13 - Conselho
— Eu não sabia que você podia me chamar — disse Nathan sentado na cadeira da minha escrivaninha.
— Nem eu — confessei.
— E a história que você me contou do que aconteceu com você e seu namorado é incrível! — Ele continuou. — Você decidiu morrer sem garantias que ia conseguir salva-lo ou voltar a vida.
— Eu sei que sou louco — afirmei com um meio sorriso.
— Isso que deve ser o que as pessoas chamam de amor verdadeiro — disse Nathan calorosamente.
Apertei os lábios para não sorrir.
Eu já estava envergonhado o bastante.
— Tem certeza que deu tudo certo esta tarde? — perguntei para mudar aquele assunto.
— Sim! — Nathan confirmou. — Eu vi quando a polícia e uma ambulância chegaram na casa da mulher que você viu. Eles entraram e a encontraram na casa.
— Ela desapareceu antes de me dizer onde morava — afirmei. — Talvez tenha seguido em frente ou encontrado outra pessoa para ajudá-la.
— Que bom que consegui te ouvir e encontrar a casa dela para você ligar para a polícia. — Ele falou animado. — Isso só mostra que você é uma boa pessoa e que vai conseguir me ajudar também.
Tive que fechar os olhos e suspirar. Eu não fazia ideia de como ajudar o Nathan dada as circunstâncias do que supostamente tinha acontecido com ele. Sem falar que ele era de outra cidade e eu não conhecia a família, os amigos ou qualquer pessoa do convívio dele.
Como eu ia ajudá-lo a descobrir o que queria?
Uma das opções era fazer uma viagem até a Filadélfia para investigar o que tinha acontecido, mas por onde eu começaria?
Eu não tinha certeza se teria coragem de arriscar tanto por um desconhecido.
— Ainda não sei como vou ajudar você, Nathan — confessei. — Tentei pesquisar formas de você seguir para o pós-vida, mas não encontrei nada a respeito.
— Como vou seguir sem descobrir o que aconteceu comigo? — questionou ele.
— Você terá ajuda, Nate! — afirmei. — Tenho certeza que todas as perguntas que você teve em sua vida serão respondidas quando você finalmente fizer a passagem.
— Leu essa frase em algum livro? — ironizou ele levantando da cadeira e cruzando o quarto impacientemente.
Mais uma vez a energia que Nathan emanava se tornou agressiva e perturbadora. Já era difícil ficar perto dele quando estava calmo ou animado...
— Pode, por favor, controlar suas emoções? — pedi levando as mãos à cabeça por conta da dor. — É impossível conversar com você quando está assim.
— Eu tento, Klay — disse ele ainda irritado. —, mas tudo isso é muito difícil pra mim!
— Nathan, eu já disse que vai ficar tudo bem — afirmei. — Você precisa confiar em mim e...
Alguém bateu na porta naquele exato momento.
Nathan desapareceu imediatamente depois.
— Quem é?! — exclamei antes de respirar aliviado por toda aquela carga negativa desaparecer.
— Seu irmão me viu chegar e abriu a porta pra mim — respondeu Pete. — Você está ocupado? Tem alguém aí com você?
— A porta está aberta, Pete! — afirmei.
Meu namorado entrou no quarto olhando desconfiado para os lados.
— Juro que ouvi você falando com alguém — disse ele antes de fechar a porta e se aproximar para sentar a meu lado na cama. — Um tal de Nathan.
— Um colega do meu curso de biotecnologia — menti. — Ele queria tirar uma dúvida sobre a última prova que tivemos.
Pete desviou o olhar parecendo não acreditar em minha resposta. Segundos depois ele suspirou, balançou a cabeça rapidamente e pigarreou.
— Quer sair para jantar, Klay?
— Sair para jantar? ...
— Já parou de chover e o céu está lindo esta noite. Faz tempo que a gente não sai para jantar ou passear.
— Pensei que você não estivesse no clima, Pete.
