𝟬𝟭. Alta sociedade



Os corredores da Academia eram longos e solenes, revestidos por colunas de mármore que carregavam o peso de gerações. Coriolanus Snow caminhava por eles com a postura impecável de quem sabia que, na Capital, cada passo era uma declaração. O som cadenciado de suas botas ecoava pelo chão polido, enquanto seus olhos – sempre atentos e críticos – vagavam para além das superfícies visíveis.

E então, ele a viu.

Grace Lavigne estava junto à grande janela do átrio principal, envolta na luz filtrada pelos vitrais coloridos. Seus cabelos, presos de maneira deliberadamente despretensiosa, refletiam tons dourados e carmesins que o sol projetava.

Ela sorria, inclinando-se levemente para ouvir algo dito por outra colega. Ainda assim, parecia alheia à agitação ao seu redor, como se tudo naquele lugar fosse um palco e ela, a protagonista inabalável.

Coriolanus não permitiu que sua expressão traísse o breve descompasso em seu peito. Ajustou o nó da gravata e se aproximou, o semblante polido como uma máscara cuidadosamente esculpida.

— Senhorita Lavigne — cumprimentou ele, com uma inclinação formal de cabeça e o tom perfeitamente controlado.

Grace ergueu os olhos, e por um instante que pareceu eterno, o mundo ao redor perdeu importância. Seu olhar tinha uma clareza desconcertante, uma habilidade inquietante de desarmar qualquer artifício. Ela sorriu, aquele sorriso que oscilava entre doçura e ironia.

— Coriolanus — respondeu, com a familiaridade que só os anos poderiam trazer. — Sempre tão pontual.

Houve uma pausa quase imperceptível antes que ele respondesse.

— Sempre tão... radiante — disse, finalmente, com um tom que pretendia ser casual, mas que se traiu pelo calor inesperado das palavras.

A verdade que ele nunca admitira, nem a si mesmo, era que Grace fora uma constante em sua vida desde os primeiros anos. 

Conheciam-se desde a infância, quando suas famílias circulavam nos mesmos círculos elitistas da Capital. Mas, ao contrário de outras garotas, Grace nunca se contentara em segui-lo.

Nas brincadeiras de criança, era sempre ela quem liderava. "Snow, você será o guarda" — dizia com um brilho autoritário nos olhos, e ele, inexplicavelmente, obedecia.

Ela determinava as regras, as alianças, os jogos. Mesmo quando ele tentava se opor, havia algo na firmeza travessa dela que tornava seus protestos irrelevantes.

Ela não comandava pela força, mas pela graça, pelo modo como fazia parecer natural que todos gravitassem ao seu redor. E ele, mesmo franzindo o cenho ou murmurando contrariedades, sabia que havia algo nela que o atraía de forma magnética.

Após uma breve hesitação, Snow virou-se para a amiga de Grace, que ainda sorria, alheia ao silêncio carregado entre eles.

— Com licença, senhorita Dane — disse ele, com a formalidade que reservava para situações públicas. — Mas preciso roubar Grace por um momento.

A garota piscou, surpresa pela interrupção, enquanto Grace arqueava uma sobrancelha, divertida pela calculada teatralidade de Coriolanus.

— "Roubar" é uma palavra forte, Snow — provocou, com um sorriso brincando nos lábios.

Ele ofereceu o braço, inclinando-se levemente em um gesto impecável.

— Então considere-se temporariamente requisitada, senhorita Lavigne.

Grace soltou uma risada suave, cheia da familiaridade de quem estava acostumada às nuances dele. Entrelaçou o braço no dele com a naturalidade de alguém aceitando um convite para dançar. Eles se despediram da colega com um breve aceno e seguiram pelos corredores impecavelmente iluminados da Academia.

O silêncio entre eles era confortável, preenchido apenas pelo som de seus passos ritmados. Snow a guiava até a aula que dividiriam, mas sem pressa.

