+ Próximo Livro - Contra o Oculto

Uma espiada em:
CONTRA O OCULTO,
a sequência direta de Contra o Decesso.

– 01 –

— Não sei por onde começar... — confessei.

— Não vou conseguir te ajudar se você não falar, Klayton — disse ela.

— Não é tão simples — resmunguei inseguro.

Eu estava exausto. Minhas mãos não paravam de tremer, meus olhos ainda ardiam e os sentimentos de culpa e pesar me dilaceravam por dentro.

— Se fosse simples, você não teria me procurado — disse ela bebendo mais um gole de seu chá de ervas.

Concordei.
Eu não podia ter medo e recuar naquele momento.

— Eu menti... — falei apertando meus olhos para não chorar. — Menti e tomei decisões das quais não me orgulho.

— Decisões? — Ela questionou.

— Decisões ruins — afirmei cruzando os braços e me encolhendo na poltrona para tentar aliviar aquela angústia.

Ela de repente ficou mais interessada.
A mulher colocou a xícara de volta no pires em cima da mesa de centro da sala enquanto me olhava com curiosidade.

— Quais decisões ruins você tomou, Klayton?

— Tentei ajudar uma pessoa.

— Uma pessoa?

— Não é bem uma pessoa agora, pois ela está morta.

Segundos intermináveis de silêncio gritaram naquela sala.

— Você machucou essa pessoa?

— Não...

— Quem é a pessoa, Klayton?

— Hum... Um rapaz...

— E como você tentou ajudar esse rapaz?

Minha cabeça começou a doer só de lembrar tudo o que eu tinha feito naquelas últimas semanas. Eu queria ter o poder de voltar atrás e consertar tudo, mas...

— Começou há algumas semanas...

(...)


— Voltei! — exclamei assim que coloquei os pés em casa.

— Já era hora, mocinho — disse minha mãe sentada no sofá da sala junto com meu pai e meu irmão.

— Achamos que você tinha esquecido da nossa noite em família, Klay — falou meu pai.

Mas não tinha como esquecer...

Desde a minha mal explicada tentativa de suicídio no lago do parque atrás do campus da faculdade que meus pais inventaram aquelas noites em família. Assistíamos programas de TV, jogávamos cartas e uma vez meu pai até inventou de levar Shawn e eu para jogarmos basquete em uma quadra perto de casa.
Eles nunca me pressionaram para descobrir o motivo de eu ter feito o que fiz, mas eu tinha certeza que desconfiavam. Pete e eu não nos desgrudávamos nem cursando faculdades diferentes. Sem falar que ele me visitava quase todas as noites e toda a vez que eu saía de casa era ou para estudar ou me encontrar com ele...

Eu sabia que meus pais desconfiavam de alguma coisa, mas não tinham coragem de perguntar.

— Como está o Pete? — perguntou Shawn.

— Trabalhando e estudando bastante — respondi tirando o tênis e os colocando ao lado da porta da frente como costumávamos fazer.

— Que curso seu amigo asiático está fazendo mesmo? — perguntou minha mãe.

— Administração — respondi.

— Administração é bom, mas nada supera o curso de Direito — resmungou meu pai.

— Eu larguei o curso de Direito para fazer Biotecnologia, pai — afirmei.

Ele fez uma careta, mas não retrucou.
Meus pais tinham apoiado minha decisão, mas ainda tinham o sonho de ver um dos filhos se tornar um advogado igual nas séries de TV.

— Pete vai vir estudar com você esta noite? — perguntou minha mãe.

— Ele disse que teve um longo e cansativo dia de trabalho — respondi balançando os ombros. — Acho que vou ter que estudar sozinho.

— Ainda estou tentando entender como vocês fazem para estudar juntos sendo que um faz Administração e o outro Biotecnologia — disse meu pai erguendo uma das sobrancelhas.

— Ajudamos um ao outro com nosso conhecimento, só isso — resmunguei revirando os olhos e me virando para sair da sala.

— Noite em família, Klay! — lembrou minha mãe.

Não respondi e subi as escadas para descansar no meu quarto.

Depois de tomar banho e vestir roupas mais confortáveis, me joguei na cama com meu celular para responder algumas mensagens. Tyler tinha me enviado um texto gigante contando que não aguentava mais as novas matérias do curso de Direito e lamentando que o prédio de Biotecnologia era muito distante do dele. Sue também lamentou a distância e quase todos os dias me mandava mensagens de saudade.

— Como foi seu dia, Klay? — questionou uma voz masculina.

Ignorei a pergunta e continuei respondendo as mensagens dos meus amigos.
Enquanto eu respondia e curtia algumas fotos no Instagram, recebi uma mensagem do Pete dizendo que estava cansado, mas que iria até minha casa aquela noite para matarmos a saudade um do outro.

