Qualificatórias





— Irmãzona, por que você não pode ir para o ginásio direto de casa? Não é o mesmo?

Era mais uma manhã de jogo em que Nico acordava pela movimentação na casa e então vinha para o meu quarto dormir na cama junto de Zun enrolado no travesseiro.

Me sentei na beirada da cama afagando seus cabelos — Preciso garantir que os jogadores não vão esquecer nada, também tenho que levar os meus equipamentos de apoio, não é? Mesmo indo para o mesmo lugar, tenho que arrumar muitas coisas antes.

Nico respirou fundo e fechou os olhos resmungando qualquer coisa em italiano sobre toalhas que não consegui entender, esperei por um momento para ver se ele voltaria a acordar, mas não aconteceu. O gato cinza também bocejou aninhando a cabeça nas patas para acompanhar o caçula numa soneca mais que merecida.

Ver ambos ali quase me fazia ter vontade de voltar a deitar e ficar com eles, porém, estava longe de ser uma opção. Voltaria a vê-lo no ginásio de qualquer forma.

Se passaram algumas semanas da classificação das preliminares, agora só restavam as qualificatórias e a decisão das três vagas para o Torneio Nacional de Primavera. Colégio Nekoma, Academia Nohebi, Academia Fukurodani e Academia Itachiyama, enfrentam dois jogos no ginásio de Sumida. Aqueles que passarem ganham automaticamente a vaga, disputando apenas primeiro e segundo lugar no chaveamento.

Para os perdedores fica a decisão da vaga de cortesia.

No geral, sabíamos não ser um jogo fácil. Independente de quem fossem nossos adversários, mas jogar com a Fukurodani logo no primeiro jogo era algo quase tão pior quanto jogar contra a Itachiyama, para quem perdemos no intercolegial.

Naquela manhã, como de costume, após deixar minha casa, encontrei com os garotos esperando para irmos à escola juntos. Os cumprimentei com um breve e silencioso bom dia, geralmente as manhãs seriam cheias de sarcasmo e piadinhas para dobrar o sono, mas hoje não era o caso. Apenas deixei eles com os próprios pensamentos e os acompanhei durante o trajeto.

Quando chegamos na Nekoma as coisas pareciam um pouco mais normais, a maioria dos meninos estavam engajando com falas aleatórias para não deixar o nervosismo subir a cabeça e perder a partida mentalmente antes mesmo de começarem. Apesar de estarem a um passo do nacional, Nekomata-sensei e Naoi tiveram uma boa conversa com eles antes de partir, afirmando mais uma vez que estavam no lugar certo, e que não importava o adversário, eles tinham, sim, a capacidade de vencer.

Com o nervosismo inicial longe dos ossos, a confiança ganhou seu lugar.

— É bom que melhorem essas caras mesmo, não quero que meu time veja a Nekoma com cara fechada — me apoiei no banco do ônibus olhando para os jogadores já sentados.

— Seu time? — Lev perguntou do fundo. — Mas, não somos nós?

Sorri — Nesse caso, não, é o time que eu treino. Nico e os amigos dele vão assistir ao jogo hoje, então tratem de colocar um sorriso nos rostos de vocês e não assustar as minhas crianças.

— Olha Yaku — Tetsurou se ajeitou na poltrona. — É uma boa chance de arrumar um fã.

O líbero fez uma careta, provavelmente foi Kai ao seu lado que impediu que ele pulasse as poltronas para pegar um punhado dos cabelos escuros do capitão e puxar.

— Tenho fãs, tá legal! A única coisa que eles estão na multidão e não são o irmão mais novo da minha namorada.

— Para isso você precisaria de uma.

Uma discussão se instaurou dentro do ônibus, dois deles sendo a briga principal e o restante tendo pequenas conversas paralelas ao assunto. Quando os treinadores subiram ficaram sem compreender o que estava acontecendo, mas antes que Naoi dissesse algo para os acalmar. O treinador Nekomata deu risada e se sentou.

— Manabu, deixe os garotos. É melhor que estejam tranquilos.

— Mas Nekomata-sensei...

— Não se preocupe — também me sentei. Geralmente ficava sozinha no primeiro branco próximo a eles. — Eles não vão se matar, depois do jogo talvez, mas agora não.

O homem franziu e respirou fundo antes de soltar os ombros — Não diga isso [Nome], nem de brincadeira.

