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07 — arco, ricotta e calor do sol

taeyong

É um dia bonito este aqui. Bem, não teria como ser diferente quando se tem a ilustre presença de Chittaphon. É como se tudo conspirasse a favor de nós. Estamos de mãos dadas, mas isso não é novidade. Quer dizer, ele está dormindo e não percebe o carinho que deixo quase sem querer na sua mão. Não está tão quente, embora o clima esteja demasiadamente agradável. Acabo tossindo sem querer e isso o desperta. Enquanto abre os olhos, vou pensando em como fazê-lo se sentir o cara mais especial do mundo.

— Bom dia, stalker — sua voz ainda está rouca quando coça os olhos preguiçosamente.

— Bom dia — acabo sorrindo.

Ambos olhamos para a janela, encaramos o céu azul e o sol exagerar. Trocamos carícias em silêncio, sabemos que há coisas sendo ditas neste momento. Como um eu te amo e obrigado, muito obrigado por ter topado essa loucura comigo.

— Você está gostando da viagem? — sua pergunta me deixa atônito, porém besta e idiota. Um sorriso se estica, porque eu não sei onde me enfiar para esconder a tamanha emoção.

Bem, para quem não sabe, estamos viajando. Depois de um tempo, sabe, é necessário curtir um pouco e deixar o trabalho e estudos de lado. Eu quis que fôssemos a um lugar perto, talvez, porque poderíamos estar mais atentos para qualquer chamado. Ten disse que se eu me limitar dese jeito nunca vou longe. E de repente a conversa terminou com duas passagens à Roma. Roma!

— Amando — afasto-me o suficiente para para pegar minha câmera analógica da bancada ao lado da cama. Ten cobre o rosto, mas eu tiro a foto mesmo assim. — Quando eu revelar, vou anotar atrás o quanto você está bonito ao acordar no nosso primeiro aniversário.

— Feliz aniversário para nós! — ele tira as mãos do rosto e sorri.

Eu deixo a câmera na bancada de novo, deslizo o corpo para estar bem grudado a ele e lhe deixo um beijo no peitoral nu. Ten inicia um carinho no meu couro cabeludo. É o tipo de coisa que mesmo que ele me faça por uns trezentos mil anos ainda ficaria arrepiado. Acho que somos a melhor versão de nós mesmos.

Um dia você está quebrado e nada faz sentido. Está assustado e com medo, ninguém entende e talvez quem diz entender diga que irá passar. Não parece que irá passar. Mas passa. Estou aqui porque passou, eu me sinto outra pessoa, vagando por um mar aberto sob um céu azul indigo.

Engulo em seco ao levantar o rosto para olhá-lo nos olhos.

— Estou tão preguiçoso hoje... — resmungo, depois viro o rosto para apoiar minha bochecha esquerda no seu peitoral. — Você também?

— Retórica. Eu sempre estou preguiçoso — sinto seu peito subir e descer rapidamente, devido a sua risada. — Mas a gente pode demorar um pouco mais. Não é como se a cidade fosse mudar se não sairmos na hora certa.

— Sabe que ainda pode cair um meteoro, né? — viro o rosto para olhá-lo.

— Ai, Taeyong... Francamente — ele abana a cabeça na negativa.

O rosto dele está meio assado, principalmente no nariz, testa e bochechas. Ele esqueceu de passar protetor solar ontem e eu esqueci de lembrá-lo, e como ficamos trezentos anos fora, foi praticamente inevitável não receber uma pancada do sol. Porém hoje está um pouco melhor, embora seus olhinhos meio inchados dêem a sensação de que ele está bem cansado.

— Eu preciso saber se você reconhece essa possibilidade.

— Sim, claro — ele revira os olhos. — E isso é a cada segundo, pode ser agora.

— Agora não — dobro o braço para poder deslizar os dedos no seu mamilo esquerdo que está bem próximo dos meus lábios. Sinto um espasmo breve no seu corpo assim que acaricio com as pontas dos dedos. — Porque assim eu não teria ficado com você por tempo suficiente.

— Que breguice — ele sorri mesmo assim.

— Você disse que seria brega no nosso aniversário, Chittaphon.

— Mas eu estou...

— Até parece. Fiz até uma lista de coisas que aprendi te namorando.

Ele gargalha e inclina o corpo para frente, me fazendo sentar na cama.

— Cadê?

Pego meu celular, abro o bloco de notas e mostro minha anotação de sei lá quanto tempo atrás. Eu não terminei, mas fiquei no meio do caminho.

