Interesse



Quando percebi, as preliminares do torneiro de primavera começaram pelo país inteiro. Os times que conseguiram alguma posição entre os quatro melhores do ano passado, seguiam como cabeça de chave para a segunda fase. Aqueles em posições baixas, medianas, ou que estavam lutando pela primeira vez jogavam antes. Que foi o caso dos rivais predestinados de Miyagi, que já tinham feito um jogo pela província quando retornaram para o acampamento em Tóquio muito depois do fim das férias de verão.

— Não vejo nenhuma das espartanas na Fukurodani hoje — Kenma comentou andando ao meu lado. — Normalmente a capitã vem te encontrar assim que chega.

Ajeitei a bolsa no ombro acompanhando o time até o ginásio masculino.

— Pelo que sei, o time foi convidado para participar de um jogo em uma universidade hoje — respirei fundo, com certo pesar. — Se elas aparecerem, será apenas no fim do dia.

— Está triste por isso? — perguntou o levantador.

— Triste é uma palavra muito forte, mas será a primeira vez em que vou encontrar a capitã depois que voltei da Itália. Temos uma promessa, estava esperançosa de cumprir ela dessa vez.

Além do pequeno desafio mental.

— Que tipo de promessa? — Kuroo se curvou para frente tentando entrar na conversa.

Sorri e respondi — Do tipo que não te interessa, capitão.

Escutei risadas atrás de mim, Tetsurou só deu de ombros, e nisso um resmungo foi ouvido.

— Eu não entendo — Lev disse. Parei e me virei, assim como o restante dos garotos que praticamente abriram caminho para o mestiço. — Se Kuroo-san e Calli-senpai estão namorando, por que continua parecendo que eles se odeiam?

Tora bateu em seu ombro, e o forçou para baixo — Você ainda é uma criança, quando crescer mais vai descobrir que amor e ódio são faces da mesma moeda.

— Ah, Tora está tentando falar bonito de novo.

— Kenma! — reclamou o ace fazendo um certo drama.

Levantei a mão até os cabelos, os ajeitando para trás — É o que costumam falar, mas não sei se é verdade. Nosso caso é mais uma questão de rotina e também respeito com vocês, ou preferem que fiquemos cheios de corações voando durante o treino?

Yaku cruzou os braços negando ativamente com a cabeça — Nem pensar.

Segurei o rosto de Kuroo com apenas uma mão apertando suas bochechas em posição de pinça — Sem falar que esse cara aqui se diz o rei da provocação, tenho que estar a altura. Nosso veneno se neutraliza.

Balancei o rosto do meu namorado antes de o soltar — Não pense muito sobre isso, Lev.

Tetsu esfregou o rosto — É Lev, não fique pensando no relacionamento alheio. Devia estar pensando em como melhorar, já que estamos num acampamento de treino.

— Ou como acertar o tempo de bloqueio — completei.

— Ou deixar de fazer recepções de merda.

— Ou pular para cortar sem errar o tempo e deixar a bola cair no nosso lado da quadra.

Essa última veio de Kenma, e também era uma reclamação pessoal, uma vez que ele esteve treinando cortadas com Lev uma boa parte dos treinos da Nekoma, inclusive quando estive viajando.  A cabeça de Lev tombou para o lado, depois da sequência seguida de acertos seu espírito pareceu ter deixado o corpo para trás.

— De repente, parece que ficamos com mais três cópias de Yaku no time — Kai disse com um riso.

— O que quer dizer com isso?

— É autoexplicativo, demônio-senpai — bati em seu ombro e voltei a andar com Kenma ao meu lado, deixando eles para discutirem por conta.

Respirei fundo, o ar da Fukurodani parece até ser diferente. A estrutura nunca falha em me impressionar, por frequentar a escola algumas vezes durante o ano já me acostumei com os caminhos, então antes de ir para o ginásio fui direto para a área onde as gerentes costumam guardar os equipamentos.

— [Nome]-chan — Yukie me cumprimentou —, chegou cedo dessa vez.