— Não estava, mas mudei de ideia.
Encarei meu namorado com desconfiança.
— Se isso te fizer feliz, eu aceito — afirmei me aproximando um pouco mais dele para acaricia-lo. — Sei que estes dias estão sendo difíceis pra você. Quero que saiba que estou aqui para o que você precisar, okay?
Ele assentiu antes de me dar um carinhoso e demorado selinho.
— Me desculpa por estar ausente e não te dar tanta atenção? — pediu ele seriamente. — Prometo melhorar nos próximos dias.
Estranhei aquele pedido.
— Não é culpa sua — falei.
— Você me desculpa? — Ele insistiu.
— Não tem motivos para você se desculpar, Pete — afirmei. — Você acabou de perder sua tia e teve que viajar para ajudar seu primo com tudo. Isso não te faz um namorado ausente.
Senti uma pontada na cabeça naquele momento. A dor que a mudança de humor do Nathan causou ainda não tinha passado.
Coloquei uma das mãos na cabeça e apertei os olhos esperando a tontura passar.
— Hey, amor — sussurrou Pete antes de beijar carinhosamente minha testa e me envolver em seus braços. — Tudo bem?
— Deve ser fome — menti mais uma vez. — Não comi nada desde o café da manhã.
— Que tal pedirmos aquela pizza que você tanto gosta? — sugeriu Pete me apertando um pouco mais nos braços dele. — E depois, se você quiser, podemos assistir alguma coisa.
Concordei.
Qualquer programa ao lado do rapaz que eu mais amava seria maravilhoso.
Pete se dava muito bem com meus pais e meu irmão. Pedimos três pizzas para comermos em família e, enquanto esperávamos o entregador com nosso jantar, ficamos na sala conversando e assistindo alguns truques de mágica que meu pai tinha aprendido em um canal do Youtube.
Achei que seria constrangedor e que ele me envergonharia na frente do Pete, mas foi bem divertido. Meu pai aprendeu um truque onde ele fazia sumir uma moeda em suas mãos e, como num passe de mágica, ela aparecia atrás da orelha de quem o estava ajudando. Ele também fez alguns truques com cartas de baralho, mas esses não foram tão incríveis por eu já ter uma noção de como ele nos enganava.
Fingi não saber qual era o truque para não estragar a brincadeira.
Durante o jantar, Pete e Shawn não pararam de conversar sobre um jogo que seria lançado nas próximas semanas e que eles estavam loucos para comprar. Meus pais e eu não estávamos entendendo sobre o que o jogo se tratava. Pete e Shawn tentaram explicar várias vezes, mas quanto mais eles falavam, mais confusos ficávamos.
— Sabe o Matt Hale? — perguntou Shawn. — Aquele streamer que eu conheci no evento de games?
Todos balançaram a cabeça positivamente.
— Ele já recebeu o jogo e vai fazer uma live na próxima semana — continuou meu irmão. — Ele vai ser um dos primeiros no mundo a jogar!
— Que inveja! — exclamou Pete pegando mais um pedaço de pizza. — E nós teremos que esperar mais duas semanas.
— Quero ser streamer também! — resmungou Shawn. — Ele deve ganhar muito dinheiro com isso.
— Que raios é esse negócio de streamer, Shawn? — questionou meu pai em um tom engraçado.
E foi mais longos minutos de conversa até explicarem para meu pai o que era um streamer, como eles trabalham e como faziam sucesso na internet.
A sobremesa foi um sorvete de morango com pedaços de chocolate que minha mãe comprou no mercado naquela manhã. Comemos todo o pote enquanto assistíamos um programa bobo sobre casamentos na TV.
Depois da sobremesa, Pete foi para o quarto do Shawn jogar videogame. Até fui convidado para acompanha-los, mas preferi não interromper tanto por não saber como jogava quanto por achar que meu namorado estava se divertindo e esquecendo um pouco do luto.
Ele precisava espairecer e se divertir.
