Capitulo 23 - Familia ~ Parte 2

O trabalho árduo levou algumas horas para ser concluído. A carne das patas foi separada para eles, e o resto foi preservado no caixote de blocos de gelo que havia na cozinha. Quando amanheceu, a carne estava em ótimas condições, e a pele estava seca. Ambos comeram os restos da perna de javali assada, e jogaram todo o produto na carroça, amarrando Audax para que pudesse puxa-los ate o campo.

No campo, Lancer retirou do bolso um Cristal Estrelar e abriu um portal direto para a entrada da capital de Dragonstone. Como de costume, o local estava agitado, com pessoas andando para la e para cá com suas compras e vendas.

A carroça foi deixada em um beco isolado, vigiada por Rider com seu arco e flechas, enquanto Lancer carregava a carne e a pele para os seus respectivos compradores. A jovem arqueira bocejou, sentindo seus olhos pesarem, implorando por um longo cochilo após a caça do dia anterior, ficar tanto tempo nas mesmas posiçoes silenciosas durante a caça ainda exigem muito de seu corpo jovem, principalmente quando as cólicas menstruais resolvem incomoda-la.

Na rua do mercado, Lancer negociou o preço da carne e da pele do animal que sua aprendiz caçou, conseguindo uma boa quantia de moedas de ouro. Nada mais justo as moedas serem de ouro, em um reino que o ouro é super valorizado.

Com a bolsa de couro cheia de moedas, ele parou para comprar algumas coisas. Da primeira loja que ele visitou, conseguiu comprar amoladores de lâminas e alguns facoes, para facilitar com a caça. Na segunda, alem de ervas medicinais e protetores femininos, conseguiu um pouco de adubo para a plantação. E quando estava pronto para voltar para a carroça, viu em uma loja belas roupas nos bonecos de madeira das vitrines. Com um pensamento cômico e um sorriso, ele entrou na loja e saiu de lá com um belo vestido florido e uma linda boneca de pano em uma sacola, e o melhor, havia restado algum dinheiro para emergência.

De volta para a carroça, encontrou Audax comendo um pouco de feno que foi deixado para ele, e Rider dormia sem preocupações no assento da carroça. Sem perceber, Lancer sorriu, sentindo-se tranquilo como nao se sentia há anos, e afagou o cabelo prateado da garota após por as compras na carroça.

Com cuidado, ele a carregou e a deitou no fundo da carroça junto com as compras, usando um pano para proteger seus olhos do sol.

- Vamos Audax, devagar dessa vez. Ela precisa descansar.

Compreendendo parcialmente o comando, o cavalo começou a caminhar devagar, lado a lado com seu dono. A unica movimentaçao da carroça era por causa do chão da cidade, no entanto, era mínimo e nao incomodava a garota.

Um tremor ocorreu e Audax se assustou. Lancer segurou as rédeas com força, falando com ele tentando o acalmar. Em seguida, outro tremor, e, no chao da cidade começaram a surgir rachaduras que subiram para as paredes das casas. Rider acordou assustada, ja tirando uma flecha da aljava.

- O que esta acontecendo?!

- Um ataque. - Lancer olhou para todos os lados, procurando uma forma de escaparem atraves da multidão alarmada - Armyasenkis.

- Como sabe?

- Eu to sentindo. Rider, fique armada. Ao meu sinal, fuja daqui com o Audax.

- E você?

- Vou estar logo atrás de você. Mas se as coisas piorarem, fuja sem olhar pra tras. Nao importa se voce ver alguem morrendo na sua frente, vá embora.

Pegando impulso na parede de uma das casas, ele subiu, enfiando a ponta da lamina entre as pedras e conseguindo se impulsionar para o telhado. O lanceiro olhou ao redor, vendo a confusão generalizada e procurando pelos Armyasenkis. Nao foi dificil encontra-los. Um pequeno exército Armyasenki tremendo o chão com seus passos e golpes, capturando pessoas de pele escura para serem transformadas em parte do exército.

