Capítulo 52 - Nadinha de nada
Nadinha de nada
Marcela
Marcela: Chego em 10
Marcela: Tá vindo?
Marcela: Edu?
Eu esperei alguns minutos na porta do seu apartamento antes de finalmente me dar por vencida e apertar o botão do interfone, porque o guardinha da rua já estava me olhando estranho de tanto tempo que eu estava ali parada. Eu queria que o bendito apenas tivesse esquecido de me avisar que estava em casa — o que não foi o caso, porque Leandro foi quem me liberou para entrar no prédio.
Como é que alguém marcava de te encontrar na casa do abençoado e ele simplesmente esquecia de estar em casa?
Ok, talvez o meu plano brilhante de comprar um engradado de Eugências no mercadinho tenha sido genial e romântico à primeira vista — principalmente porque ela estava dez centavos mais barata do que eles pagavam quando compravam no próprio Bar dos Ardos, então eu achei que valia o presente — eu só tinha me esquecido de que eu teria que carregá-las até o apartamento deles.
Na hora foi ok, porque eram apenas dois quarteirões.
No entanto, dois quarteirões não eram tão pertinho quando você estava carregando uns dez quilos em bebida e garrafa, então dizer que eu estava exausta era um leve eufemismo.
— Má! Quer ajuda? — Leandro me perguntou assim que abriu a porta — não esqueça de tirar os sapatos, pode ser?
— Combinado, Lê — eu tirei minhas sapatilhas e as coloquei no novo tapetinho que eles colocaram ao lado da porta, deixando que ele pegasse o engradado e o colocasse em cima da mesa da cozinha, começando a esterilizá-lo com álcool — está pronto para uma auditoria no apartamento? Ou alguma coisa do gênero?
A princípio ele pareceu confuso, porém eu apontei para o vidro que ele estava passando a terceira mão de álcool, praticamente arrancando o rótulo, então ele começou a rir.
— Eu acho que estou em uma vibe de organizar tudo — ele deu de ombros, depois de limpar sua garganta, e deixou o paninho na mesa com relutância, porque estava claro que ele ainda não estava satisfeito.
— Lê, pode limpar, eu deixo — eu concedi e ele sorriu para mim, voltando a passar mais uma mão de álcool nas garrafas com tanta euforia que eu me perguntava se ele ficaria feliz assim para arrumar e limpar o meu apartamento.
Depois que ele deixou todas brilhantes e perfeitamente alinhadas na mesa, ele voltou a olhar para mim, como se tivesse se lembrado que existia outro ser humano com ele naquela cozinha.
— Eu até te ofereceria um vinho, mas o Edu ainda não repôs ainda. Pode ser outra coisa? — ele coçou a nuca e eu meneei a cabeça.
— Absurdo — eu gracejei.
— Eu sei, eu disse a mesma coisa — ele meneou a cabeça, falsamente decepcionado com o colega.
— Vocês sabem que eu bebo coisas além de vinho, né? Neste momento acho que eu aceito uma água — eu disse, sentindo minha garganta seca, então ele me deu um copo, abrindo uma Eugência para si mesmo enquanto nós íamos até a sala para nos sentarmos no sofá. Acho que a maior parte das vezes que eu fui ali, eu sempre me sentava no chão em cima do tapete ou na cadeira ao redor da mesinha de centro, então eu ainda me sentia levemente estranha quando o almofadado do sofá me engolia — desculpa vir assim do nada. Eu meio que tinha combinado com o Edu, mas ele parou de me responder.
— Relaxa, hoje em dia você é praticamente de casa — ele me garantiu e colocou uma reprise de Masterchef primeira temporada para passar. Nossa, eu acho que nunca havia assistido um episódio que fosse desta temporada, porque não reconheci nenhum dos participantes — mas fica tranquila, ele respondeu agora pouco que estava no shopping com a Tams, então deve chegar em uns minutos.
— Eduardo Senna em um shopping? Isso não é tipo uma blasfêmia ecologicamente incorreta? — eu relaxei meu corpo no sofá e tomei mais um gole do meu copo d'água.
— Má, você não faz ideia do que ele faz quando você não está aqui. Outro dia a gente descobriu que o desodorante que ele usava uns anos atrás era um desodorante CFC que agredia a Camada de Ozônio — ele sussurrou e eu abri meus lábios em uma indignação verdadeira — mas você não ficou sabendo disso por mim.
— Leandro, você acabou de vencer umas trinta discussões por mim pelo resto do ano — eu brindei meu copo com a garrafa dele enquanto olhava aquele mercado caótico e Leandro dar pequenas risadinhas quando as pessoas deixavam cair o limão no chão.
