nós deveríamos ser perfeitos um para o outro
— Chegamos! — Jaehyun sorri todo animado quando abre a porta de casa. — Nunca mais você veio aqui, né?
— Verdade — eu falo, olhando ao redor. Continua a mesma coisa de antes.
Jaehyun é bem organizado, mas ele gosta de coisas rústicas. A mesa dele é rústica, o rack da televisão também. Sua cortina é verde musgo, seu sofá é um bege um pouco escuro demais. Ele tem uma escultura de uma mão ao lado da tevê, que vive desligada, e coleciona quadros aleatórios na parede de estéticas e temáticas diferentes. Reconheço um deles como um dos que comprei na Grécia e o presenteei. Ele só tem um sofá e o tapete é numa tonalidade de laranja que mais parece um marrom forte demais. Ele tem aquelas cozinhas americanas, do tipo o balcão divide a sala dela. Isso já nos rendeu papos interessantes enquanto estive cozinhando e ele se sentou numa cadeira e ficou me observando. Ele não tem muitos objetos, tudo é muito vazio, porém as cores terracota dão um certo peso no ambiente que nos faz pensar que há coisas suficientes para se observar.
— Você está muito calado, Ten — Jaehyun observa. Ele deixa minha bolsa sobre uma cadeira perto da janela e depois tira o tênis do pé. Ajuda-me a fazer o mesmo. — Hm?
— O quê?
— Você está bem calado. O que houve?
— Nada. Só tive uma discussão com Taeyong e agora estou pensativo.
— E o que teve? — ele guarda meu sapato e vem comigo para o sofá. O único sofá.
— Nada, é só que... Esperei demais, sabe? Nós deveríamos ser perfeitos um para o outro, mas não somos.
— Ninguém é perfeito um para o outro.
— É que somos bestas. Às vezes eu penso que somos bem compatíveis porque nosso senso de humor é o mesmo, falamos palavras bregas quando estamos juntos e também sexualmente somos perfeitos. Mas não se trata disso. Eu só fico cansado, porque para mim as coisas são simples, mas o Taeyong gosta de complicar.
— As coisas já são complicadas por si só, Ten.
— Foda-se. Eu só estou cansado. Acabei falando demais, porque tive um pique de energia e confusão, eu fiz a burrice de enfiar cafeína no corpo quando estou tomando o remédio. Eu esqueci que estou tomando o remédio e também estou cansado de todo mundo dizer que eu estou super chapado.
— Relaxa, Ten, você se cobra muito. E pare de tomar, café, porra — ele chega perto de mim, mas eu me afasto. — Que foi? Não quer abraço?
— Não, eu estou bravo com umas coisas... Abraço só vai me deixar irritado.
— Como você é chatinho quando briga com Taeyong, viu? — Jaehyun revira os olhos dramaticamente e depois finge que vai enfiar o dedo indicador na garganta, mas imita um vômito logo após. — Você precisa esquecer disso. Como eu te conheço, você só vai se sentir melhor quando relaxar e esquecer um pouco o assunto. Seja lá o que você estava falando na hora, vocês vão se resolver e tudo vai dar certo. Sabe que o Taeyong nunca vai desistir de você, né? Aquele garoto come até cocô por sua causa.
— O problema é justamente esse.
Jaehyun fica me olhando em silêncio, depois dá de ombros e se levanta.
— Você precisa tomar banho. Vamos te dar um banho.
— Não, eu não quero.
— Ten, não me faça te obrigar. Seu nojento fedorento! Você está há 24hs sem tomar um banho, não lava nem o cu. Vamos limpar esse cu agora mesmo.
Eu não consigo me controlar e solto um risinho pela idiotice de Jaehyun. Ele quer me animar, afinal. Ele sempre faz isso, na verdade.
— Eu não quero tomar banho.
— Você vai. Eu vou te ajudar. Vamos pôr um saco plástico no gesso e ver no que dá.
Eu reviro os olhos e me levanto. Jae me manda ir ao quarto enquanto ele arranja o saco. Eu tiro a roupa e entro no banheiro só de cueca. Vai ser uma experiência chata, mas vai ter que ser assim pelas próximas semanas. É horrível. Fazer o quê.
— Consegui juntar cinco sacos, será que dá? — Jaehyun vem entrando no banheiro. — Eu acho que sim, mas... Porra??? Quanto hematoma feio é esse, Ten??!!!
