Capítulo 37 - Desculpa a invasão

Desculpa a invasão

Marcela

Marcele: MARCELA

Eu ignorei a mensagem da minha irmã, porque ela estava enlouquecida e eu tinha muita coisa para fazer além de responder os seus surtos.

Marcele: MAR

Pra começar, eu havia acabado de sair da sala da Gisele e tive que desviar estilo Matrix de toda as suas indiretas sobre o meu tórrido caso de amor com o Eduardo e negar todas as completamente factíveis evidências que ela havia compilado junto com uma ficha de que estávamos em um relacionamento.

Marcele: CE

Só que aí, acho que um santo bateu em sua mente ou no seu coração, ela se lembrou com quem estava falando e percebeu que não havia como nós dois estarmos juntos. Acho que majoritariamente pelo meu comportamento reativo e a mania que eu tinha de atirar objetos no lixo e as pessoas simplesmente passarem na frente naquele exato momento — eu acho que isso foi uma crítica, mas ela havia acabado de concordar que eu e Eduardo não estávamos juntos, então foi mais uma vitória.

Marcele: LA

Como foi que a minha vida ficou tão complicada? Uma semana eu estava tentando convencer minha família que eu estava perdidamente apaixonada por Eduardo Senna e na seguinte eu estava correndo do RH, porque eles tinham certeza de que eu havia me envolvido com o dito cujo.

Marcele: MARCELA NORONHA

Dica para a posteridade? Tente não mentir mais, Marcela, você não foi feita pra essa vida.

Marcele: CELAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA

Falando em Eduardo, eu ainda estava devendo uma resposta para ele sobre o restaurante.

Tudo dizia não. As pesquisas dos materiais existentes no Brasil não eram realmente consolidadas e as fontes internacionais não eram muito conhecidas, então a probabilidade do lugar pegar fogo de tanto produto orgânico era maior do que ele imaginava e os custos... os custos eram assustadores.

No entanto, eu havia pesquisado sobre o assunto, lido uns livros antigos da faculdade para ter certeza que eu tinha todos os argumentos necessários para lhe dizer um não bem estruturado, só que o quanto mais eu lia, mais eu notava que ele tinha razão em um ponto: ninguém queria fazer aquilo. Ninguém queria mexer com arquitetura sustentável, o que tornava o projeto único e desafiador. E quem me conhecia sabia que eu amava aquilo: um desafio. E se eu pudesse ajudar o Edu, era o melhor dos mundos.

Marcele: AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA

Eu estava quase entrando no meu celular para bater em Marcele para que ela parasse de me atrapalhar no trabalho, mas isso significava que eu tinha que responder as últimas mensagens dela sobre Eduardo e... eu não sei. Eu não queria responder.

Não queria, porque o nosso almoço ainda estava muito recente no meu corpo e eu não era o tipo de pessoa que perdia a razão, mas com ele era muito difícil distinguir o certo do errado, porque antes a gente estava mentindo, agora... agora não seria mais uma mentira, não é? E esse era o problema.

Samantha: Marcela, eu vou emitir um mandado de busca se você não responder

Toda essa pulguinha aconteceu, porque uma fofoca errada foi feita dois dias atrás. E como toda fofoca errada, ela começava com um comentário maldoso e um affair de escritório (normalmente nem um nem outro eram verdade).

Samantha: Sua irmã está me enlouquecendo

A fofoca era simples: a Betânia do BackOffice teve um lance com o Joel da Qualidade — claro que todo mundo sabia que ela não faria isso, pois tinha dois filhos e ela nunca olhou para outro cara que não fosse o seu marido, mas a rádio-peão não se importava.

Tudo isso, porque ela trocou de carro e as pessoas logo já especularam que deveria ser presente de um amante. Como eles decidiram que o Joel era este cara, eu ainda não sei, mas mandei o Igor calar a merda da boca dele antes de falar sobre a Betânia — e eu tenho certeza de que ele ficou mais pálido com o meu olhar nada gentil.

Marcela: Sua cunhada

Marcela: Sua responsabilidade

Marcela: Se vira aí, você sabia no que estava se metendo quando casou com o Big M

Já havia passado das seis e trinta quando eu peguei minhas coisas, enfiando todos os projetos em análise dentro da minha bolsa e saindo do prédio, porque, como a fada madrinha que eu era, tinha que buscar os convites de casamento de Retúlio naquele dia para que eles começassem a mandar.