“Coisa que aprendi namorando você:
1. Você é o maior preguiçoso do mundo para acordar. Não sei como você acordava sem mim
2. Você acha que pode me seduzir, mas sempre que tenta, não consegue
3. Você tem mania de me dar bumdada durante o sono, o que é interessante
4. Você compra papel higiênico caro que parece mais um beijo na bunda do que uma limpeza
5. Você faz exercícios muito mal feito, antes nem fizesse
6. Você é muito bom em lap dance e tenho medo de te perguntar quando e onde você aprendeu
7. Você não tem medo dos mesmos insetos que eu
8. Você é uma vergonha em videogames, e eu te chamo para jogar quando quero te humilhar
9. Você beija muito bem, mas isso tu já sabe
10. Você prefere sexo matinal, o que me deixa curioso
11. Você detesta quando alguém não lava os pratos logo após a refeição
12. Você bem que poderia adotar um cachorrinho comigo”

Ele lê em voz alta e percebo como seu sorriso fica nas partes engraçadas.

— Você quer adotar um cachorrinho? — inclina a cabeça.

Antes que eu possa responder, um som na porta chama nossa atenção. Um homem do outro lado fala algo que não entendo, porém levanto-me da cama e enrolo meu corpo num robe bege.

— Você pediu serviço de quarto? — Ten questiona, e de forma indireta traduzindo para mim.

Eu não respondo. Claro que chamei.

— Por que você não vai tomar um banho rápido, hm? — curvo meu corpo para lhe deixar um beijo carinhoso na bochecha. — Eu atendo.

Ten balança a cabeça positivamente, empurra a franja para trás e sai da cama ajeitando a roupa íntima. Assim que entra no banheiro, abro a porta e o moço entra com uma parafernalha de comida que eu fiz questão de solicitar ontem de noite, assim que voltamos do Coliseu. Hoje é oficialmente nosso aniversário de um ano e estou com humor bom o suficiente para lhe dar um café da manhã dos deuses.

Agradeço ao funcionário com meu italiano de centavos. Eu sei que Chittaphon me ensinou algumas coisas antes da viagem, mas eu percebi que, pior do que eu em francês, sou eu no italiano. Mas o moço entende, e quando sai eu suspiro aliviado. Coloco todos os pratos sobre a mesa perto da janela e, pra começar, sirvo o café que pedi que fizessem. É um café especial com cacau e canela e sei que Ten gosta, porque já o escutei comentar que costumava beber há uns anos atrás. E ainda lambuzo sua torrada com ricota, azeitonas pretas e tomate.

— Docinho, você me lembra hoje de comprar protetor solar e um corretivo? — ele sai do banheiro com a toalha enrolada na cintura e os fios do cabelo pingando graciosamente.

Há um tempo estive imaginando sua presença calma e leve perto de mim, uma rotina de aparência similar a um sonho surreal de um cara solitário deitado na cama e assistindo o teto à espera de que fizesse algo. Ele vem distraidamente coçando atrás da orelha, um sorriso surgindo ao passo que percebe do que se trata tudo isso, e uma levantada nas sobrancelhas ao checar minha expressão. Eu não estou vivendo um sonho, é real. Beliscar não adianta, nunca adiantou.

— O que é isso? — ele pergunta, chegando perto o suficiente para checar o que tem para comer.

— Eu achei que, como é nosso aniversário, você iria querer algo especial — mesmo que tenhamos toda a intimidade que poderíamos ter nesse ponto, sinto-me tímido com tudo isso, e abraço a mim mesmo. — Você gostou?

— É claro que gostei, Tae! — ele se anima tanto em vir me abraçar que a toalha desliza entre nossas pernas no instante em que sinto seus braços no meu pescoço.

Acabo rindo com isso. Para provocá-lo, minhas mãos deslizam ousadas pela sua pele macia com aroma de chocolate do sabonete vegetal de cacau que ele usa. Alcanço seu bumbum e repouso minhas mãos carinhosamente.

— Lee Taeyong! — afasta o rosto o suficiente para me encarar. — Você é simplesmente o último romântico e o cara mais brega do universo.

— Obrigado pelos elogios, meu jovem — inclino a cabeça para o lado. Eu queria fazer algo diferente, já que hoje à noite teremos um jantar num restaurante bacana. — Guardarei em meu coração.

Ele sorri ainda mais e eu confesso que estou fraco demais para tentar falar algo que não seja um EU TE AMO EU TE AMO. Porque eu amo quando ele sorri animado e sem ter medo de mostrar o quanto se importa. Ele não tem mais medo de mostrar que eu sou muito, muito para ele, que eu deixo seu coração acelerado — eu estou sentindo-o aqui contra o meu peito, mesmo que ele diga que não — e provoco risos do nada. Ele não tem mais medo de encostar a testa na minha, respirar fundo, e eu não aguentar e ter de deixar um beijo na sua boca.

Ele é meu namorado, mas quando nossas línguas se unem, ele vira um elemento vital da natureza. Quando seguro sua mão, pressiono seu pulso, os olhos fechados, o mundo grita que nós demoramos pra cacete, mas o café é bom porque dá tempo de ferver.

— Preciso me vestir — sussurra ao deixar um último beijo nos meus lábios.

— Sério? Assim está tão bom...

