Um Salto
c a p í t u l o c r o s s o v e r
— Tem certeza que pegou tudo? — perguntou minha mãe quando desci para a cozinha, tomando liberdade para rumar pela minha bolsa por conta.
Hoje é o dia em que a Nekoma irá treinar com a Fukurodani, e também o meu primeiro dia de retorno às quadras.
Desde na noite passada estou com o peito repleto de ansiedade, a ponto de não conseguir dormir direito. Apesar de ter conferido a bolsa três vezes, ainda tinha a sensação de esquecer algo.
— Espero que sim — respondi —, seis meses não deve ser o suficiente para se esquecer como se faz uma bolsa de treino.
— Vai dar certo — a mulher segurou meu rosto entre as mãos —, não exagere, cuidado e mais importante... Se divirta.
Estava saindo um pouco mais cedo do que o comum, afinal tinha que ira para a Nekoma por transporte público e depois disso a viagem para a Fukurodani seria feita com o ônibus da escola. Quando saí do portão de casa, vi Kenma e Kuroo parados no fim da minha rua já esperando para irmos juntos ao colégio.
— Estou atrasada? — questionei assim que me aproximei.
— Não, Kuroo está adiantado — Kenma dedurou ganhando uma cara feia do capitão.
Troquei o peso da perna colocando a mão na cintura — Você reclama da Fukurodani e do Bokuto, mas também fica animado para encontrar com eles. É o cúmulo de bons amigos.
— É o melhor treino que podemos conseguir na região, apenas isso — ergueu as mãos explicando —, o que posso fazer se aquele cabeça de vento não desgruda de mim?
— Ser um pouco mais sincero com seus sentimentos é um bom começo.
Kenma já tinha se acostumado com a nossa rotina, acredito que mentalmente ele deva até agradecer por não precisar desviar dos seus jogos para responder o capitão. Apesar de manter os ouvidos bem atentos ao que conversamos, fazendo comentários pontuais sobre o assunto. Geralmente concordando comigo, para o desespero de Kuroo.
Porém, a pauta de hoje foi algo um pouco mais comum e sem espaços para provocações.
De alguma maneira Nico virou assunto, e também Yusuke que é o primo de Bokuto, era mais um capítulo da história dos dois montando um time no campeonato interno da escola para derrotar Haruo.
— Parece que agora eles tem um time de seis alunos para jogar, mais dois meninos e duas meninas que aceitaram se juntar. Só falta inscrever o time com um responsável e eles devem conseguir participar. Pelo que eu escutei meu pai vai fazer o formulário pra eles.
— Um pequeno grupo de rebeldes sem causa — Kuroo comentou —, Nico tem futuro.
— Fico feliz dele tentar se impor, mas me preocupa ele colocar expectativas sobre algo incerto — respondi —, nem nós conseguimos lidar com a derrota direito. Quem dirá uma criança.
— Você é uma boa irmã [Nome] — Kenma disse assim que entramos na escola —, mesmo que você queira ser o suporte. Uma hora o herói leva dano, só assim ele entende que precisa melhorar.
Como sempre, ele estava certo.
— Bom dia! — Yaku nos cumprimentou assim que chegamos, além dele, Kai, Fukunaga, Tora, Shibayama e Inuoka também estavam presentes. Aparentemente apenas Lev não chegara ainda.
— Ele parece um gato de rua — Yaku reclamou andando na minha frente de um lado para o outro —, acha que pode chegar quando bem entender. Precisa de um corretivo.
— Pare com isso — o vice-capitão disse se sentando ao meu lado —, estamos todos adiantados. Ele deve estar chegando.
— O que tem com Tora? — perguntei — Normalmente ele estaria mais animado.
Kai seguiu meu olhar e riu, o número 4 do time tinha os braços cruzados e os olhos fechados. Parecia estar num mantra mental ou algo parecido.
— Imagino que ele deve estar se preparando para encontrar com as espartanas — comentou —, elas sempre aparecem no fim dos treinos. É assim desde o nosso primeiro ano, mas parece que ele ainda não se acostumou.
Balancei a cabeça, só porque ele está um pouco mais acostumado a falar comigo não quer dizer que se aplica a outras garotas.
— Ouvi dizer que o time feminino da Fukurodani está entre os favoritos — Yaku levantou os braços cruzando as mãos atrás da cabeça —, depois da matéria na revista semanal que saiu falando delas, mais ainda.
— Estão certos em questionar a atenção seletiva — respondi sabendo exatamente sobre o que ele falava
O porquê do pilar principal da Fukurodani não ser cotada como uma das melhores jogadoras do país e como todos parecem fechar os olhos. Geralmente quando isso acontece, quer dizer que tem alguém de fora interferindo, já vi acontecer algumas vezes na Itália. Pode ser outro país, mas não duvido ter alguém manipulando o cenário por trás das quadras, como já vi acontecendo.
