nós quase desmaiamos também
Eu encaro a parede branca e sinto que a odeio. Ninguém poderia dizer o contrário, pois sou eu aqui sentado, olhando para ela e pensando em como eu queria estar em qualquer lugar que não fosse aqui. Sabe, por vezes tentei evitar, mas meu problema é sempre pensar que sou invencível. É verdade, faço isso para evitar o desespero, não quero pensar que sou um ser mortal, frágil e estúpido. Eu iria surtar. Mas talvez surtar seja melhor do que isso.
— Pronto, você está liberado — o doutor me diz.
Pego minhas receitas, minhas caixas de remédios e o casaco que Doyoung me emprestou. Tudo isso fica no meu braço esquerdo. E então eu me curvo, agradeço e saio da sala. Eu odeio esse lugar.
— Ten! — Doyoung aparece caminhando mega rápido quando me vê saindo do corredor. — Cacete!
— Pois é... — tento sorrir, mas sai algo débil demais.
Meu amigo me abraça, e logo vem Yuta, Renjun e Jaemin também. Eu me permito ser abraçado, embora eu não goste de contatos físicos com muita frequência. Acho que a única pessoa que eu me acostumei foi o Taeyong. Inclusive, cadê o Taeyong?
— Gente, cadê Taeyong? — questiono.
— Ele está se arrumando para sair — Yuta conta.
Os quatro se separam, quebrando o abraço. Isso me deixa um pouco aliviado — tanto o abraço quanto Taeyong estar bem. Eu nunca sei o que se passa com ele e muitas vezes tenho medo de ferrar com tudo.
Bem, basicamente fiz merda. Pra variar, certo? Minha ideia de pular dos degraus para chegar mais rápido poderia até dar certo... se eu não estivesse todo molhado por conta da piscina. Acontece que no último lance de escadas eu simplesmente desabei. Não foi só um escorregão e desci o resto ralando a bunda no chão. Quem me dera se fosse isso, na verdade. Mas não. Foi algo totalmente e inteiramente pior. Acho que a estupidez toda foi a água, porque meu calção de banho estava pingando e meus pés estavam molhados. Molhou a escada. Diminuiu o atrito. Eu não sei exatamente como aconteceu, porque foi muito rápido. Num segundo eu estava me impulsionando para pular, no outro meus pés deslizavam pelos degraus e meu corpo começou a cair para trás. Meu instinto foi tentar me segurar, só que não consegui, e só a tentativa me fez pôr o braço direito onde não deveria estar. Porque quando eu caí com força entre os degraus, eu fiz a proeza de cair na verdade no meu próprio braço, que recebeu a pancada do peso do meu corpo junto com a gravidade e, de quebra, a quina do degrau (o lugar mais mortal para se cair). E, sim, eu saí rolando depois. Sim, eu machuquei outras partes do corpo. E, sim, eu me arrependo profundamente disso.
Eu caí estatelado no último degrau e nem tinha percebido nada de errado com o meu corpo. Até Taeyong descer as escadas assustado, após ouvir meus gritos, e ter desmaiado pouco tempo após me ver. Ele literalmente caiu no meio da escada, quando estava segurando o corrimão, e eu não sabia se teria de me socorrer ou socorrer ele. Foi aí que a dor começou a ficar latejante no braço ao ponto de me fazer chorar, percebi que tinha algo de errado e que eu estava ferrado. Os meninos desceram em seguida. Uma parte deles ajudou Taeyong, que estava apagado no meio dos degraus, enquanto a outra parte veio me ajudar. Eu não me lembro muito de como as coisas aconteceram, porque a dor era tanta que me fazia tirar o foco de tudo, exatamente tudo. Eu acho que Taeyong desmaiou ao ver o estado do meu punho.
— Vai ficar quanto tempo com o gesso, hyung? — Renjun quer saber.
— Ele disse que pode ser de seis a oito semanas — solto um suspiro após responder.
De longe, vejo o médico vindo na minha direção. Calado, eu espero sua chegada.
— Ah, quase esqueci de dizer... — me conta. — Eu ia escrever, mas esqueci. Você vai ter que ficar algumas semanas sem cozinhar.
— M-mas...
— É mais indicado não fazer nada. Até mesmo relaxe, porque você já está ficando com vários hematomas no corpo, além de um pequeno corte no joelho. Você precisa se recuperar primeiro — ele ajeita a tira de tipóia que estou usando para o gesso. — Entendido?
Balanço a cabeça positivamente. Ele sorri, ambos nos curvamos e depois ele sai andando.
— Que merda — Jaemin comenta. — Sinto muito, Ten. Está doendo?
— Eu tô dopado de remédio — sou honesto.
— Ah, por isso sua vozinha tá super calma. Tá chapadão — Yuta ri baixinho. — Mas vai ficar tudo bem, Ten.
— Enquanto eu usar remédio, sim.
— Uh, lá vem Taeyong! — Dodo aponta para algo atrás de mim e eu me viro para ver.
Tae está caminhando para fora do corredor, mas é só me ver que ele acelera os passos. Sua camisa está invertida, e eu me surpreenderia se não estivesse. Abraça-me todo preocupado ao chegar perto de mim, olhando meu braço de gesso, olhando meu rosto, meu corpo... tudo. Ele parece muito preocupado. Isso eu também devo dizer, porque tem uma espécie de inchaço perto da sua têmpora e eu gostaria de saber sobre isso.
— Isso foi quando eu caí — me diz. — Eu não aguentei ver seu braço todo estranho daquele jeito, acabei desmaiando e meti a cara em algum lugar da escada. Quando acordei, isso já tava na minha cara. Tipo um mini galo, porque não está tão grande como daquela outra vez.