Fazia mais de três dias que eles não apareciam em casa. Tudo isso por causa da prova dos ternos que estavam apenas terminando os detalhes em um dourado delicado em uma barra ou a abotoadura correta para o outro.

Seria o casamento dos sonhos e estava a menos de três meses de distância.

Cele e Sam voltaram a falar sobre o churrasco do domingo anterior, pós-cruzeiro, em que a Valentina disse que queria apenas verduras e queijo coalho, e a tia Vanessa quase a jogou dentro da churrasqueira.

E elas fizeram todo esse escândalo, porque eu demorei duas horas pra responder o celular que estava no silencioso (o que era um exagero, porque eu já havia ficado mais de dias sem dar sinal de vida para minha família. Não que eu me orgulhasse disso, claro).

Eu cheguei na loja pouco antes deles fecharem e peguei os mais de cinco quilos de papel decorado em uma caixa, decidindo pedir um uber, porque eu jamais conseguiria entrar em um ônibus com aquele volume, ainda mais no horário do rush. E, para a ironia da vida, o motorista estava ouvindo clássicos do sertanejo nacional. Evidências para ser mais exata.

Será que um dia eu conseguiria tirar a cena do Patrício agarrado com o pescoço do Eduardo naquele palquinho? Quase certeza que não. E eu não tinha certeza se gostaria.

Entrei em casa pouco depois das oito, deixando os convites na mesa da sala, ligando meu celular na playlist que eu estava escutando de rock das antigas — a música do momento era One and One is Three —, porque eu teria um trabalho intenso agora para conseguir o Amarelo-Canário (de acordo com o pessoal da Casa Amarela), sendo que aquela cor realmente não era mais fabricada.

Única vez na vida que o Igor tinha razão, mas eu não desistiria.

Eu comecei a fazer algumas misturas de Amarelo-Mel, Amarelo-Palha, Amarelo-Milho, Amarelo-Cru, Amarelo-Açafrão e todos os outros oito amarelos que eu havia comprado — estava tentando negociar com o Agenor, o síndico, se ele não topava pintar o prédio inteiro de vários tons de amarelo, mas ele apenas me ignorou, então eu mandei uma tortinha de maçã para fazer as pazes, pois, pelo jeito, eu estava fazendo muito barulho ultimamente com os preparativos do casamento de Retúlio.

Foi no teste número trinta e dois que eu finalmente comecei a ver uma semelhança com a da Casa Amarela, então eu precisei de mais três redistribuições de tinta para chegar na cor perfeita: 35% de Amarelo-Palha, 25% Amarelo-Mel, 20% Amarelo-Damasco, 15% Amarelo-Citrina e 5% de Amarelo-Dourado (que me lembrava levemente... nada. Não lembrava nada).

— Chupa Igor — eu sussurrei em um sorriso, começando uma dancinha ridícula na sala ao olhar para parede do meu sofá que agora parecia uma loja de tintas de tantas nuances diferentes de amarelo que havia ali.

E o cheiro.

Oh, não, o cheiro.

Droga. Eu havia me esquecido que aquele cheiro ficaria ali em casa por um tempo.

— Ok, Marcela, você merece um banho — eu me ofereci, considerando uma bela recompensa depois de uma tarde de pintura.

Eu fechei os olhos e deixei a água quente tocar minhas costas. Cada gota grossa d'água era quase um carinho escorrendo pelo meu corpo, como dedos que deslizavam pela minha coluna, descendo pela minha pele em um toque que quase me santificava, mesmo que aquele seu sorriso torto me tirasse o sono todas as noites — e não era de maneira canônica.

Eu levantei meu rosto, querendo me afogar ali mesmo para parar de pensar na pessoa que eu estava pensando.

Não, Marcela. Não.

Pensa em outra coisa.

Qualquer coisa.

E a minha mente me levou para o projeto do restaurante. Eu não queria passar muito tempo pensando nele, porque eu ainda não sabia se eu aceitaria aquilo, afinal tudo poderia dar errado, mas ao mesmo tempo tudo poderia dar muito certo.

