Capítulo Treze

Ângelo Lima

Vejo Enzo passar por mim de cabeça baixa, caminhando com dificuldade por causa de sua perna e sinto meu coração se apertar. A imagem das suas cicatrizes não saem da minha cabeça e eu nunca vi alguém tão ferido daquele jeito. Mas eu não falo das cicatrizes, que são inúmeras, mas sim do seu olhar... O olhar de Enzo olhando para sua avó enquanto dizia que seu pai foi o causador de tudo o que houve com ele. Havia dor em seus olhos, mágoa, mas o que eu mais pude perceber foi a decepção. Essa história envolvendo seu pai não faz nenhum sentido para mim e sei que não irá fazer tão cedo. Só que eu vou descobrir tudo o que houve e vou fazer de tudo para que Enzo volte a ser quem era antes.

Eu não sei o que aconteceu para que ele tivesse essa explosão, mas eu quero ter o meu Enzo de volta. Me senti muito mal quando ele me tratou daquela forma grosseira há poucos minutos atrás, mas agora eu entendo que talvez não foi sua intenção e que teve um motivo maior por trás de tudo.

- Aquelas cicatrizes todas... Foi mesmo o próprio pai que causou nele? - Pergunto baixo, depois de alguns minutos em silêncio e dona Emília balança a cabeça em negação para mim.

- Me desculpe querido, mas não posso falar sobre isso. É um assunto dele e só cabe a Enzo te dizer tudo. - Ela diz e se aproxima de mim.

- Tudo bem, mas por que ele está assim? Ele até foi rude comigo por nada e Enzo não é assim... Ele é uma das melhores pessoas que eu conheço. - Falo confuso e ela abre um pequeno sorriso para mim.

- Ele é sim, mas até as melhores pessoas têm seus momentos de fraqueza. O que importa é não desistir delas. - Ela diz e me olha de uma forma diferente.

- O que quer dizer com isso? - Pergunto em confusão.

- Eu sei que gosta dele, eu vejo o jeito como o olha. - Ela diz e sinto minha garganta secar.

- Não, a se...

- Não queira me enganar e não se engane também. Eu não vou interferir na vida de vocês, mas eu quero que escute um conselho... Se você sente algo pelo meu neto, mesmo que seja algo ainda pequeno, não desista dele, mesmo que ele tente te afastar. Enzo já sofreu tanto na vida, que acabou criando uma barreira para se defender e também acredita que ele não pode ser amado por ninguém. Ele já foi muito enganado e hoje desconfia de tudo e todos. Mas eu sei que você é a cura para tudo isso, pois ele também gosta de você e eu vejo isso nitidamente, ele só tem medo de arriscar e sofrer ainda mais. - Ela diz e sinto meu coração acelerar em meu peito com a menção que ela faz de que Enzo gosta de mim também. Acho que ela está vendo coisas onde não tem. - Ele se vê como alguém indigno de amor por causa de sua aparência agora, o que é uma total mentira pois amor não é a beleza de uma pessoa. Amor vem da alma e não do quanto uma pessoa é bonita. Eu sei que você não se importa com as aparências, então mostre isso a ele, mostre que ele é um homem digno de amor, assim como qualquer outro. - Ela termina e solta minhas mãos, que eu nem percebi que ela segurava.

- A senhora acha mesmo que ele gosta de mim? Nos conhecemos há tão pouco tempo. - Falo apreensivo e vejo o sorriso crescer em seu rosto.

- E esse tempo foi o suficiente para você se apaixonar, não foi? - Ela deixa a pergunta no ar e sinto meu rosto queimar em vergonha.

- Não precisa ficar com vergonha querido, o amor é um sentimento tão lindo. Agora venha comigo, vamos pedir um jantar especial para essa noite, quero comemorar que meus dois netos entraram na faculdade. - Ela diz contente e me segura pelo braço, nos guiando para fora do escritório bagunçado de Enzo.

- Netos? - Pergunto baixo, sentindo meus olhos queimarem pelas lágrimas de emoção.

