Capítulo Quinze

Eram duas da manhã. Eu estava sentado, dentro da carrinha negra, por sua vez estacionada a cerca de quinhentos metros do armazém que servia de sede para o...negócio de Frost. Caleb e mais dois dos nossos colegas tinham saído na hora anterior e espalharam-se pelos vários pontos de entrada, enquanto eu ficara para trás, a comunicar com eles e, juntamente com o melhor informático da esquadra, a observar as nossas câmaras e escutas. Tinham passado cerca de duas horas daquela monotonia e, contra o meu próprio instinto, eu sentia que algo estava errado. Deixara o meu telemóvel na esquadra, porque não precisaria dele para contactar quem importava – os polícias -, mas o meu cérebro estava constantemente a pensar no dispositivo. Quando dei por mim, já tinha desenvolvido toda uma teoria paranoica que só me faria mal.

- Estás muito irrequieto, Farrell. O que é que se passa? – John, o tal informático, comentou e olhou para mim. Apesar da sua expressão séria, comum a todos os polícias, os seus olhos castanhos estavam suaves.

Os meus polícias preferidos eram aqueles que o eram porque queriam honestamente proteger pessoas. Nos meus anos naquela carreira, passara por todo o tipo de pessoas: aquelas que só queriam poder, aquelas que gostavam da adrenalina, aquelas que tinham seguido os passos de antepassados e aquelas que se viram obrigadas a seguir aquela carreira por motivos maiores. No entanto, alguns de nós tinham motivos honrados: eu gostava de me incluir nesse grupo, mas não era sempre verdade. Eu era bastante egoísta, como polícia; não tinham sido raras as vezes em que dera prioridade a algo que me convinha, devido à minha família, ou que desprezara casos que me parecessem simples demais para aquilo que eu procurava do trabalho. Para não falar de que o meu motivo para ser polícia não tinha sido tanto um produto do meu desejo para proteger a minha família e melhorar o mundo à minha volta como para canalizar todo aquele instinto protetor em algo útil.

Culpava os meus pais.

Ainda assim, eu considerava-me um bom polícia e nunca abusara do meu poder. Bem, quase nunca abusara do meu poder – mais que uma vez tinha contornado as regras por considerar os motivos maiores que eu, mas isso não era propriamente condenável. Mas John, que raramente saía da frente do seu computador a não ser para casos que dependiam mesmo, mesmo dele e das suas habilidades, fazia muito mais que qualquer homem ou mulher mais musculado que ele. A partir das pontas dos seus dedos, ele protegia toda uma cidade; conseguia arranjar informação confidencial e importante e tudo isso porque sabia que, com a sua inteligência, conseguia fazer muito Bem. Eu admirava qualquer pessoa que soubesse que podia ajudar todo um mundo e o fazia.

- Tenho um pressentimento mau. – encolhi os ombros e passei a mão pelos meus cabelos, suspirando – Vês alguma coisa de suspeito?

- Até agora, não. – abanou a cabeça, voltando a focar-se nos ecrãs à sua frente.

- Exato.

- Não achas que estás só a ser paranoico? – inconscientemente, comecei a rir. As vezes que ouvia aquela pergunta deveriam servir-me como uma dica de que, de facto, eu era paranoico, mas já só me faziam rir.

- Foi a minha paranoia que nos trouxe aqui. Acho que, desta vez, temos de lhe agradecer.

John riu, mas não continuou a nossa conversa. Sorri, entretido pela capacidade única que um polícia tinha de ignorar e abstrair-se do que o rodeava, e abanei a cabeça. Em silêncio, continuámos a trabalhar em equipa, até que uma figura num dos ecrãs à minha frente chamou a minha atenção. Juntei as sobrancelhas e inclinei-me um pouco mais para a frente, para conseguir ver melhor, enquanto esperava não ter razão. Lexie dissera-me que o seu irmão tinha planeado ficar em casa do seu tio e até fazer o seu próprio jantar – um ótimo motivo de orgulho para mim, tendo em conta que eu era praticamente duas décadas mais velho e não tinha aquele tipo de motivação -, mas os meus olhos raramente me enganavam. Era Connor que estava a entrar no campo de visão de uma das câmaras, a caminhar na direção do armazém daquele que eu sabia ser o seu tio.

