nós não fizemos nada
Resolver o problema da coifa foi mais fácil do que pensei. Não levou mais que uma hora e meia, o que me trouxe certo alívio, embora tenhamos começado a preparar as coisas um pouco tarde. O único problema mesmo é lá no escritório, que ainda está do jeito que deixei ontem, porque não tive oportunidade de limpar e organizar. Eu só termino de mandar Yangyang preparar o mise en place e saio da cozinha.
Jaehyun bota os olhos em mim e me acompanha durante minha jornada para o andar superior. Eu pergunto o porquê de estar me seguindo, mas ele não me responde e só fica sério. Assim que entramos no escritório, Jung fecha a porta e depois se vira para mim.
— Você é burro, Chittaphon? — ele parece estar meio irritado. — Eu nunca conheci alguém tão burro...
— Eita, vai me detonar agora, é? — eu reclamo.
Caminho até me aproximar da mesa praticamente vazia, depois me agacho para pegar o teclado do computador e coloco em cima da mesa de novo. Faço o mesmo com o mouse, inclusive depois eu checo se está tudo bem com ele ou não. Ontem as coisas saíram do controle de um modo bom. Na verdade, embora a luz do dia esteja clareando o ambiente, consigo me lembrar do Tae em cima de mim e do corpo dele se movimentando com o meu e... Porra, eu não posso ficar pensando nisso durante o trabalho. Não posso.
— Eu sei o que vocês fizeram aqui — Jaehyun faz meu coração gelar de tensão.
— Vocês...? — fico de joelhos no chão e me inclino para juntar alguns documentos.
Ele nem está me ajudando, só está parado no meio da sala, praticamente surtando. Idiota.
— Você e Taeyong. A não ser que você esteja pegando outra pessoa também, é claro — ele responde.
Viro meu rosto na sua direção, fazendo a egípcia.
— Nós não fizemos nada — explico.
— Oh, claro que não... — Jaehyun ri ironicamente. — Nem parece que vocês transaram aqui ontem...
Meu chão é arrancado de mim e eu sinto até um frio percorrer pelo meu corpo. Eu não gosto de ser descoberto numa mentira, porque fico bem ansioso e agoniado. Mas eu vou negar... Vou negar... Vou negar...
— A gente não fez isso, relaxa — eu rio de nervoso.
— Vocês fizeram, sim — ele caminha até estar ao meu lado e cruza os braços. — Estive procurando por alguma pista de algo ter sido roubado, enquanto você estava lá com ele... Então, sim, eu descobri que vocês fizeram uma festinha aqui e depois foram para a sua casa ou para a casa dele, por isso que estavam juntos agora de manhã. Eu não te julgo por isso, só julgo sua burrice de não arrumar tudo e não fingir que nada aconteceu. Quando se faz isso num lugar não muito aconselhado, Chittaphon, a gente faz de tudo para que o ambiente fique do jeito que estavam antes.
— Jaehyun, eu vou ter que desenhar? — reviro os olhos.
— Uhum, porque... Bem, eu achei isso daqui... — ele tira do bolso um frasco e põe sobre a mesa. Quando checo do que se trata, sei que não tem escapatória.
Porra.
— Gel lubrificante de morango 100g — ele acrescenta.
Porra. Merda. Que burrice eu esquecer isso aqui. Que burrice. Que burrice. Que burrice.
— Caiu da minha bolsa, só — eu minto na lata.
— Eu não sabia que você gostava de morango — Jaehyun ri da situação e depois se encosta na pontinha da mesa. — A não ser que seja de Taeyong, o que também pode ser possível. Morango é mais a cara dele do que a sua. Você vivia dizendo pra mim que lubrificante de morango, cereja, uva, frutas vermelhas, tutti frutti... Como é mesmo aquela fruta? Ah, framboesa... Sim... Você disse que esses e parecidos são pura frescura e a coisa mais brega do universo... Ah, e que são sabores de gloss infantil, o que é meio sinistro.
