⇝ CAPÍTULO 11: Viagem, mistério e goblins com fome
Questionado sobre o ferimento na boca, Oliver desconversou e omitiu. Foi um acidente na aula de Ataque e Defesa. Acontece. Assim foi explicado.
Não foi necessário ir até a Academia naquele dia, já que a mesma foi fechada. Em breve, professores e direção se reuniriam para um conselho geral onde debateriam a respeito dos alunos, turmas, trabalhos, provas e o principal, as notas em geral.
Portanto, Oliver aproveitou para passar o dia na cama. Lia um livro que estava entre os pertences de sua mãe. Capa escura, com dois olhos amarelos ao centro. O título, "A Vida de um Elementalista". O nome do autor, riscado e inelegível.
Eskkad ajeitava seu cinto cor de madeira. Sua calça escura e grossa, combinado a um casaco longo e grosso, que quase atingia seus joelhos.
— Sairei por alguns dias. Provavelmente semanas.
— Interessante. Para onde vai? Ficarei sozinho de vez?
— É trabalho. E você sabe se cuidar.
— Trabalho? Assim, de repente?
Eskkad suspirou, pensou por um momento, mas revelou.
— Vou trabalhar como emissário no Fogo. Durante o Torneio. Enviarei mensagens e atualizarei a situação a Água.
Deitado, Oliver encarou seu pai.
— Não posso ir junto? Estou sem aulas nesse período.
— Você sabe que não. Você tem deveres com o Reino, embora não tenha de ir a Academia no momento. Não pode sair assim, além do mais, é possível que você e seus companheiros recebam alguma missão, trabalho, ou qualquer coisa do gênero.
— Tudo bem. Posso fingir que estou de bem com isso. Já está indo?
— Sim. Preciso sair logo, mas antes me reunirei com algumas pessoas e discutir alguns termos. Coisas formais.
Este já era o melhor e mais longo diálogo entre pai e filho desde os acontecimentos passados.
Eskkad olhou carinhosamente para seu filho, e se retirou momentaneamente. Bateu a porta do quarto em questão e partiu para o seu. Próximo a cabeceira da cama, tocou uma imagem. Tratava-se de uma pintura antiga, na qual constava Luna e ele mesmo. Provavelmente feita por algum pintor conhecido em tempos antigos. Ambos jovens na foto. O marido passou os dedos pela imagem. Franziu o cenho. Vou trazê-la de volta.
Quando se virou para sair de seu quarto, deu de cara com Oliver, de pé. Ainda de pijama, algo branco e cafona. Ambos se abraçaram firmemente, e Eskkad apertou bem seu filho. Seguraram as lágrimas, e o pai pegou sua alabarda, recostada a parede. Olhou novamente para seu filho e partiu adiante. Ainda conduzia consigo uma enorme bugiganga as costas, com apetrechos, pequenas armas e itens necessários para uma viagem.
Não havia dado uma hora da tarde, Oliver retornou a sua cama enquanto seu pai partia rumo ao Templo da Água. Mais precisamente para o penúltimo andar, exatamente no Salão Prateado, onde o mesmo já havia estado inúmeras vezes.
A grande sala, rígida e segura, permanecia como antes. Poucas mudanças. A longa mesa, intacta, e as paredes estavam cobertas por armas e flâmulas velhas.
Eskkad, logicamente, imaginou encontrar alguns ministros e uma sala composta por pessoas de grande importância, mas estava praticamente vazia. Apenas o Rei se fazia presente. Vestia um roupão após sair de um provável banho.
— Então... É hoje?
— É o que parece, vossa majestade. - encurvou-se educadamente, e Meltar se mostrou desconfortável, já que não gostava quando um amigo tão próximo fizesse tal gesto. — Mais ninguém presente?
— Não. Dispensei os ministros. Digo, Zargo está trabalhando com uma tropa, por exemplo. E os chefes das Grandes Famílias estão se reunindo para debater sobre uma melhora na economia, mas fique tranquilo. Estamos no verde!
— Zargo anda trabalhando muito com o exército. - comentou positivamente, e o Rei preferiu manter o diálogo a respeito da viagem.
— Espero que tenha total noção do que está fazendo.
— Serei apenas um emissário da Água. Realizando o dever em pelo Reino que eu sirvo.
— E a arma, para que a leva?
— Não posso sair de casa sem meu instrumento de trabalho.
— Tudo bem. Não vou contrariá-lo... Ah! Já comuniquei aos guardas de hoje. O portão se abrirá assim que você aparecer por lá.