— Deve ter sido por conta da localização dele — Renjun afasta a franja de Tae para ver melhor. — Não está tão ruim. Hyung, você está bem?
— Uhum. Tô sim. Demorei porque pedi para me darem um lanchinho, eu não sei como fiquei com fome — abre um pequeno sorriso, mas sai meio triste. — Uh, e você Ten? — volta a me olhar cheio de preocupação. — O que foi que quebrou?
— O rádio.
— Não, meu rádio ainda tá intacto... — Yuta se intromete. — Deve estar tocando agora mesmo, inclusive. Ele tá com uns probleminhas, mas eu conheço um boy que manja dessas coisas e vai dar uma ajeitadinha.
— Eu estou falando do osso — nem me preocupo se estou soando arrogante ou não.
— Ten, você tá bem? — Taeyong arqueia o cenho com preocupação.
— Ele tá chapado de remédio — Yuta faz o favor de contar.
— Isso explica muita coisa. Ele está falando parecendo que está nas nuvens. Nunca ouvi ele usar esse tom com Yuta — Lee percebe, então sorri enquanto segura minha cintura. — Meu anjo, você tá bem mesmo?
— Sim, o doutor realinhou as coisas aqui e colocou o gesso. Vou ficar algumas semanas com ele. Ele também disse que não posso cozinhar, mas o que é que o doutor sabe, né? Medicina não tem nada a ver com gastronomia, e de gastronomia eu entendo. É bom ele cuidar de sangue e osso, essas coisas, e eu cuido de tomate e fogão. Vou cozinhar, sim.
Todo mundo fica em silêncio, olhando para a minha cara.
— Eu honestamente não sei se ele está falando sério ou brincando — Dodo finalmente diz algo e todo mundo ri. — Esse tom de voz não tem filtro! É difícil perceber sarcasmo com ele!
— Calem a boca, eu estou falando normal — reviro os olhos com irritação. — Yuta, vai lá pagar a conta do hospital. — tiro o papel e o cartão da bolsa que Dodo está segurando. Entrego tudo a Yuta, depois guardo minhas receitas de remédios para dor e também amostras grátis que recebi também.
— Eu vou pagar a minha também — Taeyong se vira para ir.
— Não, eu pago. Dê o papel a Yuta e ele paga tudo junto.
— Não precisa.
— Hospitais são muito caros. Além do mais, eu que te fiz estar aqui, então a culpa é minha. Pelo menos me deixe fazer isso.
Taeyong enfim cede e deixa que eu pague. Como estou cansado e aqui ao lado tem uma cadeira de rodas dando sopa, eu me sento nela na vã esperança de alguém me empurrar. A questão é que eu estou com o corpo estranho, pesado, ando meio sem saber como andar. Deve ser porque eu deveria estar sentindo muita dor, mas o remédio forte que o médico me deu, porque eu não parava de chorar de dor, é o que está me sustentando agora. Sinto que quero me casar com essa droga desgraçada.
— Quando vimos você lá e o Taeyong desmaiado no chão — Renjun começa a contar, parando na minha frente. — Nós quase desmaiamos também. Sei lá, foi estranho. Eu também nunca antes tinha te visto com o rosto tão vermelho.
— Ainda está vermelho? — pareço até desesperado por ligar para a minha aparência.
— Não, você está bem pálido agora. Parece que tá doente — Jaemin explica.
Solto um suspiro e esfrego a palma da mão esquerda no rosto. Acho que meu corpo está exausto, mas ao mesmo tempo me sinto alerta e acordado. Estou num meio termo em que é difícil saber se quero subir uma montanha ou dormir por cem anos. Ainda não me desceu o fato de que vou ter que ficar sem cozinhar. Eu não posso ficar sem cozinhar.
— Senhor, pode levantar, por favor? — uma enfermeira aparece para me tirar a paz.
— Oh, desculpe — levanto-me da cadeira de rodas e vejo a moça levá-la para longe. Que inferno.
— Vamos, é melhor irmos ao carro — Doyoung segura-me levemente pelo ombro esquerdo e começa a me guiar para a saída.
— Viemos de carro?
— Você não se lembra.
— Ele estava chorando de dor — Renjun me conta. — E Taeyong só acordou quando estávamos chegando no hospital. Pensei que ele estava morto.
— Real! Aliás, Taeyong, você tem que se alimentar melhor — Dodo comenta.
Saímos para a parte externa do hospital e caminhamos juntos para o estacionamento. No meio do caminho, Yuta nos alcança correndo..
— Eu tô comendo bem — Tae se defende.
— Nem todo dia — a denúncia de Renjun me deixa chateado, porque eu jurava que Tae estava comendo certinho.
— Taeyong, eu não posso ficar ao seu lado te obrigando a comer toda hora — viro-me para ele. — Você precisa se cuidar e parar de fumar.
— Eu estou bem. Só foi um desmaio de leves, nada de mais — ele dá de ombros, como se não soubesse o quanto isso me irrita.
Chegamos perto do carro de Doyoung. Eu nem sabia que tínhamos vindo com o dele. Não sei porque eu não lembro de algumas coisas, mas acho que foi tudo muito rápido e eu não estava lá nas minhas melhores condições. Eles me deixam entrar primeiro e põe o cinto de segurança em mim. Tae senta ao meu lado, me dá um beijo na bochecha e sussurra para mais ninguém ouvir:
— Eu quero estar com você na saúde e na doença, Chittaphon.
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