Às vezes eu sinto raiva do Jaehyun por ele me conhecer demais. Também, como ele não conheceria? Somos literalmente uma pessoa só. Tudo que eu faço ou deixo de fazer ele sabe ou pelo menos tem ideia. Não adianta eu tentar enganá-lo, porque é como se estivesse enganando a mim mesmo. Gostaria tanto que ele não tivesse decorado as coisas que há muito falei para ele...
— Mas são — eu respondo, porque nisso eu não vou discordar. — Eu só uso esse por conta do Taeyong mesmo.
— Sabia! Isso não é sua cara.
— É que... Hm... O dele é de morango e presumi que ele gostasse, por isso comprei um igual. Para ele.
Jaehyun sorri sem mostrar os dentes e fica em silêncio olhando para mim por um tempo, como quem apenas tirando uma com a minha cara. Eu me sento no chão e fico olhando sério para ele.
— O que foi? — quero saber.
— Você tá mesmo de quatro pelo Taeyong, né?
Eu reviro os olhos com certa impaciência.
— De novo com esse papinho? Você disse o mesmo quando eu estava com ele antes de ir à Italia.
— E estou dizendo agora porque a história está se repetindo.
— Não está se repetindo.
— Ah, não? — ele arqueia as sobrancelhas. — Você nem sai mais comigo e nem conversa algo que não seja sobre o restaurante ou, de vez em quando, perguntando sobre Doyoung... Inclusive, eu não quero falar desse assunto, mas acho que é o único que você toca comigo. Tudo na sua vida parece estar se resumindo a ele... Não estou criticando nem nada do tipo, mas eu realmente estou notando esse seu foco nele. Apenas nele.
— Não é bem assim, Jae...
— É, sim. E antes que você fique rindo, estou com ciúmes, sim. Jurava que eu era sua alma gêmea.
Eu me levanto e me aproximo dele. Realmente, ultimamente eu não tenho conversado muito com ele, nem saído. Acho que aos poucos eu acabei deixando ele de lado, mas vou tentar me atentar a isso.
— Você ainda é minha alma gêmea — chego perto dele e toco em seu ombro.
— Você anda me deixando de lado... Doyoung anda me deixando de lado... Eu estou prestes a começar a andar com Yuta, porque eu sei que ele não vai dar no pé — ele faz um pequeno draminha e eu levemente rio. — Eu não gosto de sentir ciúmes, mas é algo que está acontecendo. Não quero que viremos apenas amigos que se falam em datas comemorativas.
— Eu entendo, vem cá — chego mais perto dele para lhe dar um abraço e ele acaba retribuindo ao me abraçar pela cintura. — Tá tudo bem, desculpa... Se quiser sair um dia desses depois do trabalho, vamos lá.
— É sua obrigação sair comigo depois do trabalho, eu não tenho que pedir.
— Você não pediu. Eu que sugeri.
— Pois não é sugestão.
Me afasto revirando os olhos e depois encaro Jae.
— Você tá mesmo com ciúmes?
— Antes era eu e você sempre... De repente surgiu Taeyong e tudo em relação a você acaba sendo algo dele também. Eu gosto que você tenha a sua vida, mas às vezes eu acho que não ocupo mais a mesma posição de antes.
— Você ainda ocupa, besta.
— Eu não vejo isso.
— Mas ocupa...
— Tá, então seja honesto comigo. Você nem me conta mais coisas da sua vida. Antes você vivia me enchendo de detalhes, mas agora não dá um piu — Jae ainda está com as mãos ao redor da minha cintura.
— Ahn... Eu... — fico pensando no que falar. — Eu tenho passado bastante tempo com Taeyong...
— Não me diga... — ele revira os olhos.
— É que eu e Taeyong estamos namorando. De verdade.
Isso faz Jaehyun soltar minha cintura e consertar a postura. Fica sério, mas ao mesmo tempo gruda as sobrancelhas numa confusão eterna. Sei que ele está estranhando tudo isso, ainda mais porque olha-me atentamente para ver se vou rir ou demonstrar que é algum tipo de brincadeira. Mas não é brincadeira, por isso que ele continua mais confuso ainda. Pisca algumas vezes, desvia o olhar, mas depois me encara de novo como quem querendo explicações.