— Sempre tão dramático, Coriolanus — Grace comentou, quebrando o silêncio, o tom casual, mas carregado de provocação.

— E você sempre tão disposta a aceitar o meu drama — rebateu ele, lançando-lhe um olhar lateral que ela retribuiu com um sorriso travesso.

Enquanto caminhavam, Snow permitiu-se um instante de indulgência. Era raro que se deixasse levar, mas a presença dela tornava impossível manter o controle absoluto. Havia algo na maneira como Grace o olhava – como se enxergasse além da fachada imaculada que ele apresentava ao mundo – que fazia cada segundo ao lado dela parecer precioso.

Quando chegaram à entrada da sala de aula, ela parou abruptamente, ainda segurando o braço dele.

— E agora? Vai me devolver ou pretende me manter "requisitada"? — perguntou Grace, com um sorriso que desafiava tanto quanto encantava.

Snow segurou o olhar dela por um momento a mais do que o necessário, antes de soltar o braço com relutância cuidadosamente mascarada.

— Considere-se devolvida, por ora — respondeu, com um meio sorriso calculado.

Grace inclinou levemente a cabeça, o brilho de diversão ainda em seus olhos, antes de entrar na sala sem olhar para trás.


MAIS TARDE

Apos as aulas, os preparativos para o evento eram tão meticulosos quanto uma cerimônia, e Coriolanus Snow sabia disso melhor do que ninguém. O espelho alto em seu quarto refletia sua figura esguia, envolta no brilho discreto de um terno perfeitamente ajustado. As mãos hábeis e precisas ajustavam a lapela, enquanto seus pensamentos vagavam para além das paredes do cômodo.

— Corio, você vai acabar arrancando o botão da gravata se continuar mexendo nela assim — advertiu Tigris, encostada no batente da porta, a expressão dividida entre paciência e diversão.

Ele parou por um instante, as mãos se recolhendo como se houvesse sido flagrado em uma indiscrição.

— Estou apenas verificando — respondeu, a voz firme demais para a banalidade da frase.

Tigris sorriu, o tipo de sorriso que apenas alguém que o conhecia profundamente poderia oferecer.

— Claro, verificando. Ou talvez pensando em outra coisa. Alguém, quem sabe?

Coriolanus lançou-lhe um olhar que pretendia ser indiferente, mas falhou em ocultar o leve rubor que tingiu sua pele.

— Não seja ridícula — retrucou, voltando a ajustar os punhos da camisa, como se aquilo pudesse distraí-lo.

Mas era verdade. Ele estava pensando nela. Grace Lavigne, com sua aura inatingível, com aquele sorriso que fazia algo no fundo do peito dele vacilar. O evento da noite, uma recepção para as famílias mais proeminentes da Capital, não passava de um pretexto. Ele sabia que ela estaria lá – era inevitável.

E, se fosse honesto consigo mesmo, admitiria que o entusiasmo que sentia não era pela oportunidade de socializar, nem mesmo pela promessa de uma mesa opulenta cheia de iguarias da Capital.

Era por Grace.

A ideia de vê-la novamente, de encontrar o olhar dela em meio à multidão, fazia seu coração bater um pouco mais rápido do que ele considerava confortável.

— Vai ter comida boa, pelo menos — comentou Tigris, interrompendo seus pensamentos enquanto ajustava o próprio vestido. — E Grace.

Ele suspirou, exasperado com o olhar zombeteiro que ela lhe lançou.

— Pode parar, Tigris.

— O quê? Estou apenas mencionando os motivos óbvios para a sua ansiedade. Só espero que você não tropece nos próprios pés quando a vir.

Ele virou-se para ela, os olhos estreitados em falsa irritação.

— Tenho uma reputação impecável. Não vou tropeçar.

Tigris deu de ombros, um sorriso travesso brincando nos lábios.

— Veremos.

Enquanto ela saía do quarto, Coriolanus respirou fundo, ajustando uma última vez os detalhes de sua aparência. Por fora, ele era o retrato da perfeição – confiante, inabalável, um verdadeiro Snow.