"Meu pai está desconfiado" enviei em resposta.

"Desconfiado?" perguntou Pete.

"Ele queria saber como alguém que cursa Administração estuda com alguém que cursa Biotecnologia" respondi enviando logo em seguida um emote de rostinho irônico.

"Você administra meu corpo com seus beijos e eu estudo a biotecnologia da sua pele com os meus" respondeu ele com vários emotes de risada.

"Não faz sentido" respondi com uma carinha pensativa.

"Prefere que eu não vá?" ele perguntou.

"Vem logo!" respondi enviando em seguida um gif de coração.

— Por quanto tempo você vai continuar fingindo que eu não estou aqui? — perguntou o rapaz dono daquela voz.

— Você não está aqui — resmunguei fechando os olhos. — Você não existe.

— Você respondeu! — exclamou ele orgulhoso de sua conquista por atenção. — Se eu não estou aqui, como você escuta e responde o que eu digo?

O quarto estava mais frio.
Até o ar que saía da minha boca quando eu respirava se transformava em vapor por causa da temperatura.

— Você é uma ilusão criada por meu subconsciente — sussurrei ainda com os olhos fechados e rezando para aquela alucinação acabar.

— Quantas alucinações você tem tido nas últimas semanas? — Ele perguntou.

Tive que abrir os olhos para encara-lo pela primeira vez.

— O que você perguntou?

— Sim, eu estou te seguindo.

— Vai embora.

— Não posso.

— Me deixa em paz.

— Eu gostaria, mas não posso.

Sentei em minha cama, coloquei as mãos na cabeça e apertei meus olhos fechados desejando que tudo aquilo acabasse.

— Você precisa me ajudar, Klay — disse o rapaz.

— Por favor, vai embora — sussurrei mais uma vez.

— Você é a única pessoa que consegue me ver e ouvir — disse ele.

— Vai embora, vai embora, vai embora — falei repetidamente colocando minhas mãos para tapar meus ouvidos.

Naquele momento, alguém bateu na porta do quarto.

— Klay? — chamou meu irmão.

— Oi, Shawn! — respondi prontamente.

— Posso entrar? — questionou ele. — Tá tudo bem aí?

Olhei com raiva para aquela alucinação que insistia em ficar sentada na cadeira da minha escrivaninha.

— Vai embora — murmurei.

A alucinação balançou a cabeça negativamente.

— É para eu ir embora? — perguntou Shawn.

— Não! — exclamei levantando rapidamente da cama para abrir a porta do quarto. — Por favor, entra.

Shawn entrou e olhou desconfiado para os lados.

— Você estava falando com alguém? — questionou ele.

— Era mensagem de voz — menti.

Shawn balançou a cabeça e os ombros.

— Nossa mãe pediu para avisar que seu jantar está guardado no forno elétrico — disse meu irmão. — Você não jantou com a gente e nem quis participar da noite em família.

— Estou um pouco cansado — falei voltando para a cama.

Shawn cruzou os braços depois de estremecer.

— Está frio aqui — observou ele.

— Esqueci a janela aberta — menti novamente.

Meu irmão imediatamente olhou em direção a janela...
Ela estava fechada.

— Você está pálido, Klay — disse Shawn.

— Deve ser fome — afirmei levantando da cama segundos depois de ter voltado para ela.

Eu tentava disfarçar, mas era impossível ignorar aquela alucinação. O rapaz continuava sentado na cadeira da escrivaninha me observando e ouvindo toda a conversa com meu irmão.
Shawn percebeu que algo estava errado. Ele olhou para a cadeira mais de uma vez quando notou que eu não parava de desviar minha atenção para ela.

— Algo errado? — perguntou ele.

— Não! — menti forçando um sorriso. — Só estou ansioso, pois Pete está vindo pra cá e deve chegar a qualquer minuto.

— Vai comer, irmão — pediu Shawn enquanto saía desconfiado do quarto. — Se precisar de mim, estarei jogando no meu quarto.

Assenti e acenei com a mão antes de Shawn cruzar a porta e sair do meu campo de visão.

— Seu irmão deve achar que você está louco — disse a alucinação.

— Cala a boca — resmunguei andando de um lado para outro no quarto.

— Da pra ver que ele gosta muito de você. — Ela insistiu no assunto.

Peguei uma de minhas blusas de moletom no guarda roupa, calcei as meias que estavam jogadas no chão do quarto e vesti uma das toucas que eu costumava usar no inverno.

— Seu namorado já deve estar chegando — disse a alucinação.

— Cala a boca — resmunguei mais uma vez.

— No meu colégio tinha um menino gay — continuou ele. — Fui injusto com ele algumas vezes.

— Cala essa boca, já falei — repeti irritado.