- Sim meu anjo, você e Maria Júlia. - Ela responde e deixa um beijo em minha bochecha.

Abro um sorriso, me sentindo um pouquinho mais completo com essa conversa que tive com dona Emília, ou agora... vó Emília. Eu me sinto ainda destruído por ter perdido meu pai, a pessoa que eu mais amava e ainda amo no mundo, mas toda essa dor está sendo um pouco amenizada agora, pois eu acabei encontrando uma nova família e também um amor. Mesmo que eu ainda não saiba se esse amor se tornará real como eu quero.

* * *

Bloqueio meu celular, assim que termino minha ligação com Castiel. Acabei ligando para ele, o convidando para o jantar que dona Emília quis fazer. Mas eu sinto que para a minha felicidade ser completa, Enzo tem que estar bem e também presente nesse jantar.

Já faz mais ou menos duas horas desde que tudo aconteceu e ele ainda está trancado em seu quarto. A minha vontade é de ir até lá e conversar com ele da maneira como sempre fazemos, de uma forma alegre e despreocupada. Mas ao mesmo tempo que eu quero ir, eu sinto medo... Medo dele não me querer por perto.

Deito minha cabeça em meu travesseiro e fecho meus olhos, soltando um suspiro cansado. Eu me sinto frustrado diante de toda essa situação, pois a única coisa que eu quero é ele feliz, mas parece que essa missão é algo impossível.

"Se você sente algo pelo meu neto, mesmo que seja algo ainda pequeno, não desista dele, mesmo que ele tente te afastar"

As palavras de dona Emília ecoam pela minha cabeça e na mesma hora eu sei o que fazer.

Me levanto da cama rapidamente e descalço saio do meu quarto, seguindo em direção ao de Enzo, que fica no fim do corredor. Assim que chego em frente a sua porta, ainda fico parado por mais alguns minutos, até a coragem se apossar de mim novamente. Deixo duas batidas na porta e espero por uma resposta, mas ela não vem. Solto um suspiro e resolvo abrir a porta sem permissão mesmo.

Entro em seu quarto e a primeira coisa que noto é a escuridão ao meu redor. Não vendo quase nada, passo a mão pela parede até encontrar o interruptor. Acendo as luzes e logo tudo entra em meu foco, mas meus olhos se desviam para cama, onde encontro Enzo deitado e ao que parece está dormindo.

Fecho a porta atrás de mim e entro ainda mais no cômodo. Vejo um espaço na cama ao lado de onde Enzo está deitado e meu corpo se guia no automático até lá, me sentando ao seu lado.

Meu olhar se prende em seu rosto sereno e não posso deixar de admira-lo. Enzo é totalmente perfeito, mesmo com suas "imperfeições". Meus olhos mudam de foco e são guiados ao seu peito nu. Ele está sem camisa e é possível ver todas as cicatrizes de mais cedo. Seu corpo meio virado na cama também me possibilita ver várias outras marcas em suas costas, a maioria delas sendo grossas e espessas. Algumas estão em um tom esbranquiçado, quase parecido com seu tom de pele, mas várias outras são rosadas.

O que aconteceu para ele ter todas essas marcas em seu corpo? Faço essa pergunta a mim mesmo e não encontro nenhuma resposta para ela.

Minha mão ganha vida própria e elas vão em direção a suas cicatrizes, que parecem riscos feitos em um papel em branco. Sinto a textura delas sob meu toque e simplesmente não consigo parar de traçar as marcas espalhadas por sua pele.

- O que está fazendo aqui? - Escuto a voz rouca perguntar e minha mão trava no lugar onde está.

Guio meus olhos até seu rosto e vejo seu olhar intenso sobre mim, só que agora ele não possui raiva como há algumas horas atrás.

- Eu vim ver como está. - Falo quando recupero a minha voz.

Ele não me responde e se afasta um pouco de mim na cama. Vejo ele pegar o lençol e o enrolar em volta de seu corpo, para esconder as marcas de mim.

