Capítulo 76 - Banco? Check. Retrovisor? Check. Pernas? Check.

Banco? Check. Retrovisor? Check. Pernas? Check.


Marcela

Eu me levantei ainda ao lado do Edu, sentindo que uma escola de samba estava treinando dentro do meu peito para o carnaval que eu sentia se espalhar pelo meu corpo inteiro, porque... porque eu tinha a leve impressão que eu iria acordar a qualquer momento em minha cama, suando e me debatendo e buscando Eduardo apenas para me encontrar sozinha de novo.

No entanto, desta vez, eu tinha certeza de que não era o caso, porque aquele sentimento dentro de mim era tão vivo que que até mesmo o Sandro perceberia o que quase aconteceu ali. Algo que eu queria tanto, mas tanto que tivesse acontecido, que eu quase mandei o bom senso para a casa do caralho e beijei Eduardo mesmo assim.

Ele brigou com o Igor por mim.

Ele não me julgou pela briga.

Ele não me olhou de maneira diferente depois de saber sobre Matheus.

Ele não se afastou quando eu disse sobre o Gustavo.

Como foi que eu encontrei esse homem no mundo?

E por que eu o deixei ir embora?

Então a porta do banheiro se abriu logo depois que Sandro me ofereceu a mão para que eu me levantasse e eu escutei o barulho do salto Manolo Blahnik antes de Gisele se aproximar de nós com o seu olhar tão irado que eu segurei a mão de Eduardo com mais força, porque se havia algo que eu temia era quando uma pessoa calma simplesmente se rendia à fúria.

— Marcela, Sandro, eu preciso conversar com o Eduardo. A sós — ela nos pediu, nunca tirando seus olhos do rapaz que ainda estava sentado no vaso sanitário, branco como uma folha de papel e perdendo mais sangue do que qualquer outra coisa.

Eu me coloquei na frente dele, quebrando o contato visual entre os dois, forçando-a a me olhar ao invés de jogar aquela energia irritadiça no arquiteto.

— Não vou sair daqui, Gisele — eu disse com calma, vendo-a estreitar os olhos levemente na minha direção — se quiser falar com ele, pode falar na minha frente.

— As advertências são entregues de maneira individual e particular — ela me informou com a sua voz de RH, só que conseguia notar que aquilo também a estava matando por dentro, porque aquele era o Eduardo. O nosso Eduardo! Ela não poderia colocar ele no mesmo nível que o bosta do Igor.

— Tudo bem, metade da advertência que ele vai receber é minha — eu respondi e ela arqueou tanto suas sobrancelhas que elas passaram a armação do seu óculos de gatinho de oncinha — ele só entrou nessa briga para me defender.

— Você sabe que não é assim que resolvemos nossos problemas, Marcela. Nós conversamos — ela retrucou um pouco mais alto e eu senti os dedos de Eduardo mais fracos contra os meus, então eu os apertei mais contra a minha palma, porque ele não merecia aquilo. Nada daquilo.

Neste momento, Sandro, que até agora não havia se movido ou se pronunciado, apenas se colocou na frente de Gisele, eclipsando-a por completo e eu encarei as suas costas, sentindo minha respiração ficar presa dentro do meu peito.

— Eu teria deitado o Igor na porrada se o Eduardo não o tivesse feito, então divide essa advertência comigo também — ele falou com uma calma calculada e, mesmo que eu não conseguisse ver os seus olhos, eu sabia que Sandro estava travando uma batalha silenciosa com a Gisele para que ela o escutasse. Me escutasse. Nos escutasse.

— Não é assim que resolvemos os problemas — ela repetiu a frase, porém seus lábios tremeram e eu notei que ela balançou o seu nariz, claramente tão aborrecida com aquilo quanto estava triste, porque ela era a Gisele e ela amava Eduardo tanto quanto nós.

Talvez, apenas não amasse da mesma maneira que eu o amava.

— Eu sei, Gi — Edu comentou, utilizando minha mão como apoio para se levantar e eu passei meu braço ao redor da sua cintura quando notei que suas pernas ainda não estavam firmes.

Assim que os olhos da rainha do RH pousaram em Eduardo, acho que metade da convicção que ela tinha para brigar com ele morreu, porque ela abriu os lábios para dizer algo, contudo as palavras pararam dentro dela enquanto ela via o mesmo que todos nós.

O olho esquerdo de Eduardo estava inchado e a sua sobrancelha, sangrando ininterruptamente. A maçã do seu rosto estava arroxeada com alguns pontos mais escuros, onde a mão de Igor o havia atingido com mais força. Sua camisa azul estava manchada de sangue desde o seu colarinho até em algum lugar no seu peito. E os nós dos dedos dele estavam estourados, quase em carne-viva.

— Gi, por favor — eu pedi para ela e algo no seu olhar mudou quando ela engoliu a seco — ele faz um curso de reatividade. Faz sete. Ele busca cafezinho para todos nós por dois meses e te ajuda a organizar o próximo evento da empresa, mas, por favor, não pode dar uma advertência nele por ele... ter me defendido.

E eu acho que quando eu disse isso, ela entendeu. Foi sutil, talvez Sandro e Eduardo não tivessem notado a lágrima que escorreu, mas ela sim, porque ela era Gisele Neves. E, talvez, foi por isso que ela apenas respirou fundo e não desviou o seu olhar.

