XIV. Rastros

— COMO ASSIM, VOCÊ É MAIS NOVO DO EU! E ESSA CARA DE MARMANJO? Aurora grita totalmente incrédula.

— S-só o meu corpo é mais velho. Sadh tenta explicar.

— Só o corpo? Trocou de mente é? E por que pegou de um cara mais velho? Aurora começa a perguntar mais curiosa do que desacreditada.

— Veja bem-

Sua fala é cortada com uma mão tampando sua boca, era o Wem. Que estava em completo silêncio, apenas olhando para o meio do bosque, em uma parte que parecia ser de encontro com a vila.

Os dois rapidamente entendem que a devem ficar quietos e depois de alguns segundos entendem o motivo, vários passos de longe ecoam pelas ásperas cascas das árvores, não estavam na floresta, porém o som não era de algumas pessoas normais, parecia uma marcha.

Sem querer o real fonte do som, Wem começa a andar para dentro da mata, chamando com as mãos, os seus companheiros, que o seguem apavorados.

Nenhum questionamento é realizado, pois se nem o próprio Wem quer descobrir a origem de tal ruído constante, quem seriam eles para duvidar da autoridade.

Assim, em pouco tempo, abandonam completamente as ruínas daquela pequena clareira. Sadh dá uma pequena olhada para trás, vendo sua antiga vida sendo deixada, porém, não havia muita coisa que ele poderia fazer além de aceitar sua nova jornada ao lado dessa bela jovem sorridente e o maior monstro que ousou encontrar.


* Vila ferreira*

Um batalhão inteiro marchava nas estradas de terra ao redor de uma pequena vila, onde a fumaça nunca para de ser expelida através das cinzentas chaminés. Com passos fortes e ríspidos, marcavam o chão com suas centenas de pegadas, deixando para trás um rastro de seu caminho.

Liderando tal matilha, uma mulher em cima de um cavalo de pele negra ordena o avanço sobre tal urbanização. Com isso soldados avançam em todas as estradas, surpreendendo todos os moradores e compradores do lugar, que não viam tal movimentação de tropas desde da guerra.

Uma verdadeira vasculha acontece entre os becos das fornalhas de pedra, com todos os moradores sendo revistados, assim centenas de toneladas de carvão ilegais são apreendidos, porém, aquilo não o objetivo principal da busca, um objetivo que nem os mais leais soldados pareciam ter ideia do que seria.

Rell vasculhava por contra própria, sempre acompanhada por dois guardas, que seja por medo ou lealdade, não falariam e nem questionariam o que vissem com seus próprios olhos. Assim sua busca se resumia na extorsão das pessoas que via em sua frente, os resultados culminaram em frente a uma velha e pequena oficina, a qual era especialista em fazer pregos e armaduras.

Ela entra no local sozinha, com os dois guardas protegendo a entrada. Era uma simples forja comercializadora, em sua maioria, de coisas cotidianas, como ferramentas e pregos, porém havia algumas armaduras de malha amostra, bastante empoeiradas, indicando que essas são apenas de exposição.

Porém, diferindo do cenário, havia uma mesa velha um pouco antes de uma porta, onde um velho estava sentado. Ele usava uma pena de uma ave qualquer, com ela escrevia algumas coisas em uma pilha de papéis, as quais pareciam conter dezenas contas.

Sem demora ela se aproxima da mesa, com o velho a olhando sem nem ao menos mover sua cabeça.

— Todo carvão aqui é da mina, se quiser pode pegá-lo. Se precipita o velho.

— Eu não vim aqui por carvão. Rell responde.

— Imagino que pregos e ferramentas não estão em sua lista de desejos.

— Algumas pessoas viram dois estranhos chegarem em sua oficina ontem a noite, queria saber quem são.

— Não faço a menor ideia, cobrei um preço e eles pagaram, só isso.

— Como era a aparência deles?

— Minha memória não é boa, sabe como é, velhice. Ele diz isso num tom claro ironia.

