nós não podemos ser responsáveis por isso
« só porque pediram kkk »
Pelo amor de deus, o maluco do Schopenhauer não escreveu isso em "As dores do mundo" não. Se assim fê-lo, não prestei tanta atenção ao ponto de destacar. Ele não falou sobre a dor latente na cabeça que é acordar com ressaca e, mais ainda, perceber que está deitado no chão da sua própria sala. Porque é isso mesmo, eu estou exatamente assim. Ergo os olhos para os meninos que estão comigo e percebo que estão mais acabados que eu. Que porra fizemos ontem mesmo?
— Cê tá bem? — Dodo me pergunta num tom um tanto preocupado.
— Por que eu não estaria?
— Você... tava meio mal de madrugada — Yuta me olha. Seus fios estão espetados para todos os lados possíveis, o que é engraçado, já que Naka tem costume de andar todo arrumadinho.
— Tava?
Dodo concorda com a cabeça, mas depois olha de soslaio para Yuta e eu fico me questionando o que isso pode significar. Acho que não é algo bom.
Ponho a mão na testa, como se isso pudesse arrancar o incômodo de mim. Besteira. Eu deveria ter bebido menos.
— Vamos tomar uma sopinha para ressaca? — questiono no automático, mesmo sabendo que a resposta é sim.
Ambos concordam. Então me ajudam a levantar. Vou ao quarto, troco de roupa e lavo o rosto no banheiro, após escovar os dentes. Quando pego meu celular para checar, tem uma mensagem de Ten.
açúcar papai: duas e meia da manhã, taeyong? kkkkkk o auge
açúcar papai: outro dia você vem então, eu tava dormindo de qualquer jeito
açúcar papai: mas me avisa com antecedência.
Fico sem entender... até rolar o chat e perceber as minhas mensagens anteriores. Quase perco o chão ao perceber que aquele suposto resquício de sonho ou delírio foi tão real quanto o sangue que brota do meu corpo quando me ralo. Respiro fundo. Meu coração bate mais acelerado. Leio que estive indo para sua casa. Num espaço temporal de trinta minutos após meu anúncio de estar chegando, eu mandei o seguinte:
você: deixa pra lá, tá muito tarde mesmo
você: tu deve tá dormindo
você: durma bem
E eu não lembro exatamente disso, só sei que é um tanto familiar. Apareço com meu celular para os meninos e tento deixar claro que estou começando a recobrar a memória e... Sim, calma... Olho para Yuta vestindo a camisa preta e depois olho o Dodo sentado no sofá, ajeitando só fios do cabelo.
— Gente... — engulo em seco. — Eu estou me lembrando de ontem, eu... — ponho a mão na têmpora, mas isso não adianta muita coisa. Na verdade, não muda em nada. — Eu fui à casa do Ten ontem?
— Está explicado porque você não surtou ao acordar... você não lembra — essa fala de Yuta me parece preocupante, mas foco apenas no turbilhão de momentos de ontem para ver se consigo lembrar.
— Não, eu tô lembrando... — afasto a franja da testa, e nesse momento consigo me lembrar de tudo. Tudo mesmo. A cabeça dói, mas de repente tudo vai surgindo e fico confuso sobre ser um mero delírio ou realmente foi real. — Eu lembro agora... Eu fui à casa de Ten.
— Uhum — Dodo concorda com a cabeça. — E então você chegou aqui todo trôpego dizendo que o Ten estava dormindo com outro. Daí você foi dormir triste.
Saio do chat do Ten no meu celular e fico confuso sobre o que fazer agora. Eu não sei, eu me sinto... completamente confuso. Não foi um delírio? Não foi um sonho?
— Você disse que não sabia quem era — Yuta volta a falar, então cruza os braços. Eu fico encarando-o, tentando identificar quem era de fato o cara.
Eu lembro do rosto dele, mas não sei se o conheço. Estava dormindo, assim como Ten, e seus lábios eram cheinhos. Tinha o cabelo preto, curto (não tanto) e só. Nada de importante. A não ser, claro, que pelo porte físico mais musculoso. Quer dizer, ele não era uma bomba em pessoa, mas não era uma pessoa com 0 músculos ou com uns pequenos e quase nada. Pelo menos em questão de corpo ele parecia ser maior que o Ten, o que quero dizer. Até mais que eu.