— Você...? Você está realmente namorando Taeyong e não só pegando? — ele parece chocado. Sabia que sua reação seria assim.
— Realmente estamos namorando — eu digo. — Hoje vamos sair, depois vamos para a minha casa. Eu pedi ele em namoro na casa do meu avô, então... Bem... A maioria dos meus familiares já sabem dele.
— E como sua mãe reagiu? — ele cruza os braços na barriga e fica me olhando cheio de expectativas.
— Primeiro ela achou que era mentira, mas depois de bastante tempo acabou acreditando — respondo. — Ela achou Tae meio pombo e meu medo é que ela ache que ele não é bom o suficiente para mim e fique cismando. Ela tem expectativas muito altas sobre minha vida e meus relacionamentos.
— Mas o Taeyong realmente é pombo, amigo — quando Jaehyun fala isso, me dá vontade de jogar ele da escada.
— Ele não é — acaba saindo mais ríspido do que pensava, o que faz meu amigo rir.
— Calma... — balança um pouco a cabeça. — Só que... Ele é, você sabe. O que salva ele é a beleza.
Eu estreito as pálpebra, suspeitando algo nele.
— Não vai dizer que quer pegar meu homem, vai?
— Depende — Jaehyun dá de ombros. — Se você for me bater, a resposta é não.
— Credo, Jaehyun, você é talarico! — dou um tapa no seu braço. O desgraçado tá indo demais à academia, porque tá bem durinho.
— Eu não vou ir atrás do Taeyong, até porque ele não é meu tipo e também é seu homem — revira os olhos. — Mas eu sempre olhei ele, mesmo que tenhamos essa inimizade. O Taeyong é aquela pessoa adorável que todo mundo gosta, acha bonita e quer levar pra cama, mas sabe que não pode. Tipo... O legal dele é o sentimento de que você não vai conseguir ganhar ele, porque ele exala uma vibe de cu doce. Não só isso, mas também tem esse jeitinho dele de... Sei lá... Às vezes você olha pra ele e quer pegar ele, mas sente que ele tem uma vibe de que pegar ele não é o suficiente, tem que pedir em casamento também. Tipo... Sabe esse lance de que tem que comprar flores, chocolate, levar pra jantar e pipipo, só pra conquistar alguém? Nossa! Ele tem muito essa vibe... Mas o legal é isso: você tentar, mesmo sabendo que não irá conseguir.
Meu. Deus. Do. Céu. Meu melhor amigo quer comer meu namorado.
— Jaehyun, o que foi isso? — eu ponho a mão no peito, assustado. — O que foi isso?
— E eu tô mentindo? Eu e Taeyong somos inimigos, mas eu vivia flertando com ele em meio a ofensas. E eu digo por experiência própria que o fato de ele parecer alguém que não vai ceder a mim, era muito mais divertido de fazer. Eu nunca tive a intenção de pegar ele, então fica relax. E, além do mais, você nem estava aqui, tava lá pegando um homem na Itália...
Então quer dizer que Taeyong e Jaehyun quase se pegaram durante a minha viagem e eu só estou sabendo disso agora? Eu vou meter a cabeça dos dois numa parade, porque... Porra, que caralho é esse?
— Jaehyun, me diz que isso é meme.
— Não é meme, amigo, eu e Taeyong flertamos na zueira — ele segura meus braços como se estivesse se prevenindo de um possível tapa ou murro que eu venha dar. — Mas a gente não tem nada, nada mesmo. E mesmo se eu tivesse algum interesse nele, eu nunca, nunca mesmo, nunca iria ficar com o Taeyong. Nunca que ia destruir minha relação com você por conta de macho. Nunquinha. Você é muito mais importante que isso.