— Treinamento online de reatividade. Vai levar uma advertência por ter socado o coleguinha. E vai me ajudar a organizar o aniversário surpresa do Fernando. Não é negociável — ela informou com finalidade, porém ela estava falando com as duas pessoas mais teimosas e menos flexíveis da CPN, então Sandro e eu começamos a nos atropelar para reclamar que mesmo assim aquilo era absurdo e injusto e completamente indevido, mas ela nos calou com o seu olhar — vocês têm que entender que isso me magoa muito mais do que deveria, porque brigar com vocês é a mesma coisa que brigar com a minha família, mas ações têm consequências e eu não posso deixar que o pessoal influencie no profissional. Entendam.

Eu olhei para o Sandro, porque se ele argumentasse mais, eu iria com ele, porém ele apenas ficou calado e eu tive que morder a minha língua para não falar mais nada.

— Eu vou voltar para lá, porque já levaram o Igor embora, limpamos a bagunça e ainda tem muita comida e bebida, ok? — Gisele deu um passo para trás e voltou a dar o seu sorriso polido e completamente profissional — o fã clube do Eduardo está ali fora esperando pra saber o que está acontecendo com ele e eu vou dizer que ele está bem e que eles ainda vão encontrar o nosso eco-arquiteto segunda na CPN, ok?

— Edu, você quer voltar pro churrasco? — eu indaguei pro corpo levemente atordoado do rapaz ao meu lado, sentindo que ele não conseguia nem ao menos ficar em pé sozinho, como era esperado que ele fosse sobreviver umas trinta pessoas em cima dele perguntando o que havia acontecido? — quer ir pra casa?

Ele engoliu seco antes de anuir e eu notei que a toalha estava começando a ficar marcada com o sangue, o que era um péssimo sinal.

— Ok, eu te levo — eu o segurei com mais força para que nós conseguíssemos sair dali, porém hesitei quando o ouvi arfar quando minhas mãos tocaram seu abdômen e eu me perguntei onde mais ele estava machucado que eu nem havia notado? — Gi, consegue distrair as pessoas lá fora para uma saída à francesa? Sandro, pega minha clutch e o blazer do Edu e nos encontra no carro dele, por favor?

— Como você acha que eu sei que caralhos é uma clutch? — ele me indagou, fingindo estar irritado com a sua tarefa, porém ele apenas sorriu e eu o agradeci por aquela mudança no clima — é aquela bolsinha que estava junto com a bandeja de canapés, não é?

— Obrigada — eu concordei e ele saiu primeiro.

Logo em seguida, Gisele deixou o banheiro e eu ouvi as vozes de várias pessoas perguntando por Eduardo, todas elas se afastando um pouco mais de onde estávamos, provavelmente seguindo a portadora das notícias enquanto eu contava até cinco antes de sair com a fonte da fofoca.

— Pronto? — eu perguntei pro Edu e ele anuiu, então eu abri a porta levemente e notei que estávamos sozinhos — agora, se você conseguir andar rápido, é melhor — eu pedi e notei que ele começou a se esforçar para que seus passos trôpegos não caíssem enquanto descíamos as escadas com calma, um passo de cada vez, até que chegamos no estacionamento de brita.

Sandro, como uma pessoa competente e em uma missão, já estava nos esperando ali com seus objetos designados.

— Sandrinho, consegue dar carona pro Golden, Deia e Gali? — eu pedi, pois eles haviam vindo conosco e provavelmente esperavam que voltaríamos na mesma configuração.

— Claro, Noronha. Manda notícias? — ele me perguntou, mesmo que o seu olhar estivesse em Eduardo, que estava muito muito calado e com um semblante exaurido.

— Pode deixar. Obrigada — eu segurei a sua mão, pegando minha clutch e colocando o blazer nos ombros de Edu.

Então nós ouvimos algumas vozes se aproximando de onde estávamos e a minha troca de olhares com Sandro foi tão breve que eu quase não soube se ele me entendeu, mas eu acho que entendeu sim, porque ele saiu correndo dali para encontrar Valter perto das escadas e começar a conversar com ele, convencendo-o a voltar pro churrasco.

Era oficial, eu era fã de Sandro Ventura. Breno e Lucas tinham um pai e tanto.

— Edu, cadê sua chave? — eu perguntei, tateando o bolso da sua calça, porém apenas encontrando sua carteira e celular.

— Eu consigo dirigir — ele murmurou, dando um passo para frente e seu joelho cedendo pela falta de força que tinha em seus músculos naquele momento.

É, acho que a geleia de Eduardo o definia muito bem.

— Edu... — eu chamei sua atenção, segurando o seu corpo contra o seu Cruze prata para que ele não caísse no chão, naquela brita que com certeza causaria ainda mais estrago do que já existia — eu tenho carteira e só arranhei o carro do Romeu uma vez em dez anos. Ou duas. Mas eu juro que eu consigo nos levar para casa e...

Eu parei de falar quando senti os braços dele ao meu redor e algo pesado ser colocado contra os meus ombros. O seu perfume de One Million me inebriou por um momento e eu fechei meus olhos, inalando a essência que estava impregnada no colarinho do seu blazer antes de voltar a olhá-lo. Suas mãos estavam deslizando pelos meus braços em uma fricção delicada e quente, aquecendo-me mesmo que eu não soubesse que estava com frio.

— Desculpa por estragar seu dia, Má — ele murmurou e eu inclinei meu rosto para o lado, notando que a toalha branca estava caída no chão e o seu corte parecia que, finalmente, havia estancado.

— Eu estava apenas procurando uma desculpa para sair desse churrasco sem carne e linguicinha, Edu, só não precisava ter causado esse tanto de caos — eu sorri para ele, vendo-o sorrir, porém depois hesitar e colocar a mão no estômago — ai, desculpa.