— Eu agradeço.
— Também solicitei alguns camaradas que buscassem um bom cavalo nos estábulos para você. Acredito que consiga chegar rápido no Fogo.
— Agradeço novamente, mas não farei o trajeto com pressa. Terei paciência. - Eskkad ajeitava a alabarda as costas. — Aliás, os representantes de Terra e Ar já estão por lá?
— Não, mas acredito que ambos cheguem antes de você.
— Entendo. Quer que eu faça mais alguma coisa?
— Quero que tome muito cuidado com todos os passos que der até a nossa chegada. Em menos de um mês estaremos presentes. também. – Meltar deu uma leve tosse, e retomou. — Ah, quero que assine essa permissão para que seu filho saia em missões ou excursões na sua ausência, caso necessário.
O rei lhe passou um pergaminho e uma pena, já com tinta, onde Eskkad assinou.
— Quero que se lembre do seu dever e função. Cuidado com todos os passos até a nossa chegada. Em menos de um mês, estaremos todos reunidos. - Meltar levemente tossiu, e retomou. — Antes de ser dispensado, assine essa permissão. Você já sabe que Oliver deve realizar missões a partir de hoje, mas ainda assim precisamos de uma assinatura. Excursões também estão inclusas.
O Rei entregou parte de um pergaminho dobrado e uma pena já com tinga, e Eskkad assinou rapidamente.
O então emissário assinou e o devolveu. O Rei retornou a falar.
— Muito bem, obrigado. - disse educadamente. — Ora! Quase me esqueço de algo. Na sua ausência, levarei Oliver e a garota para uma conversa especial e amistosa.
— A respeito da viagem passada? Mas já não conversou com o velho Mago?
— Sim, claro. Mas Azelio não sabe de toda a trajetória dos garotos e muito menos tem conhecimento de como a missão foi realizada. Dumas faleceu, então não posso interrogá-lo e pedir a ele um relato. Vou contar com a ajuda dos garotos para saber o que aconteceu naquele período.
— Correto. Deve haver muitas histórias, acredito. Agora, se me permite, preciso ir.
A dupla se cumprimentou. Aperto de mão firme, como eram grandes amigos.
— A montaria lhe espera ao portão leste. Tenha uma boa jornada.
Em alguns minutos, Meltar já conseguia observar seu companheiro caminhando solitariamente pelas ruas vazias do Reino. A alabarda as costas, tralhas e bolsas acopladas na parte traseira de seu corpo. Roupas pesadas contra o possível frio, o azul misturado ao prata e ao negro se distanciando cada vez mais.
Eskkad apontou ao portão, e três soldados, incluso Mirovus, que o abraçou fortemente, estavam por lá. Lhe entregaram um belíssima cavalo, bem forte. A passagem se abriu em segundos, e os homens acenaram para ele, que sacolejou a cabeça positivamente e disparou para fora do Reino. Começava a sua viagem ao Fogo.
O alabardeiro tinha um grande conhecimento sobre as selvas de Valerian, claro. Foram anos de estadia por aquelas matas. Sobre as Florestas-Irmãs, que levavam ao Reino do Fogo, também tinha noção. Peninzel, Edizel e Anazel não seriam obstáculos. Conhecia cada palmo, incluso atalhos e outras passagens, e ele faria bom proveito de tudo que lhe era possível. Os anos de exílio junto aos Selvagens fora de grande ajuda neste aspecto.
Muitas pessoas passariam por situações desconfortáveis em uma situação como essa. Por não conhecerem a região, a temperatura, onde buscar comida, bebida, onde lagos ficavam para um bom banho ou para ter cuidado com alguns lugares curiosamente venenosos.
Eskkad não encontraria problemas em relação a isso. Sabia onde pisar, de cabeça, por onde passar e por qual caminho percorrer.
Entretanto, teve paciência e calma em sua viagem, como bem avisou a seu amigo horas atrás. Preferiu não correr tanto, cavalgando lentamente e aproveitando cada minuto, por mais que não parasse de pensar em sua mulher.
Durante a passagem por Peninzel, a primeira das florestas, o tempo estava seco e já era fim de tarde. AS árvores robustas, típica daquela localidade, foram passadas lentamente por ele e seu cavalo. De longe, pôde observar as montanhas ao noroeste, onde muitos orcs costumavam ficar, mas obviamente não pensou em passar por lá. Loucura seria passar por perto daquelas bandas!
