Capítulo Dez
Enzo Miller
Escuto uma batida na porta do meu quarto e logo após, vejo minha avó passar pela porta. Ela me olha com preocupação, mas faço a minha melhor cara de que tudo está bem.
- Como está se sentindo? - Ela pergunta e se senta na poltrona perto da minha cama.
- Melhor. - Falo simples.
Hoje acordei sentindo muitas dores na minha perna, como há muito tempo não sentia. Então achei melhor ficar em meu quarto, já que não estou conseguindo andar normalmente.
- Acho que deveria voltar ao médico, faz muito tempo que não faz uma consulta. Você sabe que tem que cuidar de você mesmo, Enzo... Tem uma vida inteira ainda pela frente. - Ela diz com um olhar sério em minha direção.
- Às vezes eu queria não ter, sabia? Às vezes me dá uma vontade muito grande de apenas desistir de vez. - Falo e solto um suspiro, deitando minha cabeça no travesseiro.
- Então desista de uma vez, pare de lutar e deixe os demônios do seu passado controlarem a sua vida. Eu pensei que você já estivesse superando tudo, mas vejo que não. - Ela diz frustrada.
- Como superar tudo aquilo, vó? Eu tenho pesadelos todas as noites com ele, com eles. E eu me odeio por ser um fraco que não pode seguir em frente, mas eu sinceramente não tenho razão para fazer isso. - Falo sincero.
- Pensei que tivesse encontrado um motivo para lutar novamente, para voltar a ser o Enzo de anos atrás. - Ela diz e eu olho para ela confuso.
- Como assim? Não entendi o que a senhora disse. - Falo e me ajeito na cama para vê-la melhor.
- Você entendeu sim o que eu quis dizer, só quer enganar a si mesmo se fazendo de desentendido. - Ela diz e me lança um olhar duro. Desvio meus olhos do dela e olho para a grande janela a minha frente.
- Eu não posso me enganar novamente, não posso sofrer tudo de novo. - Falo e sinto meu peito se apertar.
- Você acha que Ângelo é igual a ele, Enzo? - Ela pergunta de forma dura.
- Não, ele jamais seria como ele. Ângelo tem uma alma boa, ele é doce, engraçado, tem um jeito só dele e ele não me olha como se eu fosse uma aberração. - Falo, pois essa é a verdade.
- Você gosta dele, meu amor, por que não se dê uma chance? Por que não encontra uma forma de voltar a viver? - Ela diz e eu balanço a cabeça em negação.
- Eu não posso fazer uma pessoa boa como Ângelo ficar com alguém como eu. Ele merece alguém bem melhor do que eu. E não é só porque ele me olha como igual, que ele quer alguém como eu. Eu não sirvo para ninguém. - Falo sério e escuto o suspiro alto que vem da minha avó.
- Tudo bem, eu não vou tentar fazer você enxergar o óbvio. Só espero que tome a decisão certa para a sua vida. - Ela diz e permanece um tempo em silêncio, até voltar a falar novamente. - Eu quero pedir a sua ajuda em algo. - Ela diz, me fazendo voltar a olhar em sua direção.
- Em quê? - Pergunto curioso.
- Ângelo tem o sonho de poder fazer uma faculdade, mas por enquanto não pode por falta de dinheiro. Eu me ofereci para pagar sua faculdade, mas ele se recusa a aceitar. Quero que você o convença de aceitar minha proposta, eu sei que ele confia em você. - Ela diz e sinto uma sensação boa quando ela diz que Ângelo confia em mim.
- Não sei se sou capaz de fazer isso. - Respondo para ela.
- Não tente me enganar querido, eu já vivi muitos anos, sei o que estou falando. - Ela diz e se levanta da poltrona. Minha avó vem até mim e deixa um beijo em minha testa. - Pense no que eu te disse, não feche os olhos para a sua felicidade. - Ela diz e sai do meu quarto.
Me deito na cama e foco meus olhos no teto, pensando em tudo que minha avó disse. Só que por mais que eu saiba que suas palavras estão certas, eu ainda tenho medo. Já faz duas semanas que Ângelo entrou na minha vida e desde então ele tem mudado algumas coisas em mim, que eu ao menos percebi. Mas eu não posso deixar ele entrar ainda mais na minha vida, pois eu já percebi que Ângelo pode causar um estrago bem maior em mim.
* * *
No dia seguinte eu acordo sem mais nenhuma dor e decido voltar a trabalhar. Saio do meu quarto e desço às escadas devagar, seguindo em direção à cozinha. Ainda é bem cedo e não vejo ninguém acordado a não ser dona Ana, que está fazendo café. Dos empregados da casa, ela é a unica com quem converso, além de Lucio, que é nosso motorista.
- Bom dia Ana! - Falo, assim que chego na cozinha e me sento na pequena mesa que há aqui.
- Bom dia menino, já está se sentindo melhor? Dona Emília me disse que estava sentindo dores ontem. - Ela diz de forma preocupada e abro um sorriso pequeno em sua direção.
- Já estou bem sim, obrigado por se preocupar. - Agradeço e ela me serve uma xícara de café preto, forte do jeito que eu gosto.
- Imagina menino, eu te vi nascer... Claro que vou me preocupar. - Ela diz de forma carinhosa.