— Eu só... tudo dói — ele murmurou e enfiou a mão no bolso do blazer que estava ao meu redor, retirando a chave do seu carro e colocando-a na minha — eu vou me arrepender se te deixar dirigir meu carro?

— Às vezes a gente precisa tomar riscos — eu comentei de maneira evasiva, não querendo comentar que o carro dele era maior do que o do Romeu e que isso me preocupava um pouco, mas ele já estava mais prá lá do que pra cá, então esse detalhe apenas o preocuparia sobre algo que nenhum de nós tinha domínio.

Eduardo dirigir era fora de questão, então eu era a nossa melhor opção.

Depois que eu consegui colocá-lo dentro do carro, prendendo o cinto de segurança em seu corpo e conferindo se não havia mais um machucado que eu precisasse me preocupar — não tinha —, eu entrei em seu carro e respirei fundo.

Ok.

Eu ajustei o banco mais para frente, arrumei os retrovisores para minha altura e me livrei dos meus saltos, porque era apenas horrível dirigir com eles (além de ser ilegal), então eu os lancei para o banco de trás e abri minha clutch prendendo meus cabelos com um elástico e encontrando duas presilhas para segurar a seda das pernas do meu macacão, pois eu tinha certeza de que ele iria me atrapalhar se eu não os prendesse na altura do joelho.

Banco? Check.

Retrovisor? Check.

Pernas? Check.

— Cinto? — Eduardo me perguntou, pelo jeito eu estava fazendo minha checagem de lista em voz alta, e eu o olhei quando já estava prestes a tirar o carro do ponto morto para nos levar para casa — e Waze?

— Muito bem lembrado — eu senti minhas bochechas coradas, porque agora ele não acreditaria que eu conseguiria nos levar inteiros — tem que ficar de olho com blitz também. Eu tomei só duas tacinhas, mas...

Eu me prendi com o cinto e coloquei no meu celular o endereço de Retúlio, sabendo que Romeu possivelmente não estaria em casa, porque ele tinha uma confraternização de fim de ano da empresa dele, mas Tutti estava pela foto de pipoca e Naruto que ele mandou no nosso grupo "Amores do Rommi".

Então nós já estávamos a caminho e, para um sábado de noite, as ruas estavam relativamente movimentadas, não me deixando ir na velocidade da luz que eu pretendia quando notei que o corte do Edu havia voltado a sangrar e ele estava sem a toalha branca.

Onde ele havia enfiado aquela toalha, senhor?

— Eu tenho um pacote de lencinho de papel. Pode usar — eu apontei de maneira lacônica para minha clutch e ele concordou automaticamente comigo mesmo que eu soubesse que ele ainda não havia reparado que havia voltado a sangrar, abrindo-a e começando a retirar tudo o que havia ali.

Um batom, minha chave de casa, um engov, um pacote de chiclete, uma paçoquinha, uma caneta azul e outra vermelha, dois elásticos para cabelo, um colírio, minha carteira, minha bolsa de moedas e, finalmente, o pacote de lencinhos.

— Isso é tipo a bolsa da Hermione? Se eu continuar colocando a mão aqui dentro uma hora Retúlio saem também? — ele me perguntou, pegando todos os lencinhos e os pressionando contra sua sobrancelha, não notando que uma gota havia escorrido pelo seu dedo.

E eu não contaria, porque eu não precisava de um Eduardo desmaiado ali comigo.

— Daqui a pouco você vai encontrar o corpo da Yasmin e descobrir que na verdade eu a sequestrei, porque ela sempre sobrepunha a fiação elétrica com a tubulação de saneamento — eu brinquei, parando no sinal vermelho e pegando o lencinho umedecido de dentro da clutch e limpando a mão de Eduardo antes que ele notasse.

Talvez ela fosse mesmo tipo a bolsa da Hermione, porque ainda havia um hidratante para mão e meu canivete — nunca se sabe quando a gente precisaria de uma pinça, lixa ou tesoura, não é?

Ele me olhou de novo de soslaio e, por mais que o lado do seu rosto que eu tivesse visão fosse aquele que estava desconstruído por causa da briga, havia ainda um toque de Eduardo ali, a maneira como o seus lábios se levantavam na menor menção de uma piadinha ou como o seu olho, mesmo que estivesse quase se fechando de tão inchado, ainda tivesse o mesmo brilho.

Ele brilharia em qualquer lugar. Em qualquer situação.

E era tão injusto que alguém tivesse feito isso com ele!

Eu queria matar o Igor por ter machucado o Eduardo.

E queria matar o Eduardo por ter se metido em uma briga por minha causa.

Poderia ter sido tão pior. Eduardo poderia estar tão pior. Ele poderia ter se machucado de maneira mais grave ou quebrado um osso ou até mesmo tido um corte mais fundo, porque tinha tanto vidro quebrado e tanto sangue...

— Edu? — eu o chamei, seguindo o Waze e acompanhando os outros carros na mesma direção da capital, sentindo-me apenas mais um peixinho naquele extenso cardume — eu te agradeço por ter me defendido e essas coisas, mas, por favor, nunca mais faça isso, ok? — eu pedi com a voz baixa — não importa o que as pessoas digam sobre mim ou que elas mereçam uma vida no inferno por serem péssimos espécimes de ser humano... nunca mais.

— Marcela... — ele disse o meu nome no meio de um suspiro e um grunhido, como se não soubesse se queria ter calma ou apenas vomitar mais xingamentos para o Igor.