— Eu esperava sair daqui com algumas respostas, se não as coisas podem ficar um pouco sérias.

A sua face mostrava estar aborrecida, além de estar acompanhava com um par de olhos cerrados, que o olhavam fixamente. Porém, contrariando as expectativas, o velho não se intimidou, tanto que voltou a olhar os papéis em sua mesa. Isso a incomodou seriamente.

Ela aproxima sua mão de sua espada, esperando alguma resposta do idoso, que apenas voltou a escrever alguns números em sua papelada.

— Sinto muito, não posso ajudá-la madame. Diz o velho ainda rabiscando.

Em um movimento rápido puxa a sua espada e a enfinca na mesa, cortando alguns dos papéis no caminho.

— Acho que você deve começar a se lembrar velhote. Rell ameaça.

Ele larga a pena e para de anotar, já que havia um objeto de metal no meio de seus cálculos. Por isso olha para cima, a encarando, ainda não convencido.

— Se vai querer ameaçar pode ir embora jovem militar, se você pudesse fazer algum mal a mim já teria feito. Agora senta e aprende a negociar primeiro. O ferreiro responde enquanto se levanta.

Ele vai até uma prateleira, onde começa a mexer por trás dela, entre o vão da madeira e da pedra, e de lá puxa uma cadeira dobrável, velha e empoeirada. A colocando ao lado de Rell e se sentando na sua.

Apesar de sua gigantesca raiva, ela sabia que ele estava certo, uma morte violenta poderia causa suspeitas sobre o real objetivo da missão, a qual os soldados ainda acreditavam ser uma patrulha comum.

Por isso ela se senta, ainda mantendo sua postura convencida ao colocar seus pés sobre a mesa, mostrando ainda mais as suas excêntricas botas, as quais ainda estavam limpas, já que não havia dado um passo sequer nas estradas de terra barrenta.

— O que você quer? Rell pergunta já enraivecida.

— Som um simples ferreiro, e o que você está me pedindo pode acabar piorando minha imagem perante a vila. O velho tenta persuadir a mulher folgada em sua frente.

— Não venha com discurso de pena, eu sei bem que um velho como você não liga para isso.

— Você não é tão fácil como pensei.

— Fale logo.

— Quero cinco cargas do carvão apreendido e cinco moedas de ouro

— Quatro moedas.

— Cinco.

— Quatro de ouro e cinco de prata. Rell oferta jogando as moedas sobre a mesa.

— ... Foram para o bosque, atrás de uma forja com muros, a esquerda daqui.

— Você disse que eles só dormiram aqui, como você sabe onde estão?

— Isso importa?

— Responda.

— Hum!... Aquela jovem era uma gracinha, se ela não estivessem com aquele homem teria a estuprado.

— Não quero saber dos seus desejos, seu bosta.

— Calma, apenas a segui para ver aonde iria, mas um ladrão de meia tigela a levou para esse bosque, e não voltaram desde então.

— O homem foi com ela?

— Ele foi minerar carvão conforme o combinado, não sei se foi, eu estava na forja.

Sem dizer mais nenhuma palavra, Rell se levanta, porém, fica parada olhando para o ferreiro.

— Pode ir embora, não tem mais nenhuma informação aqui. Diz o ferreiro guardando as moedas.

— Você ainda tem algumas que preciso silenciar. Rell diz isso levando um dedo.

Uma luz começa extravasar por de trás da porta de forja. O velho olha curioso pelo estranho clarão atrás de si. Chamas começam a passar pelos vão da madeira, as quais pareciam deslizar pelo ar.

— O-o que é isso? Diz o velho incrédulo.

Com a sua boca aberta pela fala e espanto, as chamas começam a se aproximar em uma estrondosa velocidade e adentram no corpo. O homem completamente desesperado fecha a boca, porém as chamas começam a passar pelas frestas dos lábios e dos dentes, adentrando pela garganta do infeliz.