Ele tenta sorrir, mas eu fico sério olhando para a cara dele. Saber que meu melhor amigo já pensou ou já quis levar meu namorado pra cama não é um sentimento muito gostoso de se sentir. E eu sei que posso estar agindo como um verdadeiro idiota, porque Taeyong não é propriedade minha, mas isso me deixa muito chateado. Tudo bem, foi quando eu estava fora e, claro, eu soube que Taeyong saiu muito para a farra nessa época, inclusive foi aí mesmo que ele começou a namorar o Yuta, mas isso não muda o fato de que seria uma baita traição do Jaehyun fazer isso comigo. Sei que ele não manda na vontade dele, mas mesmo assim... Mesmo assim...
— Você ainda faz isso com ele? — pergunto.
— De vez em quando — ele dá de ombros, mesmo sabendo que eu odeio isso. — Mas é na zueira, só pra tirar ele do sério e me xingar. Aliás, eu jurava que ele estava se iludindo quando me disse que estava comprometido, chega comentei isso com ele... Eu nunca ia imaginar que vocês iriam mesmo namorar.
— Acho que uma hora isso iria acontecer, não? Alguma vez já me viu ficar com alguém por um tempão e por mais de uma vez?
— Hm... Lucas? Se você e Lucas namorassem, eu não iria ficar surpreso. Vocês se pegam desde mil e quinhentos. Então achei que Taeyong seria tipo um Lucas, embora ele tenha uma vibe totalmente diferente.
Olha o exagero dele...
— Mas eu nunca namorei o Lucas.
— E já namorou o Taeyong antes?
Solto um suspiro.
— Eu nunca tive vontade de namorar o Lucas... — calmamente explico. — Mas eu tive vontade de namorar o Taeyong. É simples.
Jaehyun abana a cabeça e eu me afasto para me sentar no sofá. Ele vem comigo, despenca ao meu lado e solta um suspiro longo. Eu não sei o que isso significa, mas apoio minha cabeça no ombro dele.
— Você se apaixonou mesmo, não é? — me pergunta em francês, estendendo o braço que em breve ficará ao redor dos meus ombros.
— Completamente — respondo em francês e fecho os olhos para me sentir mais leve.
— Oh, eu acho isso tão lindinho... — comenta em coreano. Uma vez que está me abraçando com um dos braços, usa a outra mão para acariciar meu queixo. — Tão lindinho o meu Ten apaixonadinho...
— Para com essa putaria — afasto sua mão do meu queixo.
— Credo — ele ri. — Quando vocês se casarem, eu quero ser padrinho.
— Comece com esse papinho de casamento pra você ver se eu não dou um murro na sua cara, Jaehyun.
— Ué, pensei que sua concepção sobre casamento havia mudado junto com essa sua aceitação do namoro.
— Não, Jaehyun, casamento é uma merda.
— Vou anotar isso para o meu discurso no seu casamento — ele ri.
Eu levanto a cabeça e olho seriamente para ele. Jaehyun tem cara de quem está achando graça, porque ele sabe que eu não gosto dessas coisas. Sabe que não gosto de relacionamentos duradouros nem criação de laços muito íntimos. Sabe que eu detesto o casamento de qualquer pessoa, porque eles são ridículos e só cavam buracos no peito de cada um. Olha só o casamento dos meus pais! Foi um lixo, foi um erro, e acho que até hoje minha mãe tenta se reconstruir daquela época. Até hoje eles nem conversam direito, senão cumprimentos. Se eles falam mais que isso, brigam. Eu não quero viver minha vida brigando. Ademais, valores religiosos e políticos, quando se juntam, nunca dá certo. Se eu amo alguém, não preciso assinar papéis ou fazer um show danado apenas para provar aos outros que nos amamos. Não preciso disso. E Jaehyun sabe disso, mas ainda tem esperança de que eu vou mudar de ideia.
— Você nunca vai usar — é o que digo.
— Eu aposto dinheiro que sim. Aposto de verdade.
— Idiota — me levanto e vou até a mesa outra vez, porque não quero conversar sobre o assunto e prefiro organizar minhas coisas.
Jaehyun fica em silêncio desde então, mas depois de alguns segundos vem me ajudar. Ele até me surpreende com um abraço e ficamos assim por um tempo. Acho que tenho medo das coisas mudarem.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top