Capítulo Seis - Parte 1 ⚔

Elric Redthorn

Separo a minha boca da de Jehan e o encaro nos olhos... olhos de uma cor que jamais vi em Ayllan. Ele suspira... nossas respirações se misturando. E sorri.

- Isso é um baita problema. - diz ele sorrindo.

Dou um passo para trás, mesmo que essa não seja a vontade do meu pau, nesse momento tenho que pensar com a minha cabeça de cima. Engulo em seco.

- Por que? - pergunto. - Porque isso entre nós dois?

Jehan dá de ombros e olha para o lado. Sinto que ele busca respostas assim como eu busco. Não estou me afogando sozinho nesse mar de questionamentos, pelo menos. E talvez, assim deva ser, ele e eu perdidos, para juntos nos encontrarmos... meus deuses, que tosco. Parece cantiga de bardo em bordéis de beira de estrada.

- Eu não sei. - responde ele por fim. - Essas coisas são deixadas a rolar naturalmente, Elric. - continua ele. - Não tem um meio de seleção... vem antes de nascermos. É... é...

- Uma maldição? - digo.

E ele me olha, um pouco espantado.

- Longe disso. - responde.
Um silêncio fica entre nós dois. Meu pau ainda não parou de latejar e a boca dele ainda continua vermelha. Fecho as minhas mãos.

- Isso daqui nunca daria e não dará certo, Jehan. - digo. - Mesmo que seja destino, ou o diabo a quatro, ninguém entenderia.

Vejo ele engolindo em seco.

- Meu pai, o Rei Adarel, ele... ele já me contou algumas histórias assim. - diz Jehan. - De parceiros que negaram a conexão.

- E o que aconteceu? - pergunto.

- Eles definharam. - responde Jehan. - Aos poucos..., mas quanto mais tempo eles ficavam um longe do outro a saudade crescia e doía no peito. Era como se metade do seu coração estivesse com a outra pessoa e você só conseguisse ter paz, dormir direito ou viver bem se essa outra metade tivesse perto. Fizesse parte do seu dia a dia. E, Elric, eu sei que você e sua família odeiam os feéricos até os ossos, mas acredite em mim, uma das piores mortes é não passar a vida ao lado do seu predestinado.

- Essa é a sua cultura, a sua crença. Não a da minha raça. - respondo. - Nós não funcionamos assim, temos livre escolha. Já ouviram falar de livre arbítrio? Aonde que isso se encaixa nesse... nesse negócio de predestinação?

Jehan dá um passo para trás.

- Tudo bem, Elric. Talvez seja difícil de entender agora. - diz ele. - Eu entendo que temos medo ou receio quando estamos diante do novo. Mas não quero e não vou morrer definhando aos poucos por conta de um amor. Há dias atrás eu não suportaria estar perto da família real de Ayllan, depois de tantas histórias, tantas atrocidades... acredito que tudo tem um propósito, Elric. Só não sabemos a hora que as coisas certas vão acontecer.

O silêncio cresce novamente entre nós dois. Engulo em seco, absorvendo as suas palavras. Se tudo o que Jehan diz for verdade e não estivermos apenas enlouquecendo com hormônios presos em nossos corpos... isso significaria que... o que significaria? Sei que não é hora de pensar em política, mas com Jehan sendo rei de Bellario e eu futuro rei de Ayllan, como isso se configura? Depois de uma longa história de rivalidades e batalhas e guerras... o que vai ser agora? Uma batalha contra o destino?

"Eu sinto o que você sente"

Escuto a voz de Jehan, mas a boca dele nem se abriu.

- Como você fez isso? - pergunto. - Saia da minha cabeça!

- É involuntário. - responde Jehan. - É... é a nossa conexão, Elric.

- Isso é loucura...

O céu se ilumina e segundos depois ouvimos o barulho do trovão. É involuntário, mas Jehan e eu nos encaramos. Ele sorri, o que me faz sorrir sem realmente querer.

- Bem... - ele troca o peso do corpo entre os pés. - É melhor... hã... eu...

- É... - concordo e fica nisso, mas não saímos do lugar.

- Bem... - volta ele, mas as gotas de chuva começam a cair entre as folhagens, Jehan olha ao redor, assim como eu, para o cavalo que eu trouxe, que está perto, ele tem muito medo de trovões. - Acho melhor procurarmos algum lugar até pelo menos um pouco dessa chuva passar.

- É. - respondo. - Tem razão.

Ele assente. Pego as rédeas do meu cavalo e o trago na minha direção. Caminho atrás de Jehan e o seu cavalo alado em direção seja lá qual lugar seja.

- Aqui perto tem umas grutas. - responde Jehan ainda na frente enquanto a chuva aumenta torrencialmente a nossa volta. - Não sei bem se esse é o nome do lugar, mas dá para nos protegermos por lá.

Em silêncio o sigo não por muito tempo mas até um pequeno paredão com uma entrada. E já sinto que estamos em território feérico.

