Capítulo 49 - Termo de relacionamento

Termo de relacionamento

Eduardo

Quando estacionei o carro do prédio da CPN uns minutos antes das oito da manhã, usando uma camisa bem passada (mérito de Leandro Lamas, para ser nem honesto) e com o cabelo penteado, nem parecia que o dia anterior tinha acontecido — Marcela e eu acordamos três horas da tarde, com ressaca e sobrevivemos à base de analgésicos, dos doces de lembrança do casamento de Romeu e Getúlio e delivery, tendo inclusive que disputar quem ia descer para pegar comida quando ela chegou.

Eu perdi, é claro. Aparentemente Noronhas não perdem nenhum jogo, incluindo par ou ímpar.

Foi um domingo tão devagar que parecia ter rolado em slow motion (eu não ia reclamar de uma tarde preguiçosa com Marcela porque eu ainda não tinha enlouquecido), mas eu não achei que fosse estar realmente na minha melhor forma na segunda de manhã, mas, bem, ali estava eu. E Marcela, sentada no banco do carona checando pastas dentro da bolsa e com uma blusa branca que podia ou não ser um sinal. Eu preferia pensar que sempre era um sinal.

Aparentemente ela achou o que queria e abriu a porta. Eu meio que esperei pelo momento em que ela ia sair correndo para o elevador, mas ela apenas parou por uns segundos para me esperar enquanto eu ativava o alarme do carro e nós começamos a andar lado a lado, em uma situação que era normal, mas não era — eu tinha certeza que aquela corrida matinal do meu carro até o elevador era o que mantinha suas pernas lindas daquele jeito.

Caminhamos até o elevador. Preferi nem tocar no assunto porque vai que ela apenas não tinha percebido que não estava correndo e não fosse uma escolha consciente?

Marcela começou a digitar algo no celular e, pelo sorriso no seu rosto, provavelmente era para Romeu ou Getúlio — ou para os dois. A empolgação do casamento não ia passar tão cedo.

Estávamos no oitavo andar quando ela largou o celular na bolsa e parou na minha frente, ficando na ponta dos pés para colar os lábios nos meus.

— Bom trabalho, Edu — ela disse uns segundos antes da porta se abrir.

Eu sorri para ela, mas as palavras se perderam em algum lugar que eu só ia descobrir depois qual era. Quase deixei o elevador fechar comigo dentro observando o nada e divagando sobre Marcela até me dar conta de que Marcos estava tentando descobrir o que eu estava olhando com tanto interesse e, depois, o que no purificador de água parecia tão interessante.

Felizmente, antes que eu tivesse que explicar porque estava aéreo na segunda de manhã encarando um purificador que eu via literalmente todos os dias, fui resgatado por um Lucas muito empolgado carregando um monte de papéis debaixo do braço e feliz demais para aquela hora da manhã — àquela altura, eu já tinha percebido que ele tinha a personalidade de um Golden Retriever e até seu cabelo castanho constantemente bagunçado me lembrava um.

— Consegui clarabóias tubulares! — ele disse, feliz, me acompanhando até a minha mesa. Ele provavelmente estava falando do shopping que estava projetando com Sandro e, sendo Sandro Ventura o maior fã de engenharia tradicional já visto na face do nosso planeta, aquilo era uma vitória colossal.

Ergui uma mão para ele em um high five.

— Meu garoto!

— Não incentiva, Senna — Sandro murmurou, passando atrás de nós dois com cara de pouquíssimos amigos. — Eu só disse sim porque é uma manhã de segunda-feira e ele estava com aquela cara de cão sem dono, então ou eu aceitava ou assassinava esse garoto. Qual o protocolo do RH pra assassinato, Gisele?

Gisele, de pé ao lado da mesa de Andreia, apenas ergueu os olhos para nós por trás das lentes dos seus óculos com armação gatinho que era sua marca registrada.

— Chamar a polícia? — ela perguntou, com uma carinha confusa. — Correr se estiver armado também é uma ótima ideia. E depois dispensa por justa causa pela prisão.

