Dou um pulo ao escutar o barulho de algo caindo no chão. Tal movimento desperta a pessoa ao meu lado, que no caso é Oliver.

Oliver?

Logo me recordo dos últimos acontecimentos: a ligação dele, o sonho da minha filha e nossa conversa no sofá. Pelo visto acabamos caindo no sono.

— Perdão! — digo, não olhando diretamente para o seu rosto.

Estou tão constrangida que provavelmente meu rosto todo está em um tom bem vivo de vermelho.

— Foi mal por ter acordado vocês. — a voz de Thony, vinda da cozinha, chama nossa atenção.  — Juro que tentei ser o mais silencioso possível, mas você sabe como sou um desastre na cozinha, Ali. — abre um sorriso amarelo.

— Tudo bem! — respondo, colocando-me de pé. Evitando o olhar do meu amigo também.

O silêncio se instala, e eu não ouso quebrá-lo, apesar de estar incomodada com toda essa situação constrangedora.

— Bom dia, Anthony! — Oliver o cumprimenta. — A Bonnie acordou?

— Bom dia! Acho que não. Não sabia que ela estava aqui. — aponta para o homem, ainda sentada no sofá, com o queixo. — Na verdade, fiquei surpreso ao vê-lo aqui também. — não encontrei zombaria em seu tom. — Aconteceu alguma coisa com a pequena?

— Não, ela só teve um pesadelo e quis ver a mãe. — Oliver se coloca de pé. — Vou dar uma olhada nela.

Assentimos, e ele sobe.

Silêncio.

— Er...

— Fique tranquila! Não vou falar nada, Ali! — ergo o rosto, agradecida por sua empatia. — Apesar de que não sei se seria capaz de te deixar ainda mais constrangida. Você está parecendo um pimentão vermelho!

Pego a primeira almofada que vejo e lanço em sua direção. Ele segura na mesma hora.

— Uau! Acho que seria um excelente jogador de futebol americano! — diz rindo.

— Cale a boca! — prendo o cabelo em um coque alto e vou para a cozinha.

Thony me abraça, depositando alguns beijos no alto da minha cabeça.

— Gostaria de ficar para o café em família, mas o culto começará em vinte minutos.

— Já tinha me esquecido do culto de manhã. — arregalo os olhos.

Oliver desce a escada neste instante.

— Fique tranquila, Ali! Imprevistos acontecem. Apenas fique com a Bonnie. — pisca para mim. — Além do mais, você nunca visitou a igreja da Jully. Lá é muito legal também. Acho que deveria ir hoje. — seu olhar vai para Oliver. — Vai com ele, aproveita que o Oliver também está congregando lá.

— Pensarei nisso! — foco minha atenção na preparação do café da manhã.

— Bom, estou indo lá! — ele se despede de mim com mais um beijo no topo da cabeça e segue até Oliver. Observo de soslaio a interação dos dois. — Foi bom te ver, cara! Até mais.

Quando escuto a porta sendo fechada, viro de costas para a visita e começo a preparar os ovos fritos e a linguiça. Estava tão concentrada, ou tentando manter minha mente concentrada, que não percebo o momento em que Oliver se aproxima. Apenas noto sua presença quando ele fala comigo.

— Quer ajuda? — a faca que estava encostada no tomate, derrapa da superfície lisa e corta o meu dedo.

— Ai! — solto um gemido de dor, afastando-me da bancada e dando com as costas em Oliver, que estava atrás de mim.

— Meu Deus! Me desculpe, Alice! Não tive intenção de te assustar. — ignoro suas desculpas ao perceber o líquido vermelho escorrendo do meu indicador.

— Ah, não! — puxo o ar com força e desvio o olhar para a sala. Thony tinha que ter saído logo agora.

Volto a me encostar na bancada, começando a sentir as pernas bambas. Oliver ergue minha mão e abre um sorriso de lado.

