Nós - Cap 1
Katarina estava linda de amarelo.
Estendo a mão como se pudesse tocá-la, sentir a textura do vestido, colocar uma mecha de cabelo atrás de sua orelha.
No entanto, meus dedos batem na janela de vidro e recuo, a câmera na mão.
Olho para a parede lateral, a consciência levemente pesada pelo que estou fazendo, mas sem conseguir parar.
Pego meu casaco, bolsa e desço até o térreo, dando de cara com ela. Coincidentemente.
- Oi! - Ela me dá um sorriso lindo, que derreteu meu coração desde a primeira vez que a vi - Mateus, né? Nos esbarramos de novo.
- Pois é - Gaguejo, passando as mãos nervosamente nos meus cabelos, e antes que ela possa falar, fujo dali, com as bochechas em fogo.
Katarina é a garota mais fantástica e incrível daquela vizinhança.
Pequena, com enormes olhos cor de mel e sardas na pele branca, parece uma boneca, uma princesa, uma rainha. Não há um lugar que ela vá que não desperte atenção.
Educada, gentil e de coração enorme.
Ela é simplesmente perfeita.
Saio correndo, e estou quase chegando no ponto de ônibus quando dou falta dos meus óculos.
Bato na testa, me amaldiçoando internamente por ser tão desatento. Sem meus óculos, eu não enxergo direito e vivo dando de cara com os postes da rua.
Subo a viela que dá em direção ao meu prédio, o coração batendo forte contra as costelas, em expectativa de encontrá-la de novo. No andar debaixo das residências, tem um pequeno café, e provavelmente ela estará lá encontrando algumas amigas.
Olho discretamente pela porta de vidro enquanto vou em direção as escadas, e suspiro vendo aquela belezura sentada numa mesa... acompanhada de uma figura toda de preto.
- Ela está tensa desde que ele chegou - Leo para ao meu lado, me fazendo dar um pulo de susto. Ele me dá uma piscadela - Não se preocupe, estou de olho nesse idiota.
Dou um suspiro de alivio. Leo é o porteiro e o cara mais tranquilo que eu já vi na vida, um dos meus únicos amigos aqui.
Defende mulher contra marido violento, mesmo com seu emprego em risco, sobe compras para pessoas com locomoção limitada, e sempre alimenta os gatos da vizinhança. Depois de Katarina, ele é minha pessoa preferida.
- Esqueci meus óculos, acredita? - Comento, rabugento e Leo solta uma risada gostosa, voltando para trás do balcão.
- Tenho quase cinquenta anos, rapaz, e você tem a memória pior do que a minha.
- Deus tem seus preferidos, e com certeza não sou eu - Retruco, rindo e subo para pegar meus óculos.
Quando desço novamente, vejo Katarina sair, a mão do homem encapuzado em seu ombro e o olhar baixo, quase temeroso e desconfortável. Minhas mãos se apertam em volta da alça da bolsa, meus instintos gritando que havia algo errado, o ciúmes queimando meu sangue como fogo.
Sem pensar muito, e ignorando que estou atrasado para a faculdade, me vejo seguindo furtivamente os dois.
Algo cheira errado. Muito errado.
WWW
Definitivamente eu não domino a arte de seguir alguém. Chutei duas latinhas e assustei um gato, além de ter ganhado um safanão de uma velha quando tentei me esconder atrás dela.
O homem segue a frente, e cada passo que dá, parece arrastar Katarina.
Meu corpo grita em alerta, e meu coração ruge. Quem é ele, o que está fazendo e porque ela está seguindo-o?
Tantas questões e nenhuma resposta.
Estou prestes a segui-los por uma esquina, quando meu celular escandaloso apita. Me jogo atrás de uma caçamba de lixo antes que eu seja descoberto, se é que já não fora.
- Que é?! - Sussurro, puto com quem está do outro lado.
- Ta perseguindo alguém por um acaso?! - Leticia quase grita do outro lado. - Esqueceu que a gente tem que apresentar um trabalho agora, idiota?
- Agora eu não posso. - Olho por cima da caçamba. Nem sinal deles.
- Você deve estar brincando com a minha cara, Mateus. Se eu não te ver aqui em cinco minutos, você é carne morta...
Desligo o telefone, distraído o suficiente para não dar atenção as ameaças que provavelmente ela irá cumprir. Um olhar no visor me garante que são 9 horas da manhã em ponto.
Saio devagar do esconderijo, olhando ao redor. Estamos longe das ruas tranquilas e familiares do meu bairro. Essa é uma viela escura, suja e vazia. Apenas um ponto me chama a atenção: uma câmera.
Com o coração retumbando e a carne tremendo, avanço para a esquina onde os vira sumir e ao virar, uma pancada forte na cabeça me faz cair.
Tudo o que vejo são sapatos pretos antes de deslizar para a inconsciência.
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Acordo com uma dor de cabeça gigante.
Olhos azuis preocupados me encaram quando eu olho em volta, confuso.
- Onde eu estou? - Pergunto, a língua pesada, com a sensação de ainda não estar ali 100%.
Leo abre a boca para responder, mas é interrompido por uma voz grossa e fria.
- Senhor Mateus? - Alguém me chama, e o simples virar de cabeça faz estrelas dançarem no meu campo de visão.
Um homem de uniforme me encara, com cara de poucos amigos.
- Quem é você?
Ele exibe algemas e pega meu pulso.
- Eu sou o policial Davi, e estou aqui para te prender pelo assassinato de Katarina Castro.
- O... o que? ! - Olho alarmado para Leo. Ele parece desesperado também, sem saber o que fazer.
- Não sei o que está acontecendo, Mateus. Me ligaram porque eu era o contato mais recorrente na sua agenda, já que você não tem família.
- Ela... ela morreu? - Sussurro. É a única coisa que consigo absorver.
Leo balança a cabeça, os olhos marejados.
- E eu... - Olho para o policial, notando que ele tem um parceiro atrás de si - ... estou sendo acusado de assassiná-la?
- Nos acompanhe por gentileza até a delegacia. - Ele força a algema nos meus pulsos e me arranca da maca. O sigo tropeçando, a visão escurecendo e mal aguentando a tontura.
Mas sou arrastado mesmo assim, e sussurros se espalham enquanto as pessoas notam a cena.
Mas eu não me importo. Só um pensamento passa pela minha cabeça, enquanto eu sou arrastado até a viatura, sob a chuva de protestos de Léo, que tentava se enfiar no meio e não deixar.
Ela estava morta.
Katarina. A mulher por quem eu era perdidamente apaixonado.
Estava morta.
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