33 - Apenas Uma

Levei mais tempo que o planejado para voltar ao hotel. Era impossível passear pelas ruas de Nova Iorque e não parar para admirar as vitrines, artes de rua e tirar fotos de esculturas e arranha céus. Perdi a conta de quantas vezes parei para tirar o celular do bolso e fotografar imagens em grafite e artistas fantasiados nas praças.

Recebi uma ligação do Pete depois de passar pela recepção do hotel e apertar o botão do elevador. Até tentei atender, mas minha bateria estava no fim e meu celular desligou antes de eu deslizar o dedo na tela para aceitar a chamada.

Eu estava tranquilo. Minha intuição dizia que Pete estava bem e que nada de ruim aconteceria com ele naquele dia. Tudo que eu queria, era que ele relaxasse e não ficasse mais chateado comigo.
Meu plano era esperar Pete chegar, pedir mil desculpas por aquela tarde e aproveitar nossa primeira noite naquela cidade maravilhosa.

Mas ele já tinha posto em prática seus próprios planos...

— Ué! — exclamei surpreso quando abri a porta do quarto e encontrei Pete andando de um lado para o outro. — Achei que você ia demorar mais na casa da sua tia.

— Klay, me perdoa?! — pediu Pete correndo a meu encontro para me abraçar. — Eu fui um completo idiota com você esta tarde.

— A culpa foi minha — murmurei.

Mas Pete estava mesmo se sentindo culpado.

— Eu não devia ter saído daquele jeito e te tratado daquela forma — falou ele me soltando, correndo para a cama e pegando um lindo buque de rosas para me entregar.

Minha vontade era de pular da varanda de vergonha. Pete ajoelhou, abriu os braços e me olhou com aquele jeitinho fofo e especial de sempre.

— Pete, não faz iss...

— Klayton! Nos conhecemos há algumas semanas e estamos namorando há alguns dias e eu nem me lembro direito do seu sobrenome...

— É Nivans! Pete, levanta...

— Mas eu te amo e fiz uma grande besteira hoje quando te deixei sozinho em nossa primeira tarde em Nova Iorque...

— Está tudo bem, amor. Agora levanta daí.

— Você é meu anjo da guarda, a razão da minha vida e me sinto honrado por poder te chamar de namorado.

Tapei meus lábios com as mãos. Meu rosto já estava quente e eu estava prestes a explodir de vergonha.

— Você perdoa este grande idiota? — perguntou Pete me oferecendo o buque de rosas.

— Não tenho que perdoar, pois você não fez nada de errado — falei pegando o buque. — Você só precisava de um tempo sozinho e eu respeito isso.

Pete levantou e voltou a me agarrar.

— O tempo que eu preciso é a seu lado, Klay — disse ele enchendo meu rosto de beijos. — Cada segundo do resto da minha vida eu vou querer passar com você!

— E teremos muitos anos, Pete — afirmei. — Confie em mim como tem confiado e não desista da gente.

Pete pareceu forçar um sorriso depois de minha última frase, mas assentiu e voltou a me abraçar.

As surpresas daquela noite não tinham acabado. Além do buque de rosas, Pete fez reserva em um restaurante muito elegante para o jantar. Tentei convence-lo a cancelar por achar que eu não tinha roupas e coragem de entrar em um lugar tão bem frequentado, mas Pete insistiu tanto que foi praticamente impossível resistir ao charme e entusiasmo dele.
Depois de um delicioso jantar à luz de velas e música ambiente, Pete e eu passeamos pela noite brilhante e glamurosa de Nova Iorque. Fomos de táxi até a Times Square, tiramos dezenas de fotos dos telões e letreiros gigantes de publicidade e tomamos o famoso milk shake de chocolate nova-iorquino.

Quanto mais andávamos, mais nos apaixonávamos pela cidade. Os prédios, as lojas, o sorriso e hospitalidade das pessoas que cruzavam conosco...
Tudo era grandioso e extraordinário.

— Klay, você sabia que Nova Iorque é a cidade dos apaixonados? — disse Pete envolvendo o braço em minha cintura enquanto caminhávamos.

— Que eu saiba, a cidade dos apaixonados é Verona, Pete — afirmei convicto.

— Verona? — Ele indagou confuso. — Tanto faz, pois estando a seu lado, qualquer cidade fica apaixonante.