Uma das bestas inalou o ar e virou a cabeça, olhando diretamente para Lancer. Com um rugido, chamou a atençao dos outros para ele, e começou a avançar, utilizando os braços longos como patas dianteira para aumentar a velocidade, Lancer arregalou os olhos e começou a correr, pulando de um telhado para outro. Com as garras, a criatura escalou a parede da casa, voltando a disparar atras do lanceiro, com pelo menos mais quatro Armyasenkis o seguindo.

Escondida no beco com Audax, Rider vasculhava as compras que o mais velho fez, procurando por algo util. Encontrando os facoes de caça, ela prendeu o máximo que pôde no cinto e voltou a vasculhar, mas parou. Abrindo com cuidado o ultimo saco, viu um lindo vestido e uma boneca de pano. Ela acaricou o cabelo da boneca de olhos de botão, e sorriu suave, imitando a boneca.

Ela guardou a boneca, fechando a sacola com força e a amarrando em seu cinto de utiilidados junto com os facoes. Audax se agitou novamente, e Rider sentiu uma gota ácida queimar seu braço. Assustada, olhou para cima, vendo dois Armyasenkis olhando para ela com suas mandibulas abertas, pingando ácido.

A jovem engoliu em seco, pegando duas flechas da aljava e as levando ate o arco. As criaturas perceberam e rugiram, se jogando em direção a ela. Rider gritou, pulando para a garupa de Audax, escapando por pouco de ser esmagada junto a carroça. Desesperada, ela bateu as redeas e o cavalo começou a correr em meio a confusão, enquanto as duas bestas disparavam atrás deles.

- RÁPIDO AUDAX!

Audax corria como nunca antes, e Rider mirava nas bestas que os perseguiam. Um tiro, dois flechas e dois alvos, era uma aposta arriscada e ela sabia disso. Quando os dois chegaram perto, a garota largou as setas, que cortaram o ar e atingiram seus alvos, cada uma atravessou um olho de um Armyasenki, fazendo-os finalmente cair.

Sem aviso prévio, Audax parou de correr, e Rider foi lançada por cima dele ate o chão. Ela protegeu o rosto com os braços e rolou algumas vezes ate conseguir parar. Para seu azar, ela havia parado nas patas de um Armyasenki. Ela rola para o lado, escapando por um tris de um golpe fatal.

- Quanta sorte a minha

***

Correndo pelos telhados das casas, Lancer escapava e abatia, sua lança atravessando os olhos e garganta dos Armyasenkis que tentavam o capturar. Mais a frente havia uma torre de vigilancia, e ele se apressou para alcança-la com um plano em mente.

O rugido de um Armyasenki furioso ecoou pelas ruas, seguido por um grito de ódio. Procurando de onde veio, Lancer olhou para todos os lados, vendo Rider pendurada nas costas de uma dessas bestas, golpeando varias vezes sua cabeça com um dos facoes que ele havia comprado para a caça.

O corpo caiu imóvel, ao lado de outros dois Armyasenkis mortos, que haviam começado a derreter. Rider se levantou exausta com a faca na mão, pisando na poça de sangue ácido e caminhando manca para longe, deixando um rastro de pedaços derretidos de suas botas.

Outro Armyasenki entrou naquela rua, olhando seus companheiros mortos e fixando seu olhar na garota. Escapando, ela armou seu arco com as ultimas flechas que tinha e atirou, no entanto, todas ficaram presas na pele grossa da besta, que continuava a ir atras dela.

Lancer tentou mudar o trajeto para ajuda-la, mas as criaturas atrás dele previram seu movimento e bloquearam todas as formas possíveis que ele tinha de escapar. Ele nao perderia tempo em tentar entender por que as bestas estavam o caçando, sendo que, teoricamente, estavam do mesmo lado. Ele sabia que era descartável, mas ainda era muito cedo para seus serviços serem dispensados. O que estava acontecendo?

Uma das bestas saltou para ele com unhas e dentes expostos, tentando o dilacerar. Lancer girou, enfiando sua lança dentro da garganta da criatura, usando do impacto para fazer a arma atravessar seu corpo e ficar preso. Ainda vivo, o Armyasenki estendeu as grandes maos para tentar o agarrar, mas o lanceiro foi rapido em partir seu cranio ao meio com a lança, entao, voltou a correr.

