Extra - Peixinhos e cafuné em: namorados até nos matarmos
“Every time that you get undressed I hear symphonies in my head” sai da caixa de som, sem mais nem menos. Eu abro os olhos, olho meu teto pintado com uma releitura de A Criação de Adão que diz certa vez, envolvendo personagens de Sailor Moon. Todo mundo tem suas fases… eu tive a minha. Então suspiro animadamente, espreguiçando-me na king size. Obviamente, acabo tateando, à procura de outro corpo aqui ao meu lado. Não há. Por isso me sento.
“I wrote this song just looking at you, oh, oh, oh”, Jason Derulo continua a cantar. Estou me perguntando aqui quem andou mexendo na minha Apple Music e descobriu que eu escuto Jason Derulo em momentos bem específicos.
Esfrego os olhos preguiçosamente, sentindo o sol bater na minha cara com força. As cortinas do meu quarto estão abertas, coisa que eu nunca deixo. Mas, olhando daqui, a sacada parece estar agradável. Levanto-me e caminho até ela, abrindo a porta de vidro e pondo, literalmente, a cara no sol. Não acho que está assim tão quente, inclusive está até ameno. Acabo voltando para desligar o ar-condicionado, mas logo estou na sacada outra vez. Olho o horizonte bonito da manhã e acho que isso aquece meu coração. É bom estar vivo. Acho que nunca antes estive tão grato.
Em meio à batida da música, escuto batidas de membros na água. Desço o olhar para a piscina do lado de fora e sorrio meio sem querer ao vê-lo bater as pernas e os braços na água, nadando de uma ponta a outra. O brilho do sol contra a água é lindo, eu amo essa reflexão.
— Ei! — grito, pouco me importando em parecer escandaloso.
Ten para de nadar e se aproxima da borda da piscina, sorrindo para mim.
— Nem acordei e você já está à vontade?
— Eu só vi uma piscina e pensei em nadar. Quis aproveitar que você estava dormindo e não iria reclamar comigo.
— Vem logo! — faço um gesto com a mão para que ele suba. — Tô com fome!
Ten ergue a palma da mão, pedindo para eu esperar, e depois impulsiona o corpo para fora da piscina. Eu saio da sacada e me jogo na cama outra vez. Vou cochilar só mais um pouquinho, amo ficar de preguiça.
Acredito que amo ficar de preguiça com Ten também. Tem um mês e meio que quase morri naquele sequestro. Não sei se eles iriam me matar de verdade, mas foi dito que sim. A real é que eu e Ten demos um tempo depois daquilo tudo. Precisávamos dar um jeitinho na nossa vida, sabe? Então foi bom. Ele, no canto dele. Eu, no meu canto. Tudo fluiu bem. E digo isso porque realmente estávamos precisando. Beijo é bom e sexo também, mas não é só sobre isso que se constrói uma relação. Também, não vou negar, estive bastante magoado ainda. Mesmo com os abraços dele dizendo que iria ficar tudo bem, eu ainda me sentia um pouco desconfortável. Minha mente precisava raciocinar aquela informação: num dia, ele estava ao lado de quem dizia querer me matar, mas no outro estávamos aos beijos num quarto de hotel. Eu acho que… precisei desse tempo, sabe? Fez bem.
Ainda mais porque conseguiram prender os envolvidos no sequestro, ainda que precisemos participar de uma audiência e tudo mais. Eu odeio burocracia. Acho que sou mais do tipo "vou pagar um advogado e ele resolve tudo isso para mim" quando o assunto é tribunal. Felizmente, essa parte está caminhando muito bem. Eu também não tenho muito interesse em ficar lembrando deles, então não me importo em esquecer de vez em quando o que aconteceu. Gosto de passar o tempo de boa.
