⇝ CAPÍTULO 15: Preparativos

   Luna já não estava em casa quando o sol começou a esquentar ainda no meio da manhã. Saiu sabe-se lá para onde, deixando apenas um bilhete prévio no qual dizia a seu filho e marido que voltaria logo mais.

   O esposo também não se fazia presente e Oliver estava em sua terceira fatia de bolo, quando um toque veio à porta da casa. Cônscio de que não esperava ninguém, pensou algumas vezes se deveria abrir ou não a porta, mas logo o fez, mas antes, verificou pela janela se havia algo, e o que viu foi o simples movimento de civis comuns.

   Quando a porta foi aberta lentamente, Oliver se deparou com um robusto homem de vestes escuras, detalhes e gola branca.

   — Ministro Zargo, a serviço do Rei. – disse secamente.

   — Acho que o senhor se enganou.

   — Venho para debater sobre assuntos de sua importância. Seu pai está?

   — Não, senhor. Ele deve retornar em breve.

   O homem foi entrando e deixando Oliver desconfortável. Retirou sua veste negra superior e pendurou próxima a porta.

   O traje inteiro era apenas cinzo e preto, indumentária modesta e elegante, semelhante a um terno antigo. No peito, havia um broche com a cabeça da serpente, e Oliver percebeu que o homem realmente deveria ser importante.

   Zargo sentou-se na poltrona frente a lareira, agora apagada, como se fosse um membro da família, e Oliver tirou cuidadosamente sua fatia de bolo para que o mesmo não percebesse e tentasse comê-la.

   Ikki chamou a atenção do Ministro ao mordiscar a parte da perna de sua calça, e o ignorante o levantou.

   — Não me foi falado que vocês tinham um mascote.

   — O senhor não vai embora? – disse. — Quero dizer, vai esperar por meu pai aqui?

   — Sim, você disse que ele não deve demorar.

   E assim o garoto ganhou uma indesejável visita naquele dia, que durou mais do que o mesmo imaginava.

   As horas foram passando, e Oliver não sabia mais o que fazer com o visitante. Chegou a conversar, jogar conversa fora – típico. Mas Zargo era ruim nas palavras, suas habilidades ficavam mesmo para estratégias de guerra e no campo de batalha.

   Um novo toque veio a porta.

   — Licença, senhor. Vou conferi-la.

   E a porta se abriu uma segunda vez.

   — Shargfo, à procura de Eskkad.

   — Ainda não chegou. – respondeu contorcendo os olhos.

   — Sem problemas. – disse. — Oh, Zargo, chegou antes de mim!

   E o milico se levantou para ver o amigo, que logo entrou e foram se cumprimentando.

   Os dois Ministros conversaram por um longo tempo na sala, e Oliver serviu chá para ambos, e permaneceu sem jeito e sem saber o que fazer.

   Zargo e Shargfo conversavam a respeito do anfitrião, e desconfiando se realmente era uma boa opção.

   A porta recebeu uma nova pancada, e Oliver já estava quase chorando sem saber o que fazer caso fosse um novo visitante.

   Antes de abrir, olhou de relance para os outros dois que conversavam com caras fechadas.

   — Draggash. Visita para Eskkad. – e o homem que vestia a mesma longa roupa dos outros, entrou, e este utilizava uma espécie de chapéu.

   De onde meu pai tirou tantos amigos.

   — Muito bem vindo! – gritaram os outros dois, e receberam o terceiro como se fossem donos daquela residência.

   — Ei, garoto. Traga-me uma cerveja, por favor. – pediu o Ministro das Conexões Internacionais.

   Por um momento, Oliver cogitou seriamente em agredi-lo com uma garrafa, mas esse pensamento se desfez logo que a porta se abriu novamente. Desta vez nem para baterem antes, já está passando dos limites.

   Agora, era seu pai, e ao lado dele, o Rei. Os dois entraram sutilmente, e notaram logo os já presentes no local, que se ergueram em reverência à sua majestade, que esboçou um grande sorriso.

   — Muito bom. – introduziu o dono da casa. — Vejo que estão todos aqui. Acho que meu filho os tratou bem, pelo que posso ver.

   Havia uma fatia de bolo já comida um pouco distante, canecas com chá e agora Oliver deixava a cerveja próximo aos Ministros.

   — Você os convidou? – pergunto Oliver, e o pai assentiu com a cabeça.

   — Vão todos para a cozinha. – disse. — Oliver, deixe a mesa vazia e com espaço. Iremos utilizá-la.

   Num curto espaço de tempo, a longa mesa da cozinha estava limpa como um brinco e totalmente livre de talheres e coisas do tipo.

   Os Ministros sentaram-se em cadeiras que ficavam em suas laterais. O Rei, de pé na ponta principal e do outro lado, Eskkad, também de pé.