Praguejei.

- Caleb. – chamei, depois de clicar no botão que me daria contacto ao meu melhor-amigo – O Connor está a entrar no perímetro, avisa todos os outros.

- Miúdos estragam sempre tudo! – abanei a cabeça, mas soltei uma risada bem-humorada, apesar de tudo. – Não te preocupes.

- Não me obriguem a ir aí e fazer tudo sozinho! – Caleb terminou o contacto da forma mais impassível que eu conhecia até então, fazendo-me rir ainda mais. Ao meu lado, John abanou a cabeça e riu, suavemente.

Entretanto, John relatava ao nosso capitão o que estava a acontecer. O mais velho decidira ficar na esquadra e entregara-nos toda a responsabilidade naquela noite; eu só conseguia esperar que tudo corresse bem. A presença de Connor dificultava a nossa tarefa, mas todos os polícias que tinham sido recrutados para aquela missão sabiam quem ele era, sabiam que ele era um inocente. Depois de tudo, acreditava que ele só seria condenado a umas quantas horas de serviço comunitário, porque tinha cometido certos crimes, mas não seria castigado com muita severidade. Lexie sabia disso, Connor ainda não.

Quando Frost apareceu na mesma zona do armazém de sempre, eu soube que a hora da emboscada tinha chegado. Cabia-me a mim e a John dizer quando chegasse a altura mais apropriada, mas apenas depois do sinal do nosso detetive infiltrado. Hugh, o seu nome, estava a fazer-se passar por um membro de um outro gangue do outro lado do país e eu tinha de admitir que ele estava a fazer um ótimo trabalho. Já o conhecia há anos e quase acreditei nele. Avisei todos os meus colegas para se colocarem a postos, pelos intercomunicadores, e ouvi todos eles a sinalizarem a sua concordância de volta. Vi Frost a conversar com alguns dos seus homens, até que Connor apareceu no meu campo de visão; tentei adivinhar o que eles estavam a fazer, o que estavam a dizer. Queria que o adolescente saísse dali, mas sabia que era escusado. Teríamos de fazer a emboscada rápido, ou os nossos pontos de esconderijo seriam descobertos. Era um milagre ninguém ter dado um alerta para a nossa carrinha.

- É impressão minha ou ele tem uma faca nas costas? – John comentou, baixinho, como se estivesse a pensar para si próprio.

- Quem?

- O miúdo. – arregalei os meus olhos e olhei para onde o indicador do meu colega estava a apontar. Vi claramente Connor, com as mãos entrelaçadas nas suas costas, mas a segurar algo que parecia definitivamente uma faca. – Será que...

- Não, não, não. – e, agarrando no pequeno dispositivo que me permitia falar com todos os meus colegas, saí da carrinha a correr.

A única coisa que eu pensei foi que sabia que nunca conseguiria ter ficado quieto dentro da carrinha. E sabia que todos os meus colegas o sabiam também; apesar de trabalharmos juntos apenas há alguns meses, todos me conheciam há uns anos. Sabiam quão impulsivo e fiel ao meu instinto eu conseguia ser, por isso, quando eu avisei que teríamos de entrar rápido, mas que eu teria de entrar também, ouvi apenas grunhidos resignados. Nunca deixaria que algo prejudicasse o finalizar da nossa missão, mas também não deixaria que Connor fizesse o que eu achava que ele iria fazer. A minha pergunta era: porquê naquele dia? O que é que ele tinha descoberto que eu não sabia ainda?