— Tá vendo? Eu fui obrigado a aceitar, mas ainda estou considerando voltar atrás! — Sandro disse. — Eu realmente gosto de honrar meu CREA com construções seguras e sem um monte de firula!

— Já ouviu falar de Astrid Hill, na Singapura? — perguntei para Lucas, que fez que não com a cabeça. — Foi criado pelo Tsao-McKown para reinterpretar um lar chinês aliando design sustentável e estética e é lindíssimo. Além do teto verde, eles fizeram um jardim vertical. Você já pensou nisso, Lucas? Eu consigo imaginar isso em um shopping. Seria incrível para...

— Diminuir a poluição visual das lojas! — ele completou, pegando um lápis na mesa e rabiscando no canto do maço de papel que estava carregando.

Sandro estreitou os olhos para mim.

— Vão ser dois assassinatos, Gisele — murmurou.

— Você sabe que não deveria falar isso para alguém do RH, né? — Gisele perguntou.

— Assumpção, minha resposta para qualquer coisa que vier dessa sua amizade com o Senna é não, está me ouvindo? — retrucou, se afastando. — Pensa em vidro, concreto, hidrelétricas. Shopping não é lugar para mato.

Eu realmente gostava de Sandro como ser humano, mas como engenheiro... Bom, ele era incrivelmente bom, mas inflexível, então palmas para Marcela Noronha. Ela era linha dura, mas sabia ouvir e era flexível — em muitos sentidos, mas aqui em um específico e sem libertinagem.

— Não deixa ele te amedrontar — disse para Lucas, que aparentemente estava assustado por ser chamado pelo próprio sobrenome pelo engenheiro encarregado. — Começa com as clarabóias tubulares, depois você consegue uns painéis solares e, eventualmente e com muitos anos de dedicação, talvez você consiga um bambu.

— Senna! — Sandro reapareceu apenas para me repreender, mas até ele foi contagiado pela crise de risos que Lucas teve. — Pelo amor de Deus, Lucas, você não podia ficar amigo de outro arquiteto? Vou te apresentar para o Joaquim, ele é meio turrão, mas curte vidro e concreto.

— Você já está me desprezando e eu nem comecei a falar de aquecimento geotérmico ainda... — provoquei e soube que Sandro me mandaria para lugares bem pouco bonitos se não estivesse no meio da empresa, então apenas se afastou.

Lucas riu.

— É, Edu, acho que o bambu vai ter que ficar só no seu restaurante mesmo, você vai acabar infartando o Sandrinho — Lucas disse com carinho, mesmo que Sandro tivesse quase dois metros de altura e fosse bruto como tomar um coice. — Como está o restaurante, falando nisso?

Eu abri meu sorriso reservado para os momentos em que a arquitetura me amava tanto quanto eu a amava. Aquele restaurante era tipo um sonho saindo do papel — na verdade, era exatamente isso, um sonho. E então eu comecei a metralhar Lucas com informações, falando sobre teto verde, bambu tratado e estruturado com bioconcreto, vidros eletrocrômicos que eram 75% mais eficientes no verão e 45% no inverno e ajudavam na iluminação e reduziam o gasto de energia, painéis solares e...

Eu amava aquele projeto. Era o que eu queria passar a minha vida fazendo: construções visualmente lindas e dentro de um cenário sustentável que era tão mal visto por ser caro e sem um resultado tão visualmente satisfatório. Eu gostava de buscar o melhor desempenho no menor impacto — era o único jeito de construir que fazia sentido para mim.

Talvez eu fosse o maior eco-chato do mundo, mas eu acreditava de verdade que dava para impactar menos o nosso planeta — a melhor e única Terra que a gente tinha para viver.

— Desculpa ouvir a conversa — Isaac, o novo engenheiro, disse, se aproximando com um sorriso e balançando seu crachá pelo cordão. — Que projeto é esse? Eu achei sensacional e acho que acrescentaria muito pensar de na área externa, onde não for vegetação, entrar um piso intertravado.

— Também estou curiosa — disse Gisele, a rainha do pão de alho, se aproximando por trás dele. — Nunca te vi falar de um projeto com tanto entusiasmo, Edu.