— Tinha me esquecido como você é fraca para essas coisas. — apenas fecho os olhos, tentando manter minha respiração regular. — Onde tem materiais para primeiros socorros?

Aponto para um dos armários da cozinha.

— Na verdade, em qualquer cômodo que você entrar, encontrará alguma caixa de primeiros socorros.

— Anthony...

— Exatamente! — dou um sorriso.

Oliver me guia até uma das banquetas, onde me sento e permito que ele cuide de mim, como meu amigo costumava fazer. Diferente de Thony, Oliver faz isso em silêncio.

Abro os olhos apenas quando sinto ele enrolar o dedo com esparadrapo. Meus olhos vão das nossas mãos unidas para o seu rosto concentrado. Aproveito este momento para analisar cada detalhe de sua face. Cada mudança que não tinha me permitido perceber, como as pequenas rugas ao redor dos olhos. A barba perfeitamente feita. Uma nova cicatriz perto dos lábios.

Seus lábios...

Sua risada me faz despertar.

— Assim eu ficarei constrangido. — comenta sem desviar os olhos do seu trabalho.

Fecho os meus com força e abaixo a cabeça. Apesar da vergonha, tento conter um sorriso ao notar a beleza um pouco mais amadurecida de Oliver.

— Pronto! — diz baixo.

Ele leva minhas mãos aos seus lábios. E neste momento nossos olhos se encontram pela primeira vez, desde a noite anterior. Até penso em desviar, mas olhar para aqueles orbes verdes acinzentados era reconfortante. Era maravilhoso.

— Me desculpe pela noite passada. — diz. — Acabei pegando no sono também.

— Tudo bem! — olho para o lado, mas Oliver toca o meu queixo com delicadeza, trazendo-o de volta.

— Não precisa fazer isso, Alice.

— Isso o quê? — eu só queria fugir dali. Caso contrário, minhas mãos agiriam por si só.

— Lutar contra o que está sentindo. — emudeço, sentindo a garganta secar.

Ele se afasta, sem dizer nada, e analisa a bancada atrás de mim. Sigo seu olhar.

— Confesso que estou doido para comer a sua comida novamente. Faz tanto tempo... Só de pensar dá água na boca.

— É verdade! — sorrio, encabulada. — Deixa eu terminar tudo isso antes que a Bonnie acorde. — olho para ele por sobre os ombros. — Poderia colocar a mesa?

— Claro! — ele concorda e começa a fazer o que peço.

***

Oliver, Bonnie e eu estávamos esperando Jully e Bruce na Westminster Bridge, perto de um grupo de músicos. Nossa filha se divertia com as músicas tocadas pelos artistas de rua. Apesar de morarmos em Londres, mal saíamos para fazer passeios turísticos. Poucas foram as vezes que Thony, Harper e eu fizemos isso com ela.

— Tal mãe, tal filha. — dou uma risada leve, ainda a observando dançar e bater palmas.

— Não posso negar!

— Fiquei surpreso por ter aceitado o convite. — comenta, também observando a filha.

Após o almoço, que também fiz para nós. Oliver me convidou para passear à tarde com eles.

— Saiba que eu só aceitei porque preciso conversar com sua irmã sobre o aniversário dela. — olho para ele, com um sorriso zombeteiro.

— Vou fingir que acredito. — devolve o sorriso. — Falando nisso, ela quer mesmo comemorar em Cambridge?

— Parece que sim. — dou de ombros.

— Está confortável com a ideia? — pergunta com receio.

— Por que não estaria?

— Gianna Walker.

— Ah, isso! — passo a observar o rio Tamisa diante de nós. — Me perdoe, mas não vou deixar de viver por causa da sua mãe, Oliver. Ainda mais agora que não há nenhum segredo entre nós.

— Não precisa se desculpar! Você está certa, e eu estou feliz em saber disso.

— Chegamos! — olho para o relógio e abro um sorriso largo.

— Os seus atrasos estão se tornando mais constantes, senhorita Walker, quase senhora Scott.