Ele saltou da casa para a torre, se segurando no batente de uma das janelas e conseguindo entrar. Lancer parou, respirando fundo, e voltou a correr, subindo as escadas ate a parte mais alta da torre do vigia.

A torre inteira tremia com o peso dos Armyasenkis. Lancer se equilibrou, desviando com êxito dos golpes das criaturas, que quebravam algumas das pilastras que sustentavam o teto. Um pedaço caiu, por sorte acertando o Armyasenki que saltou sobre o lanceiro. Faltando mais dois para abater, ele já estava exausto, respirando fundo e procurando forças para continuar a lutar.

A lâmina da lança estava cega, mas ainda fazia muitos estragos, atravessando o crânio de uma das criaturas através de um dos olhos. Faltando apenas um, Lancer pisou na carcaça da criatura morta e retirou a arma do seu corpo, girando o longo cabo e o segurando com as duas mãos.

O ultimo Armyasenki parecia tomar cuidado com cada movimento, ao contrário de seus colegas mortos. Ele analisava o lanceiro de cima a baixo, procurando por uma brecha para atacar.

Lancer olhou pela janela e suspirou frustrado, voltando a olhar para a criatura. Ambos, a uma distancia segura, andaram em círculo, um sem tirar os olhos do outro, esperando algum ataque. Na posiçao perfeita, Lancer pegou impulso e atirou a lança com toda a sua força. A criatura desviou, e a lança voou pela janela.

Percebendo que seu oponente estava desarmado, um sorriso predador surgiu na mandibula do Armyasenki.

A lança cortou o ar, caindo em direçao as ruas, atingindo um alvo e ficando presa na parede. Rider caiu no chão com o susto, vendo a cabeça do Armyasenki que a atacava ser empalada na parede pela arma que ela conhecia tão bem. Segurou a lança, e com força ela puxou, a retirando dali e percebendo que estava com a lâmina cega e amassada. A esse ponto, era uma arma quase inútil para um guerreiro.

Ela olhou para a direçao da qual ela veio, percebendo uma alta torre de vigia, rachando e começando a desabar, no entanto, nao havia sinal algum do dono da lança. Sentindo o rosto arder, Rider segurou a arma com força e começou a correr, procurando por seu cavalo. Em meio ao monte de corpos de Armyasenkis que derretiam, Audax trotava procurando como escapar do sangue ácido, relinchando quando nao conseguia.

Rider subiu em um dos corpos e saltou para a garupa de Audax, segurando as redeas e dando um comando para ele. O equino começou a correr em disparada, saltando os corpos e desviando dos golpes dos Wyverns, que caçavam e destroçavam como podiam os Armyasenkis remanescentes.

Segurando com força o Cristal Estrelar que tinha consigo, Rider chorava nem um pouco discreta, sentindo o nariz escorrer e a boca começar a grudar.

- Por favor, me leve pra minha casa! - implorou para o cristal, que atendeu o seu pedido e abriu um portal, teleportando ela e Audax de volta para Ophiocus.

Ela esperava encontrar sua casa queimada e a plantaçao destruida, pela primeira vez sentindo falta da voz da mãe que nunca fez nada para a proteger. A garota apenas queria ser trancada em seu quarto escuro, e ser deixada la ate o dia amanhecer, apenas mais uma vez, para que pudesse deitar em sua cama e chorar debaixo dos seus lençois. 

No entanto, enquanto sua mente pensava em um lugar, o coração pensava em outro. A cabana no meio de um campo, próxima a uma floresta perigosa, possuindo apenas um quarto, uma sala com cozinha e um estábulo para o cavalo. Rider chorou mais, queria tanto ficar ali, mas estava sozinha com o cavalo.

Respirando fundo, ela bateu as redeas e Audax começou a correr. Ela voltaria para casa, mas nao agora. Antes, ela tinha alguns assuntos a tratar.

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