada canto e não encontrei nada. O desgraçado fugiu e levou o que tinha com ele, só deixou mesmo os móveis.
— Ele saiu com pressa, talvez alguém tenha avisado sobre a gente.
— Acha que foi aquela mulher? — Jungkook não queria admitir, embora uma parte sua admitisse.
— Talvez ainda tenha alguma prova aqui.
— Se você estiver disposto a bagunçar as coisas dele para encontrar algo que nem sabemos o que é e ainda sem um mandado, então eu estou pronto. — Yoongi falou com uma pontinha de deboche, mas também falando sério.
Jungkook respirou suavemente, olhando em volta pela última vez antes de gesticular a cabeça na direção da porta. Não tinha razões para insistir em provas vazias. Sua intenção desde o princípio estava ligada à conversa que pretendia ter com Elliot, mesmo que não esperasse vê-lo em casa. Talvez alguma prova despercebida tenha sido deixada para trás.
Yoongi deixou o quarto primeiro, Jungkook atravessou a porta instantes depois, mas um som no chão, especificamente de um papel se amassando, atingiu sua audição e ele parou imediatamente.
Seus olhos caíram para o chão e abaixo da sola de seu sapato estava a ponta de uma folha. Ele retirou o pé de cima, e, ao se agachar, agarrou o papel com os dedos. Era um convite.
Atentamente, Jungkook leu cada palavra em sua mente e as emoções que tinham sumido de seu rosto voltaram de repente, dessa vez em forma de um sorriso triunfante. O canto de sua boca se elevou e os contornos tensos se suavizaram.
— Yoongi! — ele o chamou, não demorou muito e o outro detetive brotou no seu campo de visão. Jungkook levantou e entregou o bilhete para ele, no qual o pegou com desconfiança. — Acho que agora sabemos onde será a nossa próxima visita.
O detetive consultou o anúncio explícito na folha e encarou Jungkook de soslaio, a expressão dele estava suavemente sólida. Um sorriso ufano divagou nos traços de sua boca. Então Yoongi sorriu em resposta.
— Vamos para um leilão. — Jungkook completou, o calor das palavras arranhando sua garganta.
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