Grandes janelões de vidro vinham à minha mente, um teto retrátil de alumínio moldável para a varanda, um teto verde que poderiam ter até algumas flores, madeira de reflorestamento... nossa, ele me faria usar cana de açúcar misturada com a areia? Ok, a fundação seria com o bom e velho aço, mas as paredes com bambu e bioconcreto poderiam ser um ótimo começo (será que eles me xingaram se eu sugerisse o uso de grafeno? Ouvi dizer que é 146% mais forte que o aço, e não é orgânico, o que ganha muitos pontos), e em uma das paredes externas poderia descer algumas plantas? LEED? Claro, a cozinha teria que ser repensada, porque ele não aceitaria um sistema de ventilação tradicional, então eu teria que...

E eu fechei a água, sentindo que havia um sorriso nos meus lábios mesmo que eu estivesse pensando em bambu — e não era de maneira irônica ou metafórica.

Ai, Eduardo, o que você fez com a minha cabeça?

Eu saí do banho vendo que havia duas ligações perdidas de Eduardo na tela e algumas mensagens ansiosas de Túlio para que eu fizesse um unboxing dos convites, porém eu apenas os ignorei quando meu estômago me ameaçou de morte.

E aí minha campainha tocou.

Será que se eu barrasse com o Luciano, o porteiro da noite, ele pararia de deixar Getúlio e Romeu subirem sem me interfonar para perguntar se poderia? Não, eu não conseguiria fazer isso, porque Romeu ficaria mortalmente ofendido com isso.

— Rommi, sinceramente, pelo menos vocês escolheram...? — eu comecei perguntando assim que abri a porta, porém não era Romeu.

Nem Getúlio.

Na verdade, à minha frente estavam Eduardo e Cecília Senna com sacolas de compras gigantescas e dois sorrisos conspiratórios — no caso o dela era um sorriso incrivelmente brilhante cheio de felicidade e inspiração, ouso dizer que era até mais intenso do que o do Eduardo, já o dele estava apenas dando desculpas com aquele seus lábios em um esboço torto.

Realmente, bem mocinho da novela das nove com segundas intenções.

— Oi, Má, o Edu disse que você ama comida, então eu vim te ganhar pela barriga — Cecília entrou no meu apartamento e me deu um abraço forte ao passar por mim, molhando seu braço por causa do meu cabelo que ainda não havia secado.

Acho que eu não cheguei a cumprimentá-la de volta, porque ainda estava meio atordoada que eles estavam ali — definitivamente o Eduardo não morria cedo não, porque sempre que eu pensava nele, ele aparecia! E eu não pensava nele tanto assim, não é?

Eu notei que ainda estava olhando para ele quando seus olhos deslizaram quando eu mordi meus lábios, abrindo mais espaço para que ele entrasse em minha casa.

— Desculpa, a Ceci se empolga e eu não consigo dizer não quando ela decide que quer cozinhar para alguém — ele deu de ombros e inclinou o seu rosto na minha direção.

Eu precisei raciocinar um pouco para entender que ele estava me oferecendo a sua bochecha para um beijo, daqueles bem normais entre amigos que eram apenas amigos, e eu entendi qual era o meu papel naquele cumprimento.

Fiquei na ponta dos pés, fechando os meus olhos e inspirando seu aroma tão característico antes de meus lábios tocarem sua bochecha, sentindo os pelos da sua barba crescendo aos poucos e eu fiquei arrepiada, lembrando-me da sensação daquela barba por fazer contra a minha pele.

Então eu me afastei dele, fechando a porta atrás do seu corpo, olhando para minha casa e vendo a minha vida espalhada desde o sofá da sala até a minha mesa.

— Desculpa a bagunça, gente, eu não estava esperando visitas — eu comentei, sentindo o olhar dos Senna (como duas pessoas conseguiam ter aquela cor de olhos e tudo o que me restava eram aqueles olhos castanhos completamente normais? Nada justo!) observando todas as muitas latas de tinta amarela — eu estava fazendo uma pesquisa de cores para um projeto e me empolguei.

— Não é o Igor que deveria cuidar disso? — Eduardo me perguntou, colocando a sacola de compras na mesa e esticando seus braços por causa do peso carregado.