   Shargfo e Draggash tiraram de seus bolsos envelopes dobrados e pergaminhos. Todos em ótimo estado e os jogaram em cima da mesa.

   — Está tudo aqui. – e Eskkad e Meltar se entreolharam, de um lado para o outro.

   — O que está aqui? – perguntou Oliver morosamente.

   — Sua missão, camarada! Sua primeira missão. – comemorou o Rei, enquanto agarrava o garoto, que sem jeito ficou.

   — Como assim?

   — Surpresa! – gritou o Ministro das Conexões Internacionais.

   Oliver finalmente foi solto dos braços do Rei, e olhou diretamente para seu pai.

   — É sério isso?

   — Você não disse que queria voltar a viver nas selvas? – respondeu. — Então, tem uma semana para realizar esse desejo. Mas vai ser a trabalho.

   Os homens agora abriram toda a papelada sobre a mesa. Estudos, analises e conhecimento extremamente detalhados.

   — O que eu tenho que fazer?

   — Achar um velho amigo. – respondeu o pai.

   — Isso, um companheiro de muito, muito tempo... – falou o Rei.

   — Querem que eu saia pelas matas procurando uma pessoa? Mas eu não vou achar nunca. Quem é, de quem se trata?

   — Bem, acreditamos que ele tenha aparência velha e porte alguma arma. – comentou Zargo em voz baixa.

   — Bom, sentem-se todos. Inclusive você, filho. – ordenou Eskkad.

   A reunião sobre o estudo da jornada fantástica estava prestes a começar e os responsáveis logo iniciaram os tratamentos a respeito da fatídica viagem que levaria Oliver as mais insanas aventuras.

   Oliver ainda se sentia aturdido devido todo aquele rebuliço em sua casa, e agora havia piorado, pois não imaginava receber uma missão tão cedo de tal modo.

   Acima da mesa, agora estavam mapas, pergaminhos, papéis enormes e todos anotados e rabiscados para melhor analise.

   — Aqui. – disse Shargfo. – apontando para um círculo vermelho feito numa região logo acima do Reino da Água. — Há uma caverna com água ao fundo.

   — E o que tem? – perguntou Eskkad.

   — Shauagins vivem lá. A última tropa de busca que vasculhou a água detectou a presença de um grupo médio. Seria bom se evitassem entrar.

   Zargo virou a anotação para si.

   — São criaturas chatíssimas. Traiçoeiras, bestas e irritantes. Se tiverem de passar por lá, quebrem eles ao meio.

   — Que raiva é essa, meu bom Ministro? – indagou o Rei enquanto o fitava.

   — Nada. Só uma dica.

   Havia círculos vermelhos, garranchos escritos e muitos rabiscos por todos os objetos acima da mesa, e os homens passavam seus dedos e debatiam sobre cada uma delas, e Zargo sempre abria a bocarra para falar que o inimigo precisava ser quebrado ao meio se possível. Militares...

   Já era noite quando Luna chegou, mas a mesma passou os olhos pela cozinha, e trocou olhares com Eskkad, e logo foi para seu quarto, dando de ombros para a suposta reunião.

   — Entendo que querem ajudar, mas por que sempre falam no plural? Qual de vocês irá comigo?

   — Bem, nenhum. – respondeu o pai, agora olhando o Rei e amigo.

   — Queremos que vá com aquela amiga de cabelos negros.

   E Oliver revirou os olhos.

   — Vocês devem ter ingerido tanto álcool que ficaram loucos. A possibilidade é zero.

   — O Rei dará um jeito. – falou o pai em voz alta.

   E o Rei acenou positivamente. Oliver voltou a se sentar, agora incrédulo com uma ideia tão absurda como aquela.

   As partes pintadas por azul significavam trechos com água, seja vau, riacho ou lagos. Os traços verdes, florestas, sejam elas calmas ou amedrontadoras. Desenhos em amarelo significavam regiões no qual poderiam a ver raças ou outras espécies. As Ruínas - ou Salão de Valamar foram bem comentadas sobre, principalmente por Meltar e Zargo, que comentaram sobre a passada história de como os Anões perderam seu majestoso Salão no meio das florestas. Oliver, no entanto, pouco sabia sobre aquele caso que marcou os Anões para sempre.

   — Draggash. – exclamou o Rei. — Fez vossa parte?

   — Sim, majestade. Estou ciente de que não há nenhuma exploração ou expedição de nenhum outro Reino por essas bandas. – respondeu seriamente. — E nenhum sequer sabe dos nossos movimentos. Em relação a isso, fiquem tranquilos. Eu me encarreguei de tudo.

   Os homens se levantaram para se despedirem. Abraçaram os anfitriões, e Oliver se pôs de pé num salto.

   — E quando começará?

   — Amanhã. Pela manhã, se me permite a clareza. – respondeu o Rei. Oliver ficou mais atônito ainda. Faltavam menos de dez horas para voltar às selvas.