Tive que cobrir parte do rosto para esconder o quanto eu estava envergonhado. Pete tinha gasto toda a cota de elogios possíveis e imagináveis comigo aquela noite. Ele não parava de dizer que me amava e o quanto aqueles momentos estavam sendo felizes e especiais.

— Você não me falou como foi na casa da sua tia, Pete. — O lembrei. — Ela está bem? Como está seu primo?

— Minha tia não pereceu estar bem — respondeu ele sério e cabisbaixo. — Meu primo tem cuidado dela, mas parece que não há mais o que fazer.

— E eu sinto muito por isso — falei gentilmente.

Pete e eu paramos na calçada em frente a um prédio que tinha uma das paredes pintada com as cores da bandeira arco-íris. Haviam casais gays andando de mãos dadas e se beijando naquela região. Também havia muitos bares e entradas que pareciam ser de boates LGBT.

— Se quiser, amanhã vou te levar para conhecer minha tia e meu primo — propôs Pete se colocando à minha frente e envolvendo os braços em minha cintura.

— Vou adorar conhece-los, mas... — Fiz uma pausa e pigarreei. — Eles não sabem sobre a gente, sabem?

— Meu primo sabe — respondeu ele. — Se minha tia não estivesse doente, eu não me importaria em contar.

Balancei a cabeça concordando com ele.

Antes de me beijar, Pete roçou o nariz por meu rosto e me apertou mais contra o corpo dele. Por um breve momento, senti que ele estremeceu e quase recuou. A energia dele ao mesmo tempo que estava feliz e agradecida por estar comigo, parecia ter breves oscilações de medo, insegurança e pesar.

— Hey, Pete — murmurei ainda com os lábios colados aos dele. — Relaxa, amor.

— Eu te amo, Klay — sussurrou ele suspirando.

Coloquei uma das mãos no rosto dele para incentivá-lo a me olhar diretamente. Pete estava relutante e tentava a todo instante disfarçar seu medo e insegurança com sorrisos e pigarros.

— Eu também te amo, Pete — falei fixando meu olhar no dele. — Você acredita e confia neste amor?

— Sim — respondeu ele com um meio sorriso.

— Você acredita e confia em mim? — perguntei seriamente.

— É claro. — Ele respondeu abrindo um sorriso ainda maior.

Eu queria passar para ele a segurança que eu tinha de que tudo ficaria bem. Queria que ele confiasse em mim e não sentisse mais medo.

— Então vamos voltar para o hotel para você fazer aquele negócio que eu gosto? — propus antes de morder e puxar de maneira provocativa o lábio inferior dele.

— Aquele com a língua? — questionou Pete maliciosamente.

— Isso mesmo — confirmei voltando a beija-lo e me jogando ainda mais em seus braços.

– 13 –

Eu estava exausto.
Deitado naquela cama de hotel ao lado do homem dos meus sonhos, eu sentia o quarto girar a minha volta. Meu corpo estava cansado, pesado e prazerosamente sentindo os efeitos de uma noite apaixonada. O jantar, o passeio e aquela noite de amor foram tão incríveis quanto exaustivas.

Eu estava de olhos fechados curtindo a preguiça e pronto para adormecer...

— Mas você já adormeceu, Klay — disse a voz do Pete a meu lado.

Abri os olhos imediatamente e ergui meu tronco para sentar. Pete estava a meu lado sentado e recostado na cabeceira da cama enquanto lia o livro "Além da Matéria".

— Falso Pete? — deduzi.

— Por que insiste em dizer que sou falso? — questionou ele fechando o livro. — Que absurdo!

— Você é meu subconsciente — resmunguei. — Você não existe de verdade.

— Então, quem te fez gemer a noite toda nesta cama? — perguntou ele maliciosamente.

Tive que revirar os olhos e respirar fundo.

— O que faz aqui? — questionei impaciente.

— O mesmo que você, claro! — respondeu ele voltando a abrir o livro.

— Onde conseguiu isso? — perguntei ajoelhando na cama e tirando o livro das mãos dele.

O falso Pete sorriu e cruzou os braços.

— Você o encontrou e me emprestou, lembra? — Ele respondeu.

— Onde eu o encontrei? — questionei animado.

— Não sei — falou o falso Pete ainda sorrindo amigavelmente.