— Deveria, né? — eu concordei e ele rolou seus olhos com vontade, entendendo meu sofrimento, pois acho que nem mesmo a mãe do Igor gostava do filho, sendo muito sincera e nada enviesada — mas ele insiste que não conseguiu encontrar a cor. E é claro que a cor não existe mais, mas você só precisa ter força de vontade e paciência para encontrar o blend perfeito.

— Eu entendo, às vezes isso acontece com os meus temperos. O orégano do sul da França tem um gosto mais pungente do orégano da Espanha, então, quando não tem o francês, eu tenho que improvisar com outros ingredientes para dar o sabor que preciso — Cecília retirou até mesmo uma panela da sua sacola.

Eu estava prestes a dizer que ela não precisava fazer isso, porém senti a mão do Eduardo em meu cotovelo, impedindo-me, então eu olhei para ele. Este foi o meu erro, pois seu olhar me sugou para dentro daquele azul infinito que ele chamava de íris, fazendo com que eu me perdesse em todos os tons que existiam ali em um caleidoscópio que eu não sabia que existia antes.

— Desculpa a invasão — ele me pediu de novo e eu abanei o assunto com tranquilidade, pois o que eu mais estava acostumada era em ter pessoas em minha casa.

Só não, exatamente, estas pessoas.

— Eu juro que não vou tomar muito do seu tempo, só quero te fazer um jantar para você estar feliz enquanto pensa com muito carinho sobre a ideia do restaurante — Cecília começou o seu discurso e pegou uma faca maior do que o meu antebraço, amolando-a ali na minha frente e eu recuei um pouco para perto do Eduardo, pois ela não machucaria o irmão, né?

Espero, do fundo do meu coração, que a faca fosse única e exclusivamente para os legumes.

— Escuta, Cecília... — eu tentei falar, jogando meus cabelos para um lado e molhando Eduardo de propósito, ouvindo-o resmungar algo embaixo da sua respiração junto com uma risada rouca que eu bem conhecia.

— Má, por favor? Eu preciso só de uma chance de te explicar o conceito inteiro. Eu sei que você é a Rainha da Praticidade e enfia concreto em tudo — ela disse, picando alho, cebola, tomate e alho-poró com uma velocidade que eu estava muito preocupada com a integridade dos seus dedos — só que eu e a Dani queremos vender um conceito. Queremos vender a ideia, não apenas a comida que, modéstia a parte, é maravilhosa.

— Cecília, eu sei... — eu tentei dizer de novo e olhei para o seu irmão, pedindo que ele me ajudasse a acalmar sua irmã, porque ela parecia que havia sido ligada em uma tomada e não parava de falar e se mover, porém ele apenas piscou para mim e cruzou seus braços, mostrando que mesmo podendo me levantar e fazer malabarismo com o meu corpo, ele não moveria um músculo para me ajudar.

— E eu sei que a ideia de um restaurante sustentável é meio estranha e você tem todo direito de talvez não querer, mas eu te conheço, Marcela, e eu sei que você é que nem eu. Provavelmente você já pensou em todos os os problemas que essa ideia pode causar, mas você também já pesquisou e viu que dá pra fazer — ela apontou a faca para mim e eu levantei as mãos em rendição, então ela retirou alguns cogumelos tão grandes que provavelmente eram maiores do que meu punho da sua sacola e começou a temperá-los.

— Cecília — eu tentei dizer de novo em um suspiro, porém ela continuou discorrendo sobre como ela estava cansada dos restaurantes tratarem a vida sustentável apenas na comida e não no local também e continuou, engatando a sexta marcha na velocidade de fala — Cecília Senna! — eu disse o seu nome mais forte e ela parou de falar, olhando para mim e depois para Eduardo.

— É assim que você cala a boca do meu irmão? Vou adotar esse tom — ela me disse e eu não consegui não rir.

— Ceci, eu topo — eu lhe disse e ela continuou me olhando, esperando por algo, talvez uma risada ou que eu dissesse que era brincadeira, mas não era o caso.