Não demorou muito para a conversa da vida romântica de Yaku ter um basta, afinal não era qualquer um e sim o demônio-senpai que estava no olho do furacão. Precisou apenas de uma pontinha da sua raiva interior escapar para que todos eles parassem. Fora isso, a viagem foi tranquila, apenas até a entrada do ginásio.

Ainda das escadas, encontramos o time masculino da Fukurodani.

— Oh Nekoma! Parece que chegamos juntos — Bokuto disse.

— Jura? — Tetsu rebateu. — Se você não me falasse, eu não ia perceber.

O Chapeleiro Maluco devolveu para o capitão um sorriso que eu nunca tinha visto antes, sarcástico como os que Tetsurou costumava sustentar na boca.

— Alguém pisou no seu rabo, Kuroo-kun?

O capitão também sentiu o tom de provocação, e sendo o rei dela seu um passo à frente. — Eu? Estou em perfeitas condições, mas e você? Limpou as penas das suas asinhas?

Cruzei os braços e fiquei olhando os dois trocando farpas com certo interesse. Já tinha visto discussões dos dois, muitas delas, especialmente nos acampamentos de treino. Mas foi a primeira vez que ambos estavam igualmente agressivos. Bokuto, por exemplo, sequer parecia o cara que vinha feliz me pedir levantamentos. Ali ele estava como o capitão da Fukurodani.

— Bokuto-san — Akaashi o levantador chamou. — Se ficar discutindo com o Kuroo-san vamos perder os lugares para o jogo do time feminino.

— Ah! — ele gritou passando na frente de todos. — Isso não pode acontecer.

O vice-capitão olhou para a Nekoma e acenou com a cabeça em sinal de respeito antes de sair atrás do capitão do time com o restante dos jogadores.

— Parece que a Fukurodani estará em boas condições hoje.

— Diz isso baseado em quê? — Kenma que estava ao meu lado, perguntou.

— Projeção — respondi. — Os jogos femininos acontecem antes, então vamos entrar na quadra com eles depois da partida das espartanas de Tóquio. Eu não acho que elas vão perder, então a motivação do time estará no ápice.

Kenma soltou um resmungo, provavelmente considerando as probabilidades com aquele fato. Sabemos que ambos os times se incentivam dentro e fora de quadra, sabendo como a vitória é importante para elas, os garotos certamente serão altamente influenciados.

Não havia maneira delas perderem aquela partida.

Seguimos na mesma direção, porém desviamos do lado de dentro. Cada um dos times tinha uma ala para equipamentos, guardamos tudo no lugar e olhamos um pouco dos jogos antes de nos aquecer. Não cheguei a descer para a quadra, vi da arquibancada, e mesmo assim a intensidade dos ataques chegavam até mim como se eu estivesse dentro das linhas da quadra com elas.

— Você sabe a história delas? — questionei Tetsurou que também olhava com atenção as jogadas de alto nível feitas pelo time feminino da Fukurodani.

— Sim — respondeu. — Não me impressiona elas estarem jogando como se valesse a vida delas.

— É porque vale — bati os dedos na grade. — Como você se sentiria jogando com alguém que roubou todas as suas chances por inveja? Não é só a Capitã Coruja que está avançando com todas as armas que têm, o time inteiro está.

Ele se apoiou na grade colocando os braços para frente e cruzando os dedos — Elas são boas desde o primeiro ano, mas esse ano parecem estar num nível completamente diferente.

— Ficaria surpreso em quanto a vontade de algo influencia na vitória. Apesar de Kenma não acreditar e nem gostar muito, quando Tora fala da força de vontade, às vezes é a única coisa que nos faz mexer. — Olhei uma última vez para a quadra e me virei.

— Melhor irmos, não vai demorar para acabar.

Tetsurou ajeitou a postura — Mas ainda está na metade do primeiro set, tem certeza que não quer ver mais?

Dei minhas costas para ele — Sim, eu já sei o resultado. Podem ser minhas amigas, mas a Nekoma ainda é meu time. Bem, o time que faço parte, os pequenos rebeldes de Nico são outra coisa.

— Falando nisso, como você conseguiu reunir todos eles?

— Meu pai se voluntariou forçadamente para ir buscar aqueles que não tinham como vir, e levar de volta — respondi.

