♣️CAPÍTULO 2♣️

Caleb

Meus olhos se fixam na tela full HD tomando a parede inteira da suíte enquanto apago o cigarro no cinzeiro, ainda não decidi o que mais me chama atenção no vídeo que está em repeat a quase uma hora. A voz sedutora me hipnotizou ao ponto de mal perceber de que havia ficado sozinho no quarto, já que meus companheiros de farra já tiraram o que queriam de mim: o dinheiro.

Viro a garrafa de uísque na boca encarando a maldita mulher de corpo curvilíneo e olhos amendoados, cantando sobre coisas que jamais serei capaz de sentir. A bebida desce queimando tudo por dentro. Só queria que ela fosse capaz de levar consigo toda a merda que é a minha vida, mas é exigir demais.

Há anos o álcool não provoca os mesmos efeitos de antes, porém eu gosto dessa sensação de que tudo está implodindo e que os malditos fantasmas vão sumir como uma cortina de fumaça. Só que isso nunca acontece de verdade, eles permanecem aqui escondidos esperando o momento em que vão voltar e me apontar o dedo.

A voz percorre todo o espaço a minha volta em uma melodia suave fazendo meus batimentos desacelerarem. A letra fala sobre um amor cruel e perverso que parecia impossível, mas o casal da música acreditou que poderiam salvar um ao outro. Mentiras e mais mentiras... Baboseiras românticas de mulherzinha. O mundo real é um inferno e ninguém será salvo de sua podridão.

— Só restamos você e eu, meu bem — sussurro para a tela, batucando os dedos na garrafa quase vazia. — Duvido muito que seja capaz de me salvar, gracinha.

Os lábios carnudos sorriem para mim como se tivessem compreendido o que falei ou talvez seja o nível elevado de álcool no meu sangue. Não tenho ideia de como os vídeos dessa mulher começaram a tocar, mas me perdi nela a mais tempo do que sou capaz de admitir.

Eu, Caleb Aguiar, o cara que pode ter qualquer mulher aos seus pés, estou a ponto de bater uma para a filha da puta gostosa se exibindo na televisão. Não, mais do que isso, quero enfiar o pau nessa boca deliciosa e fodê-la forte a cada vez que ela se encosta ao microfone. Pode ser que esteja sob efeito de alguma das drogas que usei essa noite e tudo isso seja o caralho de uma alucinação...

Fiz uma busca rápida nas redes sociais, só que a tal Mila parece ser um fantasma – e não o anjo que sua voz insinua – não há nada esclarecedor sobre ela, a não ser o endereço da boate onde o vídeo foi gravado. Caralho! Essa porra tinha que ser no Brasil e tão próximo ao lugar onde jurei nunca mais voltar? Claro, que sim!

Tento levantar e tropeço algumas vezes nas garrafas espalhadas pelo chão. É melhor sair desse lugar, antes que algum dos meus fantasmas se materialize em minha frente.

Bato as mãos no bolso da calça. Carteira, ok. Chave do carro? Cacete. Tateio as almofadas do sofá cegamente sentindo um líquido pegajoso entre os dedos, até encontrar o que procuro. Chave do carro, ok. Do que mais preciso? Celular. Ah, merda!

O som estridente começa a soar pela cobertura e giro na direção dele, mas não consigo localizar o aparelho. Que se foda! Decido largá-lo para trás, não tem nada importante nele. Mamãe pode esperar por algumas horas. Dafne sabe onde me encontra e meu pai... bem, não quero ser encontrado por esse velho moralista que nunca me enxergou como filho, desde que ele continue bancando minhas regalias.

Pego a jaqueta jogada no chão e abro a porta parando um minuto para olhar o caos a minha volta. Aos trinta anos, eu deveria ser capaz de fazer mais do que isso, segundo o respeitável Afonso Aguiar, entretanto não consigo evitar que tudo que toco seja imediatamente destruído.

"Caleb, você ainda vai me matar. Seu pai está ficando maluco porque não consegue te ligar. Faça o favor de atender as chamadas dele."

A voz histérica de mamãe no áudio do aplicativo de mensagens, quase estoura meus tímpanos. Eles são tão exagerados, não fiquei nem 24h sem o celular — que foi encontrado pelo pessoal da limpeza. Depois de cinco anos vivendo nos Estados Unidos, minha familia já deveria ter entendido que moro do outro lado da América por um motivo bem específico: quero ficar longe da maioria deles.

Pego uma xicara no armário e coloco uma capsula na cafeteira, pronto para ignorar o pedido de dona Maitê, quando o aparelho em cima da bancada de mármore começa a tocar. Encaro a tela, não posso rejeitar essa chamada. De todas as pessoas do mundo, Dafne é a única que, mesmo não sabendo a verdadeira razão, entende o motivo do meu afastamento.

— Oi, bonequinha.

— Não me venha com apelidos fofos, seu cretino miserável — seu tom apesar de soar irritado, não me assusta. — Tem ideia do caos que virou essa casa, só porque você não atende a porcaria do telefone?

— Nada que a mamãe não consiga resolver — dou de ombros encostando-me na bancada.

— Babaca! — diz entre dentes. — As vezes acho que erraram nossas idades e a irmã mais velha sou eu. Não é possível que você continue essa criança birrenta sendo dez anos mais velho.