Meus pensamentos foram repentinamente dispersos pela chegada de Lev, e também dos treinadores. De repente um nervosismo se fez presente, fazendo até mesmo as minhas mãos suarem frias.
O percurso foi curto, quando descemos no estacionamento da Academia Fukurodani quase senti as pernas vacilarem. Dei as instruções para os primeiros anistas de apoio, e mais uma vez agradeci treinador Nekomata pela chance.
— Não se preocupe e dê seu melhor — o mais velho sorriu —, até seu retorno, vamos esperar.
Foi no caminho para o ginásio que aquela por quem estava esperando apareceu. A postura confiante, queixo erguido e um sorriso.
— Antes de serem massacrados, vim roubar a gerente de vocês — um sorriso se abriu no rosto da capitã —, espero que não se importe.
Ela pode ser amiga dos gatos, mas continua sendo e torcendo para as corujas. Raios se chocaram entre ela e Kuroo, o capitão desviando o olhar na minha direção por um segundo.
— Fique sabendo que não estou fazendo isso por você, corujinha.
O ignorando por completo, a capitã da Fukurodani se colocou ao meu lado, enlaçando o braço com o meu e me puxando de leve para seguir na direção contrária.
— Como se alguém precisasse de qualquer permissão sua para fazer algo — respondeu acenando para alguns dos jogadores que conhecia —, devolvo ela quando terminar, ou não.
Havia um tom provocativo em sua voz.
— Não se atreva capitã.
Os garotos riram e assim ficaram para trás, ela parecia feliz.
— Achei que a minha relação com Kuroo era peculiar — comentei —, mas vocês dois parecem querer se matar.
— A primeira vez que nos encontramos, ele achou que eu era uma líder de torcida — ela explicou —, o odiei. Mas como Kou e o Bakaneko se aproximaram, não tem muito o que eu fazer além de suportar sua presença, e os conselhos amorosos idiotas que ele dá pra ele.
Parece com uma certa desculpa que eu já ouvi hoje, no fim são mais parecidos do que imaginam.
— E ser uma boa amiga — respondi rindo —, consigo ver por debaixo de toda essa pose que você se respeitam.
— Kuroo ficaria insuportável se soubesse, agradeço de manter esse segredo entre nós duas.
A capitã piscou um olho para mim, pedindo por colaboração nesse segredo.
— Meus lábios estão selados — fiz um movimento de zíper.
Silêncio se fez presente durante a curta caminhada, estava acontecendo de verdade. O que era então uma sensação nebulosa começou a se tornar insegurança. Faz tempo demais que não tenho uma experiência séria numa quadra, será que meus sentidos continuam afiados?
A posição como representante U-19 pesa quando constroem uma imagem minha como jogadora, para o time feminino com que eu me identifiquei gostaria de deixar uma boa impressão. Principalmente porque algumas delas pareceram não ir muito com a minha cara.
— Não são todas as minhas jogadoras que estão aqui, as que vieram o fizeram por vontade própria. Inclusive a vice-capitã — a voz suave da capitã me alcançou, só então percebi estar segurando com força a manga do seu agasalho. — A maioria delas não conseguia manter a bola no ar por dois toques quando começamos.
Ela continuou explicando — O porquê de estar aqui, todas sabem, tem permissão para errar e levar o treino no seu ritmo.
Um suspiro longo deixou minha boca, com ele parte das minhas preocupações.
— É assustador como você parece saber o que se passa na cabeça das pessoas — respondi.
— Já ouvi isso algumas vezes.
Quando entramos no ginásio, minhas pernas pareceram travar, todos os olhos se viraram na minha direção. Segurei a alça da minha bolsa, parece tolice, mas estar ali pela primeira vez me deixou mais nervosa do que começar numa nova escola num novo país.
Diferente da primeira vez que voltei para um ginásio, quando aceitei que não queria tirar o vôlei da minha vida. Aquela atmosfera, eu não tinha desde do acidente.
Senti um toque nas minhas costas e então um empurrão, não com força, mas me dando apoio e segurança. Dei um passo firme para dentro respirando fundo e me curvando em seguida.
— Obrigada por me receber.
— E aí [Nome]? — Aki ergueu a mão me cumprimentando se aproximando com um sorriso amigável. Yusuke realmente lembra a irmã.
Já tinha encontrado as outras jogadoras durante o intercolegial então as reconheci, as meio de redes. Keiko e Sora, essa segunda sendo a vice-capitã, Emi a líbero, Hana a outra atacante fechava o grupo das terceiranistas. Misa que era a levantadora, não parecia estar no treino.
Lembrando de como ela correu para fora do ginásio da última vez, talvez seja um problema um pouco mais profundo do que aparenta. E um que eu não preciso saber.
— Tenho que admitir, você é corajosa de entrar na cova do leão por livre e espontânea vontade — Keiko comentou e juntou as mãos na frente do corpo —, desculpa antecipadamente.