Cocei a minha nuca.

— É um projeto paralelo para o restaurante da minha irmã. Tem todo um conceito sustentável e, sinceramente, eu estou mesmo empolgado — contei.

— Eu notei o brilho nos olhos — Gi disse, me oferecendo seu sorriso "você não fez nada errado, respira" que ela usava quando chamava ao RH e nós ficávamos repassando mentalmente todas as nossas ações, mesmo quando claramente ninguém tinha feito nada de errado.

— Não é bem isso que vocês fazem aqui, não é? — Isaac perguntou, falando sobre o projeto super sustentável. — Eu ainda estou conhecendo a empresa, mas olhei alguns dos trabalhos.

— Definitivamente não é o que a gente faz — Lucas mencionou. — Nós trabalhamos basicamente com construções comerciais e, normalmente, quem está fazendo isso não está tão preocupado com impacto ambiental e, mesmo que esteja, o custo triplica, então a preocupação passa.

Isaac apertou as sobrancelhas, formando um vinco entre elas.

— Para ser justo, a CPN melhorou muito com isso nesses anos que estive aqui. Tem a ver com algumas tendências que foram se tornando comuns e materiais que o preço foi ficando menos exorbitante, mas a visão da empresa com relação a isso também mudou. Quero dizer, ainda tem aqueles tradicionais até o último fio de cabelo — Lucas rolou os olhos. Ele claramente adorava Sandro, mas eu sabia como trabalhar com ele podia ser frustrante — mas também têm projetos mais novos se adaptando e eu percebo que também tem uma procura por esse novo segmento. Ainda estamos engatinhando, mas, cada construção com telhado verde, energia solar ou algo que o valha é uma vitória.

Isaac sorriu. Aparentemente um dos engenheiros da CPN realmente concordava com a filosofia dos arquitetos sustentáveis sem jogar margens de segurança na nossa cara. Lucas quase ficou emocionado e eu fiquei feliz com essa nova perspectiva, embora eu estivesse muito bem com Marcela que, mesmo relutante a princípio, sempre acabava me deixando dar meu toque sustentável e me ajudando a viabilizar que ele fosse real. E, pelo amor de Deus, ela estava fazendo um restaurante de bambu comigo!

— É isso que você gostaria de fazer, não é? — Gi perguntou, tirando os óculos e colocando uma das pernas apoiada na boca. — Projetos inteiramente sustentáveis.

— Sim, é isso — eu comecei, mas fui impedido de elaborar quando Diego, o engenheiro alocado nos projetos da Yasmin, apareceu em uma porta defronte, com meio corpo para fora e parou o olhar exatamente em mim.

— Edu, meu consagrado, tem um minuto? — perguntou ele. — Queria repassar alguns pontos do projeto do hotel.

Então eu apenas pedi licença para todo mundo e fui até a sala onde Diego estava, para que pudéssemos discutir o projeto — aparentemente ele não estava gostando muito das sacadas em balanço que tínhamos alinhado na última reunião e estava com uma conversa mole sobre uma mudança para varandas.

Não era uma ideia ruim, exceto pela perda significativa de espaço nos quartos, já que a sacada ficava "fora" do prédio e a varanda dentro e o fato de que isso ia acabar escurecendo os quartos, já que o sol ficaria concentrado na varanda e não alcançaria as portas de vidro que levariam a elas. Estruturalmente, varandas com certeza eram menos trabalhosas no ponto de vista da engenharia, mas isso não era o que a arquitetura levava em conta e eu não tinha que ser imparcial — eu sempre ouviria o ponto de vista dele, mas não iria concordar assim tão fácil.

Quando finalmente nós saímos da sala, ainda sem uma decisão definitiva (mas mantendo as sacadas até segunda ordem, pois o cliente ainda não tinha visto o projeto), eu percebi que já havia uma movimentação para o horário de almoço.

Me estiquei para ver a mesa de Marcela, mas ela não estava lá, então apenas saquei o celular do bolso e enviei uma mensagem.

