nós só precisamos acabar logo com isso

Não sei por que ligo tanto para redes sociais. Não sei por que ligo tanto para a opinião das pessoas. Acho que gosto de deixá-las pensar que têm certo controle sobre mim quando, na verdade, não têm. Não é como se eu não tivesse livre arbítrio. Também não estou esperando uma intervenção divina inesperada que irá resolver todos os meus problemas e dissipar todas as minhas confusões. Eu sei que não. Parece que eu gosto de pedir para ser amado e isso é um tanto cruel demais comigo mesmo. Não é verdade, mas às vezes soa que sim. É como se estivéssemos todos sob uma ponte caindo aos pedaços e, ao invés de arrumar um jeito de se livrar disso, estamos sapateando sobre as lascas de madeira aos tropeços para entreter os que estão em terra firme. É tudo sobre isso? Entretenimento ilimitado e barato? O ser humano é tão miserável assim?

Tenho estado off, porque estou cansado e nem falo fisicamente. Estou cansado de servir o mesmo prato a pessoas que fingem gostar, porque elas também querem ser aprovadas, também querem ser amadas. Então estamos apenas jogando sobre quem mais finge e quanto é o maior tempo que conseguimos.

Ontem assisti Happy Together de Wong Kar-Wai. Não terminei ainda, tive que tirar algo do forno e acabei ficando ocupado demais para terminar. Também não tenho muito o que comentar sobre ele, eu só citei por citar. O porquê de eu ter assistido? Bem, vi numa lista pública de um app que o Taeyong usa e ele fez uma atualização por lá. Ao invés de estar como “interessado”, estava “assistindo”. Eu pensei que, mesmo que estejamos separados — não terminamos, claro, mas não estamos nos encontrando com frequência —, podemos assistir a mesma coisa e conversar sobre isso depois. Mas eu não saberia o que comentar com ele, mesmo que tivesse terminado o filme. Eu não tenho muito o que falar. Ando meio pobre com as palavras, então perdoe minha indecisão e repetição.

A zombaria rola em qualquer canto e só hoje me xingaram umas trezentas vezes. Às vezes sinto falta de quando não conheciam o meu nome ou meu rosto, quando eu era apenas umas pálpebras inchadas e lábios sérios numa foto sem graça de uma revista de economia ou que fazem cobertura de eventos importantes. Eu odeio minha casa familiar, mas sinto falta de ficar andando sem rumo às duas da manhã, de tentar nadar durante o dia, desenhar tigres no meu caderno da escola e comer doce escondido. Não sinto falta da infância, sinto falta de quando as memórias não pareciam ser salvação.

E agora tem todas essas pessoas que eu nem conheço curtindo fotos que tirei porque vivo com tédio e me acho bonito demais para só contemplar pelo espelho. Acho que eu não saberia lidar com nada se não pudessem me elogiar pelo menos umas cinco vezes ao mês. Eu tenho ficado dependente de um veneno angustiante cujo efeito colateral é a solidão. Então, tudo bem, eu ando meio sumido, mas às vezes apareço, e também nem acho que deveriam focar muito nisso. Tenho recebido comentários de pessoas perguntando se ainda estou com o Taeyong e isso é tão estranho. Cê sabe, né? Tudo é tão espetaculoso que se as pessoas não sabem, não existiu. Decerto que o tamanho êxtase passou — não em sua totalidade, eu ainda sou o mesmo Ten apaixonado de antes —, mas ainda estou aqui e isso que importa. Não sei por que acham que eu devo contar cada passo que fizer com ele, como se estivéssemos devendo alguma satisfação.

Eu odeio obrigações. Odeio ter de fazer algo. Odeio ser obrigado a agradar e a dar satisfações. Odeio qualquer compromisso com qualquer coisa. Eu odeio. Odeio.