Sora bateu nas costas dela a fazendo dar um pulo — Calada Kei.
— Vocês estão agindo como se eu estivesse pronto para matar alguém.
Uma voz soou detrás de mim, me virei e encontrei o mesmo cara loiro que estava no consultório do meu pai, ele tinha uma careta e estava acompanhada de uma mulher, a assistente técnica que já tinha visto no banco do time.
— Não é sempre esse o caso? — Hana rebateu.
Um riso ecoou e a assistente se aproximou — Eles começaram cedo hoje, Chie Miura, sou responsável por parte do treinamento e análise de jogos. É um prazer te conhecer [Nome]-san.
— Igualmente — respondi, nisso o homem se aproximou.
— Desculpe por não te cumprimentar quando fui ao consultório D'Calligari. Minha irmã falou de você, mas ainda não havia feito as ligações — se desculpou.
— Sem problemas.
— Comessem a se aquecer, fósseis e dinossauros — ele gritou e o time concordou. Dan, como pediu que o chamasse, se virou mais uma vez — Fiz um treino relativamente simples, a capitã me disse que continua fazendo um tratamento de impacto, então vamos devagar. Tem alguma coisa que você não se sente a vontade, ou não tem confiança de fazer ainda?
Balancei a cabeça — A princípio não.
— Ótimo, me diga caso tenha qualquer desconforto.
Deixei a bolsa na arquibancada e me juntei ao aquecimento, a capitã ficava na frente e fazia contagens enquanto o restante seguia.
Havia também sentado nos degraus dois outros garotos, um deles loiro como o treinador com uma tala imobilizando o braço e ao lado dele, outro com uma prancheta que me deu um aceno de cabeça quando nossos olhos se encontraram.
— Muito bem, vamos passar por um pouco de tudo hoje e vamos terminar com alguns sets — o treinador disse — mas esse Chie vai explicar como vai funcionar para vocês depois. Façam duas filas, começamos com cortes.
— Se fosse uma ideia do treinador Esparta eu ficaria com medo, mas como é da treinadora Atena fico preocupada.
Levantei a boca para esconder um riso, quem disse isso foi a meio de rede, Keiko. Sem perceber tomei um lugar na fila, a capitã estava no outro grupo junto de Sora e algumas segundanistas.
— E não é? — Emi que estava na minha frente disse — Chie tem essa carinha de anjo, mas é tão terrível quanto o Dan.
— Porque Esparta e Atena? — questionei.
Keiko colocou as mãos nos meus ombros se inclinando para explicar — Dan porque os treinos dele parecem uma guerra, e Chie porque os dela parece uma prova simulada.
Ri novamente, apesar dela responder daquela maneira consegui entender o que quis dizer. Treinamento intenso de um lado, estratégia e sabedoria do outro, mesmo entre os técnicos elas parecem ter uma boa combinação.
— Oh, Emi mandou para fora.
— Sou líbero, não preciso saber cortar — ela gritou com Hana que estava já do outro lado da rede.
Olhei para o lado e chegou o momento da capitã cortar, ela olhou para mim antes de jogar a bola para a levantadora. Foi um toque simples, nem tão longe e nem tão perto, mas alto como nunca tinha visto. A garota jogou os braços para trás tomando impulso e pulou, não tinha vento dento do ginásio delas, e ainda assim senti o ar tremular com seu movimento.
O giro do braço não tinha movimentos desnecessários, e o som que a bola fez quando acertou o outro lado foi perfeito.
Girei o pescoço e peguei a bola que me jogaram, respirei fundo e lancei para a levantadora.
Um passo depois do outro, tomei impulso e pulei.
Não tinha jogadores me esperando para um bloqueio do outro lado da rede, apenas a bola e eu. Quando voltei para o chão, não havia dor e ainda que o primeiro passo depois disso fosse incerto, é em direção ao futuro completamente livre das algemas que eu mesma coloquei depois do acidente.
Também do outro lado, não estava sozinha. A capitã me recebeu com um sorriso e a mão estendida.
— Boa cravada.
De repente me lembrei do que eu esqueci de colocar na bolsa, era a minha própria confiança.
Bati em sua mão, o som ecoando pelo ginásio logo depois disso — Obrigada, capitã.
- ͙۪۪̥˚┊❛ [ EXTRA 17❜┊ Enfim, juntas˚ ͙۪۪̥◌
N/A: Lembrando! Capítulos Crossover, não necessáriamente atingem a história. Eles são projetados para se complementarem.
Ler as duas fics dá uma visão mais profunda do cenário, mas ler só essa também está tudo certo. Não posso forçar ninguém ir pra saga Legends, apesar de eu amar muito ela e achar uma jornada épica. Hahahaha
Obrigada por ler até aqui!
Até mais, Xx!
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