12 - Debilitado

Entrei correndo na estação e fui direto para os guichês de atendimento atrás de alguém que pudesse me ajudar a evitar o descarrilhamento do trem. Bati no vidro e acenei para um homem que estava sentado e comendo confortavelmente em uma poltrona dentro da sala de controle da estação.

— Vai acontecer um acidente! — gritei.

O homem me olhou como se eu fosse louco.

— O trem vai descarrilhar e causar um acidente na estação! — exclamei.

O homem continuou sentado na poltrona, pegou outro pedaço de torrada com geleia de um pratinho de plástico e colocou as penas em cima da mesa de controle da estação.
Ele não me deu ouvidos e provavelmente não ia me ajudar.

— E aí, Siri! — falei depois de desbloquear o celular.

— Em que posso ajuda-lo, Klay?

— Discar para Pete Praves.

— Discando...

"Aqui é o Pete! Você sabe o que fazer..." falou a gravação de voz do Pete da caixa de mensagens.

— Pete, é o Klay! — falei começando a tremer. — Estou na Estação Parque Nacional e não te vi na entrada. Por favor, assim que você ouvir esta mensagem, saia da estação e me espere do lado de fora.

Todas as dores e sensações horríveis que eu tinha quando tentava salvar o Pete estavam começando a querer me atrapalhar. Quanto mais me aproximava da escada rolante para descer até a área dos vagões, mais fraco eu ficava. As pontadas fortes em minha cabeça e aquele zumbido agudo em meu ouvido estavam mais fortes.

— Você está bem? — questionou o funcionário da estação que estava em meu sonho.

— Que horas são? — perguntei entre murmúrios de dor.

— Sete e quarenta da manhã — respondeu ele olhando no relógio de pulso. — O senhor está com algum problema?

— Eu estou indo ao médico, não se preocupe — menti para tranquiliza-lo e impedi-lo de me prender ali.

Eu estava ficando tonto, enjoado e sentindo minhas pernas e braços tremerem mais do que da última vez. Eu não podia parar, pois não tinha certeza se Pete tinha visto minhas mensagens.
Ele não tinha respondido, não tinha retornado...

— Pete — murmurei enquanto cambaleava até a escada rolante.

— Você está bem, garoto? — perguntou uma mulher.

— Estou, mas, mande todos se afastarem da área dos vagões — sussurrei por quase não conseguir falar.

— O que? Como assim? — questionou ela.

Eu não conseguia mais falar ou pensar em nada além da dor. Tudo a minha volta começou a girar. Meu estômago estava embrulhado e minha boca começou a salivar. Meu corpo tremia de forma cada vez mais frenética.
A única coisa que eu conseguia era ouvir...

"Atenção senhores passageiros: devido a necessidade operacional, nossos trens estão com velocidade reduzida em todas as estações"

Senti meu pé bater em alguma coisa me fazendo tropeçar e cair. Não consegui segurar em nada, pois minha visão estava embaçada e meu corpo tremia de forma descontrolada.

— Socorro! — gritou uma mulher.

— O garoto está tendo uma convulsão! — gritou outra mulher.

— Se afastem! Chamem os seguranças! — exclamou um homem.

Eu queria gritar por ajuda, mas meu corpo não respondia.
A dor era insuportável.

— Se afastem, por favor! — exclamou uma pessoa.

— Eu conheço ele! — exclamou uma voz conhecida. — Me deixem passar! Eu conheço ele!

***

Quando abri os olhos, demorei um pouco para me acostumar com a luz forte do quarto branco que eu estava. Minha boca estava seca, meu corpo ainda estava dolorido e senti um estranho incomodo no meu braço direito.
Onde eu estava?

— Klay? — chamou uma voz familiar.

— Shawn? — murmurei com dificuldade.

— Está tudo bem, irmão. Vou chamar nosso pai.

— Onde estou?

Shawn não respondeu.

Aos poucos, minha visão ficou mais nítida e eu constatei aquilo que eu mais temia: eu estava em um hospital.
O quarto era pequeno, mas parecia ser de um hospital particular. Havia um sofá, uma pequena mesa de canto e todos aqueles aparelhos medidores de pressão e batimentos cardíacos que apareciam nas séries de televisão. O incomodo que eu sentia no braço era um acesso venoso que me ligava a uma bolsa grande de soro pendurada ao lado da cama.

— Graças a Deus você acordou, Klay — falou minha mãe começando a chorar assim que entrou no quarto.

— Mãe — grunhi.

— No que você estava pensando, Klay? — resmungou meu pai ao lado dela. — O que você estava fazendo naquela estação de metrô?

— Agora não, Albert — falou minha mãe enquanto acariciava meu cabelo.

— Agora sim, Alice! — retrucou ele. — Houve um acidente grave naquela estação e nosso filho podia ter se machucado seriamente.

Acidente grave?

— Onde está o Pete? — questionei tentando erguer meu corpo.

— Quem é Pete? — perguntou minha mãe.

— Deve ser o rapaz asiático que veio com o Klay na ambulância — supôs Shawn.

Se ele veio comigo na ambulância...

— Ele foi para casa, mas disse que voltaria esta tarde para ver como você está — disse meu pai.

— Eu preciso falar com ele...

— Não, Klay — disse minha mãe impedindo que eu erguesse meu corpo na cama. — Você precisa descansar e esperar os resultados dos exames.

