12 - Oscilando
O tempo parecia não passar. Perdi a conta de quantas vezes andei de um lado para outro em minha sala naquela tarde. Saber que Pete estava tão perto, mas provavelmente com raiva e não querendo me ver era angustiante.
Eu não parava de comer. Quanto mais ansioso ficava, mais comia e mais andava de um lado para outro. A irritação me deixava tão tenso que tentar me distrair, relaxar ou trabalhar era impossível.
— Charlotte? — chamei minha secretária, indo até a mesa de trabalho dela.
— Sim?!
— Você sabe se o Pete já foi embora?
— Não, mas posso checar se o senhor quiser.
Apertei os lábios e balancei a cabeça.
— Deixa pra lá.
— Sr. Nivans, confirmo com o Phillip o jantar? Fiz as reservas para as dezenove e trinta.
Cocei a nuca e suspirei. Eu não sabia se queria ter aquele tipo de aproximação com Phillip, pois sabia que ele esperava coisas que eu não poderia dar. Por outro lado, eu queria manter a farsa, pois provavelmente eu sairia daquela realidade mais cedo do que mais tarde e o verdadeiro Klay teria sua vida de volta.
— Pode confirmar, Charlotte — autorizei, já arrependido. — Me avise meia hora antes e chame um Uber para me levar até lá, tudo bem?
Minutos depois de entrar em minha sala, ouvi a voz do Pete do lado de fora. Ele estava conversando com a Charlotte, mas não consegui ouvir de que assunto se tratava. Esperando que ele entrasse em minha sala para mostrar o trabalho do dia como costumava fazer, arrumei minha mesa e desliguei o computador depois de salvar os arquivos de trabalho. Estava quase na hora de eu ir encontrar com o Phillip no restaurante, mas eu cancelaria se fosse necessário.
Meu coração acelerou quando bateram na porta. Levantei da minha mesa, arrumei minhas roupas, passei a mão em meu cabelo e conferi se meu hálito estava agradável.
— Entra! — exclamei, esperançoso.
— Desculpe atrapalhar, Sr. Nivans — disse Charlotte, entrando na sala.
— É Klay, Charlotte — resmunguei, decepcionado. — Por que você bateu na porta?
— Porque achei que o senhor estava ocupado — respondeu, me entregando a pasta do Pete. — De qualquer forma, só vim te entregar isso. É o trabalho de hoje do novo fotógrafo.
Aquela era a prova de que ele não queria mais me ver.
— O que ele disse, Charlotte? Ele perguntou por mim?
— Hãn... Ele disse que era para entregar as fotos de hoje para o senhor e que era para eu devolver amanhã com o seu parecer.
— E ele já foi embora?
— Saiu com pressa, Sr. Nivans.
Não havia nada que eu pudesse fazer. Pete me odiava e tentar contornar aquela situação era complicado. Eu me sentia mal por ter feito o que fiz, mas na hora não deu para controlar... Eu o amava demais e estava com muita saudade.
Cheguei ao restaurante onde tinha um encontro com o Phillip as dezenove e quarenta. Ele estava me esperando em uma das mesas mais afastadas e aparentemente mais caras do lugar. Meu namorado indesejado havia trocado de roupa e estava mais bonito do que de costume. O olhar e o grande sorriso que ele deu quando me viu fez meu dia ficar um pouco menos amargo.
— Está atrasado, Sr. Klayton Nivans.
— O Uber demorou um pouco para me pegar no trabalho.
— Por que não veio dirigindo?
Balancei os ombros antes de sentar à mesa. Eu já estava cansando de ter que explicar aqueles detalhes.
— Vai querer o de sempre?
— O que é o de sempre mesmo?
— Ravioli com molho de cogumelos e petit gateau com sorvete de flocos, bebê.
— Parece ser uma delícia — comentei, sentindo meu estômago roncar e pegando o cardápio. — O que mais eles têm aqui?
— Sei que você está comendo muito bem, então pode pedir o que quiser hoje que é por minha conta — disse Phillip, levantando a mão para chamar o garçom.
Pedi quatro pratos diferentes e não me importei com o que meu namorado indesejado ou qualquer outra pessoa fosse pensar. Também pedi cinco sobremesas do cardápio, pois elas pareciam pequenas demais e provavelmente não matariam minha fome.