— Não importa o que. Eu não posso... não quero nunca mais te ver assim. Por favor — eu não tirei os olhos da estrada por um segundo que fosse, mas senti minha voz embargando levemente e eu comecei a piscar rapidamente para não chorar ali, porque o Eduardo já tinha coisa demais em sua mente e eu não queria ser uma preocupação — por favor, Edu.

Eu troquei da quinta para a quarta, depois para a terceira e nos virei em uma esquina, porque o Waze alegou que teria uma blitz a nossa frente e eu não queria ter que passar por aquela situação, principalmente, porque o Edu estava com o rosto arrebentado e os policiais poderiam querer nos parar para saber se estava tudo bem.

O Waze recalculou nossa rota e acrescentou dois quilômetros e sete minutos, porém aquilo era melhor do que perder a carta e levar uma multa — e possivelmente uma noite na cadeia.

— Sinto muito por te fazer sentir assim — ele murmurou, apoiando a cabeça contra o apoio do carro.

— Eu só... odeio te ver dessa maneira e não conseguir ajudar em nada. Eu me sinto tão...

— Impotente — nós dissemos juntos, porque eu acho que estávamos compartilhando o mesmo sentimento por motivos diferentes.

Eu parei o carro em mais um sinal vermelho e arrumei a presilha na minha calça, pois ela estava escorregando, então, senti a mão de Eduardo em cima da minha mesmo que ele soubesse que eu tinha que sair do neutro e ir para a primeira quando nos colocasse em movimento.

E depois para a segunda.

E depois para a terceira.

Ele não soltou minha mão e eu senti como se ele fosse elétrico, pois sempre que seus dedos abraçavam os meus, todos os meus pelos se arrepiavam e eu respirava fundo, porque aquele simples movimento aquecia meu coração, fazia com que eu quisesse virar uma esquina errada só para aumentar o tempo de viagem e não ter que dizer boa noite.

"Boa noite", porque a noite em si havia sido péssima, mas eu estava ali com o Edu agora e isso fazia com que as coisas não fossem tão ruins assim, eu acho.

O arquiteto ligou o seu rádio e, automaticamente, ele conectou com o seu bluetooth, começando a tocar a playlist com todas as músicas que eu já conhecia de cor e salteado de tanto que havíamos ouvido juntos.

Será que quando ele escutava cada uma delas, ele se lembrava de mim da mesma maneira que eu me lembrava dele? Será que ele ainda se perdia em mim mesmo quando eu não estava perto? Ou melhor, será que ele ainda se perdia em mim por eu não estar perto? Porque eu me sentia assim às vezes.

Acho que era isso o que chamavam de saudade, né?

Eu nunca acreditei quando me falaram que havia um abismo de diferença entre sentir saudade e sentir falta de alguém, mas agora, naquele pequeno espaço de tempo no meio de São Paulo, trocando as marchas do Cruze com Eduardo segurando minha mão, eu entendia.

Saudade era maior. Era mais forte. Era uma emoção que vinha de dentro e te enchia com uma nostalgia tão boa que era como se você estivesse flutuando em gravidade zero mesmo que seus pés jamais saíssem da Terra.

Eu parei na frente do prédio de Retúlio e admito que sofri um pouco mais do que o socialmente aceito para fazer aquela bendita baliza, mas, em minha defesa, o carro do Eduardo era mesmo maior do que o do Romeu e eu estava morrendo de medo de bater no Fox que estava na nossa frente ou no Fiat que estava atrás.

— Pode só me levar para casa, Má — ele resmungou quando eu o arranquei do carro e nós entramos no prédio.

— Boa noite, Genilson, o Getúlio está? — eu perguntei pro porteiro assim que nós entramos.

— Claro, Dona Marcela, pode aproveitar e levar essas cartas? — ele me entregou cinco cartas e eu apenas sorri, pegando-as e andando para o elevador antes que ele resolvesse perguntar sobre o que havia acontecido com o meu acompanhante.

Eu apertei o botão do décimo andar e notei que Eduardo estava ainda com os meus lencinhos imundos de sangue contra a sobrancelha e eu me aproximei dele, retirando-o de sua mão para que ele não tivesse que ver o sangue quando chegássemos no apartamento de Retúlio.

Sua mão machucada se levantou e ele tocou o meu rosto com leveza, como se tivesse medo que eu fosse me afastar dele, só que ele não entendia que eu já havia ficado longe o tempo suficiente para saber que eu nunca mais queria passar mais do que dois minutos distante.

— Obrigado por cuidar de mim — ele comentou baixinho, mais uma vez.

— Me agradeça apenas depois que o Tutti te costurar — eu brinquei e os lábios do Edu ficaram brancos como papel e o seu corpo começou a desabar no elevador mesmo, então eu apenas o prendi em uma gaiola de pernas e braços — Eduardo! Edu, caralho! — eu passei um braço dele ao redor do meu corpo e nós saímos do elevador.

Eu toquei a campainha três vezes, pois eu até tinha a chave do apartamento deles junto com a minha, porém se eu tentasse pegá-la, Eduardo estaria des-mai-a-do no chão do corredor e eu temia que não conseguisse mais levantá-lo, porque meus braços estavam começando a queimar de tanto sustentar o seu peso.

— Esqueceu a chave, Cela? — o pediatra atendeu a porta com seu pijama que era o rosto de Romeu dentro de vários corações. Blusa e shorts.