Corri com toda a minha força, pedindo demasiado dos meus pulmões. O ar da rua era frio e parecia quase cortar a minha cara, mas eu não parei de correr até estar perto da entrada principal do armazém. Era arriscado entrar de rompante num sítio como aqueles, mas calculei que, se eles não magoaram Lexie quando ela apareceu em busca do seu irmão, também não me magoariam a mim. Do que eu conhecia do modus operandi do líder, era que ele preferia manipular e torturar as pessoas. Por muito que eu saísse dali ferido, ele nunca me magoaria sem primeiro saber o que eu queria dele – principalmente se já soubesse quem eu era e a importância que tinha para Connor e Lexie. Só esperava não estar errado nos meus preconceitos. Precisava de não estar errado.

- Agora, agora, agora! – murmurei praticamente contra a minha mão, que segurava o intercomunicador.

Tudo aconteceu demasiado rápido, como acontecia sempre. Quando a minha adrenalina disparava no meu sangue, eu tendia a focar-me demasiado nos meus movimentos e não tanto naquilo que eu estava a ver. Num momento, estava a empurrar com força a porta do armazém e, no outro, estava a fugir dos dois seguranças que Frost tinha plantado na sua entrada. As palavras de Caleb vieram à superfície – eu estava demasiado velho para tudo aquilo – e a primeira coisa que pensei foi que, depois de tudo aquilo, só queria dormir durante dez horas e sonhar com um mundo em que Frost já estava preso. Depois, provavelmente ficaria na cama até ter vontade de me mexer de novo. Todos esses pensamentos ocorreram enquanto eu corria, porque eu era um idiota que compartimentava tudo. Isso resultou em eu conseguir correr até à sala onde eu sabia que Frost estava, porque a planta do armazém estava fresca no meu cérebro, sem sequer sentir o esforço dos meus músculos.

Quando cheguei à sala, vi Connor a ser agarrado por dois homens musculados. Um deles era, ironicamente, o homem com quem me tinha cruzado no meu prédio. Ele olhou para mim, eu olhei para ele, e vi o mútuo reconhecimento em ambos os pares de olhos. Frost não demorou a agir; assim que reparou que um estranho tinha conseguido invadir a sua fortaleza, ordenou numa voz forte que eu fosse apreendido. Ninguém conseguiu chegar a tempo, no entanto, porque Caleb e os nossos colegas entraram, armados e preparados, na mesma sala onde eu já estava.

- Larga o rapaz, Frost. – ordenei, numa voz severa. Connor, ainda preso pelos dois homens, olhou para mim com olhos verdes gigantes. Resisti à tentação de olhar para ele e prometer que ficaria tudo bem porque, enquanto ele estivesse a olhar para mim, estaria bem. Desde que não se mexesse.

- Receio que não possa fazer isso, Steve. – semicerrei os meus olhos ao ouvir o meu próprio nome.

Os meus colegas continuavam a apontar as suas armas para os criminosos e a receber a mesma quantidade de armas apontadas na sua direção. O ambiente era tenso, eu sabia, mas não estava na minha natureza ser tão sério como os meus colegas. A minha natureza era sarcástica, animada e divertida, e nem um vilão como Frost me roubaria isso. Portanto, mais para o provocar que outra coisa, baixei a arma que segurava na direção do Connor Sénior – odiava pensar nele a partir do mesmo nome que o adolescente, mas achava a sua alcunha ridícula – e cruzei os meus braços. Levantei uma sobrancelha e encarei-o com toda a minha audácia.

- Porque não? Ambos sabemos que não o vais magoar. – encolhi os ombros, impedindo-me de sorrir. – Tudo isto é uma fachada. Eu sei que és incapaz de magoar a tua própria família e tu também o sabes. – ignorei o choque do mais novo, ao ouvir a nova informação – Também sei que o teu irmão e a sua mulher morreram a fugir de algo que tu causaste e que tens protegido os teus sobrinhos desde então. Larga o rapaz, Connor.