A última viagem que havia feito fora na longínqua ocasião em que buscou respostas com os Elfos em sua morada. Um bom tempo atrás. Naquela ocasião, estava acompanhado por Mirovus e Kora, mas agora cavalgara sozinho.
Enquanto disparava para a segunda floresta, o elementalista ressuscitou um curioso episódio daquela ocasião: o ser com cabeça de tartaruga na fantástica Floresta Espiritual. Uma das imagens mais inacreditáveis que o mesmo havia visto, e curiosamente, os Elfos garantiram e ele e seus amigos que não havia nenhuma espécie com aquelas características em Valerian.
Será que ele poderia encontrar aquela criatura novamente? Mesmo estando em uma região diferente, em outra localidade e ambientação? Sua mente trabalhou por intensas horas neste período, e logo parou para dormir sabiamente antes de chegar a terceira das florestas.
Fora gasto mais dois dias de viagem. Eskkad não aguentava mais sentir aquele cheiro de mato e tantas árvores o cercando. Repousou inúmeras vezes, tirou alguns bons cochilos, alimentava inteligentemente sua montaria e se refrescava sempre que podia em lagos próximos. Não tinha pressa, é verdade, mas queria chegar logo. Seguiu assim todo o caminho.
O cheiro forte de Anazel era duro de encarar, mas ele aguentavaria. Bateu em retirada em uma quente manhã, mas o período da tarde o venceu. Fazia muito mais calor, e logo isso o incomodou, já que a última das florestas era a mais aberta por cima. O sol sol chicoteava suas costas. Nuca e testa escorriam em suor. Não foi suficiente ele tirar as pesadas roupas de frio e amarrar ao cavalo, já que pesava o animal e assim retardava ainda mais a viagem, mas era o que dava para fazer naquela situação.
Ao fim da tarde, desistiu. Optou por descansas, não resistiu. Dormiu como um bebê, aproveitando o frescor que lhe restava.
Ainda sem clarear o dia, Eskkad se banhou em águas próximas, e revigorado, voltou a cavalgar. Ainda sem o sol acima de sua cabeça, precisava aproveitar o tempo agora.
Os últimos trechos foram insanos, tamanha a velocidade que percorria. O cheiro subia e desaparecia imediatamente. O cavalo era realmente bom, estava tinindo. Estava no auge, e Eskkad se aproveitou disso. Nem mesmo a natureza lhe atrapalharia naquele momento da viagem.
As horas passavam, e ele persistia em alta velocidade. Fisicamente estava sem problema algum, mas mentalmente, se cansava aos poucos.
Isso porque muitas dúvidas pairavam em sua cabeça. Como estaria a Água em sua ausência após esses dias? Virgo estaria vigiando seu filho, e se o garoto está bem sem ninguém ou se recebeu alguma ordem de missão nesse período... Questões que eram impossíveis de serem respondidas com ele à distância.
Mas o seu maior questionamento e dúvida eram a respeito do destino, o Fogo. Fazia décadas que Eskkad não visitava aquele lugar. A última vez havia sido durante a antiga guerra, salvando a vida de sua esposa grávida.
Em todos esses anos que se passaram, ele apenas estava ciente da caótica situação. Pobreza, desgraça e morte assolando o povo do Fogo, e claro, mais recentemente, uma nova liderança assumindo o comando após um golpe.
Mas encarar tudo isso era diferente, e ele sabia que não seria fácil. Ainda mais com sua cabeça explodindo em procura de sua desaparecida mulher.
Logo, precisou descansar. Seu corpo não era de aço, ora. Assim, desembrulhou algumas bolsas que carregava em suas costas junto a sua arma. Retirou uma boa corda e amarrou seu cavalo próximo a uma árvore e um riacho. Deu algumas maçãs para o animal.
Visando o descanso, Eskkad subiu numa árvore logo acima. Até chegar ao topo, passou por alguns galhos e deitou-se num forte tronco. Observou as nuvens passarem para lá e para cá, e usou seu casaco como travesseiro.
Tirou um bom cochilo, mas quinze minutos após, ouviu um cochicho aterrorizante. Olhou de um lado para o outro, não havia nada e nem ninguém nas árvores.
Logo, virou-se lentamente para baixo, com a cabeça, e assustadoramente viu que seu cavalo estava a dormir, mas o problema não era esse. Havia um grupo de goblins em torno do animal.
— Ele nos deu essa rota! – gritou um deles.
— Dane-se, seu idiota! Estamos com fome. Este cavalo será nossa jantinha de hoje.