— Seu amigo falou que você teve uma crise e convulsionou no meio daquela estação de metrô, filho — disse meu pai ainda revoltado. — Você foi grosseiro esta manhã, saiu sem dizer para onde ia e teve uma crise em uma estação onde ocorreu um acidente grave!

— Albert! — exclamou minha mãe tentando interrompê-lo.

— Não, Alice! — exclamou ele. — Não há justificativas para as atitudes do Klay! Ele podia ter morrido! A sorte é que esse tal de Pete que por acaso também estava longe da faculdade em dia de aula estava com ele.

Meu pai pensava que Pete era meu colega de faculdade. Apesar da bronca, fiquei aliviado por ele achar isso.
Menos uma coisa para eu explicar.

— Tudo bem, então, a bronca já foi dada — murmurei.

— Na verdade, a bronca nem começou... — retrucou meu pai.

— Pai, o Klay precisa descansar — disse meu irmão em minha defesa.

— Você está usando drogas, Klay? — questionou meu pai.

Todos me olharam esperando uma resposta.

— É sério que você pensa isso de mim?

— Seu colega da faculdade disse que você convulsionou e espumou pela boca.

— E só por isso você chegou à conclusão que eu uso drogas?

— Klay...

— Eu estou com dor de cabeça e não quero mais falar sobre isso.

— Eu não terminei de falar, Klay! — resmungou meu pai.

— Já chega, por favor! — exclamou minha mãe. — Vamos deixar o Klay descansar e esperar os resultados dos exames.

Voltei a deitar e tentei relaxar naquela cama dura de hospital. Fechei os olhos e ignorei toda e qualquer conversa que meu pai insistia em ter com minha mãe sobre meu comportamento e minha falta de responsabilidade.
Eu me sentia enjoado, fraco e com a impressão que minha cabeça estava cheia de água. Minha boca ainda estava seca, mas eu não queria pedir nada para meus pais depois de tantas acusações e broncas.
Até as juntas dos meus dedos doíam.

— Você está usando drogas? — perguntou Shawn depois que meus pais saíram do quarto.

— Você acredita mesmo nisso, irmão?

— Eu sei que não, mas nosso pai não está nem um pouco feliz com o que você fez.

— Dane-se ele — resmunguei.

Shawn sorriu.

— Você está encrencado, Klay.

— Não ligo — falei retribuindo o sorriso.

Meu irmão é muito parecido comigo fisicamente, mas tem traços mais voltados para a família do nosso pai. Ele sempre foi mais corajoso e extrovertido que eu. Shawn costumava fazer muitas amizades, praticar vários esportes e interagir mais com nossa família. Eu, por outro lado, era o introvertido e não sociável que passava a impressão de ser inteligente só por ser uma pessoa calada.

— Você está se sentindo melhor?

— Sim, mas você pode pegar um pouco de água para mim, por favor?

Shawn balançou a cabeça positivamente e saiu do quarto atrás do meu pedido. Enquanto eu esperava, senti o quarto começar a girar. Meu corpo ainda doía, mas junto a dor vinha um imenso cansaço mental.

Não era natural...

06

— Você conseguiu de novo — disse Pete sentado na cadeira da mesma lanchonete do sonho que tive dias atrás.

— Como vim parar aqui?

Há um segundo eu estava em uma cama de hospital esperando meu irmão Shawn com a água que pedi e...

— Sim, você está sonhando — disse o falso Pete respondendo minha pergunta mental.

— Você não é real, Pete.

— É claro que eu sou real, Klay! — exclamou ele sorrindo daquele jeitinho especial.

Estava tudo igual ao sonho passado.

— Você só está na minha cabeça.

— E também no seu coração.

— Não diga bobagens!

Tentei controlar o sonho e sair da lanchonete. Fechei meus olhos com força e imaginei uma ilha deserta, uma montanha coberta de neve e até a fantástica fábrica de chocolate, mas...

— Você não vai a lugar nenhum — disse o falso Pete.

— Eu sei o que você está tentando fazer, mas não vai funcionar.

Ele sorriu de novo, mas apenas com um dos lados da boca.

— Por que você tenta fugir dos seus sentimentos até em seus sonhos?

— Do que você está falando?

— Ninguém vai te julgar aqui, Klay.

— Será?

O falso Pete adotou uma expressão mais séria.

— Se você quiser ignorar seus sentimentos por mim, okay, mas não pode ignorar que o que está acontecendo.

Falar comigo mesmo com a figura do Pete era estranho. Odeio sonhos lúcidos que não consigo controlar.

— Eu sei, falso Pete — murmurei coçando a cabeça. — Aconteceu de novo.

— Sim — confirmou ele. — Você teve que me salvar mais uma vez.

— E o que isso significa? — questionei.

O falso Pete ficou pensativo. Ele olhou para baixo e para os lados de uma forma muito fofa.
Até que...

— Quer parar?!

— O que?

— De ficar me olhando deste jeito, Klay!

— Que jeito? Você é louco? 

— Klay!

— Que jeito? Você está louco?

— Klay!

— Responde, falso Pete!

— Klay!

(...)


— Klay?! — chamou minha mãe.

Abri os olhos.
Eu ainda estava no quarto do hospital.

— O que houve?

— Seu amigo está lá fora — sussurrou ela enquanto acariciava meu cabelo. — Ele veio saber se você está bem.

— Pete está aqui?

— Está, mas se você estiver cansado, eu...

— Eu quero falar com ele, por favor.

Minha mãe assentiu com a cabeça, levantou da cadeira a meu lado e saiu do quarto.

Pete estava lá e veio me visitar.
Ele estava lá!

...

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