— Como ele era? — Dodo mostra-se eufórico, chega arregala os olhos de curiosidade.
— Sei lá... — meus dedos deslizam pela tela do celular. Acho o Instagram e pressiono levemente seu ícone. Os meninos correm para ficar ao meu lado, para que possam ver também. — Deve ter alguma foto deles, né?
— Eu não acho que o Ten faria isso.
— Isso o quê? — pergunto ao Nakamoto.
— Te trair — por fim, ele fala. Eu sei que isso surgiu na minha cabeça há um tempo, mas eu não quis admitir. Minha mente esteve fugindo dessa palavra desde ontem, eu sei.
Meu dedo para no meio aplicativo e eu fico sem saber o que fazer ou pensar. Lambisco o lábio inferior. Doyoung rouba o celular da minha mão resmungando que não sei nem pesquisar. Eu só fico olhando a parede e pensando sobre a possibilidade de Ten ter transado com aquele cara ontem à noite e dormido agarrado a ele, assim como faz comigo.
— Eu vou beber água — passo direto pelos meninos e vou à cozinha.
Encho o copo até a boca. Não bebo nem metade. Sento-me à mesa. Esfrego a ponta do indicador no tampo. Os meninos vêm chegando devagar, discutindo entre si. Eu apenas mordo meu lábio e encaro a minha garrafa térmica de chá que provavelmente está vazia agora.
— É esse? — Doyoung vira o celular para mim
Na foto, tem um rapaz sorrindo ao lado de Ten. Eles estão no provável estúdio do programa de culinária. Eu abano a cabeça, porque ele parece mais novinho do que o rapaz de ontem. Ou hoje. Tanto faz.
Dodo e MotoMoto voltam a procurar o tal rapaz. Eu penso em procurar alguma coisa para comer, mas não estou com vontade de comer. Eu nunca tenho vontade de comer e fico tentando ao máximo ter. Mas acho que não tenho mais. Acho que não sou mais nada. Respiro fundo, não saio do lugar, fico olhando a plantinha perto da porta.
— Esse? — ele me mostra o telefone de novo.
É o Taemin. Eles estão se abraçando de lado, no meio da rua, cada um segurando um churros, vestindo casacos grossos. Taemin está abertamente sorrindo para Ten, que por sua vez está sorrindo para ele também, só que sem mostrar os dentes. Quem visse de fora pensaria que eles são uma espécie de casal apaixonado ou sei lá. Mas eles não são.
— Não foi o Taemin, eu reconheceria — engulo em seco.
Ten sempre tem amigos que parecem não ser apenas amigos. Eu me pergunto se o modo com que vejo todos eles é o mesmo com que eles provavelmente me viam quando estive sendo apenas mais um dele. Ten é solto e livre, como uma folha de bordo no meio do outono. Ele é assim. Sai voando por aí, pousa em todo o tipo de coisa, mas nunca fica. Eu sou um banquinho caindo aos pedaços e de repente ele decidiu ficar. Será mesmo? Será que ele vai ficar mesmo?
Porque ele tem tantas amizades esquisitas que, literalmente, pode ser qualquer um. Só excluo o Jaehyun da lista porque eu reconheceria o rosto do desgraçado e, pelo que tudo indica, ele está mesmo com Doyoung.
— E esse? — ele me mostra outra foto.
É uma matéria jornalística postada ontem à noite bem tarde. Na foto, está Ten e o cara. Sim, ele mesmo, o cara que eu vi dormindo com Chitta. Pego o celular e tento ler o que está escrito. “Ten e o ator iniciante Lucas estavam juntos no aniversário da emissora”. Kim e Nakamoto se esbarram em seus próprios ombros, brigando por espaço para lerem também. Eu vou rolando a página... Vou lendo aos poucos...
— Então eles foram juntos para a festa da emissora — Yuta comenta quando terminamos o texto. Não foi tão grande. E o título é bem sensacionalista.
Veja bem: a mídia acha que, se o homem é gay, logo qualquer cara com que ele sair é um provável namorado ou ficante. E o que está escrito só corrobora: “Término in the area?” A linha fina: “Internautas afirmam que Ten terminou com T. ao vê-lo acompanhado com Lucas num evento hoje à noite”. No meio do texto ainda tem alguns tweets sendo citados, um dos tais diz: “ok, já faz algum tempo que o ten não posta nada com o taeyong, talvez eles tenham apenas terminado. eram tão grudados antes e agora nunca são vistos juntos. com certeza terminaram e ten está com lucas”.