- Você não precisa se esconder de mim, Enzo. - Falo olhando para ele, que desvia seus olhos de mim.

- Você não deveria me ver assim. - Ele diz e sinto a insegurança em sua voz.

- Por que não? - Pergunto com meus olhos ainda fixos nele.

- Porque eu não queria que visse o quão destruído eu sou, o quão destruído eu fiquei. - Ele diz com incerteza.

Subo ainda mais em sua cama e me aproximo dele. Vejo seu olhar incerto sobre mim e em um movimento rápido tiro o lençol que envolvia seu corpo e me abraço a ele.

- Você não tem que se esconder de mim Enzo, você é lindo... Por que não vê isso? - Sussurro em seu ouvido e sinto ele ficar rígido enquanto tem meus braços ao seu redor.

- Você não sabe o que diz. Eu já fui um homem bonito, mas hoje não sou mais. - Ele diz duro, mas isso não me afeta. Eu sei o que eu quero e vou lutar por isso.

Desfaço meu abraço e me afasto dele aos poucos. Prendo meus olhos aos dele, levo minha mão direita ao seu rosto e traço as duas cicatrizes que há ali.

- Eu não ligo para essas marcas, isso não importa. O que importa de verdade é o que você é por dentro. E mesmo nos conhecendo há pouco tempo, eu sei o homem incrível que você é... O homem incrível pelo qual me apaixonei. - Confesso e vejo que seus olhos se arregalam.

- Sim, eu me apaixonei por você Enzo. Na verdade, acho que me apaixonei no instante em que te vi parado na porta da cozinha. Você, mesmo estando distante de tudo, me acolheu e tomou a responsabilidade de cuidar de mim. Você me ajudou no momento em que mais precisei de alguém e você simplesmente me conquistou. Eu me apaixonei pela sua alma, me apaixonei pela sua bondade, me apaixonei pelas suas cicatrizes, pelos seus medos, pelas suas inseguranças... Eu só me apaixonei por você. - Falo o mais sincero que posso, para que ele acredite em minhas palavras.

- Você não pode ter se apaixonado por mim, não assim... Desse jeito. - Ele diz desnorteado.

- Você é um homem assim como qualquer outro e eu seria um bobo se não me apaixonasse por você. Mas eu sei que você não deve gostar de mim da mesma forma, afinal de contas eu sou só um garoto ainda e existem tantas pessoas por aí mais experientes que eu. Tudo bem, eu me contento por enquanto com isso, mas saiba que quando eu quero uma coisa, eu não desisto fácil, então tenha em mente que eu não vou desistir de você. Até porque meu sonho sem... - Não consigo terminar a minha fala, pois sinto outros lábios se juntar aos meus, me calando.

Fecho meus olhos e aproveito a sensação de ter a boca de Enzo na minha. Passo meus braços por seu pescoço e sinto sua língua pedir passagem para minha boca. Ele aprofunda nosso beijo, que antes era apenas um toque e sinto seu gosto se misturar ao meu. Nosso beijo é calmo, mas a mesma medida também é voraz. Não sei quanto tempo permanecemos no beijo, mas nos separamos quando o ar se faz necessário.

Abro meus olhos e eles se conectam ao dele. Sinto um sorriso se formar em meu rosto e deixo mais um selinho em seus lábios.

- Eu também estou apaixonado por você, mas ainda tenho medo de me entregar novamente. - Ele diz e sinto a apreensão em sua voz.

- Não sinta medo, só me deixe amar você e curar suas feridas. É somente isso que eu te peço.

- Você não se importa? - Ele sussurra, se referindo ao seu "estado atual".

- Nenhum pouco! - Respondo e deixo um beijo bem em cima da sua cicatriz maior.

- Então... Talvez eu possa tentar. - Ele responde e meu sorriso se torna maior ainda. Junto meus lábios aos seus novamente e sinto meu peito se encher de felicidade e um pouquinho mais de amor.

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3/4

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