- Relaxa. - diz Jehan, talvez sentindo o que eu senti? - Nem todas as cavernas feéricas tem dragões. - ele ri.

Dou um meio sorriso enquanto entramos na boca da caverna. O interior tem um pequeno túnel, escuro, para depois encontrarmos uma espécie de salão de pedra natural... com um buraco no teto da caverna que faz com que a luz natural entre, e na metade da caverna até o outro lado uma água cristalina brilha enquanto a chuva entra pelo buraco no teto da caverna.

- Uau! - solto.

- É... - concorda Jehan. - Bellario tem as suas belezas, Elric.

- E você disse que tem outras? - pergunto.

- Eu disse que nem todas têm dragões. - responde ele. - Mas a maioria das cavernas em Bellario são assim. Com frio?

- Hum... - começo e ele sorri.

- Eu sei que você está. - Jehan solta as rédeas do seu cavalo e caminha até um canto da caverna aonde pega uns gravetos, que não faço ideia de como entraram aqui, e amontoa todos entre nós dois. Fica de pé e aponto a mão, em segundos uma pequena chama surge em sua mão e passa para os gravetos e a pequena fogueira se acende. - Obrigado. - diz ele depois de um tempo em que nós dois estamos em silêncio.

Ele se senta em frente ao fogo. Solto as rédeas do meu cavalo, que vai até o cavalo de Jehan. Olho para o rei feérico.

- Eu pensava que você comia os bebês de vocês vivos. - digo.

- Que horror! - ele diz enojado. - Eu tenho medo das histórias que contam sobre o povo feérico no reino humano.

- Eu nem imagino o que contam de nós em Bellario. - digo.

- Trabalhamos com a verdade, Elric. - diz Jehan sorrindo.

Sorrio também e olho para o fogo, que parece mais vivo do que se tivesse sido feito da forma "natural". Olho de relance para Jehan e lembro do que ele disse: "É involuntário. É... é a nossa conexão, Elric."

Engulo em seco e tento fazer a mesma coisa.

"Com a verdade no estilo acusar minha família de ter matado o seu pai, o rei Vlad?"

Jehan sorri e ergue o olhar na minha direção.

- Pode perguntar isso em voz alta. - diz ele.

- Mas...

- Eu disse. - responde Jehan. - Sentimos o que o outro sente e podemos conversar assim, para casos de como... você está em Forte Redthorn e eu em Porto Larkin, é uma forma de nos comunicarmos.

Assinto. E o barulho da chuva preenche o nosso silêncio dessa vez. Levanto meu olhar e lá está ele, mais uma vez me olhando. Ele se levanta devagar e depois caminha devagar para mais perto de mim. Ele se senta ao meu lado, bem próximo mesmo de nossas coxas se tocarem. Ele suspira e sua cabeça descansa no meu ombro.

- Acho que essa chuva vai demorar. - digo, sentindo o meu coração batendo loucamente dentro do meu peito.

- Vai. - responde ele e vejo que ele encara o fogo. Suspiro e quanto mais a pele dele está contra a minha, mais eu sinto meu coração enlouquecido e mais o meu pau luta para ser liberto das minhas roupas de baixo.

࿇ ══━━━━✥◈✥━━━━══ ࿇

Jehan Larkin

O silêncio ao nosso redor se faz cada vez mais presente e só é possível escutar o barulho dos pingos de chuva se chocando com a água cristalina do lago no centro da gruta. Aperto meu robe ao redor do meu corpo, me sentindo arrepiar pelo frio. É até estranho estar aqui com minha cabeça no ombro de Elric, mas também parece tão certo.

Meu coração ainda bete acelerado em meu peito e sentir seu cheiro tão próximo de mim, me causa sensações ainda desconhecidas. Eu sei que tudo isso é o chamado de predestinados que cresce ainda mais dentro de nós dois. E não adianta fugir, tudo isso ficará ainda pior... O que me causa medo. Apesar de saber que ficar com Elric é o certo, eu também sei que nossas famílias jamais vão nos apoiar.

Solto um suspiro e fecho meus olhos, me sentindo ainda mais perdido em meio a todos esses sentimentos. Aproveito o silêncio ao meu redor e tento esvaziar minha mente, pensando em outras coisas.

- Eu não tenho mais certeza se realmente foi seu pai quem matou o meu. - Falo quebrando o silêncio e abro meus olhos, me afastando um pouco dele para olhar ele melhor.

Elric fica em silêncio por alguns segundos e então fixa seus olhos nos meus.

- Então por que tudo aquilo e a guerra? Muitos homens e mulheres morreram, Jehan... Inclusive feéricos. - Ele diz sério e me encolho um pouco com seu tom de voz.

- Eu não sei... Acho que estava sob um tipo de feitiço. - Falo sincero, mas escuto uma risada amarga vinda dele.

- Está brincando comigo? - Ele pergunta e isso me enfurece.

Me afasto ainda mais dele e me coloco de pé, apertando minhas mãos em sinal de raiva.