O mais velho olhou para mim, da cabeça aos pés, até que os seus lábios se deformaram num sorriso audaz. Continuei a fitá-lo, com os braços cruzados e a mesma sobrancelha levantada, embora estivesse a fazer bluff. A ideia surgira-me no exato momento em que estava a falar; a ideia de que Frost não pretendesse atacar Lexie e Connor, mas sim protegê-los. Afinal, ele estivera claramente a tentar proteger o seu irmão e a sua cunhada naquela perseguição que dera para o torto. A teoria que se formara no meu cérebro, enquanto eu corria e olhava para o homem de cabelos completamente brancos, era a de que ele quisesse controlar Connor, quisesse que ele fosse como ele. Podia estar errado, mas a forma como ele reagia dizia-me que os meus instintos tinham estado certos.

Só precisava de saber a razão de tudo aquilo, da prisão de Lexie, do recrutamento de Connor. De todos os crimes que ele fizera o seu sobrinho inocente cometer.

- Vê o que fizeste. – continuei a provocar, numa voz rouca e séria – O teu próprio sobrinho tentou atacar-te. Achas que era isso que o Norman iria querer?

Fui sobressaltado pela mão de Frost a sair do bolso das suas calças e de uma arma a sair de lá. Em vez de ele a apontar para mim, fez o inesperado e disparou para o teto. Um pó intenso caiu sobre nós.

- Não digas o seu nome. – avisou, numa voz calma e contida. Treinei a minha cara para ficar sem expressão e assenti, encolhendo os ombros. Era importante mostrar que ele não me estava a afetar.

A verdade era que, de perto, Frost não parecia muito mais que um velho revoltado com a sua própria vida. Os seus homens estavam presos aos meus e a única vantagem que ele tinha sobre mim era Connor, mas ambos sabíamos que, se ele o magoasse, seria para provar algo a si próprio e não porque realmente o queria. Do que eu tinha investigado, Connor estava sob a sua mira há alguns anos, embora só tivesse sido recrutado com catorze anos. Calculava que, quando Frost soubera que o seu sobrinho estava a tornar-se demasiado rebelde para o que eu seu pai gostaria, decidira intervir. Norman Williams – pai de Lexie e de Connor – não gostaria que o seu filho estivesse a levar a sua vida daquela maneira, mas gostaria que estivesse sob a influência do seu irmão? O maior criminoso da cidade?

- Larga o teu sobrinho. – pedi mais uma vez, numa voz ainda mais ameaçadora. Dei um passo em frente, embora recebesse como resposta a sua arma na minha direção. – De que vale toda esta farsa?

- Ele tentou atacar-me. – encolheu os ombros, e admirei a forma como, apesar do gesto, a sua arma não mudou de direção. – Família não ataca família.

- Tu fizeste dele um criminoso e atormentaste a sua irmã durante meses, acho que ele tem as suas razões. – encolhi os ombros – Porque não ser um tio normal? Porque não vir em frente quando o seu pai morreu?

- Eu morri primeiro. Connor Williams não existe.

- Mas eu estou a olhar para ele. – e olhei de relance para o adolescente que, apesar da sua posição comprometedora, achou força para revirar os olhos na minha direção. – E para ti, aliás.

Mais uma vez, tudo aconteceu demasiado rápido. Num momento, eu estava a provocar o maior criminoso da cidade e ele estava a ouvir-me e, com uma expressão sofrida, a dar-me confusão. No outro, um tiro ecoou pelo armazém e Frost caiu no chão. Olhei instintivamente para o seu corpo no chão e aproximei-me, para reparar que o sniper que disparou, apontou apenas para a sua coxa. Sorri, mas a partir daí tudo correu mal. Os homens de Frost decidiram quebrar a tensão que se tinha criado entre eles e lançar a primeira pedra metafórica. Quando dei por mim, por ter estado tão focado em Frost e no facto de ele estar no chão e longe da arma que tinha segurado, tiros ecoavam por todo o armazém. Connor caiu no chão, paralisado.