Mas no meio do meu ódio, a campainha toca e eu me levanto para atender. Não são mais que 20h05 e eu não sei quem pode ser. Só visto uma bermuda verde e boné preto na cabeça virado para trás — eu estava tirando fotos para postar, e está aí o porquê de citar redes sociais. Provavelmente estou cheirando a um mix da minha loção pós-barba e o hidratante corporal que tenho usado recentemente. Acho que estou agradável, mas nem um pouco apresentável para abrir a porta. No entanto, não preocupo-me com isso. Num horário desse, no máximo a pessoa é minha amiga.

Está tocando Time To Cry de Paul Anka e logo quando ele praticamente chora um “quando alguém te deixa, é a hora de chorar”, eu vou caminhando para a porta. “Quando você sabe que ela te deixou, você saberá que ela te deixou, então você pode chorar”, no finalzinho da música e eu estou prestes a verificar na câmera quem vem lá. Começa a tocar “Donna” de Ritchie Valens quando sorrio ao ver o meu namorado parado em frente a porta. Então eu apenas abro.

— Taeyong! — sorrio de orelha a orelha, meu coração bate acelerado e essa agitação me faz sentir como um idiota. Sempre fico mexido quando nos reencontramos após um tempo. — Docinho, quanto tempo!

— É, ficamos ocupados — ele abre um sorriso a meia boca e faz um gesto com a cabeça que mais parece um pedido para entrar.

Afasto-me e até mesmo seguro-o pelo braço para garantir sua entrada. Enquanto ele tira o tênis, fecho a porta e depois observo-o por uns tempos. Deslizo a palma da mão nas suas costas quando ele se curva para desamarrar e ainda acaricio seu cabelo quando ergue-se repentinamente. Ele não sorri nem nada, apenas olha para o meu rosto. Depois, lentamente, desce o olhar para o meu corpo, como se estivesse percebendo agora as minhas roupas (ou ausência delas) e quisesse checar por si só cada detalhe. Encaro seu rosto, porque ele é lindo e, confesso, não é só sobre beleza. É sobre segurança. Sobre como eu me sinto seguro com ele aqui comigo.

— Yah, sabia que vou tirar meu gesso em breve? — ainda mantenho meu sorriso. Seguro sua mão com a minha esquerda e estrelaçamos nossos dedos. Sua pele quente contra a minha me aquece. — Daqui a dois dias.

— Fico feliz por você — ele tenta sorrir, eu sei, mas sai algo meio desbotado e forçado.

Talvez realmente tenha algo de errado com Lee Taeyong.

— Oh, por que chegou tão cedo? — aperto mais minha mão na sua e pisco os olhos encantadoramente. Devo estar um caco, porque meus fios estão desleixados e nem roupa direito estou usando.

— Não tenho aula hoje — ele desvia o olhar rapidamente e engole em seco

“Esqueça ele e, por favor, venha para casa comigo”, é o que Bob Rydell canta em Forget Him, no background da nossa conversa.

— Isso é algo bom? — projeto meu corpo para frente, porque quero estar perto quando for abraçá-lo. — Pelo menos te tenho por mais tempo. É um pouco chato, porque eu acabei não preparando nada para agora, então não tem muita coisa pra comer. Você quer comer?

— Não — sua sinceridade me faz sorrir. É óbvio que ele iria dizer isso. — É que eu realmente não estou com fome.

— Devo confiar nisso?

Ele dá de ombros.

— Você que sabe.

No meio do sorriso, seu olhar corre rapidamente pela sala e isso me faz lembrar que nem o levei ao sofá. Como ainda estou com os dedos entrelaçados aos seus, puxo-o comigo para que possamos sentar juntos no sofá.

Sentamos lado a lado. Só que, estranhamente, ele desliza a mão para longe da minha e põe na própria coxa. Não é como se ele precisasse usar a mão, ele só não quer ficar de mãos dadas comigo e eu percebo isso. Percebo certa tensão nos seus músculos e o rosto não parece estar genuinamente alegre como de costume, naquele olhar brilhante onde se podia vislumbrar a ursa menor. Ele está mais opaco, mais sério ou nervoso. Parece que uma coisa ruim vai acontecer e meu estômago vazio se revira diante dessa sensação.

