12 - Impremeditado
Voltei para meu quarto depois de tomar banho, colocar uma roupa confortável para dormir e deixar meu celular carregando no criado mudo ao lado da cama. Pete já estava deitado. Ele estava em silêncio olhando fixamente para o teto. Meu namorado não mostrou reação enquanto eu me trocava, arrumava o quarto ou quando deitei ao lado dele.
Eu precisava encontrar uma forma de anima-lo ou tentar diminuir a dor e tristeza que ele estava sentindo.
De uma forma sutil, me aproximei dele na cama. O espaço entre nós não era tão grande, mas tentei ser o mais delicado e carinhoso possível para que ele visse que eu tinha a melhor das intenções. Pete reagiu imediatamente. Ele segurou minha mão e virou o corpo em minha direção para ficarmos deitados um de frente para o outro.
— Eu tô aqui, Pete — murmurei.
Ele sorriu e balançou a cabeça positivamente.
— Sempre estarei aqui pra você — reafirmei.
— Eu sei que tenho o melhor namorado do mundo. — Pete disse. — Por isso tenho medo de não ser o bastante pra você e te perder.
— Isso nunca vai acontecer — falei olhando fixamente nos olhos dele. — Jamais vou te deixar.
Pete voltou a sorrir, mas deu um longo e cansado bocejo em seguida.
Ele estava exausto.
— Melhor você descansar — sugeri soltando a mão dele e me afastando.
— Só vou dormir se for abraçado com você, amor — disse Pete me puxando de volta para perto dele.
Pete virou o corpo puxando um de meus braços para envolve-lo. Encaixei cuidadosamente meu corpo no dele e puxei a coberta para nos cobrir da cintura para baixo.
Meu namorado não demorou a pegar no sono. Ele estava tão cansado que ressonava respirando profundamente. Mesmo dormindo, o corpo do Pete encolhia e contraía instintivamente para se encaixar no meu.
Como eu tinha sentido falta do cheiro e do calor corporal dele...
Era inexplicável o quanto eu o amava e o quanto queria que ele ficasse bem. Também era inexplicável o medo que eu tinha de tudo aquilo ser um sonho e que no final eu despertasse e descobrisse que não tinha vencido a batalha que travei contra a morte para salva-lo.
Nos últimos meses, tentei não pensar em tudo aquilo. Tentei ignorar o fato de que eu não tinha mais sonhos lúcidos, que não conseguia mais ver o futuro através deles e que estava no escuro para qualquer coisa que acontecesse do dia do lago em diante. Fiquei preocupado, mas aliviado em saber que alguma coisa no linear entre a vida e a morte tinha funcionado e que a vida do Pete foi poupada.
Mas ele não era imortal.
Até quando ele estaria comigo?
Eu queria ignorar as incertezas, mas não conseguia. A morte da tia do Pete e toda a história com Nathan, com Rachel e todos aqueles espíritos me fizeram pensar novamente no que eu mais temia no mundo...
Perdê-lo.
– 04 –
— Você ainda não falou quais problemas que a morte da tia do seu namorado lhe causou, Klayton — disse a mulher me encarando atentamente.
— Já vou chegar lá — falei sentindo minha mão voltar a tremer.
Mesmo contando toda a história, minha cabeça não parava de pensar nos últimos acontecimentos. As horas estavam passando e eu não tinha tempo a perder. Eu precisava descobrir como resolver tudo antes que fosse tarde demais.
— Por que tenho a sensação de que você está me escondendo alguma coisa? — perguntou a mulher.
Eu precisava manter a calma.
Se eu continuasse nervoso daquele jeito, não ia alcançar meu objetivo.
— Espíritos... — afirmei apertando os olhos. — Eles nunca vão embora! Eles nunca param de me atormentar. Eles nunca param de me pedir ajuda.
— Achei que você tinha concordado em ajuda-los — lembrou ela. — Achei que já estivesse acostumado com isso.
— Não há como se acostumar com isso — confessei. — Não há como viver em paz com isso.
