Black Gives Way to Blue
— Eu queria tentar de novo... — ela diz — Se você me desse a chance.
Levanto do chão e vou até onde a corrente em volta do meu pescoço me permite ir. Fico bem diante dela, para que ela olhasse nos meus olhos. Noto o quanto ela está desconfortável com a proximidade, apenas pelo modo como ela cruza os braços e abaixa a cabeça.
— Que diferença isso faz? — rebato — Nada nunca vai poder ser normal entre nós, não entendo muito sobre a ligação mas não acredito que a nossa seja capaz de resistir depois de...
Depois de ser rejeitado duas vezes. Eu nunca mais esqueceria disso, afinal era isso que marcaram na minha pele com aço quente. "Rejeitado". Irina não responde, o que contribui para a minha total falta de empatia.
— Caralho, eu nem sei o que aconteceu com a Claire, ninguém me diz nada... — me desespero ao pensar nela.
Minha psiquiatra era uma pessoa boa e tentou me ajudar ao máximo. E como retribuição eu havia feito isso com ela.
— Ela está bem, nossos sentinelas investigaram — Irina diz como se aquilo resolvesse tudo — Aparentemente ela não teve nada a ver com o que você fez.
Respiro pesadamente me sentindo mais aliviado. Eu não tinha outra escolha a não ser torcer para ser verdade. O que eu fiz não tinha perdão.
— Apesar de tudo estou feliz que veio até aqui. — ela continua. Não sei como reagir a sua fala.
— Você não parecia feliz quando eu apareci. — dou corda, apenas para ver até onde ela iria com aquela conversa.
— Eu estava errada. Agora eu vejo o erro que eu cometi, eu me deixei influenciar pelo meu pai. Ele sempre quis que a família continuasse sendo Alfa de Arklin, como tem sido por quase duzentos anos, mas eu sou mulher e isso torna as coisas meio difíceis. Esse era o único motivo pelo qual eu aceitei me casar com Colin. — ela parece desolada.
Balanço a cabeça negativamente. Quero abraça-la mas a imagem dela e Colin abraçados naquela noite surge na minha mente. Ela não parecia forçada ou coagida a fazer aquilo. Havia pelo menos um afeto mínimo entre eles, isso era óbvio. Um misto de sentimentos confusos me invade. Que merda eu estava pensando? Ela é uma filha da pu...
— Será que você pode me aceitar? — Irina pede.
Não respondo de imediato. Era difícil de assimilar aquelas palavras agora, mas o que ela diz a seguir me quebra um pouco mais. O resquício de sanidade e juízo que eu ainda tenho acaba se esvaindo quando a ouço me pedir aquilo. Eu tinha vindo aqui para isso. Não?
— Nicholas, por favor... — sua voz era chorosa.
Eu balanço a cabeça, e não em negação desta vez. Ela vem e me abraça forte. Leva alguns segundos até que eu me acostume, mal acreditando que aquilo estava mesmo acontecendo. Eu consegui... Ela estava mesmo aqui. Nós finalmente estávamos juntos.
Meu lobo interior se agita dentro de mim, mas não de felicidade. Meu corpo esquenta lentamente, o toque dela parecia espalhar ainda mais calor. Era aconchegante, acolhedor. Algo dentro de mim me avisa que aquilo não era certo. Suspiro com a sensação que ela transmite. É claro que é certo, é a minha companheira, foi feita para mim.
Um ruído na entrada interrompe nosso momento. Assim que a porta abre, um sentinela entra e eu a puxo para trás instintivamente. O guarda dá um sorriso sarcástico ao olhar para nós.
— O Supremo Alfa está aqui. Ele quer ver vocês agora.
Irina olha pra mim preocupada. O guarda apenas retira a corrente em volta do meu pescoço, as algemas permanecem. Mais sentinelas nos escoltam pelos corredores, até que param subitamente diante uma porta. Assim que elas abrem nós estamos em um auditório vazio, exceto por duas pessoas que nos esperavam lá em baixo. Desço as escadas junto com Irina. Ela segurava meu braço, e eu não sabia como me sentir sobre isso, não estava acostumado com nada disso. Nem mesmo sabia se dariamos certo. Mas pelo nosso bem estar, eu espero que sim. O olhar do líder de todas as alcateias do mundo sobre nós era indecifrável. Apenas ele estava sentado em uma cadeira de frente pra nós, a outra ao lado dele estava vazia. Uma mulher estava em pé ao seu lado, andando de um lado para o outro a passos calmos.
— Sentem, por favor. — a Suprema Luna aponta para as duas cadeiras na frente da mesa.
Eu sabia que não era um convite apesar do tom gentil, e sim uma ordem. Eu havia esquecido o quanto ele era jovem, talvez tivesse a minha idade apesar do envelhecimento lento. Olhando o Supremo mais de perto, eu não sabia dizer se ele estava tenso, ou extremamente puto, ou os dois. Nós dois nos sentamos, e ele ainda permanece alguns segundos nos encarando.
— Irina eu me lembro de você e do seu pai. — Supremo começa — Lembro que os dois vieram falar comigo assim que você identificou seu companheiro, era óbvio que pela rapidez com que fizeram isso você queria se afastar dele o mais rápido possível. Por que estou vendo os dois de mãos dadas?
Irina soluça antes de dizer.