Finalmente a vingança por ter me inscrito como treinadora de Nico sem me perguntar antes retornou, ele ficaria responsável por todas as crianças que estavam sem os pais hoje. Sorte do velho D'Calligari que minha mãe é muito benevolente e resolveu ajudar.

— Me lembre de nunca cair no seu lado ruim — Tetsu anunciou.

Me virei e continuei andando de costas, lançando para ele um sorriso com várias interpretações — É só você ser um bom garoto.

Um brilho atravessou suas íris douradas e sumiu em seguida visto que nos juntamos ao restante do time. Imediatamente bati palmas mandando eles se levantarem para aquecer. Por não terem tantos times, era mais organizado, permitindo que eles se aquecessem por mais tempo que nos finais de semana anteriores.

— Lev — chamei, vendo que ele não estava tão animado como de costume. — Você está bem?

— Calli-senpai! — me chamou surpreso, fazendo seu rosto parecer ainda mais pálido. — Não, está tudo bem...

O garoto desviou os olhos para o outro lado, e pude jurar ver suor se formando em sua testa. Coloquei as mãos na minha cintura, e olhei para ele novamente.

— Então, porque está suando frio? — questionei — E está massageando a barriga constantemente.

Seus ombros se levantaram em susto, lentamente ele virou para me encarar. Nesse momento peguei seu rosto com apenas uma mão, o segurando pelas bochechas.

— Você quer ir ao banheiro — acusei.

— Sim. — respondeu mesmo com a boca feita em bico.

— E por que não foi?

— Porque se eu demorar a Nekoma vai entrar na quadra sem mim.

Soltei seu rosto e suspirei audivelmente — Lev, o chamei. — Sobrevivemos sem você, não é pior do que passar mal em quadra? Ou fazer o que você deve fazer no banheiro nas roupas?

— Calli-senpai! — ele ficou vermelho com o pensamento, honestamente eu nem queria saber o que estava passando por sua mente naquele momento.

— Vai logo — peguei a bola de sua mão. — Tem um set inteiro de tempo para fazer o que precisa. Sugiro não perder tempo.

Em seguida, ele saiu correndo sem um segundo pensamento.

— Ei! Lev! — Yaku tentou chamar, mas joguei a bola em sua direção.

— Deixe ele — defendi o leão bebê. — Melhor ir ao banheiro agora do que acontecer uma tragédia depois.

— Já falamos para ele não exagerar no café da manhã, nem comer nada pesado. Mas parece que ele não aprendeu! — rebateu pegando a mesma bola que joguei nele. — Devia deixar ele passando mal.

Juntei as mãos na frente do corpo — Como poderia eu, a Deusa do Vôlei, deixar um dos meus fiéis jogadores em aflição? Especialmente antes de uma partida. Demônio-senpai, não devo ser corrompida pela sua malícia tremenda.

O líbero fez uma careta e devolveu o movimento jogando a bola na minha direção, mas eu me curvei para receber. A parábola feita pela trajetória levou a bola diretamente para o carrinho.

— Calli-senpai! Boa recepção! — Shibayama e Inuoka disseram.

Sorri para Yaku, que ficou o tempo todo reclamando da minha personalidade. Ainda que estivesse ajudando ele a aquecer em suas recepções. Não muito depois, depois do aquecimento, os garotos resolveram se sentar próximos à saída das quadras, aguardando os jogos terminarem.

Shibayama disse que ia ficar de olho no jogo feminino, uma vez que a outra partida havia terminado há algum tempo, e só restava aguardar.

— Nós estamos literalmente a um passo do nacional — o capitão disse enquanto estava parado na frente dos outros. Tentando dar algumas palavras de motivação. — Vamos fazer o nosso jogo de sempre.

O time gritou concordando, mas atrás de Kuroo vi um jogador desconhecido aparecer. Apesar de imaginar sua escola pela cor do casaco.

— O jogo de sempre — disse uma voz nasalada regada com um tom cínico. — Uma defesa e trabalho de equipe com aproveitamento alto o tempo todo, e sempre deixam passar aquele "quê" decisivo, não é? Filhotes de gato?

Ergui uma sobrancelha e coloquei as mãos apoiadas no banco em que estava sentada. Tora agora estava na minha frente de pé avançando na direção do garoto da Nohebi.

— Pare com isso Yamamoto — Kuroo chamou. — Não ligue para as cobras.