Apesar dos olhares de desconfiança, a mulher estava interessada em ouvir o restante da história. Eu teria que ser cauteloso e não dar a entender minhas reais intenções.
— O que aconteceu depois que Pete voltou de Nova Iorque? — Ela perguntou.
(...)
No dia seguinte, Pete voltou cedo para casa. Ele queria passar a tarde de sábado com a mãe e os irmãos. Combinamos de nos reencontrar a noite, mas eu não tinha certeza se ele dormiria em minha casa. Meu namorado estava visivelmente triste e distante. Ele até se desculpou um pouco antes de ir embora.
— Não precisa se desculpar — falei sinceramente. — Não imagino a dor que você está sentindo, mas estarei aqui para ajudar em tudo que você precisar.
— Obrigado, amor. — Pete agradeceu antes de me dar um selinho, ligar o carro e ir embora.
Quando voltei para casa, minha mãe já estava na cozinha preparando o café da manhã, meu pai estava sentado à mesa lendo o jornal no celular e meu irmão estava debruçado sobre o balcão morrendo de sono.
Não era comum todos na casa estarem acordados naquele horário em um sábado de manhã.
— Caíram da cama? — questionei abrindo o armário para pegar minha xícara favorita.
— Seu irmão tem dentista esta manhã — respondeu meu pai.
— E eu preciso fazer as compras do mês — disse minha mãe.
— Não podemos remarcar? — resmungou Shawn de forma fofa antes de bocejar.
— Não, senhor! — retrucou meu pai.
— E você, querido? — Minha mãe perguntou. — O que vai fazer hoje?
— Onde está o Pete? — questionou meu pai. — Ele não vai tomar café com a gente?
— Pete já foi embora — respondi enquanto me servia com o leite que minha mãe tinha acabado de esquentar.
— Ele estava meio estranho ontem — disse meu pai desviando a atenção para mim. — Vocês brigaram?
Levei alguns segundos para filtrar aquela pergunta estranha.
— Ele acabou de perder a tia, esqueceu? — O lembrei.
— Você falou que ela faleceu da mesma doença que o pai dele, não é? — lembrou minha mãe.
— Sim — confirmei. — Por isso ele está tão arrasado.
O assunto não se estendeu por mais tempo. Meus pais, meu irmão e eu tomamos café em silêncio enquanto mexíamos no celular para ler notícias, jogar ou até pesquisar as baixas de preços dos produtos nos supermercados.
Meu pai e meu irmão foram os primeiros a sair. Depois da consulta no dentista, eles passariam em uma loja de esportes no shopping, pois as rodinhas do skate do Shawn estavam gastas e meu pai temia que aquilo poderia causar algum acidente.
Minha mãe saiu uma hora depois, mas antes de entrar no carro, ela me fez um pedido especial...
— Você pode ir na farmácia pra mim?
— Claro! O que precisa?
Ela pegou um papel dobrado da bolsa para me entregar.
— Quando você voltar, guarde o que comprou no seu quarto, por favor.
— No meu quarto?
— Não quero que seu pai saiba.
Desdobrei o papel e li o que estava escrito.
— Teste de gravidez? — questionei animado.
— É só uma suspeita — disse ela envergonhada.
— Isso é ótimo! — exclamei.
— Não tenho certeza, por isso, não conte a ninguém — insistiu ela. — Vai ser o nosso segredo, certo?!
Assenti já animado com a possibilidade.
Meu pai ficaria abobalhado ao saber que teria mais um filho para atormentar e Shawn não ligaria muito desde que não tivesse que dividir o computador, o quarto ou o videogame com nosso futuro irmão...
Ou irmã.
***
Uma garoa fina e fria começou a cair quando saí da farmácia naquela tarde. Eu queria pedir um carro, mas o aplicativo de carona não carregava e parecia não funcionar por alguma falha de atualização.
Não estava tão longe de casa.