Mas, por dentro, ele era um turbilhão de expectativas e nervosismo, ansioso para ver se Grace estaria tão radiante quanto em sua memória daquela tarde. E, secretamente, torcendo para que ela notasse quando ele entrasse no salão.


DE NOITE

O salão da mansão era um espetáculo de opulência. Lustres de cristal lançavam reflexos cintilantes pelo teto abobadado, e as paredes eram adornadas com tapeçarias que narravam histórias de conquistas da Capital. Coriolanus Snow estava estrategicamente posicionado perto de uma das mesas centrais, bebericando um suco de uva enquanto seus olhos atentos varriam o espaço.

— Está procurando alguém? — provocou Tigris, ao seu lado, enquanto fingia interesse na conversa de um grupo próximo.

— Apenas observando o ambiente — respondeu ele, casualmente, embora o leve tensionar de seus ombros denunciasse sua verdadeira intenção.

E então ele a viu.

Grace Lavigne estava em pé perto de uma das janelas laterais, um sorriso suave curvando seus lábios enquanto conversava com dois rapazes. Ela parecia etérea em um vestido rosa claro, que parecia flutuar ao redor de sua figura delicada.

O tecido brilhava sob a luz do salão, como se tivesse sido feito de estrelas capturadas. Seus cabelos estavam presos em um coque adornado com pequenos enfeites dourados, e algumas mechas soltas emolduravam seu rosto de forma quase descuidada – mas ele sabia que nada em Grace era realmente descuidado.

Ela parecia um anjo, pensou Coriolanus, embora soubesse que sua mente cínica jamais se permitiria acreditar em algo tão simples.

Mas o que o tirou de sua contemplação foi a visão de seus interlocutores.

Um deles era Sejanus Plinth, com seu terno que parecia um pouco apertado demais nos ombros e a postura levemente desajeitada. Coriolanus relaxou ao vê-lo. Sejanus era rico – muito rico, graças à recém-adquirida fortuna de sua família do Distrito 2.  Mas ele era, para todos os efeitos, um tolo. Ingênuo, excessivamente generoso, e incapaz de compreender os jogos sutis da sociedade da Capital.

Não era Sejanus que preocupava Coriolanus.

Era Gael Fairstone.

Gael era o oposto de Sejanus. Herdeiro de uma das famílias mais antigas e influentes da Capital, os Fairstone eram donos de metade das minas de gemas do Distrito 1, além de várias propriedades no coração da Capital. Sua riqueza era acompanhada por uma confiança fria e calculada que fazia dele um jogador perigoso em qualquer sala.

E, pior ainda, Gael nunca fizera questão de esconder seu interesse por Grace.

Coriolanus apertou levemente o copo que segurava, os dedos finos traindo a leve irritação que ele lutava para controlar. Ele sabia que Grace atraía atenção – era inevitável. Mas algo na postura relaxada de Gael, na maneira como ele inclinava ligeiramente a cabeça enquanto falava com ela, fazia o sangue de Coriolanus ferver.

— Parece que alguém encontrou o que estava procurando — comentou Tigris, sem sequer olhar para ele, mas claramente ciente de onde sua atenção estava fixada.

— Não seja dramática — respondeu ele, mas a voz soou tensa demais para ser convincente.

Ele deu um passo à frente, ajustando o nó da gravata com um gesto elegante. Era um movimento que ele fazia quando precisava reafirmar sua compostura, uma lembrança silenciosa de quem ele era.

Enquanto se aproximava do trio, manteve o olhar fixo em Grace, ignorando deliberadamente os dois rapazes ao lado dela.

— Senhorita Lavigne — disse, a voz controlada e impecável, como sempre. — Parece que a noite ficou um pouco mais interessante.

Grace ergueu os olhos para ele, e o sorriso que iluminou seu rosto fez com que, por um breve instante, o mundo ao redor parecesse irrelevante.

— Coriolanus — disse ela, o tom suave e familiar, como se seu nome tivesse sido moldado para os lábios dela.