— Como é perto, é mais vantajoso para nós. Bom dia!

— Bom dia — a segunda gerente das corujas também apareceu.

Coloquei a bolsa apoiada na bancada e então comecei a fazer as preparações, verifiquei as garrafas e também comecei a preparar as bebidas dentro delas. Tudo isso trocando palavras bobas com as garotas. Ajeitei as garrafas na bolsa e saí junto das duas gerente em direção à quadra, a maioria dos jogadores já estava ali, prontos para se aquecer.

Coloquei a bolsa vermelha da Nekoma num canto e olhei ao redor, girei os ombros e apoiei as mãos na cintura olhando os times começando a interagir.

— Calli-chan!

— Não — interrompi Bokuto imediatamente virando o rosto em sua direção com um sorriso.

— Oe! Eu nem disse nada — reclamou colocando as mãos para cima.

Troquei o peso de perna e então me virei — Então diga, capitão coruja.

— Faz um levantamento para eu cortar!

— Então era isso — fiz uma cara de surpresa e em seguida respondi num tom divertido —, não.

De choque, a bola caiu no chão rolando até o meu pé, poderia parecer que eu estava sendo apenas má, quando, na verdade, o time dele estava se organizando para começar a se aquecer e não estender a agenda para quando as outras escolas chegassem. Bokuto não se contentaria apenas com um levantamento.

Abaixei e peguei a bola nas minhas mãos, a segurando e girando — Seu time vai aquecer logo, não perca seu tempo com uma aposentada.

— Mas eu gosto dos seus levantamentos, são fáceis de cortar — ele de abaixou abraçando os joelhos encostado contra a parede do ginásio.

Balancei a cabeça, se fosse qualquer outra pessoa eu poderia interpretar de algumas maneiras, mas vindo de Bokuto sabia ser exatamente aquilo. Sem qualquer outra intenção por trás. Bati com a bola na sua cabeça de leve.

— Claro que são, se não fossem, que tipo de levantadora eu seria? Guarde sua energia para o treino, se sobrar alguma, posso até levantar.

O capitão das corujas pegou a bola das minhas mãos e levantou o rosto sorrindo — Combinado!

Não tem como odiar esse lado sincero e palerma dele.

— Ah, o time feminino deve aparecer depois. Você também gosta de jogar com a capitã, certo?

Encostei na parede ao seu lado, porém de pé. — Existe alguém que não gosta? Claro que é sempre bom ter alguém com qualidade técnica no mesmo time, mas a energia do time por si só é contagiante. Muito se deve a capitã, e Sora, elas lideram o time de maneira diferente. Já jogou com elas muitas vezes, sabe do que estou falando.

— Sim — respondeu num tom mais sério que geralmente não combinava com ele —, desde a primeira vez.

Prestei atenção em seu rosto e no brilho que tomou seus olhos, um riso puxou o canto da minha boca para cima. — Foi aí que você se apaixonou?

A nuca do capitão ficou vermelha, a vergonha se estendendo até as orelhas. O empurrei com o joelho — Que bonitinho, mas pare de ficar pensando na sua garota e vá se aquecer Chapeleiro Maluco.

— Calli-chan! — exclamou ainda mais vermelho.

— Atrapalho? — outro capitão de sorriso maníaco se aproximou. — Não está sendo um inconveniente com a nossa gerente de novo, está? Cabeça de vento.

O capitão das corujas se levantou para bater de frente com Tetsurou — Não estou não, tá legal?

Nisso, Kaori chamou o capitão indicando a aquecimento. Me deixando para lidar sozinha com Kuroo.

— Achei que você estava com problemas, mas parece que aprendeu a lidar bem com o Bokuto.

Dei de ombros — Também temos alguém simplista na Nekoma, eles não são tão diferentes assim. Não desgosto de Bokuto, apesar dele achar que sou uma máquina de levantamentos. Ele é um bom amigo para você manter por perto.

Tetsu olhou para onde o capitão saiu e abaixou a cabeça por um momento respirando audivelmente — Se você está falando.