Eduardo: Quer ir almoçar no Quíron? Diego comentou que teve uma alteração na equipe e o estrogonofe está mais incrível do que antes, e eu sou capaz de vender um rim por aquele quibe de berinjela

Eduardo: E o outro pela sua companhia, amor

Marcela demorou apenas alguns segundos para responder.

Marcela: Vou atrasar, desculpa

Marcela: Pelo menos assim você pode manter o rim

Eduardo: Eu te espero, bonitona

Eduardo: E faltou o amor

Ela me enviou aquela figurinha da tela azul escrito "faltou o nude" e eu mordi os lábios, matando uma risada porque... Um dia aquilo ia me causar um problema no meio da CPN e Marcela sabia disso — provavelmente a graça era justamente essa: me ver entrando em pane no meio do trabalho e tentando fingir plenitude.

— Eduardo Senna rindo para o celular? — Valter perguntou, passando por mim e pegando um casaco que estava apoiado em uma cadeira. — Isso não pode ser coisa boa, coração. E o nosso relacionamento?

Abri meu melhor sorriso para ele.

— Mais forte que bambu, lindo. E bambu é mais forte do que o aço, como você sabe.

— Meu Deus, você não para nunca — Sandro murmurou, nos olhando por cima da tela de seu computador. — Eu achava que Marcela era osso duro de roer, mas pra te aguentar ela tem que ser uma santa.

Ah, mas não era mesmo, mas ele não precisava saber sobre todas as qualidades dela que ele ignorava completamente. Aquilo ela podia guardar para mim, embora... Não, eu não sinto pena do resto da humanidade por isso.

— Estão sabendo da última? — Marcos apareceu do nada, seguido por Igor, dando um susto em Valter. — Galileu e Andreia assinaram um daqueles termos de relacionamento. Perdemos um soldado, senhores.

Sandro colocou uma mão na testa e a abaixou, num gesto de continência.

— Então é por isso que o Gali ficou mostrando os dentes o dia todo? — perguntou ele. — Achei que estava com dor.

— Você sabe que o nome disso é sorrir, né, Sandrinho? — devolvi, cruzando os braços e ficando atento para o celular, esperando Marcela ser liberada. — Eu sei que faz uns trinta anos que você não faz isso, mas você ainda lembra como é a ideia, certo? Tem a ver com estar feliz e tal.

Sorri para ele para ilustrar. Sandro me mostrou o dedo do meio porque, supostamente, ele podia fazer isso no horário de almoço sem a interferência de Gisele e sua "política da boa vizinhança".

— Galileu realmente ficou bem feliz mesmo, eu nem imaginava que eles estavam juntos — Valter comentou.

— Ninguém sabia, né? Mas até eu topava um caso escondido com a Andreia — Igor comentou — ou com a Sâmia...

— Fiquei sabendo que a Alice tava de rolo com o Diego — um cara de Estratégia de Mercado, acho que o nome dele era Caíque, comentou — mas até aí, com quem ela não se enrolou ainda né?

Ok, eu não sabia do Diego, mas do Alexandre e do Humberto eu já havia ouvido falar...

— Mas se for para realmente rankear, vocês sabem quem é a número um — Igor disse com tanta tranquilidade que talvez eu não tivesse notado que ele não estava falando aquilo de maneira simpática.

E quando foi que mais de dez pessoas se aglomeravam assim? Ninguém tinha trabalho?

— Acho que que essa é unânime — Caíque deu de ombros e Alexandre, que havia acabado de chegar, apenas deu risada, coçando a nuca.

— Mas quem tá fazendo barba, cabelo e bigode é o Gali. Meu herói — Igor complementou quando ouvimos o Sandro pigarrear, apontando para alguém.

Andreia estava passando ali e eu vi seus ombros murcharem, ainda que ela não tenha perdido a pose.

— Acho que essa conversa não é bem o meu estilo. Se a gente sair, ninguém nem nota. Topa? — Valter perguntou e eu coloquei meu braço sobre os ombros dele.

— Por isso você é meu amor, Valter — eu disse e meu celular vibrou.