Eu poderia até rir e tirar sarro dele, porque é o que eu faria antes de dizer que eu amava o amor dos dois, só que Getúlio olhou para Eduardo completamente desestabilizado do meu lado e logo me ajudou a levá-lo até a cozinha deles, colocando-o em uma cadeira e indo buscar um travesseiro para seu pescoço.

— Vocês resolveram terminar de brigar de maneira física? Que estrago, Marcela do céu! O que aconteceu com o Cristal? — Tutti me acusou e eu queria retrucar que eu ia fazer um estrago nele, mas eu precisava que ele me adorasse eternamente para ajudar o Eduardo naquele momento.

— Edu entrou em uma briga por mim e precisa de pontos e sal e analgésico e uma anestesia e um rosto novo — eu ajoelhei ao lado do arquiteto, pegando sua mão e contornando o nós dos seus dedos com a ponta do meu indicador com calma — preciso da sua ajuda, Tutti, por favor.

Meu amigo me olhou por dois segundos antes de encarar Eduardo, mais uma vez, e tomar o rosto dele em suas mãos, encarando-o contra a luz para ver todos os pequenos hematomas, cortes e escoriações e qual a real extensão dos danos.

— Ok, mas depois você vai ter que me explicar o que aconteceu — ele respirou fundo e esticou seu corpo, estalando seus ombros — sorte a sua que eu ainda não abri meu Pinotage, senão eu poderia costurar a sobrancelha dele toda torta.

Getúlio saiu do meu campo de visão e eu fui até o saleiro da sua cozinha, pegando uma pitada de sal e a colocando em minha palma.

— Edu? Abre a boca, por favor? — eu pedi, vendo que ele estava olhando para mim, porém eu não tinha certeza se ele estava exatamente me enxergando, então eu apenas abri a boca dele com jeitinho como havia feito antes e coloquei o sal ali embaixo da sua língua quente e suave e úmida e... — meu Deus, o Chico vai me matar.

— Ele vai me matar. E depois te matar — Eduardo comentou com a voz rasgada e mole, assim que Getúlio voltou com uma blusa branca limpa, seu kit de primeiros-socorros profissional e luvas de látex. Ele até colocou o seu óculos de lupa, porque, como eu havia suspeitado, o Edu precisaria de pontos.

Eu me sentei no chão, ao lado de onde Eduardo estava, e deixei de olhar a cena, porque eu não tinha problemas em ver sangue, mas isso não significava que eu estava tranquila quando Getúlio colocava aquela agulha na pele de alguém e...

Não sei exatamente quanto tempo demorou todo o procedimento, só sei que, quando acabou, eu já estava abraçando uma das mãos de Eduardo como se fosse minha, pousando beijos em suas costas sem nem ao menos notar o que eu estava fazendo. E eu só notei que eu tinha que parar quando Túlio me disse que ele precisava limpar esse machucado e fazer o curativo também.

Eu me levantei do chão e uma parte de mim, vinda das profundezas da minha alma, um soluço me escapou e depois dele veio uma sequência, então eu me afastei dos dois, porque, agora que a adrenalina estava abaixando, Eduardo estava sendo atendido pelo melhor pediatra de São Paulo e eu não estava mais correndo contra o tempo para que ele não sangrasse até a morte, eu finalmente relaxei.

Era como se o apartamento estivesse quente demais e eu precisasse apenas de uma brisa. Um ventinho. Um... ar fresco. Então eu fui em direção da sacada deles e a abri, recebendo exatamente aquilo que eu queria junto com uma visão de São Paulo que eu amava, porque onde eu morava eram apenas prédios em cima de prédios, mas onde eles moravam eram majoritariamente casas, então eu via as luzes das casas noite adentro e tentei me concentrar nelas.

Depois de prender minha respiração quatro vezes, finalmente o soluço havia ido embora, porém ele havia sido substituído por lágrimas que não queriam parar de descer pelos meus olhos.

— Marcela? — eu ouvi a voz de Getúlio atrás de mim, assim eu limpei meus olhos e coloquei um sorriso ali, porque não queria que ele visse como eu estava abalada — tudo certo. O corte vai acabar nem marcando, porque a pele dele tem boa cicatrização. Os roxos vão demorar uma ou duas semanas para curar e ele não pode fazer exercício físico ou passar produto químico no rosto ou na mão, porque senão pode manchar.

— Ok, obrigada — eu concordei com ele, começando a andar até a cozinha, porém ele me parou ainda com a luva látex em sua mão. Suja de sangue.

— Cela, o que aconteceu? Está tudo bem? — ele me indagou com aquela sua preocupação que em momentos assim, chegava até ser paternal.

Paternal.

Meu Deus, o que o Eduardo diria para seus pais? O Natal era logo ali e ele com certeza teria que ir para casa! Ele diria que entrou em uma briga por mim? Será que ele havia contado algo a mais sobre mim para eles? Será que eles já me odiavam e iriam me odiar ainda mais...?

— Ele... um cara falou merda sobre mim e o Edu perdeu a paciência — eu respondi, dando de ombros e senti a mão do pediatra afrouxando meu braço — eu só... muito muito obrigada, Tutti — então eu o abracei e, assim que suas mãos me envolveram, eu senti aquela força que havia dentro de mim quebrar, então eu apenas enfiei meu rosto no espaço do seu ombro e senti lágrimas escorrendo com mais força — tinha tanto sangue Tutti. E não parava de sangrar. E eu fiquei com tanto medo.