No início da semana, Ten me mandou mensagem perguntando se podia brotar aqui em Seul. Onde já se viu pedir permissão para viajar? Falei que ele era um homem adulto e que poderia para qualquer lugar que bem entendesse. Ele, por sua vez, me questionou se ainda estava de pé a proposta de ficar na minha casa. Juro, eu quase passei mal na banheira! Disse que, claro, estava sim. Então ontem ele chegou de viagem pela noite e só deu tempo de conhecer um pouco da minha casa, comermos comida por aplicativo e transar loucamente por sei lá quanto tempo até dormirmos abraçados. E… bem, aqui estamos nós, agora… Encarando a vida real longe do seu carro fedorento caindo aos pedaços e as músicas barulhentas de punk rock.
— Me deixe adivinhar — ele aparece no meu quarto. — Eu vou ter que preparar o café da manhã?
— Sim — respondo.
— É bem sua cara não saber cozinhar — sua voz vai ficando distante, sinônimo de que ele provavelmente está andando para a cozinha.
Eu não respondo, embora minha vontade seja de mandar um “ah, chupa meu pau, moleque!”
Quem cozinhava para mim era Jaehyun. Quando não íamos a um café, ele gostava de preparar alguma coisa para tapear meu estômago. Mas pensar nisso me deixa doente. Eu ainda não superei.
Jogado na cama, gasto alguns minutos da minha vida pensando no que vou fazer daqui em diante. Tenho tanta coisa para fazer, mas quero deixar tudo de lado quando Ten está comigo. Não sei como Ten vai lidar com tudo. Sabe, não estamos mais dando um tempo? Além do mais, nem somos nada oficialmente. Ele tem a vida dele na Tailândia, enquanto eu tenho minha vida na Coréia. Isso de agora é só… temporário.
— Já tá pronto! — anuncia, o que me faz pensar em quanto tempo gastei olhando para o nada. Às vezes eu levo o conceito de sonhar acordado muito a sério.
Não vou diretamente para a cozinha, passo no banheiro para escovar os dentes e dar uma ajeitada no cabelo. E assim que saio, pego Ten olhando fixamente para o meu aquário na sala de estar. Ele parece encantado. O tronco está totalmente curvado, seu rosto está perto do vidro enquanto as mãos estão apoiadas no joelho. Ten é lindo.
— Agiota e Deputado estão te olhando também — digo. — Dê tchau pra eles.
— Agiota e o quê? Que história é essa?
— Ué, o nome deles.
— Você botou Agiota como nome do peixe?
— Algum problema?
— Nenhum, patty loira esnobe e esquisita — revira os olhos enquanto sorri.
Estico meu braço para tocar seu cabelo ainda verde, úmido, e lhe faço carinho. Ele vira o rosto na minha direção, seu sorriso super fofo.
— O que você preparou?
— Arroz frito.
— Hm… — aperto sua bochecha.
Ten levanta o tronco e volta ao seu tamanho normal, só um tiquinho menor que eu. Por mais que eu o ache fofo, minha vontade ainda é de beijá-lo até o mundo acabar.
— O que foi, Taeyong? Tá me olhando assim por quê?
— Nada — dou de ombros. — Te acho um pobre feio e fedorento.
Merda. Agora ele não vai levar a sério mesmo.
— Ah, é? — Ten chega perto com esse sorriso desgraçado que eu odiei tanto porque havia amado. Simplesmente me abraça pela cintura e me dá um beijo rápido na boca. — Para de me esculachar. Gosta de cuspir no prato que come, é?
— Eu gosto de falar mal do prato que como. Literalmente.
— Aff, te odeio, sinceramente — revira os olhos dramaticamente e já está se preparando para se afastar, porém dessa vez sou eu que seguro sua cintura.
— Quanto tempo você vai ficar aqui?
— Na Coréia?
— Hm.
— Não sei. Quanto tempo você quer que eu fique?
— Quanto tempo você quer ficar?
— Depende de você.
— De você.
— Você.
— Você.
— Você, príncipe! — joga os braços por cima dos meus ombros, abraçando-me devagar.
— Para de me chamar assim, eu fico envergonhado… — desço o rosto para seu pescoço e dou uma cheiradinha. Ele está com cheiro do meu amaciante, talvez tenha pego quando se secou com a toalha. — É que já que a gente se odeia e sempre queremos matar um ao outro…
— Ainda é muito cedo para eu brincar em dizer “literalmente”? — ele me interrompe.