Ele lançou um olhar rápido e calculado para Gael, que arqueou uma sobrancelha em desafio silencioso.

Coriolanus manteve o sorriso no rosto enquanto se juntava ao pequeno grupo, mas seus olhos, sempre atentos, estudavam Gael com a precisão de um predador. O herdeiro dos Fairstone parecia à vontade demais, com aquele ar de quem já estava acostumado a ter tudo o que desejava – uma postura que irritava Coriolanus mais do que ele gostaria de admitir.

— Snow — cumprimentou Gael, com um sorriso que parecia afiado como uma lâmina. — Que surpresa encontrá-lo aqui.

— Surpresa? — Coriolanus devolveu, inclinando levemente a cabeça, como se a ideia fosse absurda. — Imagino que não esperasse menos de mim. Afinal, seria um desperdício perder uma noite como esta.

— Claro. — Gael levou o copo de cristal aos lábios, os olhos nunca deixando os de Coriolanus. — Embora eu imagine que alguns prefiram noites como essa para... fazer contatos, não é?

A insinuação era clara. Coriolanus não precisou de mais nada para entender que Gael sabia de sua situação delicada. A ruína financeira da família Snow era um segredo cuidadosamente guardado, mas rumores circulavam – especialmente entre os mais ricos e poderosos.

Grace olhou de um para o outro, aparentemente alheia à tensão que se formava.

— Vocês dois são sempre tão educados um com o outro — comentou ela, com um tom levemente sarcástico.

Sejanus, por outro lado, parecia completamente alheio ao subtexto.

— Esta festa é realmente incrível, não é? — disse ele, olhando ao redor com um sorriso desajeitado. — Minha mãe ficaria encantada com um evento assim.

Coriolanus quase revirou os olhos, mas manteve a expressão controlada. Ele não podia permitir que Grace, ou qualquer outra pessoa, visse qualquer sinal de fraqueza.

— Os Jogos Vorazes deste ano serão particularmente interessantes, vocês não acham? — Gael comentou, com o tom casual de quem fala a sobre uma peça de teatro e não um espetáculo mortal. — Minha família está patrocinando os jogos e...

— Fascinante, Fairstone — Snow interrompeu, com a voz perfeitamente controlada. 

Antes que Gael pudesse responder, Coriolanus voltou-se para Grace, inclinando-se ligeiramente como se estivesse fazendo uma reverência.

— Grace, permita-me o privilégio de uma dança?

Por um breve momento, o sorriso de Grace vacilou, substituído por uma surpresa suave, mas logo retornou, luminoso como sempre.

— Claro, Coriolanus — respondeu ela, estendendo a mão com naturalidade.

Ela aceitou a mão dele, e a sensação do toque delicado fez Coriolanus sentir uma satisfação que ele rapidamente escondeu. Grace era isso: doce demais, bonita demais, e tão encantadora que parecia impossível que alguém não fosse atraído por ela.

Não era surpresa que todos gostassem dela.

Enquanto ele a conduzia para a pista de dança, sentiu o olhar de Gael queimando em suas costas. Um pequeno triunfo, ainda que temporário.

A música começou suavemente, e Coriolanus colocou uma mão nas costas de Grace, conduzindo-a com uma precisão impecável. Ela o seguiu com a mesma graça que parecia defini-la, os olhos fixos nos dele, um brilho curioso no olhar.

— Não sabia que dançar fazia parte das suas habilidades, Snow — disse ela, a voz baixa, mas com aquele tom de provocação que ele conhecia tão bem.

— Há muitas coisas que você não sabe sobre mim, Grace — ele respondeu, com um leve sorriso. — Talvez eu devesse corrigir isso.

Ela inclinou ligeiramente a cabeça, como se estivesse avaliando as palavras dele, antes de sorrir. A verdade era que, naquele momento, enquanto dançavam sob as luzes opulentas da festa, Coriolanus Snow quase acreditou que o mundo inteiro poderia ser reduzido a isso: ela em seus braços, a música envolvendo-os como um segredo sussurrado, e o futuro que ele imaginava construir.