— Shh, acabou. Acabou — ele me segurou mais firme contra o seu corpo e me embalou até que eu parasse de ofegar entre uma respiração e a outra, afagando minhas costas com carinho — está tudo bem agora, o Eduardo já até recebeu um pirulito por não ter chorado com o antibactericida. E aí ele ganhou outro quando ele acordou depois de desmaiar de novo.

E aí eu acho que eu ri.

Getúlio me abraçou por mais alguns minutos até que eu me acalmasse e aí me mandou pro banheiro, limpar o nariz e arrumar a papa de maquiagem que havia escorrido pelo meu rosto.

Quando eu me olhei... parecia que eu era uma daquelas bonecas de cera já derretendo, por causa o que estava acontecendo com o meu reboco, então eu apenas lavei o meu rosto, vendo a base, blush, bronzer, sombra, rímel, delineador e batom serem lavados do meu rosto e escorrendo ralo abaixo.

Eu sequei meu rosto com papel higiênico, porque se eu usasse a toalha Trousseau deles, Romeu simplesmente me mataria enquanto eu dormia, e ele tinha razão, porque mesmo depois de lavar meu rosto três vezes, o papel ainda saiu com alguns resquícios de maquiagem.

Assim que eu voltei para a cozinha, eu olhei para Getúlio, que estava com uma taça em mãos, e Eduardo que tinha uma sacolinha como se tivesse acabado de sair do posto de saúde de tanto remédio.

— Vamos? Eu tenho ainda que enfrentar a ira do Henrique Francisco — eu apoiei meu corpo contra o batente da porta e tentei me focar no meio sorriso do rosto do Eduardo, porque aí eu não teria que ver os curativos e pensar que uma parte daquilo era minha culpa.

Porque ele me defendeu.

— Só pode sair depois de dar um sorriso. Ordens médicas — Tutti tombou o rosto na minha direção e eu levantei uma sobrancelha para ele, querendo saber se ele queria mesmo fazer isso, porém pelo seu olhar sério, ele realmente queria arrancar um sorriso meu, então eu apenas mostrei meus dentes para ele, quase rosnando — você já foi melhor nisso, sabia?

— Eu só... foi um longo dia — eu dei de ombros e olhei de novo para o Edu, que estava me olhando, possivelmente vendo a minha transformação entre como eu entrei no seu carro naquele dia e como eu estava naquele momento.

Começando o dia princesinha e terminando a mendiga. Fato.

Ele se levantou e eu fui até ele, porém notei que ele estava conseguindo se firmar em suas duas pernas sem mim e eu não sei se fiquei feliz por ele estar melhor ou apenas... então ele colocou uma mão na base das minhas costas, como se ele é quem fosse me guiar ali — e eu não fui nem louca de questionar, porque eu amava a mão dele no meu corpo, mesmo que tivesse camadas de roupa demais entre nós para o meu gosto.

— Boa noite, Tutti, obrigada e desculpa o incômodo — eu sorri para ele, mandando um beijo no ar, porém ele não retribuiu, apenas sorriu contra a sua taça e meneou a sua cabeça para nós antes de dar um aceno genérico. O que eu não havia entendido?

Eu dirigi quase trinta minutos no meio de um trânsito chato para sair da Zona Norte até o Itaim, parando e tentando evitar todas as motos que estavam costurando o trânsito e enfiando minha mão na buzina quando um carro simplesmente freou do nada.

Do meu lado, Eduardo estava apenas rindo da minha cara, comentando que ele poderia me dar aulas de direção caso eu realmente quisesse aprender a dirigir um carro e eu mostrei o dedo do meio para ele.

Acho que as coisas estavam começando a melhorar.

— Desde quando você escuta Boate Azul? — eu perguntei quando o sertanejo começou a tocar e Eduardo se curvou um pouco para a frente ao rir um pouco mais alto — Edu...

— Eu tô bem, Má. Provavelmente amanhã eu vou acordar um caco, mas hoje eu ainda estou só... caralho, desculpa te alugar como enfermeira e motorista — ele tombou o rosto na minha direção e eu meneei a cabeça — e desculpa te preocupar.

— Eu não... — eu tentei desdizer, mas era claro que ele havia escutado quando eu disse isso para o Túlio — eu só... — mas as palavras não apareceram.

— Bem, acho que a gente está se sentindo mais ou menos da mesma maneira, porque eu me preocupo com você todos os dias que... — aí um carro cortou a minha frente pela direita e eu, por reflexo, cortei a frente do carro da direita, porém ele estava mais lento, então nenhum acidente ocasionado — ok, Marcela, você nunca mais dirige nada!

— Cacete! Puta que pariu! Caralho, caralho, caralho! — eu praguejar tudo de uma vez, sentindo meu coração contra o meu peito quase explodindo — filho da puta — eu sussurrei — desculpa, não. A mãe dele não tem culpa do filho bração.

E aí o Eduardo começou a gargalhar, rindo e agonizando ao mesmo tempo em que eu estava apenas nos levando para mais perto do nosso objetivo. Eu não sabia ao certo se tinha que socorrê-lo ou se estava tudo bem.

Nós chegamos em seu prédio e ele estava começando a parar de rir, limpando as lágrimas do seu rosto quando eu embiquei o carro para frente e comecei a manobrar na sua vaga que era bem mais simples do que uma baliza, então eu só precisei de duas tentativas para acertar.

— Ok, entregue — eu desliguei o carro e busquei meus sapatos no banco de trás, prendendo-os nos meus pés e só notando agora que eu havia ido para o apartamento de Tutti descalça e com presilhas prendendo minha calça.

Jesus, que decadência.