Bem, pelo menos ele estava sorrindo e não estava chorando pelos cantos depois de terminar o seu rolo com a Cecília, como eu havia imaginado que ele o faria. Ele estava bem, só apenas... limpando mundo a fora — e ela, em contrapartida, estava tão focada no restaurante que eu tinha dúvidas se ela realmente havia notado que não estava mais com o Leandro.
O Edu até tinha comentado isso outro dia quando...
Então algo que Leandro comentou tocou um sininho de reconhecimento em minha mente. Tão sutil que eu não teria notado se eu não prestasse atenção em todas as coisas que me falavam para analisar e reanalisar — um hábito horrível, eu sei.
Edu estava com a Tamara? Tamara... a loira estonteante um sorriso brilhante e o cabelo com uma cor dourada que fazia inveja até no Sol? De quando a gente ainda não estava junto, né?
Eu franzi meu cenho, encarando o líquido do meu copo, para encontrar uma resposta que explicasse ele não ter me contado isso.
As vezes ele esqueceu? Sim, deve ser isso. Deve ter sido até um encontro casual em que eles se esbarraram no shopping e ele começou a falar com ela? Aí isso explica o motivo de ele não ter me respondido, porque ele estava falando com ela e ele não curtia responder mensagens quando estava acompanhado.
Mas por que ele respondeu o Leandro, então?
Bem, se pensar se aqueles três eram praticamente um trisal, então fazia sentido ele ter respondido as mensagens dele.
Certo, mistério resolvido.
Eu bebi mais um pouco do meu copo e respirei fundo, desfazendo minha careta de concentração para voltar a olhar para o episódio, notando que as pessoas cortavam mais os dedos do que cozinhavam. Era um desperdício de tempo danado e uma falta de eficiência.
Pouco depois a porta da casa deles se abriu e Eduardo chegou com mais de cinco sacolas de roupas branquíssimas e uma de um lençol que o Leandro praticamente se jogou no chão e beijou os pés do arquiteto quando viu a embalagem.
E a fama de Rei dos Lençóis procede conforme o esperado.
— Boa tarde, linda — Edu me deu um beijo de leve nos lábios ao deixar as sacolas em cima da mesa de centro e o Leandro se inclinou na direção dele, fingindo que também estava esperando um beijo — vou dar um high five na sua cara, Leandro.
— Ah, deu muito high five hoje, foi? — o "galã" deu o seu sorriso charmoso que eu juro que tinha um pouco menos gengiva do que antes.
Eu travei um olhar sereno no meu rosto, porque eu jurei para mim mesma que eu não iria mais analisar demais, mas... o que o Leandro quis dizer? High five? Por que o Edu e a Tamara...? Não foi assim que ele disse que ela se despediu dele depois deles terem... ?
Não, Marcela! Não!
Eu expirei para fora do meu sistema aquele temor infundado, porque se tinha uma coisa que eu sabia era que o Edu era uma das pessoas mais sinceras que eu conhecia — pelo bem e pelo mal —, então se ele realmente quisesse ter um rolo com outra pessoa, provavelmente eu já teria ficado sabendo disso. Porque nós dois éramos assim. Antes de qualquer coisa, nós trabalhávamos juntos. Éramos amigos.
Eu estalei o meu pescoço e expulsei aquelas dúvidas da minha mente, olhando para Eduardo, que agora estava esticando os seus braços enquanto devolvia os comentários de Leandro com rapidez e esperteza, seu lobo completamente visível pela posição que eu estava e...
Mordi meus lábios e senti meu celular vibrando, extremamente insatisfeita pela distração, porque eu poderia me perder por horas apenas desenhando Eduardo com meus olhos todas as suas nuances.
Romeu me mandou mais uma foto dele e de Túlio com os colares de flores ao lado de um vulcão ativo com as mãos dadas para sempre mostrar as alianças de ouro que eles usavam com tanta alegria que eu não conseguia não sorrir quando olhava para eles.
Aquela viagem de lua de mel era tudo e mais um pouco do que eles mereciam — ainda mais depois do surto dele quando sua mãe lhe mandou uma mensagem com a foto do meu presente de casamento que chegou um pouco atrasado. Meu e de Eduardo, né? Mesmo que eu tivesse escolhido.
Era uma caixa de Cabernet Sauvignon DOCG 2020 e o nome do vinho era... Retúlio. Bem, não daria para escolher outro presente para um homem apaixonado por vinhos que não fosse o seu vinho customizado.
Eu senti as mãos de Eduardo em minha cintura, me puxando para mais perto dele quando seus lábios encontraram minha bochecha e eu me virei para olhá-lo, buscando qualquer indício de que ele estava fazendo algo que não fosse apenas buscar as roupas brancas do Chico do shopping.