— Não sou uma criança birrenta — faço um bico engraçado, mesmo que ela não esteja vendo. — Só quero que respeitem a minha decisão de ficar longe desse hospício.

Ela gargalha como se soubesse de coisas que desconheço.

— Não sei se te deixo quebrar a cara ou se conto logo — posso ouvi-la batucar as unhas em alguma superfície dura. — Se tivesse me atendido ontem, muitas coisas teriam sido evitadas.

— Do que está falando? — arqueio a sobrancelha sentindo uma tensão no ar.

— O papai vai exigir que volte para casa — as palavras soam incertas.

— Nem morto! — a onda de irritação chega com força.

— Ah, vai sim — ela parece convicta. — Porque o nosso amado pai está nesse exato momento zerando a sua conta bancária e cancelando seus cartões. — Papai jamais seria capaz disso, mamãe nunca permitiria uma coisa assim ou permitiria? — Nas palavras de Afonso Aguiar você é "um vagabundo que precisa aprender o valor do trabalho e ele cansou de ser patrocinador de suas badernas milionárias."

Massageio o pescoço exibindo um sorrisinho sarcástico. Esse velho sem coração não pode fazer isso comigo. Na real, ele nem precisa daquele dinheiro todo e eu sou seu filho, não aquele inválido... Não, devem ser apenas mais uma de suas inúmeras ameaças vazias desde que sai de casa.

— Nem gastei tanto dinheiro assim, bonequinha — retruco fingindo indiferença.

— Papai não concorda com isso — ela não só parece saber exatamente como estou me sentindo agora, como se diverte com o meu sofrimento. — O contador dele afirmou veementemente que se essa grana tivesse sido investida na bolsa de valores, nossa herança teria triplicado.

— Exagero.

— É sério, Caleb. Seus dias de ovelha desgarrada estão contados e se eu fosse você, já começaria a fazer as malas. — Minha irmã não parece preocupada comigo, até porque há anos ela tenta me trazer de volta para casa. — A mamãe não vai conseguir fazer papai mudar de ideia. Chega de fugir, maninho. É hora de enfrentar seus demônios.

— Não é não — alcanço o cantil na gaveta do armário e dou um gole generoso, sentindo os meus fantasmas começando a saírem da caixa. — Eu vou ficar aqui, bonequinha, com tudo que mereço. Eles não podem tirar isso de mim. Mamãe prometeu.

O ódio costumeiro se alastra por toda parte conforme o álcool vai correndo pelo meu corpo. Dez anos. Eu sou um monstro. Ninguém pode mudar isso. Voltar para a maldita familia feliz vai me enlouquecer, isso não vai acontecer.

— Talvez nossa mãe tenha se cansado das suas malcriações e queira ensinar uma lição ao filho ingrato — agora Dafne usa um tom conspiratório. — Confesso que até cheguei a pensar que ela bateu com a cabeça. Tem uma semana que ela diz ao papai que você é plenamente capaz de assumir um cargo de confiança na empresa e ele só precisa te dar uma chance.

Dou uma gargalhada. Ela tem fé demais em mim, eu não sou o filho que ela acha que criou. Meu PHD em Turismo tem mais a ver com status social do que assumir qualquer cargo na empresa do meu pai. Tenho plena ciência que em um futuro bem distante vou assumir os negócios da família, mas até lá vou aproveitar ao máximo toda as facilidades que o dinheiro deles pode oferecer.

— Alguma coisa me diz que você está amando tudo isso, Dafne — tento deixar o assunto mais leve.

— É claro que estou! Vou ter a minha metade de volta e mamãe vai ter outra ocupação além de tentar me apresentar os filhos solteiros das amigas dela. — Minha irmã sorri do outro lado. — Espero que esteja em dia com suas sessões de terapia, a vida nessa casa não vai ser nada fácil, irmãozinho.

— Imagino que não.

— Preciso ir, tenho reunião com meus patrocinadores daqui há... dez minutos — ela soa adulta demais para uma garota de vinte anos. — Ao contrário do meu irmão que vive para gastar o dinheiro da nossa família, eu estou muito empenhada em criar minha própria fortuna.

— Adoro a ideia de que em breve terei duas fortunas para torrar — a faço rir. — Não posso te atrapalhar mais.

— Prepare o seu coração, porque mamãe está armada até os dentes com argumentos convincentes para te trazer de volta ao ninho — finaliza antes de desligar.

Passo as mãos pelos cabelos tentando não surtar com a possibilidade de voltar a conviver com todos os meus fantasmas e demônios na mansão mal-assombrada da minha família. Prometo que vou fazer o que estiver ao meu alcance para evitar esse desastre e caso não consiga, vou tornar a vida de todos eles um inferno e vão desejar nunca ter me tirado daqui. Papai e mamãe não tem a menor noção do homem cruel que me tornei nos últimos anos.

Voltei, meu povo.

Ok! Ok! Caleb é um boy problemático e estou assumindo todos os riscos. Espero que ele tenha te causado uma boa impressão.

Agora me respondam: 

Ele vai quebrar a cara? 

Quem é essa Mila?

A mãe dele vai conseguir convencê-lo a voltar para casa?

Quero teorias na minha mesa sobre o que acham que ele vai aprontar nos próximos capítulos.

Beijos e até breve.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top