— Quer que eu peça pro Leandro te levar pra casa ou algo? — ele sugeriu, olhando-me e eu mordi os lábios ao negar aquele convite — certeza? Não é incômodo.

— Tudo bem. Eu peço um uber — eu saquei o celular e comecei a desbloqueá-lo, porém Edu colocou a mão sobre ele, impedindo-me — ei...

Só que eu não consegui terminar de falar, porque ele envolveu meus cabelos com as suas mãos e eu fechei meus olhos, quando ele puxou meu rosto para mais perto do seu. Seus lábios tocaram primeiro meu pescoço, deslizando pela minha pele exposta até minha orelha, deixando que eu sentisse o seu hálito quente ser a fagulha que acendeu algo dentro de mim. Era um tumulto coletivo que nascia de dentro do meu peito, porém que se espalhava por todo canto, principalmente em um calor que me inundava no peito.

Aquilo era tão bom. Tão certo. Tão... era como se eu tivesse passado um ano longe do sol e agora tivesse redescobrindo o que ele poderia fazer comigo. Ele iluminava minha vida, me aquecia, fazia com que tudo parecesse girar ao seu redor e...

Havia acontecido tanta coisa naquela noite que provavelmente nada voltaria a ser o que era antes.

Para ninguém.

A única coisa que eu acho que nunca iria mudar era que eu ainda amava Eduardo Senna. Com todo o meu coração. Até as partes que eu jamais imaginei que amaria. Até as partes que eu ainda não conhecia.

Eu prendi a respiração quando o senti dar pequenos beijos, em uma linha do meu pescoço até minha boca. Cada beijo eu me perdia mais dentro daquele momento. Dentro dele. Querendo apenas que ele chegasse logo nos meus lábios e acabasse logo com aquele...

Aí um clarão fez com que nós nos afastássemos um pouco e Eduardo olhou para o lado, ainda com as mãos em mim, mas sua atenção já não estava mais no evento que me fez quase ter uma experiência extracorpórea. E que eu queria que ele não parasse.

Por Deus, o carro não poderia ter chegado em outro momento?

— O Lê tinha saído? — ele sussurrou aquelas palavras, soltando-me e eu precisei segurar o meu corpo para que eu simplesmente não o seguisse às cegas, porque eu não queria que ele se separasse de mim, já que o seu calor era tão meu que eu não sabia mais o que fazer sem ele por perto.

— Edu... — eu o chamei com a voz baixa, contudo dois vultos surgiram à nossa frente com risadas que eu já bem conhecia e eu entendi, naquele momento, que era isso.

Acabou o timming, por mais que meu corpo inteiro ainda pulsasse. Quisesse. Implorasse...

Puta merda, Eduardo.

Ele não precisou me dizer o que faria, porque eu apenas abri a porta do carro no mesmo momento que ele, saindo dali para dar de cara com Henrique Francisco e Leandro.

— Olha aí... — Leandro começou a falar quando olhou Eduardo, então ele viu Eduardo. E aí eu acho que ele finalmente me notou, só que quem realmente falou não foi ele.

— Mas que caralhos aconteceu? — Francisco correu até o Eduardo e segurou o rosto dele com toda a preocupação que a precária luz de estacionamento nos permitia — meu santíssimo Atlético Mineiro, o que aconteceu com a sua cara, Edu?

— Eu só... entrei em uma briga? — ele sugeriu a resposta de maneira ampla e sem muitos detalhes, então eu foquei minhas energias em pedir meu uber para tomar um banho e hibernar até segunda-feira.

— Uma briga? Você? A última briga que aconteceu, você comeu areia no parquinho! A gente tinha sete anos! Por que eu sempre que eu deixo você sozinho por cinco minutos, você acaba com uma tatuagem ou tentando fazer cosplay de Frankenstein? — Henrique abraçou o amigo com força, dando vários beijos no lado do rosto dele que não estava machucado ao olhar para os curativos de Eduardo com uma análise clínica — quem foi que te costurou e por que não te trouxe pra mim? — e aí ele me olhou, claramente mirando aquela pergunta para a minha pessoa.

— Foi o Getúlio — eu esclareci antes que ele pensasse que eu tinha estômago para fazer uma coisa daquelas antes de eu virar uma gelatina de Marcela e nunca mais voltar a forma sólida — ele fez dois anos de especialização em estética antes de ir pra pediatria, aí eu pensei que ele poderia dar bons pontos no Edu... desculpa, Chico, eu não pensei na hora.

Henrique Francisco me encarou por alguns segundos antes de soltar Eduardo, que foi atacado por Leandro, que apenas falava sobre Arnica e várias técnicas para usar o corretivo amarelo para diminuir o arroxeado da sua pele.

— Tudo bem, você ajudou o meu Eduzinho. Seu único erro foi não ter trazido ele pra mim direto, mas o Getúlio é realmente muito bom, então nem disso posso reclamar, mas da próxima vez eu vou descosturar e costurar de novo, ouviu? Que traição, Eduardo — e aí ele me puxou para mais perto e me deu um abraço breve que eu tentei retribuir a altura, mas meus braços estavam cansados demais e eu... estava exausta para apertá-lo com ele estava me apertando — agora como você conseguiu fazer com que ele não desmaiasse com o sangue?

— Não consegui — eu respondi assim que ele me soltou, dando uma risada nervosa — ele desmaiou umas quatro vezes já e acho que vai precisar tomar um trinta litros d'água de tanto sal que eu enfiei na boca dele.