— Vejo as coisas com mais clareza agora — disse ele pensativo. — Está tudo diferente. Não sei explicar...

Eu não queria ouvi-lo mais.

— Vou descer para esperar o Pete e comer alguma coisa — sussurrei voltando a fechar os olhos para mentalizar meu desejo de que aquele rapaz desaparecesse. — Quando eu voltar, não quero mais te ver aqui.

Não esperei uma resposta para sair do quarto.

Enquanto eu descia as escadas para ir até a cozinha, lembrei de todas as vezes que tive alucinações estranhas desde o dia que pulei naquele lago. Eu tinha começado a ver e ouvir pessoas desconhecidas. Ninguém as via além de mim. Elas puxavam assuntos aleatórios, mas depois sumiam sem nem uma explicação.

Eram alucinações.
Não tinha outra explicação.

Eu não conseguia mais sonhar e há muito tempo não conseguia ter uma boa noite de sono, pois eu ficava boa parte do tempo acordado e deitado em minha cama olhando para os lados para ter a certeza de que não seria perturbado por outra alucinação indesejada.

Aquelas alucinações com desconhecidos devia ser cansaço ou algum tipo de estresse pós trauma. Eu havia passado por muita coisa, então, era a explicação mais coerente que consegui encontrar.

Pete chegou pouco depois que terminei de jantar. Ele preferiu não entrar em casa naquela noite, pois ficou preocupado quando eu disse que meus pais estavam desconfiados.

— Que frio é esse, Klay? — perguntou Pete assim que entrei no carro dele.

— Venta muito no meu quarto — menti tirando a touca e abrindo o zíper da blusa.

— Você tem que fechar a janela, amor — disse ele antes de tirar o cinto de segurança para se aproximar de mim. — Não quero ver meu loirinho doente.

Pete me envolveu em seus braços antes de nos beijarmos. A presença dele era uma das únicas coisas que me proporcionava paz.

— Desculpa vir tão tarde hoje, amor — sussurrou ele ainda com os lábios colados aos meus. — Meu trabalho tá uma loucura.

— Tudo bem — respondi roçando meu rosto carinhosamente no dele. — Você poderá me compensar neste final de semana.

Pete se afastou um pouco para me olhar.

— Seus pais vão sair?

— Eles têm passado mais tempo juntos desde o que aconteceu com a gente. Eles disseram que cada segundo com quem a gente ama deve ser aproveitado.

— Que romântico...

Pete voltou a se aproximar para me beijar. Enquanto trocávamos beijos e carinhos, ele afastou seu banco do volante e me puxou pouco a pouco para sentar em seu colo.

— Pete... — resmunguei já excitado.

— Eu sei, eu sei... — resmungou ele sorrindo. — Nada de sexo dentro do carro.

— É desconfortável e os vidros ficam embaçados — falei segurando as mãos dele antes que elas descessem para minhas partes íntimas.

— Mas é tão gostoso, amor — sussurrou Pete mordendo minha orelha e tentando mais uma vez colocar a mão dentro da minha calça.

Era quase impossível resistir aos carinhos do Pete. Quando ele me excitava com beijos e carícias, eu me transformava em um Klay totalmente diferente do que costumava ser. Eu não conseguia parar ou pensar em outra coisa...
Tudo que eu queria era mais e mais do garoto que eu tanto amava.

Pete já tinha tirado minha camiseta e abaixado parte da minha calça quando vi um vulto passar na janela do porta malas do carro. Fiquei desconfiado por um segundo, mas voltei a beija-lo e permitir que ele fosse além em suas intenções.
De repente, vi outro vulto passar ao lado da janela do banco do motorista.
Tive que parar para olhar para os lados.

— Amor? ...

— Pete, você viu isso?

— Isso o que?

Voltei para o banco do passageiro, vesti minha camiseta e abaixei o vidro ao lado do banco do carona para olhar se havia alguém andando na rua...
Mas a rua da minha casa estava deserta.

— Achei ter visto alguém passar — falei ainda olhando preocupado para todos os lados.

— Acha que fomos pegos? — questionou Pete recolocando os bancos no lugar e desamarrotando suas roupas.

De repente, uma mulher desconhecida apareceu na frente do carro me fazendo dar um pulo de susto.
Ela não estava ali há um segundo atrás.

— Klay? — chamou Pete estranhando minha atitude. — O que foi? Tá tudo bem?

Pete olhava para o mesmo lugar que eu, mas parecia não ver aquela mulher parada na frente do carro dele...
Era mais uma alucinação.

— Klay? — chamou ele mais uma vez. — O que você está olhando?

— Nada — falei depois de pigarrear para disfarçar. — Só pensei ter visto alguém, mas me enganei.

...

CONTRA O OCULTO estará no Wattpad dia 22/07/2020 às 23h55min.

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