Ele ri, então se afasta. Veste uma bermuda jeans e uma camisa fresca de linho. Sentamos juntos para tomar café. Quando estou distraído, ele me dá na boca. Eu não saberia dizer se isso é real se não fossem os últimos meses acordando ao lado dele e compartilhando refeições. Se não fosse pela sua preocupação quando chego do trabalho, querendo saber se comi ou não, até mesmo mandando comida para mim.

Eu encaro o céu azul e todos os seus tons. Encaro as outras construções ao nosso redor, onde muito da história foi cenário, onde sequer cogitei que estaria quando menor. É estranho quando alcançamos constelações que nunca imaginamos estar perto um dia. A relatividade da expectativa e realidade encontra-se num ponto que ninguém nunca saberá explicar ou prever. Eu já sei onde quero estar. E se por algum acaso eu me desprender disso, está tudo bem. Continuar nadando sempre foi a melhor opção. Sempre se chega em algum lugar, eventualmente. Sempre se chega em alguém, nem que seja para pedir ajuda.

Viro o rosto para Ten, pego-o me admirando em dedicação. Sorrio meio sem saber. Ele não sorri. Estica a mão direita, limpa o canto da minha boca, e com os nós dos dedos ele acaricia minha bochecha. Seu contato é sutil, um orvalho doce numa manhã de março. Meu lábio úmido de geleia e da vontade de ser feliz... e que a felicidade sempre me escapou, mas de repente ela vem até mim com um semblante sério para dizer: "ei eu não vou ser inconstante agora, eu não vou sumir agora, você pode fechar os olhos e confiar em mim, porque nas suas quedas eu fiquei estrambelhado e cansado e por isso meu pulmão não me permite correr para outro lugar que não seja os seus braços".

E o sol se mete entre nossa intimidade, revela o que há de melhor aqui: seus olhos castanhos ficando maiores a medida que diminui a distância. E meus lábios melados de geleia e sede de felicidade encostam nos lábios dele que estão melados de ricota e a falta da necessidade de eu ter de perguntar se ele me ama. Porque ele ainda me ama. Sim, ele me ama.

Após o café, descemos lado a lado pelas escadas do hotel. Eu pus um boné na cabeça e vesti uma bermuda marrom de veludo e uma camisa branca por baixo de um colete de tricô azul bebê com flores. Ten fala que estou fofo, eu só retribuo o elogio ao apertar sua mão na minha.

— O protetor solar, amor — aponto para uma farmácia que vemos no meio do caminho.

— Amor... — ele repete meio a contragosto, mas o sorriso que abre mostra que não se irrita mais, acha divertido.

Faço uma careta, ele segura meu queixo para dar um selinho, eu tento me aproximar para um beijo de verdade, ele foge para dentro do estabelecimento e eu vou seguindo como se fosse ele um pote de mel e eu fosse o ursinho Pooh. Mas estamos de volta de novo, sabe? Compramos tudo super rápido. Ele abre o protetor solar e espalha em si mesmo, depois em mim. Gosto de sentir seu dedo no meu nariz deslizando devagar e o modo como me olha como se eu fosse sua família. Eu sou sua família?

— Ten — chamo. Ele me olha nos olhos. — Você já me vê como família? Sabe, quando você está no trabalho, você pensa... V-você pensa em chegar logo em casa com um sentimento de lar e família? Eu sei que está cedo para isso, só que... Eu sei lá, só...

— Relaxa, Taeyong — ele fecha a tampa do protetor solar e enfia na sacola junto com o corretivo que comprou. — Por que pergunta isso?

— Não sei. Eu... — umedeço o lábio inferior e encaro o restaurante do outro lado da estreita rua em que estamos. A construção é amarela, mas está desbotada, só que os vasos de flores ao redor torna tudo mais bonito. — Eu tenho esse sentimento, então quis saber se você sente o mesmo...

Ele faz um som anasalado como se fosse uma risada, porém se escora na lateral da farmácia ao meu lado. Ficamos em silêncio por um tempo. Eu gosto do vento. Eu gosto do calor do sol. Gosto do cheiro do protetor solar no meu rosto.

— Você é minha família, sim — por fim, ele diz. — Todo mundo que amamos, de alguma forma, se torna uma família para nós. E se eu me apresso para chegar em casa, te acordo quando levanto primeiro, preparo suas refeições e te abraço sem motivo aparente... Você é minha família, sim.

Encosto a cabeça em seu ombro, pego sua mão e aperto na minha. Quero chorar.

— Era isso que eu queria, Ten. Eu só queria mesmo ser sua família, para que você não se sinta sozinho. Feliz um ano.

— Eu também não quero que você fique sozinho — ele segura meu queixo e vira na sua direção. Percebe meus olhos marejados. — Você é muito doce, Taeyong. Sobre aquilo mais cedo... Eu também acho que devamos adotar um cachorrinho. Vem, vamos, precisamos chegar ao arco...

Vamos ao Arco de Constantino. Juntos. Eu e ele. Podemos não ser muito, mas somos uma família. Ela pode aumentar em breve. Fingimos que aquele arco triunfal está ali para representar uma grande vitória: nós.

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