— Meu momento de noiva histérica e aniversariante do momento está chegando. Apenas releve, Lice! — dou um abraço apertado na minha amiga. — Já estava com saudades.

— É, eu também!

— Titia, Ju!

Bonnie corre para os braços da tia, enquanto eu cumprimento Bruce.

— Para onde vamos? — Jully olha para o irmão, que sorri misterioso.

No entanto, descobrimos o destino logo quando voltamos a caminhar.

— Isso está me lembrando da nossa viagem para cá, há alguns anos. — Bruce comenta, analisando a London Eye.

— Não tem criatividade, irmão? — Jully resmunga ao lado do noivo. — Tantos lugares diferentes para irmos...

— Não reclame, Sméagol! Vocês que resolveram se meter em um passeio de família. — Oliver olha para a filha, que está em seu colo, com um sorriso bobo. — Bon queria vir para cá e eu estou apenas realizando seu desejo.

— Que fofinho! O pai do ano! — aperta a bochecha do irmão com mais força do que o normal. Talvez seja por causa do apelido que ela não suporta.

— Desta vez eu terei que concordar com o Oliver. Nossa filha estava radiante com a ideia de andar na roda gigante. — dou risada, acariciando sua bochecha vermelha.

— E depois eu quero comer. Já estou com fome.

— Me conte uma novidade, minha draguinha! — aperto sua barriga e ela ri.

— Podemos comer pipoca? Ou algodão doce!

— E que tal um hamburgão? — Jully se aproxima da sobrinha. — Tenho um lugar perfeito! — seus olhos fitam nossos rostos com certa animação. — Como o Bruce falou sobre nossa viagem, pensei em irmos ao KÊPUB. O que acham?

Bruce parece gostar da ideia da noiva. Oliver fica em silêncio, analisando a proposta. Eu penso em dizer que é uma má ideia, mas o filho mais velho dos Walker responde primeiro.

— Acho que será uma excelente ideia! — sorri, olhando para a irmã. — O nosso pai tinha o costume de nos levar lá quando éramos crianças — olha para a filha. —, acho que seria legal continuar essa tradição. — nossos olhos se encontram. — O que acha?

Meus argumentos vão por água abaixo. Apenas dou de ombros.

— Por mim tudo bem!

— É a nossa vez! — Bonnie grita, apontando para a próxima cabine que acabara de chegar.

Com rapidez, e um pouco de receio, dou um passo, mas travo. Oliver segura minha cintura e se inclina em minha direção.

— Acha que deixarei você cair, mulher?

Sinto um arrepio, não apenas pelo tom de sua voz, mas também por recordar o que vivemos neste mesmo lugar, há alguns anos. Pelo sorriso no rosto de Oliver, ele tinha feito isso de propósito. Crispo os olhos e subo sem sua ajuda.

Ouço sua gargalhada atrás de mim, mas o ignoro. Acomodo-me perto dos meus amigos, em uma das extremidades. Bonnie estava enérgica com toda a novidade. O que me deixou um pouco arrependida por não ter trazido minha filha antes.

Enquanto a roda girava, o sol se escondia por trás dos prédios londrinos, criando um cenário incrível e super romântico. De tirar o fôlego, na verdade.

— Eu disse que era espetacular ao pôr do sol. — Oliver diz ao meu lado.

— É! E você tinha razão! — minha voz sai baixa.

Observo a paisagem diante de nós, completamente encantada. Poderia vir todos os dias assistir o sol se pôr daqui de cima. Jamais me cansaria desse cenário. Mas ao olhar para o lado, e ver Bonnie acariciando o rosto do pai e sorrindo para ele, enquanto recebe beijos em sua bochecha em troca, descobri que este, sim, é o cenário que jamais me cansaria de assistir.

>>>><<<<

Oii, gente! Resolvi trazer mais um capítulo. Eu, particularmente, achei bem fofinho 🥰

Att.
NAP 😘