— Tem acontecido alguma coisa com você? — giro o corpo para ficar de frente para ele. Estico o braço engessado e delicadamente afago seu queixo com as pontas dos dedos. — Hm?

— Não. Você?

Abano a cabeça.

— Nada fora do normal. Ah, você viu a propaganda do programa na televisão? — lentamente deslizo a mão para o seu pescoço. Tae concorda com um movimento da cabeça. — Eu estava bonito, né?

— Uhum — abre um sorriso fraquinho.

Ficamos uns instantes em silêncio, apenas olhando um para o outro. Eu sei que tem caroço nesse angu, só que não sei como abordar e deixar ele confortável para falar.

— Tem certeza sobre estar tudo bem? — aproximo-me mais dele. — Estou aqui para qualquer coisa, você sabe. Se quiser conversar... Se estiver precisando de alguma coisa... É de dinheiro? Eu posso te dar. Ou te emprestar, se for melhor.

— Não, não... — abana as mãos no ar, inquieto. Então afasta-se de mim e tira a jaqueta. — Nós só precisamos acabar logo com isso. Vamos logo.

— Quê? Com o quê? — inclino o corpo para trás com o intuito de olhá-lo mais atentamente. Ainda está tirando a jaqueta pelos braços e parece ligeiramente apressado.

— Com o sexo — ele se levanta para aparentemente abrir o cinto. — Vamos logo.

Esse foi, literalmente, o cúmulo.

— Mas que porra...? — me levanto do sofá também. — Se você não quiser... você não precisa fazer, tá? É chato pra você conversar antes de transar? Ou você realmente não quer nada comigo hoje? Eu não vou ficar ofendido nem nada, só não quero te usar ou te violar de alguma forma.

Ele fica sério me olhando, com a mão parada no cós da calça.

— Olha, é que... só é isso mesmo. Minha cabeça tá cheia com umas coisas e... ahn... eu achei que íamos direto para isso e...

Mentira.

— Mentira — interrompo-o. — Você está mentindo.

— Eu não sou o único — e então me encara com a expressão dura demais, daquele tipo que quase nunca vi e me deixa bem desconfortável. — Mas, quer saber? Foi um erro eu ter vindo, porque eu definitivamente não estou pronto para conversar com você.

— Tem alguma coisa que eu perdi? Porque eu não faço a mínima ideia do que está falando.

— Não mesmo? Jura? — ele cruza os braços e seu tom não está nada agradável.

Fico perplexo, olhando para seu rosto e tentando entender que porra está acontecendo. Já conversamos sobre as nossas diferenças no relacionamento, então por que ele está bravo agora? O assunto já está batido.

— Eu vou indo — ele se vira e pega a jaqueta do sofá.

— Ué... Não? — adianto os passos para alcança-lo antes que se movimente até porta. — Por que está indo depois da bomba? Me diz o que está acontecendo.

— Eu não tô confortável para falar agora.

— Pois eu estou super confortável para escutar.

— Não é sobre isso.

— É, sim. Você vem e de repente fica agindo dessa maneira e espera que eu sente e trate como "normal"?

— Não sou eu quem está agindo estranho.

— O que tem de estranho em mim?

— Talvez a falta de indícios de arrependimento.

— Do que eu deveria me arrepender? — aponto para o meu próprio peito e assumo que estou completamente confuso com essa situação. Tipo... Eu tô puto e confuso.

— Nada, não, Ten. Se não brota de você, eu não vou forçar. Outro dia a gente conversa, tá? Tô de cabeça cheia e vou acabar falando muita merda que não terá volta. Enfim, boa noite. Te vejo um dia desses aí — ele se afasta de mim. Eu estou tanto perplexo com a postura dele que nem me dou conta de impedi-lo de sair.

Porra. Que porra aconteceu aqui agora?

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