— Eu cometi um erro ao rejeitá-lo, quando Nick apareceu na minha casa eu cometi esse erro novamente, mas agora eu tenho certeza...
— Então me diga o que te fez mudar de ideia, me diga o que te fez perceber esse erro — ele insiste — Achei que você não o quisesse. Quando soube que ele invadiu sua casa eu tinha certeza de que você tinha tomado a decisão certa em rejeitá-lo, afinal ele parece louco de fazer uma merda dessas.
O Supremo falava de mim como se eu nem estivesse ali. Saber que ele não aprovava o que estava acontecendo entre nós me fez questionar se Irina realmente me defenderia. Quase penso que ele tem razão, mas pelo bem comum eu mantenho as aparências. Que bem faria voltar ao sentimento de ódio e rancor de antes quando eu podia simplesmente me entregar aos sentimentos bons da nossa frágil ligação? Era extremamente deprimente e insano formular esse pensamento, mas após dias intermináveis eu não dava a mínima para o que tinha acontecido na casa dela naquela noite. Eu só queria me sentir eu de novo, eu precisava sair daqui.
— Eu estava noiva de Colin Hastings, achei que o amava por insistência da minha família, pois queriam que eu me tornassem Alfa de Arklin e a família dele era a mais próxima de conseguir esse posto, já que eu sou uma mulher e...
— Acho que você não entendeu a pergunta. — o Supremo a interrompe.
— Olha, eu queria acrescentar... — eu começo.
— Eu não falei com você. — ele rebate irritado, e se volta para Irina — Pode responder a pergunta que eu fiz? Porque mudou de ideia sobre ele?
— Colin me abandonou depois do que houve e eu percebi o quanto havia errado — ela responde.
— Deixa eu ver se eu entendi. — a Suprema Luna chega mais perto de Irina e cruza os braços — Então você foi procurar o companheiro que rejeitou pois seu noivo te largou?
Sinto uma pontada no coração, e Irina aperta forte minha mão sentindo também. Era doloroso admitir que minha companheira me via como uma segunda opção, mas eu tentava não me importar com isso, afinal ela era tudo o que eu sempre quis. Não era verdade, mas eu me agarro a esperança de que se eu acreditasse nisso, uma hora se tornaria verdade.
— Tem certeza de que esse foi o único motivo que a fez querer ele de volta? — o Supremo percebe que ela não vai dar nenhum argumento convincente.
— Eu estou arrependida! Eu cometi um erro e agora percebo isso, e eu também não aguento mais sofrer por isso. — ela desabafa.
A Luna se senta na cadeira ao lado do Alfa, sem dizer uma palavra. Odiava a situação em que nos colocaram, afinal só Irina estava sendo julgada por eles. Embora eu tivesse minha parcela de culpa por ter vindo até aqui. Talvez me achassem maluco, afinal eu ainda era um paciente que fugiu do tratamento.
— O que vocês acham que vai acontecer quando outros rejeitados descobrirem que podem parar o tratamento e ir atrás de seus companheiros? — o Supremo diz — Vocês pensaram nisso? É claro que não. Agora eu tenho que consertar a merda que fizeram.
O Alfa passa as mãos pelo cabelo parecendo exasperado, e a Luna segura em sua mão, o confortando.
— Por oito dias ele não recebeu nenhuma visita sua, e no dia em que eu chego você resolve aceitá-lo de volta... Eu vim aqui para matar ele e queria ouvir alguns motivos seus para que eu não fizesse isso, mas você vai nos dizer a mesma coisa sobre Colin Hastings te iludir e sua família te pressionar, não vai? — o Supremo a bombardeia novamente.
Irina apenas chora ao meu lado, eu aperto de leve sua mão tentando consola-la, isso era o máximo que as algemas permitiam fazer.
— E quanto a você? Tem algo a dizer para se defender? — o Supremo finalmente dirige a palavra a mim.
— Eu não me arrependo de nada. Faria tudo de novo se soubesse como termina, apenas para ver Irina novamente. — as palavras eram amargas na minha boca, não eram nem de longe verdadeiras. Talvez eu só estivesse desesperado, talvez ficar dias sem ver o rosto de outra pessoa tivesse me deixado maluco. Queria acreditar nas sensações afetivas que Irina ainda proporcionava, mas eu me sinto iludido.
— Até mesmo se soubesse que sua psiquiatra foi sequestrada pela família dela e trazida até aqui pois você falsificou o documentos que ela assinou? — a Luna questiona.
Minha vez de baixar a cabeça. Que merda estava acontecendo comigo? A Luna estava certa.
— Não. Não faria isso se soubesse. — admito. Eu vim até aqui acreditando que ninguém próximo a mim seria afetado por isso.
— Eu poderia matar você e quebrar essa ligação agora mesmo pelo o que fizeram. — o Supremo respira fundo.
— Ninguém precisa saber disso por enquanto. — a Luna intervém, olhando para mim com pena.
O casal a nossa frente troca olhares, como se conversassem por telepatia. O Alfa respira fundo antes nos olhar de volta e dizer:
— Os dois estão proibidos de sair de Arklin. A notícia vai se espalhar mas mantendo vocês aqui posso amenizar as coisas. — ele olha pra mim — E acho bom minhas ordens serem cumpridas dessa vez, não vou dar uma terceira chance.
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