O surto dele me dá um susto tão grande que acabo dando um saltinho e me jogando contra a parede. Depois do baita susto, ponho a mão no peito e fico pensando que se não fosse pelo meu braço engessado, provavelmente eu daria um soco no Jaehyun agora.
— Eu caí, é claro que vou estar com hematomas.
— Mas eu não sabia que eram tantos e estavam tão feios assim. Vira aí de lado, acho que tem um no seu abdômen — faz um círculo no ar com o indicador.
Eu me viro de lado e Jaehyun chega perto.
— Eu preciso comprar pomada para você — sua conclusão sai demorada demais. — Está doendo?
— Eu estou entorpecido — sou sincero. — Sinto que estou limitado, mas não sinto uma dor específica e forte. Acho que é o remédio.
— Posso te beijar? — a pergunta de Jaehyun me deixa confuso. — Quero muito te beijar agora.
Solto um suspiro e balanço a cabeça positivamente. Ele vem me abraçar e dá uns três beijos demorados na minha bochecha. Depois que comecei a sair com Taeyong e com o tempo namoramos, eu e Jaehyun não nos beijamos mais na boca. Ele pede pra me beijar, mas é sempre na bochecha. Fico feliz que ele respeite o que tenho com Tae. Muito embora, na minha cabeça, beijar ele na boca não muda exatamente nada o que eu sinto pelo Taeyong.
— Depois você compra o remédio, não precisa ficar preocupado agora. Vamos logo tomar banho.
— Tá bom. Mas eu me sinto horrível em te ver assim, Ten. Sério mesmo — ele faz carinho no meu cabelo. — Não fazia ideia que seu corpo estava assim.
— Tá tudo bem. É sério.
— Para de dizer que está tudo bem sempre, Ten. Não é problema algum admitir que as coisas estão uma bosta e que você gostaria de estar melhor.
Eu só respiro fundo e mordo os lábios. Jaehyun resmunga algum palavrão, mas me ajuda a cobrir o gesso com sacolas plásticas. E depois de muita luta, eu tomo coragem para tirar a cueca e entro no box. Jaehyun diz que quer entrar comigo, mas eu preciso literalmente implorar para ele não entrar. Sem minha mão direita, eu tomo um banho totalmente superficial e demoro para caramba. Além de que Jaehyun não usa o mesmo sabonete que eu, então eu já me sinto estranho por isso. E quando me enxaguo ainda é pior, porque é constrangedor ter de usar uma mão só para alcançar determinados lugares que são alcançados melhor com outra mão. E o governo não faz nada 😢!
— Terminou? — Jaehyun me grita do outro lado.
— Já.
— Aqui a toalha — ele enfia a toalha numa pequena abertura do vidro do box (que não é transparente) e me deixa pegar.
Mas eu não consigo me enxugar direito com uma mão só, tampouco me enrolar na toalha.
— Jaehyun, preciso de ajuda.
— É pra já, patrão! — ele brinca, então abre a porta toda do box e não liga se me vê peladinho da Silva. — O que precisa?
— Não consigo me enxugar direito nem me enrolar na toalha. Me ajuda a enxugar? Menos minha bunda e meu piu-piu, por favor, é muito constrangedor.
— Piu-piu? Desde quando você fala isso? — ele pega a toalha da minha mão e começa a enxugar minhas costas.
— Devo ter pego do Taeyong, ele adora falar assim.
— Credo que brega.
— É engraçado.
— Gado.
Dou uma leve cotovelada com o braço direito nele e Jaehyun entende o recado. Realmente, ele me ajuda a enxugar e ainda enrola a toalha na minha cintura. Depois vai correndo pegar minha bolsa da sala e me surge com um pijama. Ajuda-me a vestir, depois me leva para a sala e me força ficar quieto enquanto pede comida por aplicativo. Corre para tomar banho quando a comida está sendo preparada pelo restaurante, então fico quieto na sala. Eu devo estar agindo como um idiota ultimamente. Mas é quem eu sou. Talvez eu seja um grande, um grandiosissimo idiota por estar seguindo os meus instintos e vontades. Quem é que faz isso atualmente? Um verdadeiro luxo.