Corri até ele e envolvi-o com os meus braços, servindo como parede entre ele e tudo o que estava a acontecer. Com uma mão na sua cabeça, apertei-o contra o meu peito e impedi-o de se mexer, enquanto via os meus colegas a lutarem contra mais homens do que, geralmente, conseguiriam aguentar. Mas, nos olhos de cada um deles, vi a necessidade de terminar com aquilo tudo de uma vez, de acabar com a rede de manipulação que Frost tinha criado, de honrar os anos que a nossa esquadra passara a tentar acumular informação. Quem diria que o grande vilão seria apenas um tio demasiado protetor?

Mais uma vez, fui confrontado com a ideia de que as mesmas pessoas que tinham capacidade para o Bem, tinham-na também para o Mal. Era uma questão de escolha e por isso é que eu admirava tanto os polícias que, como John, faziam a sua escolha para protegerem a lei.

- Tu estás bem, tu estás bem... - repeti incessantemente, ao ouvido de Connor. Sentia-o a tremer contra o meu corpo. Apesar de, em muitas coisas, ele ser um rapaz incrivelmente forte, não deixava de ter quinze anos e de ter a ingenuidade típica da sua idade. – Eu estou aqui. Tu estás bem.

Seguiu-se o silêncio, quebrado apenas por grunhidos cansados por parte dos meus colegas. Levantei a cabeça para ver grande parte dos homens de Frost no chão e, apesar dos tiros, não se via sangue no chão. Assenti para todos eles, sem nunca largar Connor, e recebi um assentir de volta. Todos trabalhámos da mesma forma – da única forma, para mim: aquela que não magoava mais do que o realmente importante. Precisáramos de atacar Frost, para ele ceder, mas os seus homens conseguiam ser vencidos sem se derramar mais sangue. Era importante, como polícia, ter atenção ao limite que separava a lei da vontade de vingança. Éramos polícias, não estávamos acima das leis da humanidade.

- Vocês os dois estão bem? – ouvi Caleb perguntar, mas não respondi, apertei apenas Connor contra mim. – Steve?

- Estamos bem! – exclamei, por fim. – Acabou, Connor. Vou-me levantar, está bem?

Quando ele não respondeu, decidi fazer o trabalho pelos dois e levantar-me, segurando o seu peso também. Connor fez um esforço, ainda assim, de colocar força nas suas próprias pernas, e de olhar à volta. Os meus colegas estavam ocupados a algemar os criminosos que nos rodeavam e Caleb estava a caminhar na nossa direção, embora estivesse a olhar diretamente para Frost. O buraco causado pela bala não parecia muito fundo, mas impedia-o de se levantar e ele não era propriamente novo. Acreditava que doesse bastante. De qualquer forma, ele merecia um pouco de dor, depois de todo o pânico que causara à sua família.

- Fica perto de mim, está bem? Ainda vai demorar, mas a tua irmã acha que estás em casa, certo? – Connor assentiu, devagar, como se ainda estivesse a processar tudo. – Vá, acorda, miúdo. Onde está o meu adolescente sarcástico?

Connor não respondeu, mas olhou para mim com os seus olhos verdes um pouco enrugados por um sorriso suave. Assentiu. Assenti de volta e, depois de um dos polícias aparecer e garantir que tinham uma equipa a revistar todo o armazém e que bastava apenas voltarmos para a esquadra e reportar tudo, ajudei-o a sair do armazém. O ar gelado da rua causou-me um pequeno choque e reparei que teve o mesmo efeito em Connor, por isso apertei-o contra mim e aconcheguei-o contra o meu peito. Não me importava que ele estivesse a resistir um pouco, porque o importante era ele saber que eu estava ali, para ele. Não queria saber se ele tinha demasiado orgulho. Tinha passado por uma experiência traumática e eu não deixaria que ele me afastasse.

- Não achas um pouco ridículo? – questionei, determinado a trazê-lo de volta à realidade – Nos filmes, os vilões têm sempre aquele momento em que contam a história da sua vida, a sua razão para serem vilões. Hoje não tivemos nada disso.