No entanto, ele me olhava como sempre, tão transparente e tão entregue que chegava a ser impossível de eu querer suspeitar algo dele ou de suas intenções, porque era como se ele me dissesse todas as coisas apenas por me olhar. E eu sempre acreditava, porque ele nunca mentiu pra mim. Nunca me enganou. E eu confiava piamente de que ele jamais o faria.
— Quer ir lá pro quarto? — ele indagou contra o meu ouvido enquanto Leandro desembrulhava o lençol de mil fios e se enrolava nele no sofá.
Ok, até eu sabia que você precisava primeiro lavar o lençol antes de efetivamente colocá-lo em uso, porém eu acho que a maneira que ele estava encapsulado com o tecido não estava previsto no manual de instruções.
Edu segurou a minha mão e nós fomos até o seu quarto, escutando Leandro gritar a distância que era para ele deixar a porta aberta, porque aquela era uma casa de família, o que fez com que o arquiteto fizesse exatamente o oposto, trancando-a.
Eduardo Senna, o rebelde.
Eu me sentei em sua cama antes de puxar a coberta pelo meu corpo e desarrumar até mesmo seus travesseiros que estava um sem um amassado, vendo-o engatinhar do meu lado no espaço que havia sobrado, porque eu poderia ser compacta, mas eu ainda gostava de me esticar na cama e conquistar território.
Não estava tão frio assim para nós nos cobrirmos, na verdade estava relativamente quente, só que eu não queria me afastar dele, eu queria ficar bem ali, do seu lado, por todo o tempo do mundo que ele quisesse ficar comigo — mesmo quando ele ficava assobiando melodias de músicas e eu tentava identificá-las.
Esta que ele estava assobiando agora não me parecia completamente desconhecida, porém eu não me lembrava exatamente de onde eu a conhecia.
— Edu, tá na hora de nós levarmos nosso lance mais a sério — eu comentei de brincadeira e ele arqueou as sobrancelhas, esperando para saber como aquela frase acabaria — você precisa terminar de assistir How I Met Your Mother.
Ele riu com aquilo e me puxou para mais perto do seu corpo, nos encaixando de todas as maneiras mais perfeitas que eu já havia me acostumado, incluindo o meu acesso irrestrito ao seu pescoço para que eu o beijasse eternamente, porque eu amava todas as suas curvas e o seu cheiro.
Eu raspei meus dentes do seu pescoço até o seu ombro, cobrindo-o de beijos e notando que o seu One Million estava levemente apagado por uma fragrância mais cítrica. Será que ele estava pensando em trocar de perfume? Bem, eu teria que intervir, porque eu amava o seu aroma e não queria nunca que ele mudasse.
— Fome? — ele me perguntou e eu ri contra a sua pele — porque você parece faminta.
— Bem, não é exatamente comida que eu queria — eu sussurrei contra o seu ouvido e passei minhas unhas em seu braço, notando como ele havia ficado arrepiado com aquela simples frase.
Ele fechou os olhos e eu dei risada, deslizando minha mão pelo seu abdômen, porém ele me impediu de chegar até o meu verdadeiro objetivo, encarando-me com aqueles seus caleidoscópios em diversos tons de azul com um toque de aviso.
— Marcela... — ele suspirou meu nome para fora e eu me afastei um pouco.
— Ok, depois do jantar então — eu me inclinei em cima do seu corpo e retirei o celular do meu bolso, colocando-o em sua mão antes de beijá-lo brevemente — o que acha daquele lugar que serve o strogonoff de cogumelos? E tem a batatinha palha fininha?
— Combinado — ele assentiu e colou seus lábios mais uma vez nos meus, invadindo minha boca com a sua língua quente e macia e tão gostosa que eu poderia passar dias e mais dias apenas o beijando.
Eduardo saiu de cima de mim rapidamente para perguntar se o Leandro não queria comer algo também e os dois entraram em um debate extremamente acirrado sobre o motivo do leite de côco ter esse nome se ele não tinha saído de uma vaca.
O celular dele, que estava largado na cama, começou a tocar e eu o peguei, notando que Cecília estava metralhando mensagens sobre os bancos de bambu combinarem com a mesa de madeira de demolição e uma sequência de móveis que não estavam nem perto de serem funcionais.
A firula de decoração era um traço de família, pelo jeito.
— Edu! Ceci ta mandando mensagem — eu berrei para ele, com preguiça de sair do quarto.
— Fala que eu já ligo? — ele me pediu ainda na sala, pois o assunto agora tinha ido para leite de amêndoas e eu sabia que ele adorava poder discursar os prós dos leites que não possuíam lactose.
Eu já havia desistido dessa discussão quando ele tentou me mostrar um vídeo de uma produção industrial de leite, mas aí eu derrubei, sem querer, café na calça dele, o que fez com que ele se distraísse indefinidamente — a calça passa bem, antes que alguém fique preocupado.