Bati em seu ombro reclamando por ele não querer admitir, e com certa força o empurrei para onde os meninos da Nekoma também estavam se organizando para aquecer.

As outras escolas foram chegando aos poucos e também já foram se ajeitando para começar o aquecimento. Parece que a maioria dos garotos já havia se acostumado comigo, quando passavam por mim chegava a dar um aceno de cabeça e os mais corajosos até um sorriso.

Os únicos que se aproximavam sem muito pensamentos eram os próprios meninos da Nekoma, os mais velhos da Fukurodani e agora o levantador da Karasuno. Tobio. Assim que os corvos chegaram, eu estava perto da entrada, brincando com uma bola enquanto os outros continuavam se aquecendo.

— [Nome]-senpai, bom dia! — ele se curvou exageradamente.

— E aí Tobio? — coloquei a bola embaixo do braço, em seguida batendo com a livre em seu ombro. Ele se ajeitou. — Kenma me disse que ganharam o primeiro jogo das eliminatórias, parabéns.

— Sim. Obrigado, mas os próximos times vão ser o verdadeiro teste — ele olhou para a quadra com um certo brilho afiado no olhar.

Resmunguei — Sei de alguns times de Miyagi famosos, já que tenho um amigo que estuda na Aoba Johsai. São equipes tão difíceis assim?

Foi então que ele fez uma careta — Seijoh é particularmente complicada. Oikawa-san é um excelente levantador, o observei jogar por muito tempo.

— Não sei dizer que é admiração ou raiva que você está sentindo — brinquei —, mas para ser alguém que chama a sua atenção deve ser excepcional.

Olhei para a quadra e vi que o capitão estava o procurando o levantador, deixei o aluno do primeiro ano ir, prometendo falar mais com ele depois. É sempre bom falar com colegas de posição, Tobio, Kenma, e Akaashi sempre pareciam atentos a qualquer coisa que eu disser.

Joguei a bola dentro do carrinho e voltei para o lado de Naoi e treinador Nekomata. Oikawa... Esse nome não me é estranho, talvez Fideo já tenha dito alguma vez, mas também meu irmão postiço conta tanta fofoca da escola dele que é difícil lembrar todos os nomes. Poderia perguntar pessoalmente quando fosse o visitar em Miyagi, coisa que pelo escutei de meu pai pode acontecer em breve.

Ainda é uma ideia embrionária, mas Fabrício comentou que a província quer simular um acampamento espelhando o treinamento da juventude. Já que meu pai tem as credenciais para participar como profissional, talvez façamos uma visita em sequência. Primeiro Tóquio e depois Miyagi.

— Tem algo te incomodando [Nome]? — Naoi perguntou ao meu lado.

Balancei a cabeça em negação e cruzei as pernas — Não, só estou pensando. Vôlei é algo realmente divertido, não é? Dentro de quadra, fora dela, sempre tem muito para ver. Geralmente acho o que Kuroo diz estranho, toda a coisa sobre sangue e tudo, mas realmente é como um organismo vivo.

— Algo em particular que te fez pensar isso? — o treinador questionou com certa curiosidade.

— Os relacionamentos que o esporte cria, seja entre times locais, de cidades diferentes, do outro lado do mundo. É fascinante.

Nekomata-sensei pareceu concordar e balançou a cabeça — Esportes são incríveis.

— Se me é permitido perguntar — continuei —, porque virou treinador?

O mais velho olhou para cima, por um momento e então se voltou para mim com os olhos pressionados numa linha e um sorriso — Para abaixar a rede, a primeira e mais divertida lição é o quão divertido é ter sucesso em algo. Manter o vôlei, que é algo que adoro, vivo para as próximas gerações.

— A posição para ser sua neta continua vaga treinador? — deitei a cabeça em seu ombro ganhando uma risada em resposta. — Só um ano de Nekoma não é o suficiente para aprender com toda a sua sabedoria.

— Sempre será bem-vinda para visitar.