Vejo a senhora voltar aos seus afazeres e começo a comer.
Escuto o barulho de passos se aproximando e quando levanto minha cabeça, para ver quem é, vejo Ângelo me olhando com um sorriso. Fico perdido em meio ao seu sorriso, até que sua fala me traz de volta a realidade.
- Bom dia, faz tempo que não te vejo. Bem, na verdade faz um dia, mas estava com saudades de falar com você. Fiquei até preocupado com seu sumiço, está tudo bem? - Ele solta e se senta na cadeira a minha frente, começando a se servir em seguida.
- Você sentiu saudades de falar comigo? - Pergunto devagar.
- Sim, você é uma boa companhia... Pelo menos eu gosto de estar com você. Apesar de você, na maioria do tempo, não falar muito, mas não tem problema, eu falo por nós dois, não é mesmo? - Ele diz sorrindo e minha cabeça quase dá um nó.
- É. - Falo, sem saber realmente o que dizer.
- Você não me respondeu. - Ele diz, depois de comer um pedaço de bolo.
- O quê? - Pergunto confuso.
- Se está tudo bem, foi isso que te perguntei assim que cheguei. - Ele diz, sempre sorrindo.
- Ah, sim está e com você? - Pergunto de volta.
- Estou bem, já estou me acostumando a tudo de novo que está acontecendo na minha vida. E eu agradeço a sua família por ter me acolhido tão bem, não é qualquer pessoa que faz o que vocês estão fazendo por mim. - Ele diz em um tom suave.
- Não precisa agradecer, nós fazemos de coração. Falando nisso, preciso te dizer uma coisa. - Falo, achando que agora é o melhor momento para falar com ele sobre a faculdade.
- O quê? - Ele pergunta curioso e me olha atento, esperando por uma resposta.
- Minha avó me disse que você tem vontade de cursar a faculdade, mas não quer aceitar que ela pague para você. Eu acho que deve aceitar essa oportunidade, pois é o seu futuro. - Falo sério.
- Eu não posso, vocês já estão fazendo muito por mim. Não quero que pensem que quero me aproveitar de vocês, pois essa jamais será a minha intenção. E meu pai me deixou um dinheiro, posso começar a faculdade depois dos 18 anos, sem problemas. - Ele diz e acho loucura ele pensar que vemos ele como um aproveitador. Ângelo está muito longe disso, ele é muito puro para ser uma pessoa suja, ao ponto de se aproveitar de outra como muitas pessoas por aí fazem.
- Minha família e eu jamais te veríamos como um aproveitador, sabemos que não é assim. Apesar de nos conhecer há pouco tempo, eu só vejo pureza em você e pode apostar que eu sei muito bem ler uma pessoa hoje em dia. Começar uma faculdade agora será uma boa para você, irá te ajudar a se distrair e você vai ter algo a fazer. Ficar em casa o dia todo não deve ser nada legal. - Falo olhando para ele.
- Mas você fica o tempo todo dentro de casa. - Ele diz com uma sobrancelha arqueada e deixo um sorriso pequeno se abrir em meu rosto.
- Nessa você me pegou, mas você é diferente de mim, Ângelo. Não tem que viver nas sombras como eu. - Falo, agora de maneira séria.
- Tudo bem, eu aceito que sua avó pague pela minha faculdade, mas tenho duas condições. - Ele diz e levanta dois dedos seus para representar sua fala.
- Quais são? - Pergunto com curiosidade, para saber o que se passa por aquela cabeça.
- Primeiro, assim que eu receber o dinheiro que meu pai me deixou, vou pagar para a sua avó as mensalidades referentes a faculdade. E essa condição não está em discussão. - Ele diz de maneira incisiva. Ângelo é bem maduro para a sua idade.
- E a segunda? - Pergunto e ele me olha por um tempo antes de falar.
- Você terá que aceitar a minha amizade. - Ele responde e abre um sorriso inocente.
- Já falamos sobre isso. - Digo depois de um tempo.
- Não não, você apenas negou minha amizade e não me disse nem o porquê. Eu não sou nenhum monstro Enzo, só quero que possa confiar em mim, assim como eu confio em você. Jamais vou te fazer algum mal, pelo contrário... Eu quero te ajudar. - Ele fala e pega em minha mão que está em cima da mesa.
Olho para a sua mão na minha e percebo o contraste que uma dá na outra. A sua mão é menor que a minha e o tom de pele também é diferente, mas por incrível que pareça, elas ficam perfeitas juntas.
Volto a olhar para ele e vejo seu olhar de expectativa em minha direção. Eu sei que disse que não queria que Ângelo entrasse ainda mais em minha vida, mas acho que uma amizade não faz mal a ninguém. Além do mais, eu nunca tive um amigo de verdade depois de tudo, talvez eu possa ter um agora.
- Tudo bem, nós podemos ser amigos. - Respondo após longos minutos de silêncio e vejo o sorriso no rosto dele se tornar ainda maior. E com isso, sinto meu coração se aquecer. Talvez eu esteja tomando a decisão certa dessa vez.
⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊⚊
Olá jujubas!! Gente, esses dois ainda me matam de tanto amor. 😍❤ E então, o que acharam do capítulo??
Bjs da Juh 😘😘
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top