— Faz tempo que não temos um encontro, bebê.
— Faz?
— O trabalho e a rotina diária fazem a gente ter que transar no escritório ou a noite no seu apartamento. Faz tempo que não saímos para jantar, ver um filme no cinema ou só passear por aí.
— A gente fazia muito isso?
— Calma! Não faz tanto tempo assim para você esquecer, tá?
Eu já estava na quarta sobremesa, mas ainda com muita fome. Eu sabia que aquilo não era normal e que tinha algo errado, mas até então ignorava por pensar que fosse ansiedade, estresse ou qualquer outra coisa relacionada àquela realidade. Comecei a me preocupar por ver que tinha comido quatro pratos e quatro sobremesas diferentes, mas meu estômago parecia continuar vazio.
— Klay, você tá bem?
— Hãn? O quê?
— Você parece pálido, bebê.
Phillip colocou a mão em meu rosto e em minha testa, mas não senti seu toque. A fome parecia crescer e senti minha boca ressecar por um instante. Tive que beber uma taça cheia de água.
— Você se sente bem, Klay?
— Sim, Phillip...
"Desculpe, mas você passou à minha frente" disse uma voz em minha cabeça. Estranha, porém familiar.
— O quê?! — questionei, um pouco atordoado.
— Klay?! Oi?! — chamou Phillip, pegando e apertando minha mão.
Eu conseguia senti-lo novamente.
— Você disse alguma coisa? — perguntei, procurando a origem daquela voz.
— Perguntei se você se sente bem. Você está pálido e um pouco distante.
— É só cansaço.
Phillip levantou a mão para pedir a conta. Ele ficou preocupado, pois eu estava pálido e um pouco tonto, mesmo depois de comer toda aquela quantidade de comida. Ele pensou que fosse o excesso e que eu tinha exagerado nos pratos, mas eu tinha uma ideia do que aquela indisposição se tratava... Era o corpo daquele Klay e a minha alma reagindo àquela troca de realidades.
Quando Phillip e eu saímos do restaurante, ele me conduziu com cuidado até o estacionamento. Meu carro estava lá, o que me deixou um pouco confuso.
— Meu carro?
— Algo errado, Klay?
— O que meu carro faz aqui?
— Você o deixou comigo hoje, lembra?
Eu não conseguia lembrar. Parei para pensar por um segundo e pequenas coisas que eu tinha feito de manhã e nos dias anteriores estavam desaparecendo da minha mente.
— Ontem você passou a noite comigo, certo?
— Sim.
— E o que fizemos hoje de manhã?
Ele estranhou a pergunta.
— Acordamos, tomamos banho, café da manhã no seu apartamento, tivemos uma pequena discussão com um dos seus vizinhos, você me emprestou o carro para te levar pra loja, passamos na cafeteria que você gosta para tomar um segundo café da manhã...
Eu não lembrava da metade daquelas coisas. Minha cabeça estava girando. Tive que encostar no carro e respirar fundo para não cair.
— Klay? — chamou Phillip, ainda preocupado. — Você está bem? Vamos ao médico?
— Não, tudo bem! — exclamei, forçando um sorriso. — Como eu disse, estou cansado e estressado com o trabalho.
— Vamos tirar uns dias? — sugeriu, abrindo a porta do carro. — Que tal viajarmos antes de sair a próxima coleção da KN Store?
— Conversamos sobre essa possibilidade depois, tudo bem?
Phillip foi cuidadoso, carinhoso e atencioso comigo naquele estado. Ele me ajudou a entrar, colocou o cinto de segurança para mim e deu um beijo doce e amoroso em minha cabeça. Durante o trajeto para o meu apartamento, ele me distraiu com assuntos engraçados de seu trabalho. Perguntava sempre se eu estava me sentindo melhor e seu olhar era carinhoso e apaixonado... O mesmo olhar que Pete lançava para mim enquanto dirigia em minha realidade.