Marcela: Vamos?

Eu sorri de novo e Valter deu risada, olhando para a minha cara de bobo alegre. Eu nem me importei.

Marcela

Eu risquei mais um comentário no relatório que eu estava redigindo da Casa Amarela quando meu celular apitou, avisando que em quinze minutos eu teria uma videoconferência com o pessoal que estava na obra da Torre Norte sobre a importância de utilizar os EPI's (Equipamentos de Proteção Individuais), porque, aparentemente, um bonito lá achou que poderia entrar na obra sem capacete (não é, Oliver Kaiser?).

Ouvi mais um burburinho no corredor e revirei meus olhos, segurando o calhamaço de papel embaixo do meu braço para encher minha garrafinha de vidro com uma água mais geladinha — porque o Edu disse que plástico uma hora deteriora e que eu poderia ingerir elementos nocivos, o que fazia sentido, então optei por trocar a minha antiga por uma de vidro — tentando ignorar a mais nova fofoca da empresa.

E era foda fingir que estava tudo bem quando sua amiga estava na merda, sabe?

Depois do final de semana que eu tive com Eduardo, eu acordei com mais convicção sobre nós dois. Sobre o que eu significava para ele e, principalmente, sobre o que ele significava para mim. E mesmo depois de todo o álcool ter deixado o meu corpo e eu ter recebido uma multa por ter berrado sertanejos domingo de manhã pelo prédio, eu ainda queria Eduardo.

Não, não era apenas querer. Era gostar. Era estar, lenta e gradativamente, deixando que ele ocupasse um espaço cada vez maior dentro do meu dia a dia. Era sentir que eu estava apaixonada por ele sem nem ter percebido quando que isso aconteceu.

— Má? — eu percebi que a água estava vazando para fora da garrafa e eu desliguei o filtro, saindo do transe auto imposto simplesmente por ter pensado em Eduardo Senna.

O que ele estava fazendo comigo?

Eu mordi o sorriso no meu rosto e me voltei para Andreia, que estava na minha frente com um sorriso contido mesmo que eu soubesse que ela estava a um surto de mandar metade da empresa a merda. Tudo isso porque ela e o Galileu assumiram um romance — e eu digo romance, porque não fazia ideia de que eles estavam juntos (e eu me sentia uma péssima amiga por isso e não sabia o nível de envolvimento dos dois).

— Oi, Deia — eu a cumprimentei com um sorriso animado, vendo que ela estava com a sua garrafinha vazia — conseguiu...?

— Já está no seu e-mail — ela me confirmou e eu sorri, pois se havia alguém que trabalhava em um ritmo tão acelerado quanto eu naquela empresa, essa pessoa era Andreia Ramos.

— Você é incrível — eu a puxei para um abraço e beijei os seus cabelos loiros, porque eu nunca havia visto uma pessoa tão compacta quanto ela, mesmo que ela usasse apenas saltos extremamente altos e perigosos no trabalho.

Um grupo de caras de Estratégia de Mercado passou por nós e suas vozes baixaram quando eles notaram que Andreia estava ao meu lado, passando a cochichar de maneira nada discreta sobre "a loira de orçamentos que estava dando para o cara da logística" — meu sangue fervia sempre que eu escutava aquilo e eu já havia mandado umas quatro pessoas a merda por ela.

Não era errado namorar alguém do trabalho — não que a Gisele criasse os eventos de integração para que as pessoas se amassassem contra a parede de maneira nada profissional, mas ela também não desincentiva. Era necessário apenas controle para que você jamais trabalhasse diretamente acima ou abaixo da pessoa e apenas isso. Só que, em uma empresa de médio porte como a nossa com uma tendência a ser uma rádio-fofoca, qualquer motivo para falar sobre a vida alheia era um ótimo motivo.

E daí que a Andreia estava com o Galileu? Nada mudava quem eles eram dentro da CPN. Nada. Mas, do dia para a noite, era como se ela estivesse com um holofote, tendo que explicar para as pessoas que namorar o Gali não havia feito o seu cérebro parar de funcionar ou o seu desempenho diminuir.