Voltei para meu quarto, liguei o notebook e acessei mais uma vez as redes sociais do Nathan para tentar descobrir alguma coisa, mas não encontrei nada. As curtidas nas publicações e os comentários continuavam iguais. Não haviam atualizações, menções ou qualquer outra informação.
— Não sei por onde começar — sussurrei.
Eu precisava saber mais para conseguir ajuda-lo. Eu precisava conhecer a família dele, os amigos e tudo que ele tinha feito em seus últimos dias de vida. Talvez, as respostas para as perguntas que ele tanto queria fossem respondidas sem eu ter que me envolver tão profundamente naquela história.
Outra dúvida que não saía da minha cabeça era o motivo de ele não ter desaparecido como os outros fantasmas que eu via em meu dia a dia. Todos eles apareciam, tentavam falar comigo e desapareciam minutos ou até segundos depois.
Nathan não era como eles.
Eu acreditava que ele se recusava a fazer a passagem por teimosia ou por medo. Que ele não queria seguir para a luz como todos faziam.
Eu já estava deitado em minha cama lendo um livro sobre reencarnações quando Pete voltou para o quarto. Assim que entrou, meu namorado trancou a porta, tirou a camiseta e pulou em minha cama envolvendo tanto os braços quanto as pernas em meu corpo.
Ele parecia um pouco mais animado depois de jogar videogame com meu irmão.
— Desculpa a demora, amor — disse Pete começando a distribuir beijos por meu rosto e pescoço.
— Gosto de ver você se dando bem com meus pais e meu irmão, Pete — afirmei fechando o livro para dar atenção total a ele.
— Adoro sua família, Klay. — Ele respondeu desviando a atenção para o que estava em minhas mãos.
Meu namorado encarou o livro com curiosidade por um momento.
— É da sua avó?
— Sim.
Ele esticou o braço para pega-lo.
— Reencarnações?
— Pois é.
Cocei a nuca já pensando em uma desculpa por estar lendo aquele livro, mas Pete não fez mais perguntas.
Meu namorado e eu ficamos um bom tempo abraçados trocando beijos e carícias em minha cama. Ele ainda parecia cansado da viagem e triste pelo que tinha acontecido com a tia dele, então, não tentei ir além dos carinhos que trocávamos.
Cogitei por um momento contar a ele o que estava acontecendo comigo, mas lembrei o quão Pete era preocupado e o quanto ele se culparia por tudo aquilo.
— Posso te fazer uma pergunta, Pete?
— Sim.
Eu não precisava contar toda verdade...
Só precisava de um conselho do homem que eu amava.
— Eu estava assistindo um filme esta semana sobre um rapaz — comecei falando bem devagar para não deixar nada que eu não quisesse escapar. — Ele fez coisas ruins e magoou algumas pessoas, mas se arrependeu depois de morrer...
— Se arrependeu depois de morrer? — questionou Pete confuso.
— Antes! — exclamei para corrigir. — Falei errado. Desculpa!
Pete balançou a cabeça mostrando que tinha entendido.
— No final, ele precisou de ajuda para superar seus problemas — continuei. —, mas a pessoa que se propôs a ajuda-lo, por mais que acreditasse no arrependimento dele, não soube o que fazer.
— O que esse rapaz fez foi muito grave? — Pete perguntou.
— Provocações de colégio, sabe? — respondi balançando os ombros. — Dentre outras coisas que não entendi direito...
Pete ficou pensativo por um momento.
— Se ele está arrependido, tem todo o direito de se redimir — disse Pete. — Não podemos virar as costas e deixar de ajudar uma pessoa que sabe que errou e está pedindo ajuda para melhorar.
Suspirei.
Eu pensava exatamente a mesma coisa.
— Você acha que ele merece perdão? — perguntei.
— Só o perdão nos faz seguir em frente, Klay — respondeu Pete com um meio sorriso.
Talvez fosse exatamente aquilo que Nathan precisava para seguir em frente...
Ser perdoado.
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