Quando abri o livro e comecei a folheá-lo, descobri que todas as páginas estavam em branco. Estava claro que meu subconsciente estava mais uma vez brincando comigo e mexendo com minha ansiedade.

— O que isso significa? — resmunguei. — Significa que vou encontrar o livro?

— Você vai encontrar o livro e isso é um fato, mas... — O falso Pete fez uma pausa e coçou a nuca antes de continuar. — Não sei exatamente quando e onde isso vai acontecer.

— Você nunca sabe de nada! — exclamei irritado. — Você dá dicas rasas e já demonstrou que sabe o que vai acontecer no futuro, mas nunca me ajuda! Você só sabe me perturbar e me deixar mais confuso!

O falso Pete ficou sério e chateado com minha rispidez por um momento, mas depois, voltou a sorrir como se nada tivesse acontecido.

— Parte de tudo isso é mentira, Klay — disse ele depois de alguns segundos em silêncio.

— O que é mentira? — questionei.

— Parte de tudo isso — respondeu ele adotando um olhar mais sereno e empático.

Balancei a cabeça por não entender o que ele estava querendo dizer.

— Tudo isso o que, Pete?

— O que está achando de Nova Iorque?

— Não mude de assunto agora, okay?!

— Não é todo dia que temos a oportunidade de visitar uma cidade tão bonita.

Eu queria gritar, mas sei que não adiantaria.

— Por favor, responda pelo menos uma de minhas perguntas?

— Só uma? Mesmo?!

— Sim! Se me responder, nunca mais te incomodo com outras perguntas. 

— De acordo.

Balancei a cabeça positivamente.

— Que pergunta você quer que eu te responda? — perguntou o falso Pete se aproximando um pouco mais de mim.

— Eu quero saber o que é tudo men... — Tentei falar, mas ele colocou o dedo indicador em meus lábios para eu não continuar.

— Sugiro que pense bem na sua pergunta, Klay — disse o falso Pete me olhando diretamente com o mesmo jeitinho especial e amoroso do verdadeiro. — Talvez, esta pergunta seja a mais importante da sua vida.

Meu estômago congelou, minha respiração falhou e eu senti o peso da responsabilidade que estava em minhas mãos naquele momento.

Eu tinha apenas uma pergunta a fazer...
Precisava ser a pergunta certa.

— O que eu preciso fazer para salvar o verdadeiro Pete?

O falso Pete ficou sério de repente e desviou o olhar por um instante. Ele pareceu pensativo e receoso antes de responder:

— Morrer — disse ele voltando a me olhar diretamente. — Você precisa morrer, Klay.

Estremeci com a resposta.
Não era o que eu estava esperando.

— Se eu morrer, o destino do Pete vai mudar? Ele terá outra oportunidade para viver muitos anos? — perguntei.

— Eu prometi responder apenas uma pergunta — disse o falso Pete.

Eu não sabia o que fazer ou o que pensar, pois não podia ser assim tão simples. Se eu morresse, que garantia eu teria que Pete estaria a salvo? O motivo de ele ainda estar vivo era por minhas premonições e intervenções no destino, então, como eu teria certeza de que depois da minha morte ele estaria seguro?

Theodora tinha razão...

— Não pense tanto, Klay — disse o falso Pete pegando em minha mão. — Não desista agora, okay?

— Como me pede isso depois do que acaba de dizer? — questionei arrasado.

— Siga seu coração e acredite no seu dom — respondeu ele colocando a mão em meu peito. — Eu acredito que você encontrará as respostas certas. 

O falso Pete voltou a ficar pensativo, colocou uma das mãos no queixo e voltou a me olhar daquela maneira toda fofa e especial.

— Me promete uma coisa, Klay?

— O que?

— Promete que você não vai desistir?

(...)

— Klay?! — chamou Pete me apertando em seus braços na cama. — Klay? Você está bem?

— Pete? — murmurei sonolento. — O que foi?

— Você estava resmungando muito enquanto dormia, amor — sussurrou ele beijando minha testa e meu rosto. — Acho que estava tendo um pesadelo.

Não respondi.
Retribui o abraço e deitei minha cabeça sobre o peito dele para tentar dormir novamente, mas eu sabia que eu não ia conseguir...

Theodora estava certa.
Pete e eu não ficaríamos juntos.

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