Alguém bate à porta. Jaehyun sai do quarto já vestido, comentando que deve ser o motoboy. Por cima da calça ele ajeita o íntimo na cueca enquanto anda até a porta. Só põe o olho no buraco mágico e depois surta, porque vem correndo na ponta do pé sussurrar:
— Porra, é o Doyoung!
— O Doyoung? — acabo olhando para a porta como se fosse possível ver o Dodo daqui.
— É! Ele tava sem falar esse tempo todo comigo e... — pausa do nada, já que a campainha toca de novo. Ignorando, continua: — Ontem a gente conversou um pouco. Ten, não posso perder essa oportunidade. Se esconde no quarto para a gente poder conversar?
— Vai me tirar do rolê mesmo, Jaehyun?
— É! Na sacada tem uma escada e você pode descer e dar um passeio na rua. Eu juro, tô há um tempão esperando ele me procurar... Depois eu te compenso, eu juro!
— Jaehyun? — Dodo fala do outro lado da porta, tocando a campainha de novo.
— Eu te odeio Jung Jaehyun! — eu resmungo.
Contra minha vontade, pego meu celular e minha carteira antes de ir correndo para o quarto. Não sei qual quarto ele se referiu, mas acho que é esse de hóspedes. Eu mal entro, encosto a porta para não ter chance de Dodo me vir tentando fugir da situação. No entanto, eu deixo uma fresta aberta e sento do ladinho. Não vou ir embora ainda. Preciso saber o que vai rolar. Ponho os olhos encostados na porta e só consigo ver de longe o Dodo entrando na casa e claramente cumprimentando Jaehyun. Desbloqueio meu celular e procuro o contato de Yuta. Preciso mandar uma mensagem.
você: yuta, vagabundo, acorda
yuta 🤮: que é
você: dodo veio na casa de jaehyun
yuta 🤮: CONTA TUDO GAY
Eu deixo ele no vácuo para tentar escutar a conversa deles dois. Deposito toda a minha atenção nisso.
— Eu pensei sobre o que você disse ontem — Dodo diz. — E eu concordo, sabe? Não dá mais para ficar fugindo. Não quero vacilar e acabar te perdendo também.
— É que parece que você não sabe o que quer — Jaehyun fecha a porta.
Dodo tira o tênis e se senta no sofá. Jaehyun senta ao lado dele. A parede do corredor me impede de enxergar Jaehyun, então pelo ângulo só consigo ver Dodo, que está grudado numa ponta do sofá. Eu respiro fundo.
— Não, eu sei sim — Doyoung torna a falar. — Só que não quero abrir mão de certas coisas. Estou acostumado a tê-las e perder é muito difícil. Mas... Eu já falei com ela sobre essas coisas e ela entendeu.
— Oh, ok. Você veio falar dela — o sarcasmo é evidente no tom de voz do Jaehyun, além de ter uma certa pitada de decepção também.
— Não é isso. Eu só quero dizer que acabei complicando algo simples. Eu fico pensando em você o tempo todo e te ver está me machucando, porque estive me pressionando em relação a isso...
— Doyoung, eu já entendi que ficamos sem querer.
— Não tem como ficar sem querer, você sabe disso. Eu quis e você quis também. A questão é que não dá mais pra fingir que não aconteceu, entende?
— Então você admite agora que rolou algo?
— Eu sempre soube, eu só estava com medo. Desculpa por te machucar — Doyoung claramente respira fundo. A postura dele sentado está horrível. — Eu só queria me deixar protegido, mas nem percebi que você poderia estar nessa comigo.
— O que quer dizer?
— Eu gosto de você, Jaehyun. O que aconteceu não foi sem querer, a gente se beijou algumas vezes e foi incrível. Eu estou sendo sincero agora.
Ok, está ficando meio íntimo demais, eu nem deveria estar aqui.
você: dodo tá dizendo que gosta do jaehyun
yuta 🤮: EU AMO KKKKKKK
você: aquieta
Levanto-me para ir até a sacada e descer as escadas. Caminho na ponta dos pés, vou até ela mas não encontro escada alguma. Será que ele quis dizer o quarto dele? Porque se for, estou fodido. Eu não posso mais sair desse quarto senão Doyoung me vê. Se Doyoung me vir, eu estou ferrado, porque além de destruir o momento deles, o Jaehyun vai ficar bem chateado. Tenho que pensar em algum modo de sair. Ou talvez eu deva ficar, esperar Dodo ir embora e depois sair do quarto. Não deve demorar tanto tempo assim, né? Eu acho que não.