Quando chegamos, fui direto para o banho. Phillip se ofereceu para passar a noite comigo mais uma vez, pois ainda estava preocupado com a minha indisposição naquela noite. Não neguei, pois estava começando a gostar da companhia dele. Claro que isso não significava que eu o aceitaria como namorado... Pete, mesmo sendo hétero e me odiando, ainda era a minha total prioridade.
Acordei um pouco melhor no dia seguinte. O quinto dia naquela realidade estava começando e eu precisava estar bem disposto para tentar reverter minha situação com o Pete. Eu não estava com tanta fome e a tontura tinha passado. Minhas lembranças, ou quase todas, estavam intactas em minha mente. Haviam buracos escuros que eu não conseguia preencher, mas o que era importante eu conseguia lembrar.
Phillip me levou para o trabalho mais uma vez. Estávamos mais próximos e quase nos comportávamos como um casal.
— Fico com o seu carro e venho te buscar mais tarde? — perguntou ele, antes de me dar um selinho.
— Por favor — respondi, retribuindo instintivamente.
— Me avisa se você não se sentir bem, ok?
— Aviso sim.
Meu namorado indesejado sorriu e me deu outro longo selinho. Suspirei e o acompanhei até a porta, mas dei de cara com o Pete conversando com minha secretária. Ele estava pegando sua pasta de trabalho que eu havia deixado na mesa dela antes de fazer as anotações que ele tinha pedido.
— Bom dia, Sr. Nivans — disse Pete, de forma estranha.
— Bom dia, Pete — respondi, suspirando novamente.
— Então esse é o novo fotógrafo? — perguntou Phillip, estendendo a mão na direção dele. — Sou Phillip Russel, namorado do Klay.
— É um prazer, Sr. Russel — respondeu Pete, retribuindo o cumprimento.
— Me chame só de Phillip, pois não sou seu chefe.
— Mas namora meu chefe, Sr. Russel.
Phillip riu, assentiu e acenou para se despedir do Pete, da Charlotte e de mim. Pete e eu nos encaramos por alguns segundos. Ele parecia mais desconfortável do que de costume.
— Pete, eu queria te dizer que...
— Podemos conversar em particular, Klay?
Fiquei surpreso quando ele pediu para conversarmos me chamando pelo primeiro nome. Eu não tinha o costume de usar minhas habilidades para saber o que as pessoas estavam sentindo, mas foi impossível não detectar medo e ansiedade vindas do Pete.
Entramos em minha sala e eu fechei a porta para conversamos mais à vontade. Eu queria me desculpar pelo que tinha feito, pois era de se imaginar o quão desconfortável ele ficou por outro homem beijá-lo daquele jeito.
— Hoje o modelo que você indicou vem para o teste, né?
— Sim, Pete. Nathan confirmou que vem hoje à tarde, pois está vindo da Filadélfia.
— Eu vi as fotos dele no Instagram e concordo com você, Klay. Ele é bonito, tem um porte atlético e será perfeito para a campanha.
— Obrigado, Pete.
Ele colocou as mãos nos bolsos da calça e me encarou por mais alguns segundos. Sua expressão era assustada, como se ele fosse sair correndo a qualquer segundo.
— Pete, antes de você voltar ao trabalho...
— Sim...?
— Nada precisa mudar em seu trabalho e nada vai mudar em seu contrato, ok?
— Okay.
— E eu queria te pedir desculpa por...
Antes de conseguir terminar a frase, Pete avançou em minha direção, segurou meu pescoço com uma força um tanto quanto exagerada e me beijou quase machucando os meus lábios. Com o susto, dei três passos para trás, caindo sentado em minha mesa, batendo as mãos em meu porta canetas e as espalhando por todos os lados. Claro que retribui e continuei aquele beijo. O que eu mais queria estava acontecendo e a felicidade que senti em ver que havia esperanças de ficarmos juntos novamente era indescritível.
— Desculpa, te machuquei? — perguntou ele, roçando o corpo contra o meu.
— Não, tudo bem — respondi, ainda surpreso.
Ele colocou uma das mãos por baixo da minha camiseta e a tentou levantar. Com a outra, tentou tirar meu casaco, mas não estávamos em uma posição confortável.
— Desculpa, mas não sei o que fazer — disse ele, envergonhado entre nossos beijos.
— Eu te ajudo — sugeri, já animado.
...
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