Era oficial, eu construiria o pesadelo dos engenheiros e eu tinha certeza que mesmo que eu perdesse cinco anos pelo estresse que seria aquela obra, seria uma das coisas mais incríveis que eu poderia fazer em toda minha carreira. A companhia era apenas um a mais — ou um grande a mais.

— Mas? — Eduardo sugeriu, pois ele me conhecia e sabia que eu não aceitava nada sem uma ressalva.

E este era o grande motivo que eu estava aceitando aquela loucura. Porque seria ao lado de Eduardo, e se três anos trabalhando com ele me ensinaram algo, era que ele não usaria sua primeira chance para realizar o seu sonho sustentável para fazer algo que não fosse perfeito.

— Os "mas" a gente pode conversar depois, porque a fundação vai ser de aço e concreto. Bambu é orgânico e pode se decompor no solo — eu lhe disse e ele concordou comigo, abrindo o maior sorriso que eu já havia recebido em toda minha vida. Bem, se ele parasse de me olhar com aquela carinha de cachorro sem dono, isso também era um extra — só que eu topo, Edu. Vamos colocar o meu CREA em risco pelo seu bambu.

— Ai meu Deus! — Cecília largou a faca (amém) e veio me abraçar com tanto calor que eu não consegui não abraçá-la de volta com a mesma intensidade, notando que ela finalmente havia relaxado — obrigada Má, obrigada!

— Você tem razão, eu amo um desafio — eu lhe confidenciei e ela beijou meu rosto umas trinta vezes antes de finalmente me soltar, deixando-me um pouco tonta com tanta demonstração de afeto.

Então, antes que eu pudesse arrumar o cabelo que havia colado em meu rosto, senti a mão de Eduardo me puxando pelo pulso na direção do seu corpo e eu colidi contra ele. Seus braços me envolveram lentamente, como se quisessem aproveitar o momento para me ter mais perto. Fazia mais ou menos quinze dias que eu não ficava tão próxima dele, quiçá abraçá-lo, mas meu corpo reagiu antes mesmo que eu pudesse refletir sobre o que estava acontecendo e eu pousei minha bochecha em seu ombro, ouvindo seu coração completamente descompassado do seu ritmo normal, parecendo estar em total sintonia com a música da sala.

Eu tenho certeza de que já havia escutado Is this Love umas trinta mil vezes, porque era um dos maiores clássicos do rock que aprendi a gostar, mas eu nunca tinha parado para realmente sentir a música invadindo meu corpo e me fazendo querer parar naquele momento por mais do que os seus poucos minutos.

— Obrigado, Má, eu juro que você não vai se arrepender — ele sussurrou contra os meus cabelos e plantou um beijo ali, apertando-me um pouco mais e eu deixei minhas mãos deslizarem pelas suas costas, desenhando os músculos escondidos embaixo de sua camisa.

— Eu sei — eu me afastei com toda força que eu invoquei dentro de mim, reparando que Cecília estava sorrindo para o irmão como se soubesse de algo que não estava pronta para dividir ainda.

Então pela próxima hora ela cozinhou a melhor refeição da minha vida e eu não estava nenhum pouco pronta para aquele orgasmo gastronômico que era a culinária de Cecília Senna. Eu, inclusive, descobri que amava abobrinha, chocando um total de duas pessoas. Eduardo e euzinha.

— Aí eu roubei a garrafa — Ceci me contou e eu tive que limpar as lágrimas de tanto que eu estava rindo. Aquela mulher era a finesse encarnada e ela roubou uma garrafa de vinho que valia mais de quinhentos reais.

Se não era minha nova musa inspiradora, com certeza eu não sabia quem era.

— Eu sou sua fã — eu falei ao enfiar mais um cogumelo na boca, sentindo-o derreter com aquele gosto de manteiga lavando minha língua — não só pelo roubo, porque é errado mesmo que tenha sido sensacional, mas por você correr atrás dos seus sonhos.

— São seus olhos, sua linda e maravilhosa engenheira — ela piscou para mim e eu me senti completamente impactada. Definitivamente foi a Cecília que seduziu o Leandro e não ao contrário. Eduardo poderia ficar bem tranquilo que era ela quem estava dando as cartas naquela relação — e você ainda não experimentou o meu tofu. Depois disso com certeza você vai se apaixonar por mim.