Pelo menos, eu não me sentia menos profissional do que antes só porque eu estava saindo com o Edu. Na verdade, eu me sentia ainda melhor, porque ele me apoiava e sempre estava do meu lado mesmo nos surtos de madrugada quando o Thales ligava para conversar sobre treliças suíças ao invés de americanas.

Eu acho, sinceramente, que eu não teria saído inteira destes últimos meses se não fosse por ele estar comigo, descontraindo o clima e me fazendo sorrir por todas as tolices que ele sabia que iriam me alegrar — desta vez eu não estava nem pensando em sexo.

— Vocês querem falar alguma coisa? — eu perguntei para os cinco rapazes que, já conhecendo a minha fama de não levar desaforo para casa, começaram a se afastar, resmungando coisas pouco educadas que eu não fazia questão de saber, mas eu não ia deixar passar, né? Claro que não — Ah, Caíque, não esquece de conversar de novo com Eliseu da Casa Amarela? Pelo jeito ele não está satisfeito que você não responde os e-mails dele sobre como abordar a comparação que está sendo feita com a Casa Rosada. E não mande de novo aquele pdf, se ele quisesse ler aquilo, não estaria ligando para você.

E aí ele me xingou mais um pouco, só que desta vez eu sorri para suas costas — eu não arranjava briga, eu apenas não gostava que as pessoas fossem escrotas de graça.

— Ele pode falar com a Gi e você levar uma advertência, sabia? — Andreia comentou comigo, cruzando seus braços ao meu lado e eu pisquei para ela — não que ele vá fazer isso, né? Sabemos que ninguém ousaria fazer isso com você por causa da história da prancheta.

— Desta vez eu não mandei ninguém para lugar nenhum, apenas pedi que ele fizesse o trabalho dele. E você sabia que esse ano eu não atirei nada em ninguém? E estamos rumo a outubro — eu lhe contei com animação.

— Será que esse ano a gente sai da nota três em reatividade? — ela arqueou as sobrancelhas de brincadeira e eu ri do seu tom debochado — mas se sua nota subir, eu vou perder todos os momentos icônicos de você mandando as pessoas a merda com elegância.

— Icônico foi você empurrar o Igor na piscina — eu retruquei e ela engasgou com a própria saliva — nada de julgamento, na verdade, eu amei.

— Ainda não conheci alguém que realmente não gostasse disso — ela considerou e eu tive que concordar. Igor não tinha muitas amizades na empresa, mas as pessoas o aceitavam por ele ser o rei das fofocas. Todo boato que surgisse dentro da CPN com certeza vinha daquela boca. Coloco meu CREA em jogo.

E a pessoa era tão dissimulada que ele fazia questão de que o alvo da fofoca fosse sempre uma das primeiras a saber do que se tratava — Gisele estava tentando rastrear um dos boatos até ele para adverti-lo, porém não conseguia, então ela apenas mandava comunicados pedindo atitudes profissionais dentro do trabalho. Não era pedir muito, não é?

— Obrigada por sempre... você sabe — Andreia esbarrou seu ombro no meu e eu completei suas palavras não ditas com tudo o que eu sabia que ela realmente queria dizer.

— Você é sensacional, Deia. Não merece ficar ouvindo besteira e se sentindo mal por isso. E você é uma das nossas melhores analistas. E joga o Igor na piscina. Zero defeitos — eu complementei e ela sorriu ainda mais.

— Sorte minha trabalhar com você, na verdade. Acho que é o que? O sétimo projeto que estamos juntas? — ela colocou a garrafa no filtro e eu decidi que estava na hora de nós avançarmos na nossa amizade.

— Oitavo. E eu meio que pedi para Renata sempre te alocar comigo, talvez seja por isso — ela me olhou surpresa e eu revirei meus olhos, não querendo entrar em todas as suas qualidades mais uma vez — você me conquistou o dia que me deu aula de orçamento estático e flexível.

— Marcela Noronha pediu por mim? — ela fez um barulho e eu rolei meus olhos mais uma vez.