   Os Ministros e o Rei partiram já no meio da noite. Shargfo e Draggash caminharam sozinhos, e Meltar e Zargo partiram à residência Havertz.

   A lua iluminava o trajeto, e a morada da família misteriosa ficava em uma relativa distância do centro do Reino.

   A dupla caminhou a pé, o que retardou a pequena viagem. Quando se aproximaram, as curvas da arquitetura diferenciada da casa já apareciam entre um terreno bonito e inúmeras árvores e flores que se abriram as suas laterais.

   Um grande paredão cercava a residência que era deveras larga e só tinha um andar, mas era enorme, se esticando por um terraço de grande tamanho. Não era uma família comum.

   Havia um grande portão de madeira, arqueado e com uma maçaneta dourada ao centro, com detalhes rústicos, e o Rei bateu à porta, e dois homens vestindo roupas justas ao corpo e de cor cáqui abriram-na.

   De imediato, os rapazes prestaram reverência ao Rei, que agradeceu prontamente.

   — Gostaríamos de falar com o patriarca. Avise-o que o Rei está à sua espera.

   Em alguns segundos, um homem de aparência cansada apareceu. Vestia uma espécie de terno com agasalhos marrons e tinha olhos severos, de quem pouco temia ou respeitava o Rei. O cabelo, castanho e escorrido para trás - percebe-se que os cabelos enegrecidos de Mya foram herdados de sua falecida mãe.

   — Majestade. – reverenciou.

   O Rei sacou de suas vestes um envelope, o qual dizia que a filha do dito cujo deveria sair em missão na manhã seguinte. Arvid leu com paciência, e atrás os dois homens permaneceram, como se fossem seus seguranças.

   — Ela não está permitida a sair.

   — O senhor não pode negar isto ao Rei. – exclamou Zargo, que pouco havia sido notado.

   — Não me importo. Minha filha não sairá, muito menos para uma missão perigosa na qual terá uma semana para encontrar um suposto amigo do Reino.

   A resposta já era esperada pelo Rei, que insistiu por mais algum tempo, mas Arvid era seguro de si, e permaneceu imóvel negando a missão perante o Rei e ao Ministro Zargo, e este ficou extremamente irritado.

   — Por que não a deixa ir, senhor Havertz? – soou uma voz atrás do Rei e de Zargo, que se viraram e abriram espaço. Era um homem com uma capa verde-musgo e o símbolo dos Elfos talhado ao peito. Tinha olhos serenos e um cabelo sedoso, mas não a pele clara da raça e as orelhas pontiagudas. Não era um Elfo.

   — Dumas. – introduziu o patriarca Havertz. — O que faz aqui a essa hora, dispensei-o ao fim da tarde.

   — Vi a presença do Rei e do Ministro das Forças Armadas. Soube que algo aconteceria, mas não mude de assunto. Por que não deixa sua filha participar desta missão, meu bom senhor? – disse olhando secamente para Arvid.

   — Você nos conhece há tempos. Não posso permitir que minha filha saía para uma viagem tão lunática quanto. Ela não tem experiência para tal. – bradou. — E veja só, sairá ao lado de um outro aluno. Um aluno! Achas mesmo que esses dois possuem capacidade para algo?

   — Senhor, sua filha é um talento bruto. E eu bem sei disto. – respondeu com olhar malicioso.

   — A resposta é não. – finalizou, e os dois homens atrás, trataram de fechar a porta, mas, num segundo antes, Dumas chamou o nome de Arvid novamente, e se ajoelhou perante ao mesmo.

   — Deixe-a participar, senhor. – pediu uma última vez.

   E de costas, Arvid respirou secamente, preparando-se para cravar um novo não a todos. Dumas olhou de relance para o Rei e manteve-se de joelho para Havertz, e prosseguiu.

   — Deixe-me acompanhá-los nessa missão. Cuidarei de ambos.

   Todos se assustaram, e o Rei estava ciente de que não poderia permitir aquilo, mas também estava ciente de que sem Dumas na missão, Arvid não permitiria sua filha, e Oliver sozinho seria incapaz de realizá-la.

   O Rei, então, pensou um pouco mais. E esperou pela resposta de Arvid, que pela primeira vez, deu o braço a torcer e se virou novamente.

   — Jura em nome de minha família que protegerá minha filha até mesmo com sua própria vida até seu último suspiro?

   — Sim, senhor. Eu, Dumas, o Aço-de-Esmeralda, Amigo-dos-Elfos e Servo de Havetz, juro com minha vida que serei espada e escudo de Mya Havertz até meu último dia de vida.

   Arvid colocou sua mão direita sobre o também ombro direito do homem.

   — Está dispensado.

   Meltar e Zargo sabiam que não era a melhor opção e desfecho, mas foi a única coisa que permitiu com que a missão fosse realizada entre ambos.

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