Andei a passos rápidos por cinco quarteirões até chegar na zona residencial que eu morava. Minhas roupas já estavam úmidas quando a chuva começou a engrossar. Não havia para onde correr ou onde me proteger. Eu não podia invadir o jardim das casas e me refugiar na varanda de pessoas que eu não conhecia. Também não era uma opção me proteger em baixo das arvores, pois os trovões ecoavam junto ao barulho da chuva caindo no asfalto.
— Você aí! — chamou uma voz feminina.
Continuei andando, pois não queria passar muito tempo na chuva.
— Por favor, eu preciso da sua ajuda! — insistiu a dona daquela voz.
A dor de cabeça, o enjoo e o peso que eu sentia em meu corpo demonstravam que aquela voz não era de uma pessoa viva. Mesmo querendo ajudar, não olhei para trás e não parei de seguir meu caminho.
— Você é o único que pode me ajudar! — gritou a mulher.
Aquele espirito emanava uma energia tão perturbadora que me fez ter dificuldade para respirar. As emoções dela estavam tão confusas que fui obrigado a parar e reunir forças para não cair ajoelhado na calçada.
— Por favor, se acalma — pedi quando finalmente voltei a respirar.
— Eu preciso de você — afirmou ela.
— Vou te ajudar, mas você precisa se acalmar — afirmei já passando muito mal. — Não vou conseguir se você não se controlar.
Ela tentou se acalmar, mas minhas dores só pioravam.
— Você passou em frente a minha casa e eu senti sua presença — disse ela se aproximando lentamente de mim. — Vi sua luz, sua força e vi que você é o único que pode me ajudar.
— O que aconteceu com você? — perguntei antes de virar para finalmente encara-la.
A mulher estava toda machucada.
Os olhos inchados, um lado dos lábios sangrando e diversos hematomas nos braços.
— Eu caí da escada — disse ela. — Meus filhos e minha família moram longe.
— Quando foi isso? — questionei pegando meu celular para chamar a emergência.
— Foi agora — respondeu ela. — Exagerei um pouco na bebida e me desequilibrei.
A chuva estava piorando. Eu tentava deslizar o dedo na tela do celular para fazer a ligação, mas o touch não respondia por estar completamente molhado.
— Ligo para a emergência quando chegar em casa — prometi.
— Não, por favor! — exclamou ela ficando ainda mais nervosa. — Você não pode me deixar sozinha!
— Não vou conseguir ligar ou te ajudar no meio da rua com essa chuva! — retruquei.
— A garagem da minha casa está aberta — disse ela. — Tem toalhas secas ao lado da máquina de lavar.
— Ficou louca?! — questionei. — Não posso entrar na sua casa, pois serei envolvido no que aconteceu.
Tentei secar o celular em minha jaqueta, mas a tela estava muito molhada e o touch não obedecia a meus comandos.
— Eu moro sozinha — disse ela. — Se você me deixar aqui, vão demorar para achar o meu corpo.
— Não consigo discar — murmurei frustrado. — Minhas mãos e meu celular estão molhados.
De repente, a mulher desapareceu.
Ela não tinha falado onde morava e haviam dezenas de casas naquela rua.
— Senhora?! — A chamei.
Ela não respondeu.
Eu não podia ir em todas as casas do bairro para descobrir onde aquela mulher morava. Eu não podia sair espiando a janela das pessoas em um dia de chuva, pois provavelmente seria agredido, preso ou coisa pior. Também não era uma opção ligar para a polícia ou para a emergência, pois ninguém acreditaria em mim...
Mas eu precisava fazer alguma coisa.
— Nathan! — O chamei na esperança que ele pudesse me ouvir.
Alguns segundos passaram...
Nada aconteceu.
— Nathan! — chamei novamente.
Nada.
Fechei meus olhos, respirei profundamente e me concentrei naquilo que eu queria. Eu precisava da ajuda do Nathan para resolver aquele problema. Eu precisava que ele escutasse meu chamado, onde quer que estivesse, para vir me ajudar.
— Nate! — O chamei mais uma vez.
Alguns segundos passaram...
Senti uma presença familiar se materializar atrás de mim.
...
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