- Steve...

- Eu acho ridículo. – levei a minha mão livre ao meu peito, continuando a andar – Tanto trabalho para ele cair no chão só com uma bala na perna. Ridículo. O pior tipo de vilões é aquele que só o é porque tem vinte homens musculados à volta dele.

- Steve. – Connor voltou a chamar, numa voz mais séria. Parei de falar, embora um pequeno sorriso ainda continuasse nos meus lábios. Perto da carrinha preta de onde eu saíra a correr, estava agora uma ambulância e vários carros decorados com as cores azuis e brancas da polícia. – Obrigado.

- Não tens de me agradecer, miúdo. – abanei a cabeça e sorri-lhe. – É o meu trabalho.

- Cala-te.

- És demasiado parecido à tua irmã quando me mandas calar. Começa a ser um bocado sinistro, não te vou mentir.

Antes que Connor pudesse retorquir com algum insulto ou sarcasmo, um enfermeiro aproximou-se de nós, com um cobertor, e indicou-lhe que o seguisse. Empurrei-o suavemente e prometi estar por perto. Quando me encontrei longe o suficiente do adolescente para poder assimilar tudo o que tinha acabado de acontecer, comecei a rir. Tapei a minha cara com as minhas mãos e abanei a cabeça, rindo até que senti o meu coração a apertar com todos os nervos que não me deixei sentir na última meia hora. Eu tinha mesmo confrontado Frost com a verdadeira razão de fazer tudo aquilo aos seus sobrinhos – tinha-o confrontado com o facto de ele ser tio da minha Lexie e do meu Connor.

- Enlouqueceste de vez? – ouvi o meu melhor-amigo perguntar e levantei finalmente a cabeça. Respirei fundo e endireitei a minha postura. – Como está o miúdo?

- Abalado. – respondi, uma voz pesada que me soou estranha. – Pareço-te louco? Acho que estou um bocadinho – aproximei o meu polegar do meu indicador – louco.

Caleb revirou os olhos, mas deu dois passos em frente e abraçou-me com força. Eu adorava abraços, desde que as minhas irmãs nasceram e Mia recusara-se a ser acarinhada com beijos e preferira sempre abraços. Lembrava-me de ela estar sempre a abraçar Ava e a mais alta das duas, com os seus grandes olhos azuis, olhar para mim e sorrir. Como se soubesse o que a sua irmã estava a pensar e concordasse com ela – abraços eram a melhor forma de mostrar carinho. Lembrava-me de os meus pais terem começado a abraçar-nos, ao chegarem a casa, porque era mais fácil do que tentar beijar a testa de cada uma das gémeas. Aquilo ficara tradição. Na nossa família, nós abraçávamo-nos.

Ainda assim, o abraço do meu melhor-amigo soube melhor que o costume. Apertei-o com a mesma intensidade com que ele me apertou e senti, em ambos os nossos peitos, o alívio de um caso bem-sucedido.

- Olha para ti, a ser um urso de peluche gigante. Quando o meu próximo sobrinho nascer, ofereço-te. – Caleb bateu com força nas minhas costas, mas ouvi o seu riso grave.


não vou mentir, tenho demasiada vontade de escrever uma história para o Caleb no futuro lmao

MAS ISSO É IRRELEVANTE

eis o meu disclaimer do costume: eu não sou muito boa a escrever cenas relacionadas com crime, e super vilões e etc, mas acho que fiz um bom trabalho em ver tudo da perspetiva do Steve. a parte em que ele começa a rir é 10/10 para mim, faz-me sempre rir imenso e é isto que eu gosto nesta história

anyway, espero que, ainda assim, tenha conseguido fazer um vilão com motivações minimamente credíveis. no próximo capítulo vai-se perceber um bocado melhor, mas a verdade é que, muitas vezes, só a pessoa percebe a sua lógica

espero que tenham gostado e muito obrigada a toda a gente que tem começado a ler esta história, nos últimos dias <3

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