— Eu não tenho certeza se eu gosto de tofu... — eu comentei para mim mesma, sentindo Eduardo me chutando embaixo da mesa e eu queria não ter feito uma careta, porém foi mais forte que eu — e não tem como se apaixonar mais, só se eu te pedir em casamento.

— Não pergunta duas vezes que eu aceito — ela brincou e eu ri com ela, notando que o arquiteto estava apenas de braços cruzados observando nossa conversa.

— Mas e o molho de tangerina? — ela perguntou e eu passei meu garfo de novo no molho para relembrar.

— Achei doce demais — seu irmão rebateu e ela apenas o ignorou, pois claramente estava falando comigo e aquela não era a resposta que ela estava procurando.

Cada segundo que passava, eu adorava Cecília Senna um pouco mais.

— Eu gostei, mas eu talvez deixaria um pouco mais ácido? — eu sugeri e ela parou para considerar.

— Posso diminuir o tempo de redução — ela sorriu para mim e depois arqueou as sobrancelhas para sua sósia masculina — viu? Isso é um comentário construtivo.

— Eu amei sua irmã — eu coloquei minha mão na perna dele, talvez um pouco mais alto do que eu deveria, mas eu não tinha reparado e foi um gesto tão automático que eu só notei que não deveria ter feito isso quando senti o seu corpo enrijecendo com o meu gesto, então eu a retirei dali, antes que Cecília notasse algo — eu...

O celular dele começou a tocar e eu vi o nome de Chico ali na tela, calando-me.

— Um segundo — ele pediu e se levantou, saindo da mesa da sala para ir até a minha varanda.

A playlist ainda estava rolando com um Winds of Change e eu notei que a cabeça dele estava balançando de acordo com a melodia da música. Provavelmente ele conhecia até mesmo a ordem das músicas, visto que foi ele quem me apresentou a lista de reprodução.

— Eu só não trouxe um vinho, porque não queria que você achasse que eu estava tentando te embebedar para conseguir o seu sim — Cecília continuou falando e eu revirei meus olhos.

— A melhor e mais rápida maneira de me conquistar é com vinho — eu confessei.

— Eu também — ela retornou e nós duas rimos — eu só preciso de um novo fornecedor, porque o meu chefe antigo me colocou na blacklist de várias pessoas.

— Vinhos? Eu vou te apresentar a pessoa certa — eu lhe garanti, e estendi minha mão na sua direção, porém ela me olhou confusa — eu preciso do seu celular para te passar o número do Romeu.

Aí ela me entregou o aparelho e eu coloquei o contato dele ali de cor, pois eu sabia apenas quatro números de cabeça: o meu, o da Renata da CPN, o da minha casa em Vitória e o de Romeu. Não necessariamente nesta ordem de prioridade.

— Porra, Chicão! Que bosta! — Eduardo berrou da sacada e eu e sua irmã esticamos nosso pescoço para tentar entender de onde vinha aquele ataque de fúria.

O rapaz retornou para onde estávamos ainda com o telefone no ouvido e se jogou na cadeira ao meu lado. Ele estava tão consternado, que estava olhando para o nada como se pudesse abrir um buraco na minha parede.

— Tem um cano vazando no apartamento — ele comentou conosco, ainda falando com Henrique Francisco.

— Puts, Edu — Cecília fez uma careta igual a que ele fazia quando escutava algo que não gostava.

— O banheiro está completamente alagado e a água está invadindo o apartamento — ele resmungou as palavras para fora, provavelmente repetindo os berros desesperados de Leandro sobre o seu secador de cabelo estar completamente pifado.

— Primeiro você tem que fechar o registro d'água, então — eu disse, inclinando-me na sua direção para que ele parasse de se lamentar internamente e começasse a me escutar.

— Nossa, sim! Chicão, fecha o registro — ele levantou da cadeira um pouco mais enérgico — como não sabe onde fica? Na área de serviço, do lado do tanque. Sim. Isso. Como assim tá vazando água daí também? Não era do banheiro? — ele retirou o celular do ouvido e ficou olhando entre eu, Cecília e a louça, como se não soubesse o que fazer.

— Edu, vamos fazer assim? Vai pra casa e ajuda com isso que eu cuido da louça — eu lhe garanti com um sorriso controlado, pois o seu desespero naquele momento era quase palpável.