— É, estou com traumas profundos. Mas eu entendi a piada, foi muito engraçada. Guarde para daqui a seis meses.
— Hm… — esse tom usado é meio que um “hm, interessante…”
— O que foi?
— Seis meses… — repete.
Eu afasto meu rosto do seu pescoço e passo a encarar Ten.
— O que isso quer dizer?
— Estaremos assim daqui a seis meses? — aperta mais os braços e até mesmo encaixa nosso quadris.
— Você não quer?
— Não é isso. Eu quero. É que a incerteza e casualidade me deixaram confusos. Isso ficou em aberto, né?
— Uhum — mordo o lábio inferior. Ten foca nisso durante alguns segundos. — Você quer… ser meu namorado até eu te matar?
— Você sabe que nosso namoro nunca mais será o mesmo, né?
Eu acabo sorrindo e concordo com a cabeça.
— Aliás — volta a falar. — Sabe que eu vou te matar primeiro, certo? Esganado ainda.
— Isso me deixa super na vontade, sabia? — aperto sua cintura sensualmente. Lentamente, esfrego meu corpo no seu, porque sei que ele gosta disso. Sussurro: — Então, recapitulando…
— Eu amo quando você fala isso — ele sussurra de volta.
— Cala a boca — meu comentário o faz rir.
— Você odeia quando sou romântico.
— Não odeio, não — beijo sua bochecha. — Só fico sem graça. Aaah, você é tão lindo! Promete ser meu namorado?
— Já não somos?
— Namorados até nos matarmos, então.
— Namorados até nos matarmos — ele repete.
Sorrimos que nem idiotas mesmo, não tem mais o que fazer. Caímos nessa. Beijamos mais de uma vez, até mesmo mais do que pensei. Finalmente ele aqui em casa, fim de semana, solzinho morno da manhã e sua pele fresca por ter ficado na água. Mas nos beijamos mesmo, tipo de novela adulta, esfregando os lábios, quiçá os corpos também. A gente se encaixa e ri, e diz o quanto odeia o outro, mas na verdade a gente se ama e eu finjo não notar que sua risada é mais linda quando acompanha a minha ao ponto de me fazer rir mais ainda.
Baby segura-se com força em mim antes de pular e enlaçar as pernas no meu quadril. Eu vou tontinho, perdido, gado demais, andando aos beijos até o quarto outra vez. Eu estou lembrado do café da manhã, porém finjo que não. É bom fingir às vezes, para que isso dure mais, seja eterno e grude no peito, como eu pensei que chiclete grudava ao engolirmos. Eu tinha sete anos, mas agora sou adulto e sei mais. Ou menos, dependendo do ponto de vista. Mas se tem uma coisa que me orgulho em saber, é em como deixar Ten louquinho louquinho. Pega a receita: beijar sua boca sem pressa, carinho na cintura é essencial, vai deitando-o na cama até ficar por cima, segura seu rosto e diz suas melhores palavras.
— Se lembra quando você me disse aquilo na árvore?
— O quê?
— Que me ama.
— Sei.
— Eu te amo também.
— Eu já sabia disso — ele sorri, então me puxa pela nuca para que voltemos aos beijos.
Corpos emaranhados, em breve suados, jovens e necessitados sob o banho do sol. Sou um homem que quando quer, consegue. E hoje tudo que quero é me esfregar a manhã, tarde e noite inteira no corpo dele. Sussurrar que odeio também é essencial, porque amor é uma palavra muito forte e eu tenho vergonha de dizer demais. Não quero perdê-la no vento, no eco do vão entre as palavras. Ele entende, diz que me odeia também, e no fundo nos odiamos mais que tudo. Precisamos nos suportar, eu digo. Mas é afastando suas pernas enquanto desço lhe deixando constelações pelo corpo com a minha boca, que eu percebo que isso vale muito a pena.
É que se tudo isso foi um engano, dessa vez eu quero ter certeza. Eu e Ten somos o erro mais bonito que aconteceu. E ninguém pode tirar isso de mim.
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