De início não sentia nenhum ardor, era como se labaredas evitassem sua carne, porém em menos de um segundo, sente a queimação dentro de seus pulmões. Em completo desespero pela sua vida, tenta gritar por ajuda, porém suas cordas vocais já haviam sido devoradas pelas chamas, e mesmo se as tivesse, o fogo já havia se alastrado, consumindo todo ar dos flácidos órgãos.

Sua morte vinha por meio da dor e sufocamento ao meio do calor, porém nenhuma parte externa era afetada por tal assombração, pelo contrário, pareciam querer manter o bom e intocável aspecto visível de seu corpo.

Em último ato de vida, se aproxima da provável causadora de seu sofrimento, a encarando com um olhar desesperado e raivoso, que é correspondido com apenas um prazeroso sorriso perverso.

Vendo suas tais atrocidades, ela se abaixa, ficando no ouvido do quase corpo de joelhos, e grita em bom e alto som, para ficar na sua cabeça por toda sua morte, o último ruído da sua existência: "Ele está tendo uma crise de pneumonia!".

Os guardas ao ouvirem se adentram rapidamente no lugar, vendo a sua líder puxando algumas moedas do bolso do ferreiro, o qual agonizava por ajuda. Ao caminhar na direção dos dois, as moedas de ouro roubadas foram dadas igualmente para os dois sérios homens, seguidos de uma simples ordem, chamem um médico.

Os dois guardas correm clamando por algum improvável médico naquela cidade de cinzas de carvão, uma multidão começa a se formar ao redor da cena, porém, guardas rapidamente tomam o controle e mantêm uma área ao redor do lugar.

Contrariando o fluxo de pessoas, uma destemida mulher caminhava para a esquerda da forja, indo em direção a um muro ao lado de uma construção.

Contrariam o caminho de sua busca, simplesmente arrodeou a forja, assim ficando de frente ao dito bosque.

Apesar dos ruídos e gritos vindo do tumulto, um silêncio dominava a flora e conforme pisava nas folhas secas, o som, cada vez mais, ficava retido entre os troncos e folhas de outono. Não parecia ter muita vida animal ali, nem os mais simplórios pássaros ousavam cantar, mesmo escondidos em seus estreitos ninhos.

Isso era muito suspeito, pois até na vila, onde a fuligem se prendia nas frágeis penas dos pequenos voadores, ainda assim assobiavam suas mais belas canções. Algo havia os matados, ou talvez os afugentados.

Sua responda não demoraria para aparecer. Em uma pequena clareira cercada por tais árvores semelhantes, havia uma que se destonava das demais, parecia uma aberração, contorcida em si, ainda aterrada no mais fundo do solo visível, parecia cavar a própria cova. Além disso, haviam diversas raízes que saltavam para fora da terra em um padrão caótico, porém algo era comum entre elas, todas haviam marcas de cortes atravessando as rudes camadas superficiais.

Ao se aproximar da tumba recém-cavada, percebe diversas tábuas grudadas e soterradas junto a deformação, revelava haver algo construído ali, e pela conservação, não havia muito tempo que haviam sido condenadas.

Rell tentava entender o que havia se passado ali, uma batalha? Não parecia que Wem havia lutado ali, as marcas não correspondiam a sua grandeza, será que ela está seguindo o rastro errado?

Era inexistente seu interesse por outro ser amaldiçoado dela achar, quanto menos concorrência mais valorizada era, por isso estava prestes a desistir daquelas pistas infundadas. Porém, antes de sair, por sorte ou azar, olhou para determinado canto da floresta. Nele só havia árvores, mais nada. Porém, uma estranha sensação de desconforto e ódio eram emanadas dessa direção, como se as próprias plantas tivessem medo de algo que se aproximou delas.

A militar não conseguiu conter seu mais sincero sorriso de vitória, afinal apenas um ser poderia causar tamanho desgosto, e esse era sua caça.

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