- No seu mundo pode não existir magia, mas no meu existe e muitas vezes ela é usada para o mal. Se eu ainda tivesse tanta convicção de que foi rei Guiscard quem matou meu pai, mesmo com essa merda de chamado eu estaria longe de você. Eu podia não ser tão mais próximo ao meu pai, mas eu o amava e ele também, à sua maneira. E então ele foi tirado de mim... Foi eu quem o encontrou morto, Elric! - Deixo toda minha frustração sair em forma de palavras gritadas, sentindo meu peito se apertar.

Ele não diz nada e isso é o suficiente para que eu me afaste dele. Ando em passos lentos até o lago que há em minha frente e sinto meus olhos arderem pelas lágrimas presas neles.

A cada instante uma angústia maior cresce em meu peito. Está tudo acontecendo ao mesmo tempo e não sei para onde correr. E piorando tudo ainda tem o fato de que eu sou o rei de Bellario, o que me deixa com um peso ainda maior sobre os ombros. Desde o momento em que meu pai morreu, a responsabilidade de toda uma nação ficou sobre as minhas costas e até agora eu só agi de forma errada. Aquela guerra idiota deixou o sangue de muitos inocentes em minhas mãos.

Agora tem o fato de que eu tenho um predestinado que não gosta nenhum um pouco de mim e acha que sou um mentiroso sádico. Mas eu realmente acho que estava sob o efeito de algum feitiço de manipulação, pois normalmente eu sou mais prudente, ainda mais para convocar uma guerra. Quem me conhece sabe que sou uma das pessoas mais medrosa que existe, esse era um dos motivos de constantes brigas entre mim e pai Vlad, que tinha convicção de que eu não seria um bom rei e seria um príncipe covarde. Bem, ele não estava errado.

Sinto uma lágrima descer por minha face e não faço nada para impedir seu curso. Meus olhos se focam na água cristalina do lago e vejo meu reflexo ali refletido, graças ao vários diamantes que emanam seu brilho na água. E olhando para mim mesmo, eu sinto vergonha do homem que sou hoje... Queria apenas honrar meu pai, mas fiz tudo o contrário.

- Eu acredito em você! - A voz rouca e grave diz atrás de mim e me viro, vendo Elric parado a apenas um passo de mim.

- O que? - Pergunto e passo minha mão por minha bochecha, a sentindo úmida pela lágrima.

Seus olhos se prendem aos meus e parecem ver através de mim, o que faz um arrepio percorrer meu corpo.

- Disse que acredito em você, realmente não faz sentido tudo o que aconteceu. E mesmo sem te conhecer direito, eu já percebi que você não é uma pessoa sádica, que gosta de ver apenas a destruição... Você é um feérico diferente. - Ele diz e essas palavras me causam um sentimento estranho de alívio.

- Obrigado! - Falo baixo.

- Não precisa agradecer, eu que peço desculpas. - Ele diz e quebra a distância entre nós dois, fazendo minha respiração travar ao sentir ele tão perto. - Eu ainda estou confuso com tudo isso. Nós humanos não temos essa coisa de predestinados e sentir essas coisas agora estão me enlouquecendo. Ainda tem o fato de que nossas famílias se odeiam. Estou tão perdido quanto você, Jehan. - Ele diz e suas palavras soam sinceras para mim.

Respiro fundo e pego em suas mãos, sentindo sua pele mais grossa em contato com a minha. Nossos olhares permanecem conectados e sinto meu estômago gelar.

- Nós podemos nos achar juntos. - Falo e não ligo se minhas palavras soam bobas.

Eu sei que jamais vou conseguir viver sem Elric. A partir do momento em que encontramos nossos predestinados, o chamado vai nos controlar até que nossa ligação esteja completa e caso ele me rejeite, eu não tenho escolha a não ser literalmente morrer de amor. Por mais que eu não ame Elric nesse momento, esse sentimento será inevitável, pois agora ele é essencial para mim.

- Sabe que não podemos de verdade. - Ele diz e suas mãos deixam as minhas.

- Não podemos, ou você não quer? Eu estou disposto a lutar por isso. - Falo e aponto para nós dois. - Mas se você não quer, me negue agora... Diga a mim que jamais ficará comigo, Elric! Quebra a nossa ligação! - Peço, elevando meu tom de voz.

Vejo suas expressões endurecem e é como se seus olhos estivessem em chamas. Sinto meu peito comprimido e uma dor quase física me atinge. Espero ele dizer as palavras que vão me destruir para sempre, mas elas não são ditas. Ao invés disso ele me puxa para seus braços e toma minha boca com selvageria.

Não consigo ter outra reação a não ser corresponder seu beijo e colocar minhas mãos em seus fios longos e grossos. E sentindo sua boca junto da minha, eu tenho certeza de que Elric Redthorn é a minha total perdição.

༺═──────────────═༻

Olá jujubas!! Mais um pouquinho de Elric e Jehan para vocês. O que acharam??? Será que agora vai??

Bjus da Juh, até a próxima 😘😘

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top