E assim o primeiro dia de treinos passou, houve uma pausa para o almoço, e quando retornamos até que a agenda oficial voltasse depois do descanso aproveitei para jogar com os garotos. Não em quadra, mas sim, numa brincadeira de não deixar a bola cair. Fazer isso entre os jogadores da Nekoma é sempre uma diversão, mesmo sem valer absolutamente nada, o time leva a sua fama de recepções bem a sério.

Me apoiei nos joelhos ofegante, passando a mão no queixo para secar o suor — Droga Yaku, você não pode ser um pouco ruim?

— Digo o mesmo — rebateu também cansado.

— Faça uma cortesia para a sua querida gerente, e perca então.

— Você não precisa da minha simpatia Calli-chan.

Travei os dentes olhando diretamente para os olhos do líbero, se é assim que ele quer jogar vou ter que tirar o meu lado espartana da gaveta. Um bom líbero consegue ler a trajetória da bola, não quer dizer que ele sabe como que posiciono meus dedos para ter efeito. Em partida é um pouco perigoso, mas numa brincadeira como essa posso ser um pouco mais malandra.

Levantei a bola e me preparei para cortar em sua direção, ele se posicionou corretamente, mas na hora de soltar a bola, mirei ela para seu pé.

— Essa foi baixa Calli-chan — reclamou o líbero com fúria nos olhos depois de perder para mim.

— Literalmente — sorri para ele.

— Certo, certo, já acabou — escutei o capitão da Nekoma falar, em seguida colocar uma toalha na minha cabeça cobrindo meus olhos. — Não precisam brigar na frente das crianças.

— Não tem ninguém brigando príncipe da Química — puxei a toalha e sequei meu rosto. — Afinal, eu venci

— Trapaceando, qualquer um vence.

Girei a toalha deixando um riso cínico ecoar da boca — Menos você.

Kuroo virou meus ombros e me guiou para longe, Kai entrou do outro lado também servindo de barreira entre nós dois. — Sei que vocês dois são demônios, mas pode maneirar um pouco?

— Sabe que não é sério — olhei por cima do ombro. — É só uma competição amigável.

— Não deixa de ser violenta — ele cutucou minha bochecha. — Se comporte e não morda os jogadores, Calli-chan.

Balancei a cabeça e voltei para a lateral enquanto o restante dos garotos voltavam para a quadra. Rindo mentalmente com a analogia feita ao meu antigo time, os lobos de Roma. Na primeira pausa, o líbero já estava de volta ao seu normal, sendo o melhor demônio-senpai que eu conhecia, mantendo a atmosfera normal até os últimos jogos do dia.

— Ubugawa está usando mais o centro hoje — avisei o líbero. — Comparado com os outros jogos de hoje mais ainda, parecem estar evitando Kuroo já que você está rotacionando com Lev.

— Entendido. — Yaku fechou a mão e bateu na minha antes de voltar para a quadra.

Os últimos jogos acabaram e então os técnicos organizaram os times para dar as instruções. Assim que as últimas palavras foram ditas, a porta do ginásio de abriu e com isso abri também o meu sorriso.

— Até que enfim — murmurei.

— Desculpe por interromper — a corujinha disse se curvando, com o restante do time seguindo seu movimento em seguida.

Diferente das outras vezes que as vi invadindo o treino masculino, estavam uniformizadas, trazendo uma atmosfera completamente avassaladora. A maioria do times já estavam acostumados, mas os corvos caipiras — como Tetsu os chama —, pareciam paralizados.

— Não é exatamente uma novidade capitã — disse o treinador do time masculino da Fukurodani. — Conhece as regras.

— Como a palma da mão treinador Yamiji, não se preocupe.

Vi até mesmo os treinadores entrarem no ginásio depois do time, indo direto conversar com os outros responsáveis.

— Você não fica feliz desse jeito quando me vê — Tetsurou reclamou em voz baixa. Bati em seu peito de leve e o empurrei.

— Não leve para o coração — pisquei e me afastei.

Esse treinamento acabou de ficar muito mais interessante.









N/A: Obrigada por ler até aqui!

Até mais, Xx!

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