Eu desbloqueei o seu celular e mandei mensagem para Ceci, garantindo que Eduardo logo ligaria para ela, algo que a acalmou temporariamente, porque nos últimos dias ela estava com a mania de simplesmente aparecer quando não recebia uma resposta em três segundos.
Quando eu estava voltando para a tela de mensagens principais, antes de bloquear o aparelho, eu notei que o nome de Tamara Betini estava ali em uma das mensagens recentes mandando o nome de uma música para ele.
Eu sei que eu não deveria ter olhado. Eu sei que eu não deveria nem ao menos ter olhado que eles conversaram, mas a mensagem estava apenas ali e meus olhos passaram por ela.
Totalmente sem querer.
De verdade, porque eu não queria me intrometer na vida dele ou ficar bisbilhotando suas conversas.
Eu não era esse tipo de pessoa. Eu não ficava controlando o Edu, então eu não iria fuxicar a sua vida!
Mas a mensagem estava ali e a leitura dinâmica aconteceu sem o meu consentimento.
Tamara Betini: Feel Like Makin' Love, do Bad Company
E foi aí que eu reconheci a melodia que ele estava murmurando poucos minutos antes e eu bloqueei a tela, colocando o aparelho contra a cama em um movimento lento — ou eu que me sentia em câmera lenta.
Bem, ele poderia sim ter saído com ela como amigos, e a gente nunca disse nada sobre termos algo sério e exclusivo, não foi? Não era nada demais.
Ele saiu com a Tamara e pode ser sido sim de maneira totalmente casual, mas se fosse algo mais romântico, como pode ter sido por causa da música que ela enviou para ele, o que eu tinha a ver com isso? Desde quando ele me prometeu amor eterno e fidelidade infindável? Nunca, então eu não poderia cobrar isso dele.
Eu só...
Eu só confiava tanto nele que eu sabia dentro do meu coração que não tinha sido nada demais. Nadinha de nada, porque eu conhecia Eduardo Senna e tinha certeza de que esse mesmo calor que eu sentia quando estava com ele, ele sentia comigo.
Era só esperar que em dois minutos ele entraria no quarto e me contaria da mega coincidência que foi encontrar com a musa do marketing no shopping e que foi uma ótima conversa e que ela o ajudou na caçada até a loja-alvo de Henrique Francisco, porque ele era um poço de transparência que nunca, nunca, errou com ninguém. Muito menos comigo.
Era só esperar.
E talvez foi isso o que me fez perceber que o que a gente tinha era muito maior do que apenas um lance. E talvez maior do que apenas duas pessoas que estavam ficando frequentemente. E talvez muito maior do que eu mesma estava pensando que fosse, porque desde o nosso encontro eu acreditava que a gente tinha dado um passo a mais.
E ao mesmo tempo que essa sensação era incrível, era assustadora.
— Quem você vai matar e por que seria o Leandro? — o arquiteto me perguntou no batente da porta de braços cruzados, olhando-me com curiosidade.
— Podemos enrolá-lo no lençol novo em uma mumificação moderna que eu tenho certeza de que ele morreria feliz — eu complementei sorrindo.
— Não façam isso, sou bonito demais para morrer tão jovem — o dito cujo apareceu atrás de Eduardo e o abraçou pela cintura — como você ousa planejar meu assassinato? Só porque eu joguei fora sua chia velha?
— Você jogou até mesmo o rabanete que eu comprei ontem, Lê. Vamos ter que fazer uma intervenção — Edu deu dois tapinhas na cabeça do colega e eu sorri com aquilo — ou então a Marcela nunca mais vai dormir aqui em casa.
— Na verdade, por mim podemos banir o rabanete para sempre, Lê. Você tem o meu voto — eu pisquei para ele e Eduardo me fuzilou com o seu olhar, meramente de brincadeirinha.
— Um dia, Marcela Noronha, você vai comer verduras e a-do-rar — ele praticamente mastigou aquelas para fora de sua boca e apenas por acompanhar o seu movimento, eu concordei, porque ele poderia falar que Erva-Daninha é uma delícia que eu diria que a amava refogada.
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Vem de CEM com a gente que a semana tá na metade!
Má descobrindo que o Edu estava com a Tams é um misto de "PELO AMOR DE DEUS NÃO ENTENDA TUDO ERRADO" com "MEU DEUS ELA TA SENDO SENSATA DEMAIS"! Vocês também acharam isso?
Quem também adora ver como a Má é amiga do Lê e do Chicão mesmo sem o Edu? Isso só mostra como esse casal é tudooo <3
Capítulo 53 de CEM está chegando e tudo o que a gente pode pedir para vocês é... preparem o coração!
Esperamos que estejam gostando! Não esqueçam da estrelinha e de nos dizer o que estão achando!!!
Beijinhos,
Libriela <3
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