— É verdade! – insinuou outro. — Faz um dia que não como nada gostoso! Não me importo com as ordens, vou parar para comer esse animal. Podemos fatiá-lo e dividir entre nós.
Eskkad estava sem sua arma, claro. Havia deixado escondida próxima ao corpo de sua montaria. Poderia usar suas técnicas de Água, é verdade, mas pensou duas vezes. Evitou movimentos bruscos, observou a conversa das criaturas que incrivelmente não haviam visto sua alabarda atrás do viril cavalo. Mas teve algo que o deixou extremamente ressabiado: os goblins presentes usavam a linguagem normal, e não de sua raça originalmente.
As criaturas verdes e nojentas, com seus dentes sujos e vestindo trapos, conduziam apenas algumas facas em suas cinturas e berravam horrorosamente. Seu cavalo acordaria em algum momento, não aguentaria.
Não havia muito o que fazer. Eskkad optou por um ataque surpresa. Queria muito saber quem era o dito cujo que havia dado aquelas ordens para o grupo, mas não era possível esperar. O cavalo ficaria em risco.
Só restou uma alternativa. O homem saltou da árvore, acertando em cheio a cabeça de um dos inimigos, esmagando sua cabeça como uma fruta.
O restante gritou loucamente, e o cavalo relinchou, e acertou uma patada num dos outros, o que fez este goblin voar. A mata naquela região era baixa.
— Homem! Um homem! – bradou um deles.
— De onde saiu! Matem-no, rápido!
Os goblins puxaram suas facas afiadas com detalhes em roxo, e em conjunto, atacaram, mas Eskkad saltava para trás, na defensiva.
Além de encarar as criaturas, enfrentava também aquele bafo horrível dos pequenos esverdeados. Eram nojentos!
Quando conseguiu espaço, Eskkad juntou seu dedo anelar e indicador, da mão direita, próximo a boca. Em uma fração de segundos, quando o grupo adversário avançou contra ele, suspirou fundo, e quando abriu sua boca, uma enorme quantidade de água foi jorrada. Como braços extremamente poderosos, a técnica devastou alguns metros do local e arremessou as criaturas como lixo.
— Elementalista da Água! – gritou um dos inimigos.
— Maldito seja o momento que paramos!
Todos eles foram derrotados e ao chão. A vida acabaria em breve, e alguns ainda reclamavam ao esperar a morte.
— Morte por causa de fome.
— Eu só queria a coxa daquele cavalo! - bradou o outro.
— Seus inúteis! A culpa são de vocês. - reclamou mais um.
A vitória estava selada, pensou Eskkad, mas quando parou para dar um respiro descansado, um último goblin apareceu. Suicida. Pulou com sua faca contra Eskkad, que desviou no susto e na sorte. Agora, com espaço, a arrancou a arma do inimigo, enfiou em seu peito sujo e o chutou como uma bola, fazendo com que o mesmo se chocasse com a árvore de outrora. Os entulhos de Eskkad despencaram devido ao impacto, cobrindo o corpo do inimigo.
Ele se aproximou, e calmamente retirou sua tralha. Logo, puxou a faca mansamente, e o demônio verde gritou em dor.
— Quem é "ele"!?
— Não sei do que fala, elementalista tolo!
— Eu ouvi vocês falarem a respeito de uma rota dada por alguém.
— Ouviu coisas! Está ficando louco! – respondeu em deboche.
Eskkad puxou a adaga novamente, e apontou para o peito sujo da criatura.
— Responda. Que rota é essa e quem a entregou a vocês?
O goblin sorriu finamente, com aqueles olhos porcos e seus dentes afiados.
— Eu já disse, idiota! Ouviu coisas!
A adaga entrou lentamente em seu corpo. Os olhos se fecharam aos poucos. Todos foram derrotados.
Agora, havia uma certa inquietude e um certo medo presente em Eskkad. Pairando em sua cabeça. O que um grupo de goblins fazia naquela região e o que buscavam? Qual rota seria seguida e quem havia ordenado?
Ah! Claro, ele não se esqueceu de seu querido cavalo. Agitado ele estava. Eskkad o acalmou carinhosamente em algumas horas. Em seguida, realizaram os últimos trajetos da mata verde que se tinha visão.
Chegou ao Reino do Fogo ao início da noite. Fazia um certo frio, não só no clima, como em seu corpo e estômago. Não sabia o que esperar quando viu a grande mulhara que cercava o local.
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