Volto na pontinha dos pés para perto da porta, me agacho com o celular na mão.
— ... Muito achismo — não sei sobre o quê, mas Jaehyun está falando. — Eu não posso me arriscar por incertezas.
— Não é incertezas, eu... estou sendo honesto. Só estou um pouco hesitante. Sabe, é normal sentir medo antes de dar um longo salto. Parece que falar "talvez" ameniza um pouco as coisas.
— Se você quer amenizar, não está pronto.
— Quero amenizar porque é fora da minha zona de conforto. Eu nunca fiquei com um cara antes. Até pouco tempo todos da minha bolha social tinham certeza de que eu era hétero. E está tudo bem, eu nunca vendi outra imagem. Só que eu não sou, só... é o meu histórico, entende? Além do mais, já é muito arriscado jogar as opiniões dos outros no lixo para embarcar algo com você. É tudo que eu consigo pensar, sabe? Em você e em como você está se sentindo. Eu realmente quero.
Eles passam alguns segundos em silêncio.
você: dodo provavelmente quer entrar num relacionamento com jaehyun, mas tá com certo medo já que é diferente de tudo que ele já fez
yuta 🤮: te amo tanto ten 😭😭😭🤏🤏🤏🤏
yuta 🤮: e o jaehyun vai aceitar?
você: eu não sei, não estão falando nada.
Tiro os olhos do celular e aproximo da fresta da porta. Quero ver o que estão fazendo. Dodo está menos visível agora, porém sei que eles estão trocando sussurros porque a mão de Jaehyun está na mandíbula de Dodo, que concorda positivamente com a cabeça. Eu não consigo ouvir o que falam, só sei que estão muito próximos.
— Então você quer mesmo? — escuto Jaehyun falar um pouco mais alto.
— Eu não penso em outra coisa.
Eu sou surpreendido por um beijo entre os dois. Afasto-me da porta e ponho a mão no peito. Lembro de atualizar o Yuta, mas até isso me dá preguiça. Eu levo muito tempo escrevendo com a mão esquerda, além de sempre errar alguma coisa. Dessa vez não vou me corrigir não, vai ser do jeito que eu conseguir escrever.
você: ele s beijarn
yuta 🤮: eles estão se beijando?
você: é
você: vou para d escrve meu dedo tá doen
yuta 🤮: ok obrigado pelas informações valiosas
você: 🙄😒
Suspiro e depois chego perto da porta de novo, tentando ver se já pararam com os beijos. Não. Ainda estão se beijando. Ambos estão ao lado do outro, por isso a mão direita de Jaehyun já está no pescoço de Doyoung, enquanto a de Dodo está na coxa do Jung. Não sei quanto tempo vai durar essa baixaria, mas espero que termine logo. Paro de olhar, senão vou enlouquecer. Um lado infantil meu quer assistir, mas meu lado maduro diz que é para eu jogar alguma coisa no celular ao invés de tomar conta da vida deles.
Estou nervoso, porque quero sair daqui e não tem como. Mesmo que eu vá até a sacada e fique olhando, não consigo encontrar uma solução. Vou simplesmente me jogar daqui? Talvez eu não morra, mas possivelmente irei fraturar mais algumas coisas e piorar minha situação. Eu não quero ficar mais tempo tomando remédio ou pôr mais gesso. Seria um pesadelo pior do que estou agora. O melhor é sentar na cama e esperar pra ver. Ou ver enquanto espero. Ah, não consigo me controlar! Volto até a porta e espio pela fresta de novo.
Jaehyun coladinho no Dodo o faz entrar no meu campo de visão. Eu devo admitir, ele é bem bonito e sensual beijando, sua imagem é limpa e ao mesmo tempo me faz desejar ter o que ele tem. Eu sei que Jaehyun beija bem pra caramba — haha, eu bem sei —, mas não estou com vontade de beijar ele. O que quero dizer que vê-lo beijar me faz querer beijar também, mas não necessariamente ele. Eu queria ter beijado Taeyong mais cedo. Não deu. É o que tenho para hoje. Ou não tenho. Que merda. Acho que estou ferrando as coisas ultimamente.
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