— Lucas! — Doyoung praticamente grita. — Vocês não lembram do Lucas?
— Calma. Eu não lembro nem o que comi hoje — Yuta solta um risinho.
— Você não comeu nada — respondo meio ríspido. Ele fica sério. Arrependo-me do tom no mesmo instante.
— Lucas, gente!
— Dodo, repetir não adianta porra nenhuma — Naka revira os olhos.
— Desculpa se isso te machucar, Tae. Mas, explicando melhor, o Lucas é um contatinho do Ten há trezentos anos. Se lembram quando estávamos prestes a ir para a Grécia, e rolou uma polêmica que o Ten estava namorando o Lucas, porque eles foram pegos aos beijos na saída de um desfile de moda ou algo do tipo? — sua fala deixa-me extremamente preocupado.
Acho que minha expressão facial mudou drasticamente, porque Yuta me abraça de lado e repreende o Doyoung por me contar isso.
— Não estou dizendo que eles fizeram coisas agora. Só estou explicando o porquê da mídia estar falando isso — Kim ergue as mãos, como se estivesse se rendendo.
— Eles não fizeram nada, então relaxa — Yuta fala isso bem próximo de mim. — Tá bom?
— O Ten disse para mim que eu não poderia ir com ele, porque não podia levar acompanhante, que esse foi o porquê de ele não me levar. Por que o Lucas foi com ele? — olho de Yuta ao Doyoung.
— Ele deve trabalhar lá, não? Pode ter sido convidado também.
Doyoung pega o celular de volta e fez umas pesquisas.
— Não. Ele não fez nenhum trabalho nessa emissora — é o que descobre. — E não tem nenhuma notícia recente dizendo que ele irá estrelar algum drama nela ou algo do tipo.
— Sinceramente, Dodo, você tá fodendo o momento — Yuta dá um tapa na nuca dele. — Vê se fica calado.
— Eu não quero mentir para o Tae. Há duas possibilidades: rolou algo ou não rolou. Não podemos bater o martelo.
— Você é um especialista — Nakamoto me solta quando me movo, incomodado, querendo sair ao máximo do contato. — Você já traiu, então deveria falar sobre o assunto.
Eu olho para o Doyoung, que dá língua ao Nakamoto.
— Não tem como descobrir assim. Eles estavam abraçados? — e então se vira para mim.
— O braço de Lucas estava embaixo da cabeça do Ten. Ele estava praticamente abraçando o Ten também, mas o Ten estava com o corpo projetado para o outro lado. Se ele estivesse alguns centímetros para trás, seria uma espécie de conchinha.
— O Ten não estava abraçando ele?
— Não. Como eu disse, estava mais para o Lucas abraçar ele do que o contrário.
— Para com essas perguntas diretas, Dodo — outra vez, Yuta dá um tapa na nuca do Kim.
Dessa vez, Doyoung não deixa passar. Dá uma cotovelada no abdômen de Yuta, que se afasta fingindo sentir uma dor agonizante.
— É provável que não tenha acontecido nada — por fim, Doyoung diz isso. — Ou pode ter acontecido. É bem difícil saber, sério. O Ten é muito desprendido das pessoas. Acho que ele dormiria numa cama separada mesmo se um dia se casasse.
— Nessa eu concordo cem por cento — balanço a cabeça, porque ele sempre reclama quando dormimos juntos. — Mesmo assim, ainda estou confuso.
— Se ele tiver feito algo — Doyoung volta a falar. — Ele pode se arrepender e o sentimento de culpa vai perpetuar. Isso aconteceu comigo. Me senti extremamente culpado e quis agradar a Minyoung ao máximo. Se ele fizer isso, aí tem.
— Doyoung, é sério, você tá ferrando o garoto! — Yuta tenta bater no Kim de novo, mas ele segura seu pulso dá uma apertada. Depois disso, solta. — Nós não podemos ser responsáveis por isso.
— Eu não sou um garoto. Eu sou um homem. Eu já cresci, ok? Eu sei o que está errado e o que pode ter acontecido. Eu quero que não tenha acontecido nada. Mas, no fundo, algo em mim diz que isso é apenas balela de autocuidado. Eu posso encarar isso, sabia? Eu posso encarar qualquer coisa.
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