— Você está sempre com o mesmo corte de cabelo — apontou o recém-chegado. — Usa para ficar mais alto? Você nem deve ter 1.80 m.

— Hã? Eu não preciso de truques para ser alto. — Falar da altura dele podia ser tão ruim quanto mencionar para Yaku. Agora era ele que estava na frente do desconhecido. — Para sua informação, eles apertam o cabelo para medir.

— E você, que levou um fora da Mika? — Tetsurou jogou uma frase venenosa no ar. — Vai conseguir jogar de coração partido?

— Os dois de novo nessa — comentou Kai.

— É comum acontecer? — perguntei.

Yaku deu de ombros e fechou os olhos ao cruzar os braços — Sempre que eles se encontram.

Me levantei e passei por eles, abraçando a cintura do capitão pelas costas. — Tetsu, quem é esse? Nunca o vi antes.

O choque foi generalizado para todos eles, eu nunca faria algo como aquilo num ambiente de torneio. Porém, considerando que aquele garoto estava atormentando meus meninos, parecia uma boa oportunidade para ajudar. Afinal, cobras também são alimento para lobos.

Os olhos de fenda viraram para mim, o capitão já havia entendido minhas intenções e resolveu entrar na encenação logo depois de passar o choque.

— Ninguém que precise se preocupar — respondeu.

— Oe, oe, o que significa isso? Todos sabem da gerente da Nekoma, mas... — sua voz travou quando mirei os olhos nos seus o desafiando.

— Mas o quê? — pedi para continuar. O garoto, que eu ainda não sabia o nome engoliu seco.

— Vamos nos encontrar na final! — ele gritou para Tetsurou e então saiu.

Soltei a cintura do meu namorado voltando ao meu normal — Medroso.

— Se você me olhar com a intensidade que olhou para ele, também fugiria. — empurrei o capitão para o lado e voltei para me sentar no banco de antes.

— Não sabia que você mantinha os olhos nos relacionamentos das outras pessoas — cruzei as pernas olhando para ele e dei o cheque-mate. — Kuroo.

Tora que veio ao seu socorro — Calli-san, não precisa disso! Sabemos que Daisho sempre vem falar besteira, então temos uma rede de informações na Nohebi.

Me inclinei para a frente — E por que eu só descobri agora?

Taketora se ajoelhou na minha frente segurando as mãos fechadas em punho no alto, como se eu já tivesse dado a ele uma punição.

— Nossa deusa do vôlei não merecia ter contato com um ser tão desprezível como Daisho, nem sequer ouvir a menção do nome dele. Mika-chan foi apenas algo que descobri e contei para Kuroo-san se defender.

Coloquei o dedo no meio da testa dele e o empurrei de leve para trás — Vocês são fofoqueiros demais. Abaixe os braços, ou vai começar a partida cansado.

— A partida feminina acabou! — Shibayama veio correndo para avisar.

— Bem, vamos lá. — o capitão comentou, segui os garotos de perto, já sentindo a atmosfera frenética que vinha das partidas femininas. A Nekoma tem a sua torcida, mas a Fukurodani com sua banda e líderes de torcida era algo diferente. Considerando que seu capitão também estava confiante, podia dizer termos um potencial problema pela frente.

Ajudei os garotos a se aquecerem como de costume, tudo que tínhamos conversado fora da quadra ficando realmente do lado de fora.

Em certo momento andei próxima à rede para pegar uma bola que rolou para longe, e quando me levantei vi próximo a mim um enorme número 4 vestido num jogador ainda maior. Um sorriso abriu no meu rosto, não do tipo gentil, mas distorcido.

Sem perder a oportunidade, usei dos mesmos dons do rei da provocação para tentar tirar ao menos um pouco da confiança problemática dele.

— Não vai pedir para eu levantar para você hoje vai?

Bokuto se virou levemente e me olhou com cima dos ombros. A aparência leve e despreocupada, até boba, podem deixar que ele seja mal interpretado, mas no fim corujas também são carnívoras e se quiserem podem até mesmo tentar devorar gatos.

Um brilho feroz passou pelos seus olhos redondos de pupilas em fendas.

— Não, hoje não.














N/A: Olha o capítulo passando!

Mesmo não sendo o fim de semana deles, vou tentar postar sempre que conseguir! Isso, fora os dias "regulares".

Obrigada por ler até aqui!!

Até mais, Xx!

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