— Não, é muita cara de pau. Olha a quantidade de louça que a Cecília fez! — ele apontou para a minha pia e eu também estava impressionada com aquela montanha, porém era um sacrifício a ser feito pelo bem da gastronomia.

— Por que nós três não vamos para a casa do Edu, resolvemos o vazamento e depois voltamos aqui e eu arrumo a cozinha? — Ceci sugeriu e eu comecei a menear a cabeça, pois aquilo não fazia o menor sentido — você não é a melhor engenheira que já nasceu? Com certeza vai conseguir ajudar lá mais do que o meu irmão.

— Eles precisam de um encanador e não de uma engenheira — eu corrigi a morena de olhos muito-muito azuis.

— Eles vão precisar de um apartamento novo sem você ajudando lá — ela me garantiu.

Eduardo apenas deu um tapa em sua nuca e ela começou a beliscá-lo enquanto ainda tentava falar com seus amigos para salvarem o apartamento de uma possível inundação.

Como eles conseguiram fazer isso? Normalmente um cano trinca e começa a infiltrar, mas para o apartamento estar no caos que eles narraram era porque o cano, sem dúvidas nenhuma, estourou. Como eles deixaram isso acontecer?

— Vamos lá, aí eu passo aqui, deixo o apartamento um brinco e levo minhas coisas embora — ela me garantiu já pegando a sua bolsa e eu olhei para Eduardo, que estava no telefone com Chico explicando a diferença de uma torneira e um registro.

— Eu posso devolver tudo amanhã para o Edu — eu lhe garanti e ela meneou a cabeça para mim.

— Não sei se posso confiar minhas facas Korin Suisin Gyutou — ela estreitou os olhos na minha direção de maneira divertida — promete não roubar?

— Não prometo nada.

— Então você vem com a gente — ela me puxou com o seu braço para perto, abraçando meu pescoço e eu calcei meus sapatos completamente vencida, o que era algo novo para mim.

Cecília abriu a porta da minha casa e nós olhamos para trás, pois Eduardo, o dono do carro e do apartamento em questão, ainda estava discutindo sobre o sentido anti-horário que Leandro deveria girar o registro para fechá-lo, porém ele desligou o telefone ao perceber que estávamos de saída sem ele se ele não se apressasse.

— Eu não tenho certeza se eu gosto de vocês duas amigas, sinto que isso não vai ser bom para mim — ele considerou e eu sorri, pois eu estava contando com aquilo.

Eduardo Senna conseguiu converter todos os membros da minha família a gostarem dele, então era justo que sua irmã gostasse de mim também. Era a Lei do Retorno.

— Tarde demais, Eduzinho — Ceci me puxou para mais perto e eu ri do desespero cruzando o semblante dele, mesmo que eu soubesse que ele não estava nenhum pouco incomodado com aquilo.

⟰ ⟰ ⟰ ⟰ ⟰ ⟰ ⟰ 

Boooa tarde, pessoal! Tudo bem com vocês?

Primeiro dia da nossa segunda #maratonadeCEM e vocês já conhecem as regrinhas:

1) Votem e surtem muito que garantimos posts na quarta e quinta também;

2) Para o campeão de engajamento (aqui estamos considerando comentários), capítulo dedicado e um spoiler exclusivo!

Agora vamos aos fatos: além de madrinha de casamento em tempo integral, a Má ainda pintou o apartamento inteiro pelo projeto! Alguém mais faria isso? A gente ama a dedicação dela com o trabalho!!!

E... MARDO VAI CONSTRUIR UM RESTAURANTE DE BAMBU E TEMOS PROVAS!!!!!!!!!!! Ceci só precisou chegar com sua culinária mágica e umas facas assustadoras, nada demais! hehehehe

Mas quem tá ferrado mesmo é o Edu, com Chiandro surtando no apartamento e um cano estourado. Como será que nosso eco-arquiteto vai salvar o dia?

Libriela espera que estejam todos gostando! Não esqueçam da estrelinha e de nos contar o que estão achando, porque olha, se a gente já era apaixonada por essa história antes, agora o amor é incondicional!!!!

Beijinhos,

Libriela <3


Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top