A música parecia envolvê-los em uma bolha particular, alheia ao burburinho da festa ao redor. Coriolanus conduzia Grace com uma precisão quase ensaiada, mas a proximidade entre eles tornava cada movimento uma dança de intenções não ditas.

— Você está especialmente encantadora esta noite — disse ele, a voz baixa e propositalmente casual, mas o olhar fixo no dela entregava mais do que suas palavras.

Grace arqueou uma sobrancelha delicada, o sorriso brincando nos lábios.

— Esta noite? Apenas esta noite? — devolveu ela, com um tom ligeiramente provocador.

Ele permitiu-se um sorriso que parecia planejado para desarmá-la.

— Bem, seria um tanto repetitivo dizer isso toda vez que nos encontramos, não acha?

Ela riu suavemente, o som como um sino delicado, mas seus olhos permaneceram fixos nos dele, avaliando, talvez desafiando.

— Coriolanus Snow, o mestre das palavras bem escolhidas. Sempre soube como fazer alguém se sentir especial — comentou ela, girando graciosamente sob sua mão antes de retornar à posição inicial.

Ele inclinou ligeiramente a cabeça, a mão em suas costas se movendo quase imperceptivelmente mais próxima.

— Não é difícil quando estou dançando com alguém como você, Grace — respondeu, a sinceridade forçada de propósito, porque sabia que ela perceberia.

— Sempre tão lisonjeiro — Grace replicou, os olhos brilhando com algo que ficava entre diversão e cautela. — Mas eu me pergunto: tudo isso é apenas um jogo para você?

Coriolanus piscou, surpreso pelo tom sutilmente mais sério de sua pergunta. Ele tentou medir a expressão dela, mas Grace, como sempre, era um mistério.

— Um jogo? — repetiu ele, como se estivesse refletindo sobre a ideia. — Talvez. Mas, se for, é um que eu gostaria de ganhar.

Grace sorriu, e por um instante ele não conseguiu discernir se era um sorriso de aprovação ou de algo mais perigoso.

— Ganhar contra quem? — perguntou ela, inclinando-se ligeiramente para mais perto, como se estivesse conspirando.

Coriolanus permitiu que seu sorriso crescesse, um toque de arrogância intencional.

— Contra todos, é claro.

Ela riu novamente, mas dessa vez o som parecia carregar algo mais profundo, algo que ele não conseguiu decifrar.

— Sempre tão ambicioso — murmurou ela, balançando a cabeça ligeiramente. — Mas cuidado, Coriolanus. Alguns jogos têm consequências que nem mesmo você pode prever.

Ele inclinou-se um pouco mais, os olhos ainda fixos nos dela, enquanto seus passos os levavam para o centro da pista.

— Talvez — disse ele, a voz baixa e calculada. — Mas você sabe tão bem quanto eu que não gosto de perder.

Grace o observou por um momento, como se estivesse ponderando suas palavras, antes de sorrir com um charme que parecia feito para deixá-lo em suspenso.

— Suponho que não — respondeu ela, finalmente. — Mas nem sempre cabe a nós decidir quem vence, não é?

A música chegou ao fim, e os dois pararam, ainda próximos, como se o momento não pudesse ser quebrado. Coriolanus inclinou ligeiramente a cabeça, mas não disse nada. Ele sabia que, com Grace, palavras demais podiam ser tão perigosas quanto palavras de menos.

Ela o olhou por mais um segundo, então fez uma leve reverência, afastando-se com a elegância que parecia ser sua marca registrada.

— Obrigada pela dança, Coriolanus.

Ele nem teve tempo de compreender completamente o que estava acontecendo. Um lustre monumental acima da pista de dança balançou violentamente antes de despencar. As pessoas ao redor gritaram, recuando em pânico. O cristal brilhante despedaçou-se no chão em um espetáculo caótico de luz e som, seus estilhaços voando em todas as direções.