— Eu até ia pedir para isso não subir a sua cabeça, mas acho que é tarde demais — senti meu celular apitando que estava perto do horário da reunião — tenho que ir, a gente vai se falando?

Ela apenas concordou e eu notei que ela ainda estava sorrindo quando eu voltei para minha mesa, o que eu considerei como uma pequena vitória.

— Noronha! — eu ouvi Thales me chamando de dentro da sala da Renata.

— Valter! — eu chamei e ele olhou para mim em um susto, já com o telefone em mãos — toca a reunião de EPI?

— Sim, Má! — ele berrou de volta com tanta vontade que eu quase não acreditei que estava falando comigo, por isso eu sorri para ele e entrei na sala da P de CPN.

Má? Acho que, e agora era apenas um palpite, o Valter estava finalmente me aceitando de volta na sua vida. Seria o fim da era do concreto?

Assim que eu fechei a porta, Thales apontou para a cadeira na frente dos dois e eu senti um gelo subir pelas minhas costas, porque para dois sócios estarem ali me olhando com a seriedade que olhavam, era porque eu estava... fodida, para usar uma palavra gentil.

Eu comecei a recalcular tudo o que eu havia entregado para eles nos últimos dias, querendo prever o que eles poderiam reclamar e como eu conseguiria não ser demitida...

— Marcela, não sei se você notou, mas nós estamos reestruturando um pouco o nosso ambiente de trabalho, as divisões de projetos e até mesmo a nossa área de atuação — Renata começou explicando e eu acho que não estava prestando muita atenção, porque tudo o que passava pela minha cabeça era se ela iria me demitir por causa da reestruturação ou por um erro — e com isso nós vimos que abriu um espaço dentro do departamento de engenharia para o nosso novo segmento de pontes estruturais e construções não comerciais...

— Só que esta vaga precisa de um profissional sênior pelas qualificações e o nível de responsabilidade solicitado — Thales interrompeu Renata com um sorriso e eu acho que minha expressão não foi exatamente o que eles esperavam. Mas o que ele queria? Estava jogando na minha cara que eu não teria uma vaga por não ser sênior, mesmo que...

— Por isso nós solicitamos a sua promoção, que foi cadastrada hoje no nosso sistema — Renata finalizou antes que Thales pudesse interrompê-la — Parabéns!

Eu tenho certeza do que eles disseram, mas minha cabeça precisava ouvir isso de novo.

— Quê? — eu murmurei de volta, notando que estava segurando com força o tecido da minha calça.

— Nós sabemos que esta promoção já tinha que ter acontecido faz meses, mas a janela de RH só surgiu este mês e nós não tivemos dúvidas. Você é nossa melhor engenheira e os seus projetos com o Eduardo te deram uma visibilidade exponencial — meu chefe sorriu para mim e estendeu a mão na minha direção — parabéns, Noronha.

E foi aí que a ficha caiu.

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Hoje não é quarta, mas as mensagens de vocês nos levaram do riso às lágrimas, então a gente decidiu adiantar, sim, o capítulo (e o prêmio de spoiler será enviado em breve, fiquem de olho)!

MARCELA CONSEGUIU A TÃO TÃO TÃO SONHADA E AGUARDADA E MERECIDA PROMOÇÃO E É LINDO CONSEGUIR DIVIDIR ISSO COM VOCÊS <3

E Galéia (Galileu + Andreia) já é um ship que a gente estava planejando faz muuuito tempo! Eles são dois personagens que ganharam um espaço gigante na história e podem ser encontrados no HORA DO MATCH! 

Agora, com a promoção e amigos assumindo relacionamento, significa que finalmente a gente vai ter alguma movimentação amorosa nos próximos caps para nosso casal amado? (será que o spoiler do cap anterior ta pertinho de nós?).

Obrigada por serem leitoras/os maravilhosas/os! Esperamos que estejam surtando tanto quanto a gente em CEM!!! Não esqueçam da estrelinha e de nos contar suas teorias para o futuro dos nossos personagens queridinhos.

Beijinhos,

Libriela <3

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