CAPÍTULO 9


PRELÚDIO

25 de Dezembro de 2022. 


ERA O PRELÚDIO do temporal, como se, ao longe, víssemos as nuvens escuras crescerem e caminharem na nossa direção.

Eu, Pat e o menino capturado estávamos imóveis no banco de trás do carro do exército. Desde que o rapaz fora colocado à força no veículo, depois de levar uma surra que o deixou com o olho roxo, a perna manca e um rádio fraturado, achava eu, as ideias minhas e de Pat, confabuladas com ardor, morreram como folhas no outono.

Acontece que tínhamos planejado ofendê-los moralmente com várias palavras extremamente impróprias para serem escritas aqui, enquanto fugíamos desvairados pela mata. Não era um bom plano, mas era a única solução desesperada que tínhamos em mãos. Ver a crueldade daqueles militares ao assassinarem a sangue frio uma família toda fez esses planos envelhecerem como leite.

Eu consigo lembrar de cada detalhe da curta viagem que fizemos desde o cenário de assassinato até a escola em que fomos levados. O resto do caminho foi silêncio, mas só um idiota não perceberia a tensão palpável dentro do veículo. O carro descobria a estrada conforme avançava, o mundo todo envolto em treva, neblina e floresta, e os faróis pareciam não colaborar com a iluminação. Havia um forte cheiro de tabaco no veículo, misturado com o da terra e mato molhado pela chuva que ainda caía. E ventava. Os vidros abertos do carro faziam os cabelos de Pat grudarem em seu rosto. Era um vento frio. Coisa atípica para Dezembro.

Lembro que pescava o rosto de Pat de canto de olho todas as vezes, apenas para conferir se ela estava bem ou se chorava, mas era ao rosto do menino que meu olhar sempre prendia-se. O rapaz que sentava ao meu lado tinha a pele marrom clara e límpidos olhos verdes. Rangia os dentes muito baixinho, de forma que só eu escutava, e seus olhos estavam postos ora em um militar ora no outro, mas não desviavam e nem vacilavam deles dois. Havia nele o traço puro do ódio, que suplantava até mesmo as linhas de expressão raivosas que enchiam o rosto de Pat. A cada instante, ele colocava o dedo indicador direito na palma da mão esquerda e cutucava-a exatamente sete vezes. Fazia isso com muita frequência. O garoto parecia marcado para cometer uma tragédia.

E deu no que deu. No final, eu chamaria de justiça. Mas, até um ponto, pode ser que tragédia seja mais apropriado.

===

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top