Coriolanus reagiu antes de pensar. Ele avançou, puxando Grace pela cintura com força para longe do perigo iminente. O impacto fez o coração dele martelar no peito, mas o som era abafado pelos gritos ao redor.

Quando o silêncio breve se instalou, ele percebeu que um pequeno filete de sangue escorria no lábio inferior de Grace. Um fragmento de vidro a havia atingido, e ver aquela imperfeição – ainda que mínima – no rosto dela era quase desconcertante.

— Você está machucada — disse ele, a voz baixa e carregada de uma urgência que ele mesmo não reconhecia.

Antes que pudesse se conter, Coriolanus levou o polegar até o corte delicado, limpando o sangue com um toque cuidadoso. A sensação da pele macia dela sob seus dedos o fez prender a respiração. Era algo tão simples, mas profundamente íntimo.

Os olhos de Grace se fixaram nos dele, amplos e brilhantes, enquanto suas mãos permaneciam apoiadas contra o peito dele. Coriolanus percebeu, com um súbito desconforto, que seu coração estava batendo rápido demais, tão forte que ela provavelmente podia senti-lo através do tecido da camisa.

— Estou bem — Grace murmurou, quase sem fôlego, mas seus olhos ainda pareciam perdidos na intensidade dos dele.

Ele abriu a boca para responder, mas um som muito mais ameaçador cortou o ar. O primeiro disparo de arma de fogo foi como um trovão, e depois vieram outros, rápidos e ensurdecedores.

O salão, que antes estava repleto de risadas e música, mergulhou no caos absoluto. Pessoas corriam em todas as direções, derrubando mesas e copos, enquanto tiros ecoavam pelas paredes.

Coriolanus segurou Grace com mais firmeza, protegendo-a enquanto olhava ao redor, tentando avaliar a situação.

— Fique comigo — disse ele, sua voz grave, mais uma ordem do que um pedido.

Ela não protestou, suas mãos ainda apertando o tecido da camisa dele, como se ele fosse a única âncora em meio à confusão. Mas o caos ao redor só piorava. O lustre despedaçado agora começava a arder em chamas, o fogo iluminando o salão com um brilho selvagem e ameaçador. Os tiros, antes espaçados, tornaram-se constantes, um estampido ensurdecedor que fazia ecoar o pânico nos rostos das pessoas.

Coriolanus olhou ao redor rapidamente, avaliando o cenário. O salão, antes impecável e grandioso, estava tomado por gritos, fumaça e correria desordenada. Ele apertou a mão de Grace, seus dedos entrelaçando-se firmemente nos dela.

— Venha comigo! — disse ele, puxando-a com decisão, ignorando qualquer protesto ou hesitação.

Eles começaram a se mover em meio ao tumulto. Coriolanus abria caminho como podia, protegendo Grace com o corpo enquanto desviava de móveis tombados, cacos de vidro e convidados desorientados. O calor do fogo crescia, o ar ficando pesado e difícil de respirar, mas ele não parava.

Então aconteceu.

Um impacto violento atingiu o ombro dele, uma dor ardente que percorreu todo o lado esquerdo de seu corpo. Por um momento, Coriolanus vacilou, mas a visão de Grace, agarrada à sua mão, o fez seguir em frente.

— Coriolanus, você está... — começou Grace, percebendo o sangue que começava a manchar a manga impecável de sua camisa.

— Não! — ele interrompeu, a voz firme, mas entrecortada pela dor.

Ele ignorou o latejar constante no ombro, cada passo exigindo um esforço sobre-humano. A saída estava próxima, mas parecia distante como um sonho inatingível. Grace continuava ao lado dele, olhando-o com uma mistura de preocupação e descrença, mas sem soltar sua mão por um segundo sequer.

Quando finalmente avistaram as portas principais, Coriolanus apertou os dedos dela com mais força, como se quisesse garantir que ela não se perdesse em meio à confusão.


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