— Levantar as pernas ajuda também, sabia? Pode fazer isso na próxima — ele acrescentou, coçando seu queixo.

— Pelo amor de Deus, eu mato o Eduardo se tiver uma próxima vez. Meu emocional não aguenta mais um dia desses não, sinceramente — eu senti meu celular vibrar, meu uber avisando que estava a cinco minutos de distância dali.

— Bem, você basicamente passou pela prova de fogo, porque eu desmaiei quando o Edu desmaiou a primeira vez na minha frente — Leandro disse do meu lado e apertou o meu ombro em um cumprimento tardio.

Sem sorriso cheio de gengivas, eu reparei, o que eu acho que era algo bom?

— Você sabe o transtorno que dá cuidar de dois desmaiados? Leandro deu mais trabalho que o Eduardo, de verdade — Chico continuou e eu olhei para meu celular de novo — Ele desmaiou umas três vezes porque o Eduardo não acordava e só falava coisas sobre proteger o rosto lindo dele. E não se engane, "dele" não se refere ao Edu.

Três minutos.

— Gente, eu tenho que ir... — eu avisei, começando a retirar o blazer do Eduardo que ainda estava em meus braços. Não porque eu estava com calor, mas porque eu tinha que devolver para o seu verdadeiro dono, né?

— Fica com ele, Má. Me entrega depois — o arquiteto segurou minhas mãos — seu macacão está todo sujo e está tarde, sabe? Tem certeza de que não quer aceitar a carona do Leandro?

— O Leandro não se importa, ok? — Leandro em pessoa me informou, mesmo que eu tivesse notado que o Edu, em momento algum, perguntou ao colega se ele tinha essa disponibilidade.

— Não precisa, sério. Meu uber está a dois minutos — eu mostrei a tela do meu celular para ele — mas aceito o blazer então. Aí eu mando lavar junto com o macacão, porque provavelmente ele deve estar com uns resquícios de sangue também e...

Só que eu parei quando o rosto do Edu passou para uma cor branca que eu conhecia mais. Era o branco-preocupação.

— Marcela... eu estraguei o seu macacão? Por causa do sangue? — ele me questionou e a resposta era sim, o sangue provavelmente havia estragado o tecido e eu teria que ver com a lavanderia se ela conseguiria salvar ainda, porque a seda era delicada demais para passar produtos muito agressivos.

— Não, claro que não. Vanish resolve. Confia no rosa — eu menti na cara de pau e notei que ele tentou franzir as sobrancelhas, porém eu coloquei meu polegar entre elas para impedi-lo — não faz isso, vai repuxar o ponto e te machucar. Finge que você fez um botox.

— E isso significa...? — ele pediu implicitamente que eu continuasse a frase.

— Ficar sem mexer o rosto — Leandro complementou, se entregando de graça — não que eu tenha feito, claro, minha pele é perfeita naturalmente com skincare e amor, mas pessoas normais precisam, né?

— Claro — nós três respondemos juntos quase em uma canção de desconfiança, porque isso explicaria tanta coisa.

— Ok, eu realmente preciso ir. Meu carro chegou — eu comecei a me afastar deles na direção do elevador.

— Má? — eu senti a mão de Eduardo me puxando para perto antes de me abraçar e eu apenas deixei minhas mãos pairando sobre o seu corpo, porque eu estava apavorada de machucá-lo se eu o abraçasse um pouco mais forte — quer que eu te acompanhe até lá em cima?

— Nada disso, Don Juan. A gente acabou de fazer compras de supermercado e você não está tão acabado assim que não possa levar umas sacolas lá pra cima — Chico o interrompeu e os dois trocaram olhares.

Aquele tipo de olhar que é uma conversa inteira em apenas dois segundos, por isso eu desviei o meu, porque eu não queria ser enxerida mesmo que estivesse morrendo de curiosidade para saber sobre o que, efetivamente, eles estavam falando.

— Fica aí, Edu. Eu acho que consigo chegar até a entrada sem me perder — eu brinquei com ele e senti sua mão arrumando meu cabelo que havia se tornado um emaranhado meio estranho, já que o rabo de cavalo havia caído e o elástico estava no meu pulso, mas ele ainda estava meio preso para cima com alguma mágica antigravitacional.

— Obrigado por hoje, Marcela, e desculpa — ele repetiu aquelas palavras pela enésima vez naquela noite.

— Para de pedir desculpas, Eduardo — eu pedi, usando o seu nome assim como ele havia feito comigo e virei o seu rosto para o lado antes de pousar um beijo gentil em sua bochecha que não estava machucada — boa noite e tenta descansar. Qualquer coisa você me manda uma mensagem?

— Você também? — ele me perguntou depois de concordar comigo.

— Claro — eu assenti, entrando no elevador depois de um aceno para Leandro e Henrique Francisco, que prontamente haviam acenado de volta.

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Quartou, pessoal! Como vocês estão?

Por aqui estamos com o coração quentinho por Mardo ser tão cuidadoso e carinhoso um com o outro, mas extremamente fullstolas com os amigos deste casal que possuem o pior timming da história!

Tutti brilhando um pouquinho nas técnicas de como tratar um paciente frágil (pirulito é sempre uma ótima opção) e notando tudo o que a nossa Celinha não contou.

Quem aí aceitava uma carona da Má? Autoescola mandou um beijinho pra ela e convidou para umas aulinhas extras.

Quem está curtindo essa vibe dos dois? O que estão achando da história? Conta pra gente!! E não esqueçam da estrelinha!

Beijinhos,

Libriela <3

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